Esta segunda-feira marcou o oitavo dia de mobilizações, com a chegada de milhares de manifestantes à cidade de Quito, principalmente do movimento indígena. As medidas de luta são mantidas apesar do novo decreto de estado de exceção e do avanço repressivo do governo Lasso.
terça-feira 21 de junho de 2022 | Edição do dia
Apesar do impacto das medidas de controle e repressão, até hoje e como um todo, nem mesmo o estado de exceção decretado para as províncias de Pichincha, Cotopaxi e Imbabura (que na tarde desta segunda-feira Guillermo Lasso ampliou, pelo decreto 459, a mais três províncias - Chimborazo, Tungurahua e Pastaza), nem a invasão e ocupação policial da Casa da Cultura do Equador, nem a prisão de quase 50 manifestantes, nem os falsos apelos ao diálogo por parte do governo nacional conseguiram deter a mobilização de 14 das 24 províncias do país.
Durante o dia, milhares de indígenas e camponeses, principalmente da Serra Centro e Norte, iniciaram a marcha em direção a Quito e chegaram às entradas da cidade. Em seguida, grupos de estudantes e pequenos comerciantes se juntaram. Os jornais equatorianos falam da cidade de Quito agora convertida no epicentro do protesto.
#Guayaquil al canto de “Quito, aguanta, el Pueblo se levanta” pic.twitter.com/rWufRM4AHJ
— María Cecilia Herrera 💜💚 (@Mceherrera) June 20, 2022
Há mais de uma semana que foram desenvolvidas diversas medidas de luta contra o aumento dos preços dos combustíveis, a redução do orçamento da saúde e da educação, a fraude do sistema bancário contra quem, por necessidade, teve de se endividar devido aos níveis de pobreza, apesar da relativa recuperação econômica e de todas as medidas de ajuste típicas da submissão que o FMI impõe ao país, realizadas pelo governo neoliberal e representante do sistema bancário.
O decreto 455 (hoje revogado e alterado para 459) de estado de exceção, escandalosamente chegou a falar em controlar a internet e o fluxo de informações - questão em que o governo teve que recuar. O novo decreto ordena - como o anterior - o uso progressivo da força, o que inclui a força letal.
URGENTE|
Presidente #Lasso deroga #Decreto455 y expide nuevo #Decreto459 que amplia #EstadoDeExcepcion
a las provincias de Tungurahua, Chimborazo y Pastaza.
El decreto incluye el llamado a Estado de Emergencia. #ParoNacional pic.twitter.com/S7fZfRWOel— Wambra Medio Comunitarioᅠ (@wambraEc) June 20, 2022
Esta segunda-feira, quatro dias depois de ter decretado a proibição de concentrações e viabilizado a coordenação do exército nas ruas em conjunto com a Polícia Nacional, com um importante avanço repressivo que já deixou cerca de 50 feridos, a oposição institucional da Assembleia Nacional, a pedido de 72 dos 137 legisladores, se dispunha a discutir a revogação do primeiro decreto, questão que perdeu sentido quando o 459 foi conhecido.
A intenção da oposição era baixar o estado de exceção para possibilitar uma mesa de diálogo entre a CONAIE e outros órgãos com o Governo. O mesmo papel que desempenhou em 2019 com a intenção de desmobilizar.
O acordo de direita para manter o estado de exceção
O Partido Social Cristão (PSC) e a Esquerda Democrática, que vinham se fazendo de opositores ao governo, cerraram fileiras e anunciaram que não apoiariam a revogação do decreto, ecoando a linha oficial de repressão com mão dura. A prefeita de Guayaquil, Cynthia Viteri (PSC) falou diretamente em cercar a cidade com a ajuda da inteligência do Exército, enquanto o prefeito de Quito tramitava uma medida cautelar para impedir que a Assembleia votasse pela revogação.
Por sua vez, a UNES (coalizão do ex-presidente Rafael Correa) e Pachakutik apoiam a abertura da exceção e a convocação de uma mesa de diálogo, porém, deve-se lembrar que foi a UNES, e com críticas, um dos setores da própria Pachakutik, quem apoiou, na época, a lei do Uso Progressivo da Força que o partido no poder apresentou para fortalecer o aparato repressivo, sob o pretexto de violência nas prisões.
Um chamado ao diálogo, com repressão nas ruas
Em meio à crise pelo enorme descontentamento social contra as medidas de ajuste, os apelos ao diálogo do governo apenas ratificam o cinismo daqueles que oferecem medidas parciais que não respondem à questão profunda, enquanto reprimem nas ruas, saudando com homenagens aos militares no Dia dos Pais, (com todo o simbolismo que implica que o próprio presidente se veste com camuflagem) e anunciam quase ao mesmo tempo um novo decreto (457) de precarização do trabalho, onde as diárias para os trabalhadores são extintas e contratações são limitadas (abrindo as portas para novas demissões), entre outras medidas para cortar o setor público.
Nesse quadro, um setor dos partidos da Assembleia Nacional teve que responder (com bastante atraso) a uma questão básica de liberdades democráticas, pressionado pela constante denúncia dos manifestantes sobre a escalada repressiva e de avanço contra o direito ao protesto, mas, ao mesmo tempo, buscam em segundo plano descomprimir as manifestações com uma "chamada de mesas de diálogo", onde a Assembleia se oferece como "mediadora" da crise, mas uma "chamada de diálogo" em meio à condições de repressão, com os novos ataques do Governo Nacional e que visa retirar os manifestantes das ruas, constitui apenas uma farsa e a consolidação do ajuste que Lasso procura aplicar.
As reivindicações dos trabalhadores e dos setores populares devem ser bem-sucedidas
Por enquanto, a CONAIE declarou que, se houver diálogo, não será retirando-se das ruas, usando as mobilizações como extrema pressão, mas é fundamental alertar todos os manifestantes, trabalhadores, estudantes, organizações sociais e sindicatos (que, como dissemos, chegaram aos milhares a Quito, onde fica a sede do governo), diante das tentativas de conter e dissolver as manifestações.
Vecinas y vecinos del sur de #Quito saludan a la marcha indígena. Por la Av. Maldonado avanzan camiones y motos, acompañando a los marchantes. #ParoNacional pic.twitter.com/xnY9dvBwfQ
— Wambra Medio Comunitarioᅠ (@wambraEc) June 21, 2022
Para a quarta-feira, 22, é convocada uma mobilização nacional de organizações sociais e operárias, que se juntará às manifestações que o movimento indígena está liderando em várias províncias. A expansão do estado de exceção também busca antecipar isso.
Nas ruas se mostrou que há forças para poder enfrentar o programa político do governo Lasso, do empresariado equatoriano e do FMI e que triunfam as demandas dos trabalhadores e setores populares, que não estão dispostos a permitir que essa crise seja novamente descarregada em suas costas.