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LUTA INDÍGENA | Indígenas fecham Avenida Paulista em ato pela demarcação de terras

Considerados extintos durante 300 anos, os Tupinambá de Olivença fecharam na tarde de segunda-feira, 7 de setembro, uma das avenidas mais importantes do Brasil. Junto com eles, um grupo de aproximadamente 200 manifestantes acompanhavam o ritual que pedia pela demarcação de terras e o fim do genocídio, que tem aumentado de forma brutal, principalmente contra os Guarani-Kaiowá no Mato Grosso do Sul.

terça-feira 8 de setembro de 2015 | 00:45

Ao chegar no Vão Livre do MASP, onde se concentraria o ato, um pequeno grupo de pessoas com uniformes do exército e cartazes pedindo a intervenção militar e o impeachment da presidente Dilma Rousseff se reuniam tentando fazer algum barulho. Com uma faixa que dizia claramente “nossa bandeira nunca será vermelha”, é possível estabelecer um diálogo com o ato dos Tupinambás e perceber como estas pessoas estão interessadas apenas em defender os direitos de uma parcela mínima da população. Enquanto isso, ao ritmo das maracás e pisadas fortes no chão, os indígenas mostravam aos paulistanos que, apesar da bandeira de nosso país não ser vermelha, a nossa terra é muito vermelha, tanto pela cor dos povos originários, como pelo sangue que foi derramado pelos invasores que queriam colonizar estas terras.
E se São Pedro não consegue fazer chover na Cantareira, certamente ele deve pedir ajuda aos Tupinambás. Enquanto realizavam seu ritual, cantando letras para Tupã e pedindo chuva para a fertilidade de seus solos, uma tempestade com raios e trovões começou a cair sobre as pessoas que se dirigiram imediatamente para a parte coberta do vão.

“Nós vivemos uma guerra há 515 anos”, denunciava Maria Tupinambá em sua fala extremamente politizada e consciente das ações do Estado sobre os povos indígenas. Ao contrário do estereótipo que muitas pessoas carregam sobre estes povos, que seriam incapazes de falar por si mesmos e lutar por seus direitos, Maria faz um extenso depoimento sobre a omissão do Estado e sua atuação ao lado do agronegócio, que tem se mobilizado fortemente com políticas anti-indígenas, especialmente no Congresso.

Veja fala de Maria Tupinambá no ato.

Uma das medidas contra estes povos é a PEC 215/2000, que pode ser levada a votação a qualquer momento. A proposta desta emenda é passar do Executivo para o Legislativo a demarcação dos territórios indígenas, além de homologar apenas os territórios que foram ocupados até 1988. Sabemos que esta PEC é inconstitucional e atinge diretamente os direitos indígenas assegurados no artigo 231 da Constituição Federal, uma vez que esta decisão ficaria a cargo do Congresso que é composto em sua maioria por ruralistas e nenhum representante indígena, a demarcação dos territórios provavelmente iria cessar. Além disso, homologar somente os territórios ocupados até 1988 é deixar de lado povos como os Guarani-Kaiowá, que por conta dos conflitos com latifundiários, nunca puderam permanecer num local fixo e assegurar suas terras.

“Os bandeirantes de ontem são os ruralistas de hoje”, gritavam os Tupinambá. Enquanto isso, a icônica estátua do bandeirante Manuel Borba Gato amanhecia pichada e ensanguentada com frases que diziam “bandeirante ruralista assassino” e “Guarani-Kaiowá resiste”.

Estátua do Borba Gato nessa manhã de 7 de setembro

É cada vez mais evidente a violência dos ruralistas pela defesa de suas propriedades. No final de Agosto presenciamos o assassinato de mais uma liderança indígena durante um confronto com fazendeiros.

Mas esta violência não vem apenas por parte dos ruralistas. Hoje durante o ato do Grito dos Excluídos, realizado anualmente no dia da independência, uma indígena foi presa e agredida covardemente pela polícia no município de Montes Claros – MG. Durante um tumulto causado pelas falas do prefeito, uma grade foi derrubada, e Juvana Petyrhara da etnia Xakriabá que segurava um cartaz com a segunte frase: “somos Todos Guarani-Kaiowás contra o genocídio a mando do agronegócio”, foi violentamente abordada por um agente da PM, que a segurou contra a parede, nocauteou e derrubou-a no chão, pressionando fortemente sua cabeça contra o chão. Segundo a PM, Juvana teria derrubado a grade num ato de vandalismo e foi necessário realizar a prisão de maneira violenta. A indígena que é estudante de direito terá seu caso acompanhado pela justiça comum, já que a PM afirma que não houve nenhum direito indígena relacionado ao acontecimento. Porém sabemos como é a atuação da PM é truculenta em relação a manifestantes. Ocorreu um princípio de tumulto, onde justamente uma mulher indígena foi abordada de maneira extremamente violenta. A comunidade Xakriabá já recolheu imagens para realizar um dossiê e afirma que vai acionar a comissão de direitos humanos para tratar do caso. A mesma polícia que agrediu Juvana também atua nas zonas de conflito em MS, bloqueando estradas para indígenas e fornecendo mantimentos para assegurar o conforto dos fazendeiros, enquanto esses assassinam pessoas inocentes.

Os povos indígenas voltam a passar por momentos difíceis, uma violência que dá continuidade a todos os crimes que lhes foram cometidos desde a chegada dos portugueses ao Brasil. Mesmo unidos e mobilizados, a situação parece ficar cada vez mais apertada com o poder do agronegócio que só aumenta.

A população não-indígena tem se mobilizado cada vez mais e se tornado mais consciente acerca das 243 etnias indígenas que ocupam esse país, mas é necessário que nos tornemos cada vez mais presentes nessa luta. Reconhecer o maior genocídio da história da humanidade é fundamental para qualquer movimento social que luta por direitos nesse país. Não basta apenas afirmarmos entre amigos que temos sangue indígena, pois esse sangue que carregamos no corpo, na maior parte das vezes não veio com felicidade. É consequência de diversas mulheres que foram retiradas de suas aldeias, estupradas e violentadas. A miscigenação brasileira não representa uma diversidade bonita e característica do nosso povo como muitos afirmam, ela é fruto de um estupro. Lutar ao lado desses povos é reconhecer que tanto eles como nós merecemos o direito a terra, a criação de nossos filhos, uma vida com direito a educação e trabalho dignos e também pela reparação do maior crime que a humanidade cometeu, e parece evitar discutir até hoje.




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