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COLUNA | Kalil e o político entre os escombros da “Nova República”

Douglas SilvaProfessor de Sociologia

sexta-feira 12 de fevereiro de 2021 | Edição do dia

Ainda no final do ano passado, Vera Magalhães (entrevistadora do programa Roda Viva) falava com todo entusiasmo, em seu Twitter, sobre a entrevista que viria a fazer com o prefeito de BH – "puro creme do milho" –, reeleito no primeiro turno da última eleição municipal, Alexandre Kalil (PSD). O entusiasmo de Vera vinha do fato de Kalil ter saído da zona dos “outsiders” da política mineira para se tornar popular entre a velha política tradicional. A euforia da apresentadora do programa é a mesma demonstrada quando fala dos seus, como os tucanos paulistas, na tentativa de opor tais atores golpistas ao bolsonarismo e a preparação do terreno para a corrida presidencial de 2022.

Kalil, podemos dizer se tratar daqueles políticos que, com a crise econômica e política agravada pela chegada da pandemia do coronavírus, saiu das sombras e ganhou seu espaço sob o sol do regime golpista por um ilusório combate a pandemia. Ilusório porque se deu sem testes massivos, com ocupação de UTIs em estado crítico – inclusive nos últimos dias –, mais de 2 mil mortes e mais de 96.000 casos confirmados. Todavia, são sobre essas figuras que alguns buscam alçar novas alternativas frente a Bolsonaro e construir aquilo que insistem em chamar de uma saída democrática contra o capitão, ainda que a mesma se dê com os mesmos responsáveis por pavimentar a estrada pela qual Bolsonaro, militares e extrema direita passaram sem que a “direita democrática” pestanejasse.

Agora, na última segunda-feira (8), em entrevista para a Folha de São Paulo, Kalil foi questionado sobre o que acha do impeachment e, como a maior parte da direita brasileira, claro, se colocou contrário. Não porque o impeachment represente uma saída progressista como tentam pintar setores da esquerda, mas porque, assim como outros atores golpistas, jogam para ganhar com Bolsonaro, como os bilhões distribuídos ao centrão na eleição da Câmara, buscando assegurar o mínimo de estabilidade para garantir o que realmente importa: os ataques contra os trabalhadores, enquanto esperam 2022. Mas, enquanto isso, e o partido de Kalil, o PSD? Bem, “praticamente todos fechados com Arthur [Lira], a começar pelo atual e futuro líderes”, como afirmou Kassab, presidente do partido, antes da eleição para a presidência da Câmara dos Deputados. Resultado: o partido de Kalil terminou elegendo Lira na Câmara e, com ele, toda uma agenda de ataques que une bolsonarismo à direita “tradicional”.

Com elogios a Doria, quem Kalil chamou de “pai da vacina”, o prefeito de BH faz um aceno, ainda tímido, em direção ao governador de SP, que governa o estado com os olhos voltados para o horizonte presidencial de 2022. Com a velha ladainha de “nem direita nem esquerda”, Kalil, que tem “pauta de direita, liberal”, faz coro na necessidade de avançar com privatizações e acha que “o Estado tem que tirar a mão de tudo”. Uma entrevista que, com certeza, fez Vera Magalhães saltar de alegria.

Se é verdade que Kalil faz críticas a Bolsonaro e ao governador de MG, Romeu Zema (NOVO), também é verdade que essas críticas não passam pelos inúmeros ataques promovidos por ambos os governos contra a classe trabalhadora. As críticas do empresário são, justamente, pelo governo não ter “entregado o que prometeu”, a saber, toda a agenda de reformas que hoje busca aprovar com a ajuda de um presidente da Câmara e Senado eleitos sob muito dinheiro, cargos distribuídos pelo Planalto e champanhe. Pois, para Kalil, se o governo entrega “o que prometeu, vai ser reeleito”. No fim, uma agenda de ataques une diversos atores desse novo regime político, erguido sobre os destroços da “Nova República”, sobretudo quando, inclusive entre “diferentes”, existe o que os unem, bem como o mais novo presidente do Senado que na sexta-feira passada teve encontro marcado com prefeito de BH e governador de MG.

A entrevista do prefeito mineiro é um deleite para liberais e toda a velha direita tradicional, pois Kalil encarna todas as qualidades que aquela apresentadora citada logo no início podia esperar, inclusive a velha e boa dose de demagogia de quem joga para agradar “gregos e troianos” numa entrevista que se confunde com declarações de Mourão, quando o prefeito de BH chama a DITADURA de 1964 de revolução e que só veio a “entender a revolução depois que ela acabou” (sic!), já demonstrando, por como a chama, que não entendeu muita coisa.

Empresário e preocupado com sua classe, ele emerge na política mineira como um legítimo representante dos interesses de classes burguesas ao mesmo tempo em que, em meio à crise orgânica (social, política e econômica), se alçou como uma figura das “menos piores” possíveis frente a extrema direita, muito disso por ter, frente a todo o negacionismo bolsonarista, surgido como um bom gestor diante da pandemia, ainda que tal gestão, assim como de Doria, signifique ter mantido trabalhadores em ônibus lotados, sem testes massivos, aumentando o número de contaminados e mortos, enquanto seu slogan era: #ficaemcasa.




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