Logo Ideias de Esquerda

Logo La Izquierda Diario

SEMANÁRIO

Hungria: uma revolução operária e socialista contra o stalinismo

Elizabeth Yang

Hungria: uma revolução operária e socialista contra o stalinismo

Elizabeth Yang

A revolução húngara é uma das mais importantes do século 20, devido ao seu caráter operário e aos seus objetivos avançados: varrer a burocracia stalinista russa do poder e ao mesmo tempo manter as conquistas que significaram a expropriação da burguesia após a Segunda Guerra Mundial. O que Trótski já tinha escrito como uma necessidade, que chamou de revolução política, para retomar o caminho revolucionário, e que as massas fizeram em forma espontânea em alguns países do Leste Europeu.

O imperialismo e o stalinismo quiseram desvirtuar seu valor histórico, assumindo a luta do povo húngaro como uma tentativa contrarrevolucionária de voltar ao capitalismo. Mas como veremos nesse artigo, os fatos demonstram a falsidade dessa interpretação política.

Os antecedentes imediatos

Em março de 1953 morreu Stálin e foi como um sinal aberto para o início de processos de luta e rebeliões operárias contra a burocracia, que começaram com greves na Tchecoslováquia e na Alemanha Oriental.

O stalinismo da União Soviética tinha imposto aos alemães um aumento muito alto da cota de produção, de 10%, sem nenhum aumento salarial, mas com incremento nos preços dos produtos de consumo massivo. Esse ataque acabou desencadeando uma greve metalúrgica em Berlim no 17 de junho, que depois se tornou uma greve geral e, finalmente, uma insurreição que rapidamente se espalhou para mais de 400 cidades.

Junto com as reivindicações econômicas vieram as demandas de liberdades políticas contra os burocratas e por eleições livres, enquanto a nível nacional se desenvolviam os conselhos de trabalhadores, ocupações de prédios e ataques às sedes do stalinismo. Nas cidades de Halle, Merseburg e Bitterfeld, os comitês de greve eleitos começam a ser o novo poder, e clamavam pela formação de um governo “metalúrgico e revolucionário”. Esta insurreição foi brutalmente esmagada pelos tanques do Exército Vermelho.

A luta de classes questionava pela primeira vez a burocracia stalinista de forma revolucionária. Até os prisioneiros de Vorkuta fizeram uma greve geral dos trabalhadores dos campos de concentração na URSS. Eles também tiveram seus comitês clandestinos de greve que possibilitaram superar o medo da repressão. Em 29 de julho, a greve terminou com a intervenção das forças de segurança, centenas de mortos e cerca de 7.000 prisões. O movimento conseguiu se espalhar para outros campos de concentração, influenciando posteriormente na decisão para dissolvê-los.

Apesar das graves derrotas, três anos depois, o processo revolucionário continuou na Polônia e na Hungria.

Na Polônia, os metalúrgicos da fábrica da Zispo, da cidade de Poznan, iniciaram uma greve, em junho de 1956, também contra as metas de produção e pelo aumento de salários.

A luta seguiu com uma grande mobilização de 100 mil pessoas, reprimida com violência, mas a onda de greves se espalhou e começaram a surgir conselhos de trabalhadores exigindo a autogestão das empresas. Esta situação teve uma saída com a assunção do governo de Wladyslaw Gomulka, que tinha sido secretário do PC durante a ocupação nazista. Um líder dissidente, mas vindo do próprio aparato stalinista, que podia ganhar popularidade como reformista e afastar a ameaça de uma revolução.

Como foi na Hungria?

Em marco de 1955 nasceu o Círculo Petöfi, que reunia intelectuais, artistas, jornalistas e estudantes. Só depois do “discurso secreto” de Nikita Khrushchev no XX Congresso do PCUS, em fevereiro de 1956, o círculo teve um eco massivo, quando milhares de jovens e inclusive de trabalhadores foram debater nesse espaço político.

Khrushchev tinha denunciado os crimes de Stálin, com o objetivo de descarregar a responsabilidade do regime “nas costas de um morto”, e também declarou a coexistência pacífica entre os dois regimes mundiais, e que, portanto, não era provável uma terceira guerra mundial no horizonte imediato.

Por esses tempos, também aconteceu a “reconciliação” com o marechal Tito da Iugoslávia, quem tinha relativa independência de Stálin. Todos esses elementos fortaleceram as alas “críticas” das burocracias locais.

Em solidariedade com a Polônia, no 23 de outubro de 1956, o Círculo Petöfi convocou mobilizações com a palavra de ordem “façamos como os poloneses” com a ideia de que o povo desse país teria conquistado sua independência.

Grande parte do povo húngaro ouvia programas de rádio ocidentais, em especial a Rádio Europa, que era grátis. Sob a liderança imperialista dos EUA, a estação sugeriu que o Ocidente faria todo o possível para libertar os povos “oprimidos pelo comunismo” em referencia ao stalinismo.

O Círculo Petöfi intensificou as suas críticas ao stalinismo e gerou um movimento que tentaria realizar as reformas no regime.

Quando as autoridades húngaras souberam da revolta dos trabalhadores poloneses, proibiram as atividades da oposição e suspenderam os fóruns do círculo. O movimento de oposição continuou se desenvolvendo, e uma nova intervenção da burocracia substituiu o odiado Rakosi por Ënro Gëro, que não mudou muito a situação.

Outros setores mais radicais de estudantes e intelectuais optaram por agir. Os universitários de Szeged, no dia 16 de outubro, formaram um corpo independente, a Organização Unificada de Estudantes Universitários e Institutos Superiores (em húngaro, MEFESZ). Mais tarde, cada universidade e instituto superior da Hungria aderiu a essa organização formulando suas próprias demandas, que não eram apenas reformas estudantis e sociais, mas também manifestos políticos, incluindo a retirada das tropas russas, a exigência de punição dos culpados e a convocação de novas eleições.

Foram justamente esses estudantes da Politécnica e os da Filologia que participaram mais ativamente e formularam os famosos 14 pontos (ou 16, de acordo com outras versões) com as reivindicações da oposição política: nomeação de Imre Nagy como chefe do Governo, convocação ao congresso do Partido, revisão do sistema de entrega forçada de produtos agrícolas e do regulamento; e uma maioria de objetivos democráticos e nacionais: sistema multipartidário, eleições livres, liberdades civis, independência econômica, restituição de feriados e símbolos tradicionais e nacionais. Todos os pontos eram liderados pela retirada das tropas soviéticas.

Os estudantes organizaram a manifestação do dia 23 de outubro, para tornar públicas as suas reivindicações e expressar a sua solidariedade para com o povo polaco. Não só havia estudantes, também crescia a participação dos trabalhadores e das massas de Budapeste.

A radicalização da juventude avançou queimando as bandeiras e símbolos “soviéticos”, como a estrela imposta em sua bandeira nacional, eles convidaram os soldados do quartel a se unirem e lançaram duas palavras de ordem que foram o centro da cena: “Greve Geral!” e “Fora os Russos!”. A revolução húngara já tinha começado.

Um grupo foi para a estação de rádio em Budapeste, eles queriam o manifesto da Politécnica fosse lido no ar, mas os chefes rejeitaram o pedido. Muito pelo contrário, Ernö Gerö em seu discurso à noite e na mesma rádio, condenou a manifestação como “nacionalista” e “contra-revolucionária”. A resposta foi a derrubada da estátua de bronze gigante de Stálin. Por volta das 21h, desde o prédio da rádio atiraram contra os manifestantes que insistiam em declarar as suas demandas. Agora o a resposta deles foi diferente, não bastava com jogar símbolos e estátuas, e foram procurar as armas que haviam obtido. Neste momento a manifestação tornou-se um levante armado ou insurreição.

A polícia política, a AVH (Allam Vedelmi Hatosagnom, em português Autoridade de Defesa do Estado), tinha atirado contra os manifestantes e a juventude. Os armamentos para os trabalhadores e estudantes vieram das fábricas e armazéns militares. Três tanques do exército foram enviados pelo governo para reprimir e acabaram do lado dos insurgentes, incluindo seu próprio comandante Pál Maléter. Tanques soviéticos entraram em Budapeste na madrugada de 24 de outubro, tentando usar a tática de aterrorizar, adotada com sucesso durante o levante de Berlim de 1953. Mas não deu certo porque vários milhares de manifestantes já tinham adquirido armas na noite anterior, e lutaram nas ruas.

Nesse mesmo dia, Imre Nagy assumiu o cargo e, após os confrontos, tentou fazer com que os jovens entregassem as armas, se rendessem, prometendo-lhes que a lei marcial não se aplicaria contra eles. Os prazos foram estendidos, mas os lutadores nunca desistiram [1].

Naqueles dias surgiram os primeiros Conselhos Operários nas cidades de Miskolc e Budapeste, com o objetivo de dirigir as fábricas. Também nestes organismos revolucionários, os jovens eram maioria, ganharam prestígio e respeito durante a resistência dos anos anteriores.

Havia uns 2.100 conselhos operários no país com 28.000 membros e nos comitês locais participavam várias dezenas de milhares [2]. Deve-se levar em conta que os delegados participavam das comissões ou conselhos eram por sua vez votados nas fábricas e estabelecimentos. Tomando uma população que no máximo naquela época atingiria cerca de 10 milhões de habitantes, há uma proporção de um comitê para cada 5.000 húngaros e pelo menos um membro ativo desse conselho em cada 350 habitantes. A relação é ainda mais estreita se considerarmos apenas os trabalhadores. Ou seja, uma proporção de representatividade direta muito maior do que em qualquer democracia burguesa e poderíamos até dizer mais do que em muitas das centrais sindicais que conhecemos.

Existiram várias resoluções do Conselho Central dos Trabalhadores ou do Manifesto Juvenil que davam conta das aspirações das massas: “Em 31 de outubro de 1956, por exemplo, foi realizado um encontro de trabalhadores com a presença de delegados de 24 grandes conglomerados (...). Neste encontro, foi aprovada uma resolução que em seus nove pontos estipulava os ‘direitos básicos e funções dos conselhos operários’. O primeiro ponto afirmava: ‘A fábrica é propriedade dos trabalhadores’, e o segundo: ‘Os conselhos operários são eleitos democraticamente com controle total do conglomerado [3]”.

Os combatentes atacaram os tanques russos durante seus movimentos numa forma muito engenhosa, causando-lhes várias perdas. Eles colocavam no caminho do tanque pratos de metal para que parecessem minas explosivas. Na dúvida, o tanque diminuía a velocidade, e os combatentes aproveitavam para colocar um ferro nas rodas e assim interromper a marcha, subiam no veículo e jogavam um coquetel molotov. A multidão armada era composta principalmente de trabalhadores e aprendizes, adolescentes ou estudantes do ensino médio, homens e mulheres jovens, de pouco mais de vinte anos. Geralmente, eles vinham de albergues para trabalhadores e residências de estudantes nos distritos industriais mais pobres de Budapeste.

O exército stalinista teve que ir embora derrotado, mas será apenas a primeira batalha, a guerra ainda não tinha acabado. Esta seria a primeira fase da Revolução Húngara. Haverá uma segunda invasão de tropas no 4 de novembro. Naquele curto período, Imre Nagy, como primeiro-ministro, desenvolveu uma política conciliatória com o poder da URSS, com o objetivo de avançar com algumas reformas e tentar restabelecer a ordem.

Esse objetivo era completamente utópico porque os conselhos e comitês de trabalhadores, exercendo duplo poder, pressionavam constantemente Nagy e seu governo a seguir um caminho revolucionário, que exigiam a liberdade dos partidos socialistas, retirada das tropas da URSS, o fim do Pacto de Varsóvia e a declaração de neutralidade e outras demandas importantes.

O stalinismo tomou a decisão de derrotar a revolução e não negociar, para acabar com o processo que tinha se iniciado na Alemanha Oriental. A queda do regime de partido único junto ao desenvolvimento de conselhos operários, mais o desejo de independência nacional que poderia se desencadear em outras nações e nacionalidades oprimidas sob a dominação da URSS, pôs em perigo a burocracia stalinista.

Os combatentes e conselhos de trabalhadores não depositaram confiança no novo governo de Nagy, especialmente na retirada das tropas russas da Hungria, e continuaram a Greve Geral. O governo de Imre Nagy era fraco, do tipo “kerenkista”, como o que surgiu na Rússia durante a revolução de fevereiro de 1917 após a queda da autocracia czarista.

A partir de 1º de novembro, as manobras do Exército Vermelho foram sendo preparadas para entrar em Budapeste. O governo Nagy simplesmente usou as suas forças para negociar a retirada das tropas, e ao mesmo tempo declarou o abandono unilateral do Pacto de Varsóvia. Com estes anúncios os Conselhos de Trabalhadores reunidos em Budapeste decidiram erroneamente confiar no governo e suspender a greve geral. A Igreja Católica saudou o governo, e o fim da greve.

Na madrugada de 4 de novembro, o Exército Vermelho russo invade. A mensagem de rádio de Imre Nagy foi de derrota, depois ele se refugiou na Embaixada da Iugoslávia convidado por Tito. A burocracia stalinista, após impor uma derrota contra a revolução nas ruas, colocou como primeiro ministro Janos Kadar.

Os principais centros de resistência foram os Conselhos Operários, e em meados de novembro, surgiu um centro reconhecido em todo o país: o Conselho Operário Central da Grande Budapeste, mas já era tarde mais.

A resistência dos combatentes foi heroica contra um exército altamente superior em armamento. Apesar de todos os esforços, eles foram derrotados.

Faltou um partido revolucionário que ganhasse a direção dos conselhos e que conduzisse as massas e sua vanguarda revolucionária ao não depositar confiança no governo reformista de Imre Nagy. Para enfrentá-lo era necessário preparar sua derrubada com um programa claro e uma estratégia revolucionária que levaria a cabo a insurreição para que a classe trabalhadora tomasse o poder. Mas tal partido, que cumprisse o papel do Partido Bolchevique na revolução russa de 1917, não existia.

No 21 de novembro, Kadar tentou com a ajuda militar soviética impedir a formação do Conselho Nacional dos Trabalhadores. O impasse nas negociações e as prisões levaram o Conselho Central dos Trabalhadores a convocar uma greve geral para os dias 11 e 12 de dezembro. A resposta foi a proibição dos Conselhos Operários, o estabelecimento da lei marcial e os campos de concentração. Não havia mais forças de resistência.

Milhares de refugiados migraram para o oeste, enquanto aqueles que permaneceram no país enfrentaram represálias massivas.

A repressão teve uma crueldade brutal que perdurou muitos anos. A lei marcial foi imposta, em todos os três anos seguintes, mais de 230 húngaros que participaram da revolução foram enforcados, incluindo Imre Nagy em junho de 1958. Mais de 20.000 foram para a prisão e cerca de 13.000 internados, 200.000 deixaram o país e foi a maior emigração do pós-guerra.

No entanto, essas revoluções abriram uma crise nos Partidos Comunistas em todo o mundo, e especialmente na Europa, com o afastamento de uns cem intelectuais, entre eles, Peter Fryer, escritor e jornalista do Daily Worker, órgão oficial do PC inglês, os historiadores Edward Thompson e Christopher Hill na Inglaterra, junto com alguns milhares de militantes, resultando em um duro golpe especialmente para o PC britânico. Também houve repercussões importantes na França.

O que foi a Revolução Húngara de 1956?

A Revolução Húngara de 1956 fez parte do processo de revoluções políticas na Europa Oriental que, mantendo a expropriação da burguesia, suas fábricas e suas terras, procurava colocar o planejamento da produção e o destino da nação nas mãos da democracia plena, a dos conselhos revolucionários. Uma revolução que tentou derrubar a burocracia para acabar com a ditadura stalinista e estabelecer um estado operário revolucionário que impediria a restauração do capitalismo.

Em seu livro A revolução traída, Trótski especula sobre como seria o processo após uma revolução política:

Suponhamos que a burocracia soviética seja expulsa do poder por um partido revolucionário que tem todas as qualidades do velho partido bolchevique; e que, além disso, é enriquecido com a experiência mundial dos últimos tempos. Este partido começaria restaurando a democracia nos sindicatos e nos sovietes. Poderia e deveria restaurar a liberdade dos partidos soviéticos. Com as massas, à cabeça das massas, procederia a uma limpeza implacável dos serviços do Estado; aboliria condecorações, privilégios e restringiria a desigualdade no pagamento pelo trabalho, na medida permitida pela economia e pelo Estado. Eu daria à juventude a possibilidade de pensar livremente, de aprender, de criticar, numa palavra, se formar. Isto introduziria modificações profundas na distribuição da renda nacional, de acordo com a vontade das massas operárias e camponesas. Não teria que recorrer a medidas revolucionárias de propriedade. Continuaria e aprofundaria a experiência da economia planejada. Depois da revolução política, depois da queda da burocracia, o proletariado realizaria na economia importantíssimas reformas sem precisar duma revolução social.

Esta revolução política, naquela época dos anos 50, era uma necessidade na URSS, na China e nos estados do Leste Europeu porque eles mantinham uma terrível contradição. Apesar de todos os desastres do stalinismo, eles eram Estados Operários porque expropriaram a burguesia.

Em particular nos estados do Leste Europeu a expropriação da burguesia foi pela assimilação do Estado Operário degenerado da URSS, sem revolução social, senão que a partir da invasão do Exército Vermelho depois da derrota dos nazis na batalha de Stalingrado. Tampouco existiram sovietes nem partido revolucionário.

A pesar de todas essas contradições, a expropriação foi uma conquista a ser preservada e, portanto, era tarefa dos revolucionários derrubar a burocracia dominante, realizando uma revolução política. Inclusive nos estados do Leste Europeu, já que desde sua gênese sofreram uma deformação burocrática.

Trótski definiu a URSS como um estado operário degenerado e apresentou um prognóstico político de um caráter alternativo, que é possível aplicar também aos estados operários deformados: “ou a burocracia, tornando-se cada vez mais o órgão da burguesia mundial no Estado operário, derrubará as novas formas de propriedade e lançará o país de volta ao capitalismo ou a classe operária destruirá a burocracia e abrirá uma saída em direção ao socialismo [4]”.

A Revolução Húngara, por suas características, teve traços de uma revolução clássica, devido ao caráter operário, o desenvolvimento de conselhos operários ou sovietes, a divisão e ruptura das forças armadas, passando parte de suas tropas às fileiras da insurreição.

Em todos os casos, as revoluções políticas da Europa Oriental, e no caso húngaro em particular, começaram com as exigências de liberdades democráticas e políticas de organização e crítica, contra as desigualdades sociais que surgiram entre a burocracia e o povo, entre uma casta privilegiada e o resto da população. Nestes países ocupados pelo Exército Vermelho, a opressão teve forma de pilhagem de seus recursos naturais, da produção de suas fábricas e campos, até mesmo no campo cultural, sua linguagem, seu folclore nacional, símbolos e crenças. Uma vez que a revolução foi impulsionada por demandas democráticas, surgiram os conselhos de operários e comitês revolucionários que assumiam o controle das fábricas, ou também de alguns territórios. O proletariado liderou a revolução e a direção dessas organizações manteve a propriedade coletivizada, permitindo e até mesmo garantindo a liberdade de tendências políticas e da imprensa, expulsaram os burocratas e a sua “polícia política”, libertaram os presos políticos e os combatentes, confraternizaram com setores das tropas, das Forças Armadas (húngaras e russas) e, em alguns casos, conseguiram ganhar divisões completas.

Durante os dias da revolução, os combatentes ouviram ruídos vindos do subsolo. Com picaretas, pás e brocas, eles descobriram um vasto sistema de porões do AVH sob a sede do Partido Comunista, onde armas, alimentos e roupas eram armazenados, e onde também se torturava.

Era preciso tirar do poder a burocracia termidoriana, como Trótski chamava o stalinismo, fazendo uma analogia com o mês (Termidor) na França revolucionária, quando os jacobinos foram derrotados por uma ala reacionária, mas que não conseguiu restaurar o feudalismo. No caso do stalinismo, a reação iniciada pela burocracia, embora não tenha levado as relações de produção de volta ao capitalismo, conseguiu com sua política bloquear o desenvolvimento da transição para o socialismo e, assim, iniciar a degeneração que iria minar as bases operárias do próprio estado e aumentar as forças sociais da restauração.

Mas para os objetivos revolucionários, faltou um elemento subjetivo muito importante, o partido revolucionário. Não existia nem um embrião desse partido que, como vanguarda socialista conscientemente revolucionária e organizada, pudesse se fundir com a classe trabalhadora em todos os conselhos operários e organizações revolucionárias que as massas construíram e dessa forma efetivamente direcionar a luta para o poder e o triunfo.

Um partido revolucionário não pode ser construído durante o calor da revolução, deve existir antes e pode rapidamente se tornar poderoso, desde que interprete corretamente o curso da revolução.

Esta é a grande e apaixonante tarefa dos revolucionários do século XXI, contando com o legado valioso de Leon Trótski e da Quarta Internacional.


veja todos os artigos desta edição
FOOTNOTES

[1Depois da derrota, foram confiscados dos rebeldes e da população ou abandonados, os seguinte número de armas: armas pequenas, 181.766; metralhadoras, 3.172; de várias morteiros, 40 barris e 64.000 granadas. “Revolução Húngara de 1956: Uma História em Documentos”, 2002, Documento No. 9, Relatório da Situação de Malenkov-SuslovAristov, 22 de novembro de 1956, Comitê Central do Partido Comunista, em www.gwu.edu, The National Security Archive.

[2Revolução Húngara (Novas descobertas sobre a Revolução Húngara de 1956) no instituto para a história da revolução húngara de 1956, www.rev.hu, Studies, 1956.

[3Nagy, Balasz, Budapest 1956: El Consejo Obrero Central, em Revoluciones obreras contra el estalinismo. Hungría del 56. Fryer, Broué, B. Nagy. Ediciones IPS. Centro De Estudios, Investigaciones y Publicaciones “León Trotsky” Argentina.

[4“O Programa de Transição”, Leon Trotski. Este é o programa de fundação da Quarta Internacional em 1938, apresentado no congresso do Socialist Workers Party americano a pedido do próprio Trotsky. https://www.marxists.org/portugues/trotsky/1938/programa/cap02.htm#17
CATEGORÍAS

[Leste Europeu]   /   [Stalinismo]   /   [Joseph Stálin]   /   [Revolução]   /   [URSS]

Elizabeth Yang

Comentários