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TRIBUNA ABERTA | Estados Unidos: Imigrantes detidos em campos de concentração entram em greve de fome

As greves de fome se tornaram formas comuns de resistência e luta em centros de detenção. Na última semana, detidos em Bakersfield, na Califórnia entraram em uma greve de fome para lutar contra condições deploráveis a que são submetidos.

sexta-feira 17 de julho de 2020 | Edição do dia

Detentos da Immigration and Customs Enforcement (ICE) em Bakersfield, na Califórnia, tomaram as coisas em suas próprias mãos. De acordo com o Immigration Defense Project, muitos entraram em greve de fome para protestar contra as condições desumanas no Centro de Processamento ICE Mesa Verde. Especificamente, os manifestantes estão chamando atenção para a falta de comida fresca e falta de condições sanitárias em dormitórios e banheiros. Os manifestantes representam uma coalizão internacional, que incluem pessoas do Bangladesh, Camarões, Gana, Haiti, Jamaica, Etiópia, e Brasil. Além disso, é informado que os detidos pela ICE em San Quentin, na Califórnia, entraram em greve de fome por razões similares.

Ocorreram mais de 30 greves de fome em centros de detenção durante a pandemia, demonstrando uma maneira que os imigrantes encontraram de lutar contra essa opressão. Mais de 2.400 migrantes detidos se juntaram as greves de fome nos últimos meses – com mais de 1.600 nos últimos 4 anos.

As terríveis condições de vida dos grevistas são especialmente perigosas durante a pandemia. Mesmo antes do surto de Coivid-19, os campos de concentração da ICE eram centros de disseminação de doenças. Principalmente como resultado de negligência, gripe, pneumonia, e infecções por estafilococos já eram comuns.

Um comunicado de imprensa da ICE em Junho buscou colocar dúvidas nos motivos dos grevistas. A razão da greve de fome em Mesa Verde, segundo o porta voz da ICE, Jonathan Moor, era para “protestar contra o ciclo repetitivo do menu de comida”. Moor também afirmou, sem evidências, que os detidos estavam sendo coagidos a entrarem em greve por forças externas, tais como advogados e ativistas.

O grevista Asif Qazi, nativo de Bangladesh, desmentiu essas acusações como “besteira total”.

“A ICE sempre coloca informações incorretas para defender a sua própria organização. E penso que eles creem em um monte de informações incorretas para desencorajar a causa da libertação. Nós estamos fazendo isso por nós mesmos, e ninguém está nos coagindo,” Qazi afirmou.

O líder dos grevistas, Donovan Grant, originalmente da Jamaica, confirmou o relato de Qazi. Em uma entrevista com o “Centro Legal de la Raza”, uma firma de imigração em Oakland, na Califórnia, Grant disse o seguinte:

“A ICE inventa coisas para fazer parecer que tudo está normal, e que está ocorrendo distanciamento social. E essa é uma das principais razões pela qual entramos em greve de fome.. nós precisamos de muitas coisas. Nós não tínhamos ... desinfetantes, não tínhamos alvejante, não tínhamos dispensários de papel toalha, nem mesmo dispensários de sabão. Nós tínhamos mais de 100 pessoas por dormitório ... E essa é uma das principais razões por que entramos em greve de fome, pois um monte de pessoas estavam ficando doentes e nós queríamos estar seguros”.

De acordo com o comunicado da própria ICE, quase 3.000 imigrantes detidos testaram positivo para Covid-19. Isso é muito provavelmente uma estimativa reduzida. Mesmo assim, isso faria com que os detidos pela ICE tivessem uma taxa de infecção três vezes maior que a da população geral. Migrantes em custódia da ICE estão sendo levados para a morte.

Comunidades de imigrantes estão sob um sério ataque, que foi a intenção da administração Trump desde o princípio. E o sofrimento dos migrantes foi extremamente aumentado pela pandemia que o executivo não demonstrou nenhum interesse em combater de forma séria. Essa combinação mortal ameaça ser um dano irreparável à um segmento da população que já é marginalizado.

Concomitantemente às greves de fome, levantes estão ocorrendo pelo país exigindo justiça racial. Com o chamado do #BlackLivesMattter, manifestantes pelo país conclamam por um fim da brutalidade policial contra negros. Motivados por nada mais do que noções básicas de igualde e justiça, suas intenções são as mais puras possíveis. E por meio de seu massivo apoio popular, o movimento do BLM está rapidamente ganhando espaço.

Mas a luta por justiça racial não pode parar com a luta contra a violência policial de nossos irmãos e irmãs negros. Sem dúvida, nossa visão de justiça racial precisa incluir justiça para os imigrantes, o que necessita abolir o ICE e sua crueldade. Nas palavras de Martin Luther King Jr., “Injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça em todo o lugar. Nós estamos presos à uma teia inescapável de mutualidade, amarrado em uma única peça do destino. O que afeta um diretamente, afeta a todos indiretamente.”

Vamos atender à mensagem eterna do Dr. King.

Em adição as manifestações contra as más condições de vida, os migrantes no Centro de Processamento ICE Mesa Verde também usaram a greve como uma forma de tributo à memória de George Floyd e outros afro-americanos vítimas de assassinato pelas mãos da polícia. Em uma nota pública:

“Nós, os detidos nos dormitórios A, B, e C na Mesa Verde ICE Detention Facility, estamos protestando em memória dos nossos camaradas George Floyd, Breonna Taylor, Oscar Grant, e Tony McDade. Quase todos de nós também sofreram no sistema de justiça corrupto e racista de nosso país antes de sermos jogados nas mãos do ICE”

Esses bravos grevistas entendem as queixas que nós todos compartilhamos; como o famoso slogan sindical diz, um ataque a um é um ataque à todos. Os detidos em Mesa Verde entendem que nós apenas venceremos quando permanecermos juntos, organizados como uma força única. Mesmo estando em cativeiro, eles ainda têm força e coragem para lutar pelos oprimidos. O resto de nós deve seguir o exemplo deles, pois só assim podemos conquistar justiça para todos.

Elias Khoury para o Left Voice, seção norte-americana da Rede Esquerda Diário.




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