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Frente Parlamentar pelos LGBTQI+: um debate sobre como lutar contra a extrema direita

Nesta segunda-feira (10) se lançou pelo Mandato Quilombo impulsionado pela deputada Estadual de SP, Erica Malunguinho (PSOL), a Frente Parlamentar em defesa dos direitos das pessoas LGBTQIA+. Queremos neste artigo debater com todos os LGBT e pessoas simpatizantes que foram entusiastas na defesa de eleger pela primeira vez uma mulher transsexual negra e hoje seguem buscando alternativas para lutar contra o retrocesso nas vidas LGBT e negras. Mas abrindo uma importante reflexão crítica sob quais as bases que devemos organizar nossa luta contra o que representa o governo Bolsonaro para milhares de pessoas gays, lésbicas, travestis, trans e bissexuais, que veio para precarizar a nossa vida e nos quer mortos. Achamos que uma posição parlamentar pode ser muito importante se se luta a partir de uma estratégia e um objetivo em comum com a classe trabalhadora contra nossos inimigos.

Virgínia GuitzelTravesti, trabalhadora da educação e estudante da UFABC

terça-feira 11 de junho de 2019 | Edição do dia

Frente a chegada da extrema direita na Presidência da República, que se elege fruto das eleições mais manipuladas da história do país, com um discurso de ódio declarado a comunidade LGBT e com seus Ministros e deputados fortalecendo as ideologias conservadoras contrárias a diversidade sexual, com destaque para Damares que queria inclusive controlar quais cores de roupa podemos usar, muitas pessoas não heterossexuais e com identidades não cisgêneras querem buscar alternativas para contrapor todo esse obscurantismo e reacionarismo que apresenta o novo governo. E como sabemos, apesar das inúmeras divisões dentro deste governo, a bancada da bíblia e o clã Bolsonaro são grandes inimigos que exigem a mais ampla unidade para impedir retrocessos e para defender a vida da população LGBT.

Há quem diga que "qualquer pessoa que se manifestar em defesa dos nossos direitos, deveria ser parte dessa ampla unidade". Neste caso, teríamos que agora adicionar ninguém mais repudiável do que o próprio Donald Trump, que demagogicamente está lançando uma campanha internacional pela descriminalização da LGBTfobia. Também teríamos de aceitar a Rede Globo - o braço esquerda do golpe institucional de 2016 - como outro apoiador por ter adicionado em suas novelas, comerciais e programas de TV a pauta LGBT. Mas qualquer visão séria sobre a luta LGBT consegue ver que os interesses econômicos da Globo, e os interesses eleitorais de Trump nos EUA que começam a renascer na juventude uma simpatia pelas ideias socialistas, são pragmáticos e se ligam a manutenção desta sociedade que é estruturalmente patriarcal e repressora da sexualidade e das identidades de gênero livres. E que no Brasil tem um núcleo duro da extrema-direita do clã Bolsonarista, querendo retirar qualquer conquista e direito que conquistamos na luta, se opondo e lutando contra qualquer demanda, da mais democrática que seja, dos setores oprimidos.

Mas se escapamos da lógica formal, isto é, de uma visão matemática simplificada de 2 + 2 é igual a 4. E analisamos uma matemática mais complexa - dialética - e introduzimos os "vetores", podemos entender que a mesma equação, com vetores contrários, resulta a zero. Isto para política, superar o pensamento formal sem excluí-lo, é fundamental para se obter um pensamento maduro. Neste caso, se há apoiadores da exploração capitalista e da opressão necessária para a realização do trabalho alienado de um lado, e grupos sinceros de ativistas, estudantes e trabalhadores que querem garantir os direitos conquistados por anos de luta e em busca de uma emancipação da opressão e também da exploração do trabalho, não podemos chamar de unidade, pois de fundo, isto é, além das aparências, significa em sua essência a submissão do grupo de ativistas, estudantes e trabalhadores à dominação já estabelecida do primeiro grupo de defensores do capitalismo.

É a utilização de nossa energia para servir de manutenção dessa sociedade capitalista que vivemos, que se apoia e necessita da opressão às mulheres, negros e LGBT’s. Qualquer estratégia que inclua aliança com setores que hoje defendem a reforma da previdência e maiores ataques à classe trabalhadora (que no Brasil em sua maioria é negra e feminina) afasta esses setores sinceros de ativistas, estudantes e trabalhadores da luta pelo fim da opressão.

Uma Frente Parlamentar com alianças do PCdoB ao PSL

A ideia de conformar uma Frente Parlamentar em um momento onde se vota planos de austeridade contra o conjunto da classe trabalhadora e do povo pobre parece para milhares de pessoas como algo sensato, isto é, "respondamos os ataques advindo do parlamento com uma resposta parlamentar". E que para crescer e poder ter força séria para enfrentar o governo, é preciso reunir o máximo de apoio possível, "seja com quem for". Essa visão pragmática já foi refutada acima, mas parece ganhar uma qualidade quando membros do mesmo partido de extrema direita, o PSL, são partes dessa "unidade". Como podemos acreditar num mecanismo para combater a LGBTfobia estrutural de nossa sociedade, se está atrelada a partidos que são inimigos declarados de nossa existência?

Segundo o Guia Gay de São Paulo e o portal Põe na Roda, os representantes do PSL na frente parlamentar proposta por Érica Malunguinho são: Delegado Bruno Lima, Gil Diniz, Janaina Paschoal, Major Mecca. Além Coronel Telhada do PP.
Alguns dos inimigos declarados da população LGBT e do conjunto da classe trabalhadora. Com Janaina Paschoal sendo uma das mais intusiastas do golpe institucional, que tira Dilma do poder para colocar um governo que implementasse os ataques mais duros à classe trabalhadora como a reforma trabalhista. É ela também que atuou duramente contra qualquer tentativa de descriminalização do aborto chegando a dizer que “realizar aborto é como fazer parte do tráfico”.

Tem também partidos como o PT, PCdoB que queremos estar juntos na luta em uma frente única em torno de um objetivo para golpear junto, mas marchar separado.
Os anos de governo do PT e do PCdoB nos mostraram que essa frente se dá nas ruas e nas lutas, e não no parlamento. Pois esses partidos têm um objetivo claro de administração do capitalismo, com inclusive a bancada de governadores do PT no Nordeste votando favorável à reforma da previdência e colocando a necessidade de que se inclua os estados e municípios nas reformas. Não tem por objetivo lutar contra a opressão e a exploração até o final, mas na verdade querem usar nossa energia para sua estratégia eleitoral de reeleição em 2022. Deixando Bolsonaro passar todos os ataques fundamentais aos trabalhadores, mulheres, negros e LGBT’s.

São os partidos que "por baixo", na organização dos trabalhadores em suas organizações sindicais atuam permanentemente pela divisão das nossas fileiras e por perpetuar demandas corporativistas que excluem o papel de tribuna da classe trabalhadora em falar em nome dos que mais sofrem com esta sociedade opressora, como o PT e o PCBdoB, também estão ali, de forma acrítica.

Entender de forma abrangente os movimentos do Brasil em ponto de mutação a partir dos processos de luta de classes. O que justificaria uma frente parlamentar em que entre seus componentes está os setores mais reacionários da extrema direita?
É também com relação à alianças com setores da burguesia que se dizem democráticos e que faz ressurgir um antigo debate no interior dos movimentos de combate a opressão, com relação se é possível uma aliança - ainda que momentânea, pontual ou ainda limitada - com a burguesia liberal? Ainda é possível apoiar-se em partidos e setores da burguesia democrática contra os ataques a comunidade LGBT? O caminho construído da visibilidade ou das "referências positivas" defendidas por amplos setores LGBT e que estão diretamente relacionadas a marcas como Natura, Avon e agora bancos e outras empresas "inclusivas" demonstram um caminho possível para lutar pelos nossos direitos?

Como marxistas revolucionários acreditamos que sem uma compreensão científica sobre o Estado é impossível compreender profundamente o problema que está em questão: de onde emerge a verdadeira relação de forças capaz de garantir ou retirar direitos historicamente conquistados? Qual a relação entre a exploração e a opressão, ou melhor colocado, aonde se insere a repressão sexual e de identidade de gênero na ordem capitalista de produção? A primeira vez que foi estabelecido uma verdadeira avaliação científica sobre o caráter do Estado capitalista foi em 1848, pelo Manifesto do Partido Comunista de Karl Marx, aonde dizia que o Estado nada mais é do que "um grande comitê de negócios para tratar dos interesses da classe burguesa". Desta frase, se desenvolve uma série de compreensões fundamentais para pensar uma luta verdadeiramente consequente, e portanto revolucionária, em defesa dos direitos LGBT: o Estado não está acima das classes sociais, não representa os interesses do povo, não é agente e resultado da racionalidade e muito menos é um organismo neutro e comprometido com a justiça.

Se o parlamento é então, um dos instrumentos de dominação de classe, isto é, apenas a forma política com que a burguesia consegue consolidar sua dominação e seus interesses econômicos, o parlamento é então o resultado de um antagonismo de classe criado pelo desenvolvimento da nossa sociedade atual, capitalista. É então, um reflexo distorcido das relações de força que se encontram não nesta super-estrutura, mas sim, na sociedade, nos locais de trabalho e de estudo, na forma com quem os dominantes buscam seguir dominando - e no Brasil, concordamos que é com muitas dificuldades - e os dominados aceitam a hierarquia e a sua própria purgação. Se invertemos então, compreendendo que o Estado é um agente da classe dominante, temos que buscar as verdadeiras fontes de poder da classe trabalhadora, a única classe revolucionária de nossa época histórica, e desde este angulo, precisamos definir para que lados encontram os vetores e as forças com as quais buscamos nos aliar.

Seria então possível conformar uma frente parlamentar pelos direitos dos LGBT’s com deputados do PSL como Janaína Paschoal, do mesmo partido de Bolsonaro e com o mesmo tom de reacionarismo, e que querem nos ver mortos tanto por não aceitar qualquer mínima livre expressão do gênero e da sexualidade ou de tanto trabalhar com a reforma trabalhista e da previdência ou na mira deste pacote "anti-crime" de Moro? Achamos que não.

A unidade que precisamos: a da luta de classes

Queremos abrir um debate com o PSOL que é com relação à qual unidade precisamos frente os ataques do governo Bolsonaro, em especial seu reacionarismo com as mulheres, os negros e o LGBT’s.

Achamos que a frente de luta que precisamos, passa pela mais ampla unidade das fileiras da classe trabalhadora em torno de golpear um inimigo com um objetivo em comum. Uma defesa da verdadeira unidade que necessitamos baseada na confluência de todas as categorias de trabalhadores separada por filiações sindicais ou pela terceirização, do conjunto dos estudantes de universidades públicas, privadas e secundaristas em defesa do nosso futuro. Senão utilizamos o espaço do parlamento, conscientes que é um terreno de nossos inimigos, e não "um terreno em disputa", para estimular a organização extraparlamentar, apoiando a ação contundente da luta de classes, com os métodos próprios da classe trabalhadora, estamos pisando em falso.

Todavia, ao encarar a realidade de forma que ela se apresenta "apenas pela aparência", passam longe da preocupação de desenvolver um ativismo independente, que permita com que as LGBT estejam na linha de frente de construir uma unidade entre a classe trabalhadora e os jovens que saem em luta em defesa das universidades para enfrentar as instituições que perpetuam nossa opressão, algumas seculares como a Igreja e outras próprias da democracia burguesa. Assim reconhecidas lideranças em defesa dos direitos humanos como Erica Malunguinho apostam unicamente na soma de forças parlamentares que possam acumular votos nas seções que sejam relativas as pautas LGBT ou raciais, o que esta estratégia necessariamente obriga com que grupos pequenos como o PSOL aceitem "unidades" com os mais variados partidos, enquanto renunciam o papel de denunciar o papel nefasto de fragmentação que as burocracias sindicais da CUT e CTB, dirigidas pelo PT e PCdoB, e que controlam a maior parte dos trabalhadores do país organizados sindicalmente buscam impor.

A separação do papel dos parlamentares das grandes tarefas da realidade, da luta política de intervir no parlamento para propagandear e para estimular a luta de classes, as formas de fomentar a auto-organização da classe trabalhadora e do povo pobre e denunciar os freios das burocracias estudantis e sindicais acabam por reforçar a ideologia dominante, que presa uma visão da realidade não dialética, aonde a política seria um resultado da ação consciente dos parlamentares, sendo estes executores imparciais da lei e claro, acima dos interesses de classe e por isso capazes de serem disputados "um a um". Tudo o que se contrapõem a está lógica será atacado por sectário. Nesse caso, se rebelar contra alianças com o partido de Bolsonaro, será um delírio sectário? Será uma falta de visão realista sobre as dificuldades do país? Não. É justamente por termos uma visão realista que podemos denunciar esse divórcio fetichista produzido no Estado capitalista de que independente da economia - isto é, se você detém os meios de produção, se você possui um pequeno comércio ou se vende sua força de trabalho para sustentar a si mesmo e toda sua família - todos são "igualmente cidadãos". É por contrapor a ideologia burguesa, com o marxismo revolucionário, que podemos abrir os olhos de outros lutadores para a armadilha que significa submeter ativistas e setores de jovens e trabalhadores aos partidos da burguesia, que unicamente querem garantir a melhor de salvar o capitalismo brasileiro. Enquanto nós, queremos salvar o Brasil do seu capitalismo.

Por isso, escrevemos este artigo para dialogar com todos que buscam neste momento de ebulição política no nosso país, uma alternativa para enfrentar a extrema direita, o judiciário e os ataques que estão em curso. Somos totalmente contrários a narrativa petista que os ataques a nossa sexualidade e identidade de gênero são apenas "cortina de fumaça", assim como repudiamos a estratégia de conciliar as nossas vidas com partidos que abertamente defendem nossos assassinos. O Esquerda Diário e o MRT estamos na linha de frente em todas as lutas por conquistas parciais, por melhorias em nossas condições de vida e contra os retrocessos anunciados pela extrema direita, ao mesmo tempo, que buscamos ligar cada um destes combates com uma perspectiva de construir uma alternativa política independente da classe trabalhadora que possa organizar setores amplos do melhor que há na vanguarda de trabalhadores e jovens para dirigir milhões de outros trabalhadores numa luta decidida contra o capitalismo, o patriarcado, o racismo secular e a LGBTfobia.

É possível que no primeiro ano de um governo de extrema direita, sejamos milhares nas ruas junto com a juventude que protagonizou o 15 e o 30M e a classe trabalhadora que pode incendiar o país no dia 14. E é com esse conteúdo que queremos debater com o movimento LGBT que pode voltar a ativa, em um momento de gigantes ataques da extrema direita. Que pode se expressar em grande paradas no primeiro ano de Bolsonaro, e no mundo inteiro com a crescente ascensão da extrema-direta. Achamos que o movimento LGBT já protagonizou grandes experiências históricas que mostram seu poder se se aliam com a classe trabalhadora para derrotar a opressão e a exploração.




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