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CULTURA | Entrevista com o poeta e agitador cultural Felippe Regazio

Antologia de poemas Gengibre

Fábio NunesVale do Paraíba

terça-feira 28 de fevereiro de 2017 | Edição do dia

Fábio Nunes - Eu sempre peço para o entrevistado se apresentar, falar dos seus trabalhos, pesquisas, projetos etc.

Felippe Regazio - Eu sou horrível falando de mim mesmo de forma sistemática. Esqueço coisas e lembro depois e fico mal, tipo "porra, seria legal ter dito tal coisa". Bom, Eu me chamo Felippe, e escrevo. Ultimamente tenho feito alguns corres pra movimentar a literatura pelas bandas da internet - uma literatura que não seja muito isso que os eruditos chamariam de literatura, e ainda bem. Pra fazer um recorte sobre mim vou falar um pouco sobre as coisas do ano passado pra cá: Abandonei o curso de letras na USP porque achei chato, então fui mochilar. 2016 foi um ano de merda em muitos aspectos, aí fiquei meio puto e caí de carona pelas estradas. Fiquei uns tempos por aí e quando voltei pra casa me mudei pra São José dos Campos, que é onde vivo atualmente. Nesse meio termo escrevi bastante, em 2016 terminei meu primeiro romance e um livro de crônicas sobre a estrada - algo entre o fictício e entre algumas experiências que tive de alguns anos indo e vindo de mochila. Reuni também alguns poemas que escrevi durante o ano passado e organizei um novo livro de poemas chamado "O Estranho Teorema das Nuvens e Outros Poemas", e acho que se não fosse esse apreço com a literatura as coisas teriam sido bem piores no ano passado. Enfim, eu gosto pra caralho de literatura, de domecq, de web development e acho Debussy realmente foda. Vou deixar aqui a bio que coloco nas publicações por motivos de não tenho muito o que dizer:

Felippe Regazio vive em São José dos Campos e escreve. Publicou "Oceana", em 2013, pela editora Ponto da Cultura e "Atentado Contra a Vida das Coisas Belas", em 2015, numa edição artesanal. Em 2016, foi menção honrosa pela USP com os poemas do livro "Sonata em Mi Menor Para Porcos e Outros Quadrúpedes", que será publicado este ano pela editora Euquister. Em 2017 Felippe Regazio idealizou e produziu a antologia "Gengibre - Diálogos para O Coração das Putas e dos Homens Mortos" que reuniu 53 autores contemporâneos e nacionais numa publicação de sucesso que alcançou +3000 views ainda na primeira semana de lançamento. Felippe organiza antologias alternativas e tem diversos trabalhos publicados em revistas como Mallarmargens, SubVersa, Labirinto Literário, Revista Saúva, Libertinagem, O Emplastro, Revista Gueto, além de alguns jornais locais".

Fabio Nunes - Comente a antologia Gengibre

Felippe Regazio - A ideia pra Gengibre surgiu no final de 2016. Foi uma ideia que veio gradualmente, o nome veio enquanto eu cozinhava, o subtítulo é de algo que tava anotado na parede do meu quarto que eu achei que poderia usar um dia, e então veio a ideia de fazer uma antologia. O cerne da coisa é que eu conheço muito gente que escreve. Muita gente foda que escreve coisas fodas, e achei que era hora de juntar essa galera. E juntei. Dentro da individualidade de cada um, achei possível encontrar uma identidade, uma marca. No começo de 2017 tive certo sossego e então aproveitei pra produzir. Agitei a galera via inbox convidando 23 pessoas, depois fiz uma chamada aberta com breve curadoria e algumas indicações. Demorou um mês pra ficar pronta. Quando publiquei ela teve um pequeno boom dentro desse nosso feudo literário. Foi lançada em 6 de Fev e teve +3000 views nas primeiras semanas. Fiquei feliz por isso.

Fabio Nunes - A poesia de hoje "tem uma cara"? Existe um movimento poético hoje atuante?

Felippe Regazio - Tem. Existe. Eu não sou um estudioso de antropologia, história, nem um bom observador dos movimentos poéticos pq faço um corre um tanto quanto sozinho nesse meio, mas é inevitável notar que hoje a poesia tem várias caras. As pessoas têm se interessado por poesia e a poesia tem unido alguns grupos, alguns interesses, alguns pensamentos. Há menos poesia pra poeta e mais poesia pra pessoas. Mais Poeta-Pessoa do que Poeta-Artistão, e isso é legal pra caralho. Não vou me arriscar a dar nomes ou apontar um norte, mas dê um rolê e você vai ouvir. O máximo que posso dizer é sobre onde estou, e por mais que eu desenvolva a literatura de uma forma solitária, por vezes me sinto parte de um grupo, me vejo em "comunhão poética" com algumas pessoas e sei que elas se reconhecem em mim também. Algumas dão nomes e direcionam isso, outras não. Mas tá rolando sim. Talvez daqui alguns anos possamos afirmar isso com mais sobriedade, por enquanto fico com o Saramago - acho que é do Saramago: "é preciso sair da ilha pra ver a ilha", e eu tô um tanto dentro da ilha, então nosso posso dizer com propriedade muito mais do que já disse.

Fábio Nunes - Estamos vivendo uma forte crise econômica e política no país e no mundo. A prefeitura de São Paulo está caçando artistas de rua e as verbas para a cultura...

Felippe Regazio - Eu acho que a arte sempre vai estar além de qualquer configuração política ou econômica. A política sempre fodeu com os artistas, e isso é histórico. Se o cara fala pra mim que não cria porque não passou edital na Proac ou porque houveram cortes de verbas, eu vou dar risada da cara dele. Então acho que essa já não é mais uma discussão sobre a arte ou a literatura - porque a arte e a literatura são que nem baratas voadoras, dão medo em alguns e não morrem nunca - a questão ao meu ver se torna então o ’direito de ir e vir com a arte’. Ao meu ver, esse direito anda ameaçadíssimo, tanto pela política quanto pela fragmentação cultural que estamos sofrendo com essa "globalização" que ainda não aprendemos a lidar. Se incomoda alguém torna-se quase proibido, e se não incomoda ou se vc caga pra isso, a política dá um jeito de pisar em cima. Tá foda. Mas eu acho também que a liberdade nasce daí, algumas coisas sempre vao sofrer um processo de resistência e acho que essa resistencia vem de ambas as partes - de quem faz e de quem recebe - e isso gera energia. Pra ter liberdade na arte basta trangredir, tacar o foda-se. Pra ter liberdade de veicular isso, nem sempre, aí é preciso ir pra cima. Vc tem que ter um culhão - com cu mesmo - artístico e tacar um foda-se e fazer o que tem que ser feito. Dentro desse contexto acho que as pessoas acabam se unindo sim, e isso pode ser um dos fatores de aglutinação artística que falamos acima - apenas um de muitas variáveis - o incômodo também unifica. Então acho que os artistas acabam se organizando sim - vc vê desde grupos, coletivos, editoras alternativas, cartoneras, casas de saraus, páginas no fb, antologias, e é possível notar unidade e indignação nisso tudo - e acho que é por aí mesmo. Avante.




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