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Eleições 2022 | Eduardo Serra (PCB): discurso "comunista" com propostas reformistas para o governo do RJ

Com a debandada de Freixo para o PSB, o espaço para candidaturas reformistas que antes era ocupado pelo PSOL ficou aberto, e o PCB tenta ocupá-lo com Eduardo Serra.

quinta-feira 7 de julho de 2022 | Edição do dia

Com a debandada do de Freixo para o PSB, fazendo alianças com a direita mais tradicional da política carioca buscando Cesar Maia para ser seu vice, abraçando um programa totalmente burguês, e ainda recebendo apoio do seu antigo partido PSOL, o espaço para candidaturas reformistas que antes era ocupado pelo PSOL ficou aberto. Com a candidatura de Eduardo Serra, professor e ex Pro Reitor da UFRJ, o Partido Comunista Brasileiro tenta ocupar este espaço. Apesar de lançar slogans como “governo de comunistas” ou medidas “anticapitalistas”, as propostas de Serra e do PCB não se distinguem fundamentalmente das que foram colocadas na mesa por Freixo quando este se candidatava pelo PSOL alguns anos atrás.

Na última pesquisa atingiu 1% das intenções de voto. Apesar disso, o Partido Comunista Brasileiro insiste em falar exclusivamente das medidas de governo que seriam adotadas caso vençam a eleição, dando nenhuma importância para o uso do espaço eleitoral para a denúncia contra o sistema capitalista como propunha a III Internacional em seu período revolucionário. No caminho oposto, o PCB dedica 100% de suas energias apresentando projetos de gestão e de governo por dentro das instituições da democracia capitalista.

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Em entrevista ao portal UOL, Eduardo Serra afirma que, nas eleições, o PCB se apresenta como “esquerda socialista claramente demarcada” defendendo um “programa anticapitalista realizável, possível de ser feito num governo dos comunistas” (minuto 20:00). Mas nenhuma das medidas apresentadas pelo candidato em todo o debate propõe qualquer medida de ruptura com a propriedade privada capitalista. Ao invés disso, a proposta do PCB é fazer o setor estatal competir com o setor privado seguindo as regras do jogo capitalista, como tentamos demonstrar neste artigo.

Para os transportes, Eduardo Serra diz que a proposta é a estatização do sistema de transportes. Mas como isso seria feito? Segundo Serra, através da criação de uma empresa pública que receberia investimento Estatal para concorrer com as empresas privadas existentes e não da estatização direta de nenhuma empresa, coisa que o PCB na realidade não defende. Falando sobre o mesmo tema em entrevista para o jornal “O Poder Popular”, do PCB, Serra detalha que tal empresa começaria encampando as linhas das empresas que faliram e assim, gradualmente, iria avançando na estatização dos transportes, pelo menos do rodoviário (ver a partir de 13:00).

Ou seja, a proposta é uma suposta “estatização” que respeita as permissões legais do estado capitalista, através de uma medida de gestão como uma “encampação” igual a que foi feita por Eduardo Paes no Sistema BRT, ao invés de avançar diretamente para a expropriação da máfia dos Barata e atacar o problema de frente. Mesmo que tal medida melhorasse o serviço de algumas linhas a ideia de que a criação de uma empresa que, através da competição seguindo as regras do jogo capitalista, supostamente suplantaria a máfia da Fetranspor e, com isso, solucionaria o problema dos transportes, é uma verdadeira utopia. Justamente as linhas das “empresas que faliram” são aquelas que davam menos lucro aos empresários, e com a medida proposta por Eduardo Serra, na prática as empresas, que têm concessão estatal para fornecer o serviço, ficam desobrigadas de cobrir estas linhas, podendo as empresas privadas seguir concentradas nos trajetos mais lucrativos.

Agora, qual capitalista aceitaria fornecer os carros, o combustível e manutenção para a “empresa comunista” de transportes do PCB, se hoje o fornecimento é controlado pelo mesmo cartel dos Barata e da Fetranspor? Além de não ser “anticapitalista” de fato, o programa também não é tão “realizável” assim como o candidato afirma... Não é preciso dizer que a proposta sequer é a estatização de fato, já que a medida proposta é a criação de uma empresa pública do zero, e não a transformação da propriedade capitalista já existente em propriedade comum controlada pelos trabalhadores. A diferença, então, entre a proposta de “estatização” do PCB do processo de encampamento do BRT realizada por Eduardo Paes é que Serra jura que no final será possível ter uma tarifa zero em seu governo.

Nenhuma estatização, utopias de gestão por dentro das instituições capitalistas

Uma lógica parecida é aplicada pelo candidato do PCB para a Saúde. Nesta área, Eduardo Serra defende também investir no SUS, mas, além disso, acabar com os contratos com as Organizações Sociais e a terceirização dos trabalhadores do setor. Concordamos que é preciso acabar com esta forma de privatização do SUS: as OS e a terceirização são uma forma do Estado repassar recursos para empresas e organizações privadas, que ficam com a maior parte da verba para si e repassam salários de fome para os trabalhadores do SUS, trabalhadores que sofreram durante toda a pandemia a precarização do trabalho pelas mãos do Estado e das prefeituras. Mas estes trabalhadores não podem novamente pagar a conta da privatização, com a extinção das OS e dos contratos terceirizados, todos os trabalhadores deveriam ser incorporados ao quadro de funcionários da Saúde estadual sem necessidade de concurso público e com isonomia salarial e de direitos, e isto o PCB não vem levantando. Não defender a incorporação sem necessidade de concurso público de quem já exerce a função significaria jogar milhares de trabalhadores nas ruas.

No ponto da Saúde, ainda, Serra também deixa claro que a “a ideia não é estatizar uma clínica privada”, deixando claro que, novamente, sua proposta de estatização obedece todos princípios e normas permitidos pelo estado burguês. Não estatizar as clínicas e hospitais privados significa aceitar que existam equipamentos, leitos, ociosos a serviço do capital enquanto a população trabalhadora e mais pobre amarga superlotação, precariedade.

No caso da educação, essa mesma lógica é defendida: expansão do ensino público com convivência pacífica sem propor a estatização do ensino privado, propondo investir na educação pública para competir lado à lado com empresas privadas como os grandes oligopólios como o grupo Eleva de Jorge Paulo Lemann, homem mais rico do país, que, além de escolas e faculdades privadas, detém também diversos contratos pelo país afora para o fornecimento de materiais didáticos que foram feitos sob medida para o Novo Ensino Médio. Apesar desta realidade, o candidato do PCB faz questão de reafirmar: “de novo, não vamos fechar nenhuma escola privada na marra”. Como reforçar e expandir o ensino médio sem enfrentar o lobby destes grupos que, no último ano, definiram reformas estruturais que precarizam ainda mais o ensino médio a nível nacional?

Para o problema da moradia, a mesma lógica se repete: o programa apresentado pelo PCB prevê um plano de obras públicas que criaria 150 mil moradias populares. É correta a proposta de se criar moradias populares, mas nada se fala acerca das dezenas de milhares de imóveis que estão vagos nos centros das grandes cidades, em especial no Centro do Rio de Janeiro. Além do plano de obras públicas, seria necessária uma reforma urbana radical que exproprie grandes especuladores imobiliários, colocando estes a serviço dos trabalhadores.

Como parte desta reforma urbana radical, obras de infraestrutura como a instalação de redes de coleta de esgoto e melhorias na rede de água teriam que ser feitas, mas para isso acontecer seria preciso bater de frente com a privatização da Cedae, defendendo a anulação do processo, coisa que o PCB também não levanta em sua campanha.

A proposta do PCB de humanização da polícia para “combater o crime”

Para os negros,para os trabalhadores mais precários, e para os pobres , a única coisa que o Estado do Rio de Janeiro tem reservado são as chacinas cometidas pela polícia militar a mando de seu governador. Só em 1 ano de Cláudio Castro foram 40 chacinas, e voltando atrás temos uma lista dos horrores, não só da PMERJ, mas também da Polícia Civíl, assassinando inocentes, inclusive crianças à caminho da escola.

No ponto da Polícia, o PCB vem levantando uma política que é incapaz de parar essa máquina assassina e de defesa da propriedade privada. Na entrevista ao UOL, Serra defende a reformar as duas polícias formando uma polícia unificada não militar que inclusive tenha “tropas especiais”, trata-se de programa que já foi defendido por representantes burgueses de partidos capitalistas em outros momentos, como o tucano Mario Covas quando este governou São Paulo. A PM é de fato um resquício da ditadura militar e deve acabar, mas nem é essa a proposta de Serra, que na mesma entrevista afirma que não se trata nem mesmo de uma medida de demissão do efetivo da PMERJ. Trata-se de uma reforma cosmética do aparato policial repressivo e apenas isso.

A “extinção da PM” defendida pelo PCB vem acompanhada da proposta de investimento e valorização da categoria policial, e criação de tropas especiais que farão o policiamento ostensivo. Para Serra, se houver investimento em “inteligência”, desmilitarização e valorização da carreira, parece que do dia para a noite as chacinas vão desaparecer, junto com as milícias, os “autos de resistência”, os “excludentes de ilicitude”, os assassinatos de inocentes, a repressão às manifestações e todo histórico da trajetória racista de uma polícia que foi criada para caçar os negros escravizados que se rebelavam contra os senhores de terra, e que depois foi aparelhada para caçar comunistas e opositores durante a ditadura militar, junto com a Polícia Civil. Como se a polícia fosse repressora e assassinas do povo negro por ser mal remunerada e estar mal equipada. Na realidade defendem que os a instituição assassina do povo negro e trabalhador, tal com vimos recentemente, seja melhor paga, melhor equipada, melhor treinada e unificada em uma única corporação.

E basta ver exemplos internacionais como o próprio EUA, onde a polícia civil se ajoelhou sobre o pescoço de George Floyd e o sufocou até a morte, para ver como a proposta do PCB é cosmética . Os destacamentos de polícia ostensiva defendidos pelo candidato são uma afronta, já que o CORE – destacamento da Civil – compete lado a lado com o BOPE em letalidade contra negros e pobres. E investimento em inteligência, qualquer comunista que se preze sabe que quer dizer mais P2, policiais usados para se infiltrar e espionar os movimentos populares, manifestações e organizações de esquerda, que não faltaram em 2013 e em todas manifestações que pusessem colocassem qualquer risco ao poder dos capitalistas. Neste ponto, o programa de Eduardo Serra é uma cópia idêntica do programa do Freixo de alguns anos atrás, com a diferença que Freixo nunca disse ser comunista.

Investimentos estatais sem estatização do sistema financeiro e sem reverter a obra do golpe?

Para haver verbas para o investimento em transporte, saúde, educação, moradia e geração de empregos, seria necessário medidas como a taxação das grandes fortunas, expropriação de grandes empresas sob controle operário, ou então cessar o pagamento da dívida pública, que deverá chegar à R$ 6,4 trilhões no ano de 2022. Mas nenhuma destas medidas é defendida pela campanha do PCB.

O gasto com a dívida e o teto de gastos a nível federal é maior mecanismo de extração das riquezas produzidas pelos trabalhadores, expropriadas através deste imenso roubo praticado à luz do dia pelos bancos. Mas sobre o tema da dívida pública, o PCB também se esquiva de responder com um programa definido: no início do ano esboçou um slogan defendendo uma “lei de responsabilidade social” como proposta para substituir a lei de responsabilidade fiscal. As críticas ao teto de gastos e à destinação da maioria dos recursos públicos para o pagamento da dívida pública é algo que é fundamental de ser questionado, mas a saída proposta pelo PCB ainda obedece a institucionalidade, pois condiciona o processo de ruptura a combinação entre um projeto de lei através das instituições estatais. Para dar um viés mais de esquerda a todo esse programa reformista, o PCB propõe então conselhos populares para definir onde deve ir o orçamento público.

Os conselhos e o “Poder Popular” entram no programa do PCB como ideia híbrida de pressão sobre as instituições capitalistas, por um lado, e como ferramentas de gestão estatal, por outro. Através de um Conselho da Saúde, profissionais e comunidade usuária pressionariam por mais recursos e melhor atendimento no SUS; igualmente, o PCB propõe conselhos para o transporte, para a educação, segurança e em todas as áreas de interesse público.

Esse programa não passa de uma reedição do projeto de democracia participativa do programa chamado de “Democrático Popular” do PT, programa que Freixo também defendeu de sua maneira nas eleições para prefeito em 2016. Veja abaixo em um de seus vídeos de campanha:

Os conselhos e o poder popular do PCB estão limitados pelo programa que não rompe com o capitalismo, prestando respeito à propriedade privada que não deve ser expropriada. Então, em um segundo momento, o poder popular e os conselhos se tornam ferramentas de gestão, auxiliares a um possível “governo dos comunistas” fruto de uma eleição burguesa. Com isso, o poder popular proposto pelo PCB não passa de mais um projeto de gestão do estado burguês.

Apesar de falar em “governos dos comunistas”, “experiências socialistas” e de toda a roupagem e retórica “esquerdizante”, o que o PCB propõe é da disputa eleitoral do estado capitalista, com o “poder popular” voltado para pressionar as instituições capitalistas sem romper com as mesmas. Destruir o capitalismo, não é uma necessidade para os comunistas do PCB, pois nem mencionam essas coisas em sua campanha. Ao invés disso, propõem os exemplos de “governos de socialistas em países que não são socialistas”, quer dizer, experiências fracassadas de nacionalismo-burguês que são apoiadas pelo PCB e propagadas aos 4 ventos como solução. Com isso, apesar da “verborragia socialista”, a proposta dos “comunistas” do PCB não passa de uma utopia de gestão do capitalismo, apostando que o comunismo pode ser construído de cima para baixo, elegendo governos “comunistas” ou “socialistas”. Sem uma ruptura de fato, fazem campanha propagando a ilusão de que o poder popular virá através da eleição de um candidato do PCB e criando conselhos populares para ajudar em seu governo.




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