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REFORMA DO ENSINO MÉDIO | Entenda a reforma do ensino médio em 5 pontos

Em meio a tanta desinformação promovida pela imprensa, pelas manobras no Congresso, e a aproximação da votação do projeto no Senado, sintetizamos em 5 pontos as principais mudanças da reforma do ensino médio e seus impactos sobre a educação.

Danilo ParisEditor de política nacional e professor de Sociologia

quinta-feira 15 de dezembro de 2016 | Edição do dia

Mais do que informar sobre as mudanças, esse artigo pretende servir de munição para que os professores, estudantes e todos que defendem a educação pública utilizem em suas escolas, locais de estudo e trabalho para debater com toda a comunidade escolar como construir uma ampla resistência à um dos piores ataques à educação brasileira. Sintetizamos as principais mudanças em 5 pontos, mas é inegável que a amplitude do ataque produzirá efeitos para além do que elencamos nesse texto.

1- O aluno poderá escolher as matérias?

A resposta aqui só pode ser um imenso não. Segundo o projeto, nos primeiros três semestres a grade curricular permaneceria com todas as matérias, e a partir do quarto semestre (ou metade do segundo ano) o aluno poderia optar por algum dos “itinerários formativos”, tal como se definiu no projeto: linguagens; matemática; ciências da natureza; ciências humanas; ou formação técnica e profissional. Isso tem como consequência a redução pela metade a Base Nacional Curricular Comum.

Porém, se buscarmos os parágrafos 1 e 2 do artigo 36 do projeto, eles mostram exatamente o seu contrário, assim está expresso:

§ 1o Os sistemas de ensino poderão compor os seus currículos com base em mais de uma área prevista nos incisos I a V do caput.

§ 2o A organização das áreas de que trata o caput e das respectivas competências, habilidades e expectativas de aprendizagem, definidas na Base Nacional Comum Curricular, será feita de acordo com critérios estabelecidos em cada sistema de ensino."

O parágrafo 1o descreve que os sistemas poderão compor os seus currículos com base em mais de uma área prevista, dentre as 5 apresentadas. Poderão, não deverão. Ou seja, um determinado sistema de ensino poderá oferecer apenas um dos “itinerários formativos específicos”, ficando a seu critério a seleção de quais áreas poderá oferecer. Portanto, para os estudantes não há nenhuma possibilidade de escolha.

Não é preciso ser um grande estudioso das legislações educacionais para concluir que tudo aquilo que a lei permite, mas não obriga o estado e poder público à garantir, está longe de ser considerado um direito universal. No contexto de congelamento de gastos, escancarado na aprovação da PEC55, a possibilidade de escolha é letra morta no projeto do MEC.

Poderíamos ainda desenvolver outras críticas a tal sistema de “escolha”, que na boca dos liberais e reformadores se traduz como “flexibilização”, mas nos restringiremos somente às próprias contradições presentes no texto-base do projeto.

2- As escolas particulares também terão que se adequar a reforma?

Em entrevista concedida à Época, a secretária executiva do MEC diz com todas as palavras: “Uma das propostas é que a Base contemple até o final do 1º ano do ensino médio, quando os alunos têm 15 anos de idade. É assim na Austrália. A partir daí, caberá a cada sistema de ensino definir os itinerários formativos, ou seja, as possibilidades de estudo que se abrem a partir do final da etapa comum a todos”.

O que se depreende das declarações da secretaria é que cada sistema de ensino definirá o que fazer com suas grades curriculares. Dadas as condições objetivas da rede pública, não há dúvidas que oferecerão ensinos técnicos e profissionalizantes, com baixa qualidade, enquanto nas particulares, a preparação para os vestibulares seguirão sendo a tônica.

Um aprofundamento do “dualismo escolar”, separando de forma ainda mais absoluta a formação geral da formação profissional. Traduzindo as intenções do MEC: escola particular para formação universitária, escola pública para formar mão-de-obra de forma mais acelerada.

3- A educação pública será privatizada?

A extensão dessa privatização é difícil de ser mensurada imediatamente, mas podemos afirmar a reforma do ensino médio abrirá um flanco privatista de imensa magnitude. Segundo o próprio texto base:

§ 15. Para efeito de cumprimento de exigências curriculares do ensino médio, os sistemas de ensino poderão reconhecer, mediante regulamentação própria, conhecimentos, saberes, habilidades e competências, mediante diferentes formas de comprovação, como:

I - demonstração prática;

II - experiência de trabalho supervisionado ou outra experiência adquirida fora do ambiente escolar;

III - atividades de educação técnica oferecidas em outras instituições de ensino;

IV - cursos oferecidos por centros ou programas ocupacionais;

V - estudos realizados em instituições de ensino nacionais ou estrangeiras; e

VI - educação a distância ou educação presencial mediada por tecnologias.”

A desfaçatez do MEC mostra suas reais intenções. Como explicamos no primeiro ponto, reduziu-se pela metade a Base Nacional Curricular Comum para o Ensino Médio, o resto se dará por escolhas de “itinerários formativos”. O aluno poderá ter uma formação em instituições privadas, ou no seu próprio trabalho, e tudo isso será contado como “formação escolar”.

Para os empresários da educação, um “novo continente” para ser explorado, às custas do futuro de nossos jovens.

4- Como os professores e quais matérias serão afetadas?

Sem nenhuma dúvida podemos afirmar que todas as matérias serão afetadas. Muita informação e desinformação tem sido vinculada sobre esse ponto, com o objetivo claro de confundir a opinião pública e toda a sociedade. As mídias chegaram a noticiar que as matérias mais afetadas, Sociologia e Filosofia, voltariam a ser obrigatórias. Uma mentira deslavada como explicamos aqui. Os deputados aprovaram "estudos e práticas" nos quais os conteúdos de Sociologia e Filosofia devem ser inseridos dentro da Base Nacional Curricular Comum (BNCC). Na prática o que vale é a diluição desses conteúdos que podem ser oferecidos em outras matérias, e não sua manutenção através de matérias específicas, como leva a crer os títulos da mídia apoiadora do golpe.

De maneira proposital o debate tem se resumido à essas duas matérias, como se não houvesse impacto no conjunto das matérias. Novamente como explicamos nos pontos 1 e 3, a Base Nacional Curricular Comum será reduzida pela metade. Quantitativamente a diminuição da oferta de aulas de todas as outras matérias, (com exceção de matemática, português e inglês que se mantém durante os três anos) é impossível de ser mensurada no momento. Mas é um fato que haverá redução das matérias no conjunto das redes de ensino pelo país.

Outro ponto refere-se à adoção do “notório saber” para seleção dos novos professores. Agora cada sistema de ensino poderá contratar professores sem formação superior, bastando uma banca avaliadora “atestar” (definhada pelas Secretárias de Educação) sua capacidade para lecionar determinada matéria.

A demissão de professores não consta no projeto. No entanto, com a reformulação em toda a arquitetura da educação brasileira, que tem entre seus propósitos seu enxugamento, não se pode descartar que sua aprovação venha acompanhada da demissão de professores, mesmo que efetivos. Como vimos no “regime de recuperação fiscal” aprovada pelo Senado, os ataques sobre o funcionalismo estão na agenda do governo.

5- quando começa a valer a reforma?

A reforma do ensino médio apareceu inicialmente como media provisória, e, portanto, tem força de lei. Na prática a reforma está valendo, e já foi incorporada a Lei de Diretrizes e Bases (LDB). No entanto toda MP tem prazo de vigência de sessenta dias, prorrogáveis uma vez por igual período. Produz efeitos imediatos, mas depende de aprovação do Congresso Nacional para transformação definitiva em lei. Em fevereiro de 2017 se completam os 120 dias de publicação da MP, portanto esse é o limite máximo para que seja votada no Senado, uma vez que já foi aprovada pela Câmara Federal. É improvável que toda a reformulação que descrevemos nos pontos acima sejam aplicadas em 2017, uma vez que depende de uma reestruturação global dos sistemas de ensino. Mesmo que vários dos seus defensores declararam que sua implementação integral será a partir de 2018, não está descartada sua implementação gradual a partir de 2017.




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