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Venezuela | Disfarçando a catástrofe: Governo de Maduro corta 6 zeros do bolívar

O governo de Maduro anunciou na semana passada uma nova reconversão da moeda, que será aplicada a partir de 1 de outubro. Já é a terceira dentro do período do chavismo. A nova medida elimina 6 zeros do bolívar atual, que se transformará em bolívar digital, mesmo que continuem a existir notas e moedas, segundo o que declarou o Banco Central da Venezuela. Mas o que este anúncio significa?

quinta-feira 12 de agosto de 2021 | Edição do dia

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O novo bolívar entrará em vigor no próximo dia 1 de outubro, “ao aplicar uma escala monetária que suprime seis zeros da moeda nacional. Ou seja, todo valor monetário expresso na moeda nacional será dividido por 1 milhão”, detalhou o Banco Central da Venezuela (BCV) em um comunicado. Esta medida já era esperada, e já tinha sido pré-anunciada por algumas mídias.

O bolívar soberano, que nasceu em 2018, junto a um pacote econômico que incluía outra reconversão monetária que naquele momento eliminava 5 zeros da moeda. Estes zeros pulverizavam o valor da moeda e também faziam com que o papel-moeda desaparecesse, já que era muito alta a hiperinflação (o papel-moeda passou a representar apenas 1,90% de toda a quantidade de bolívares em circulação no país no último fevereiro, segundo dados do BCV).

De acordo com o último relatório do BCV, atualmente a taxa de câmbio é de 4.036.194,85 bolívares soberanos para um dólar, ao passo em que a maior nota em circulação é a de 1 milhão. O bolívar soberano substituiu o bolívar fuerte, criado em 2007, mas que só começou a circular em 1 de janeiro de 2008, que já eliminava também mais três zeros da moeda, o que nos leva à conclusão de que, em 13 anos, a moeda venezuelana já perdeu 14 zeros, (100.000.000.000.000) constituindo assim, a maior desvalorização monetária da história contemporânea.

No marco de pacotes e constantes ajustes econômicos, desvalorização dos salários e eliminação de direitos trabalhistas como parte de um avanço do entreguismo nacional e das privatizações, que pretende converter a Venezuela em um país maquilador com a nova Lei das Zonas Econômicas Especiais, a atual conversão monetária não é nada mais do que um disfarce da catástrofe econômica em curso.

A hiperinflação e as constantes mega desvalorizações acabaram por transformar a moeda nacional em algo insignificante em relação à divisa estadunidense. Devido a esta situação houve uma diminuição do papel-moeda em circulação, já que a de maior quantia é de 1 milhão de bolívares, vale por volta de 25 centavos de dólar e serve para comprar apenas duas passagens de ônibus em Caracas. Um quilo de batatas vale alguns milhões de bolívares, só para dar um exemplo.

Na Venezuela existe uma "dolarização" em quase todo o tipo de transações, tanto as do dia a dia quanto as bancárias, autorizadas pelo governo, pois a divisa estadunidense é majoritária na hora de se fazer pagamentos em dinheiro. Essa medida acompanha uma liberalização geral das importações, já que os empresários e grandes importadores não pagam nada de imposto sobre importações, mas definem seus preços se pautando ao nível internacional, enquanto os trabalhadores recebem um salário mínimo que não passa de dois dólares mensais.

Mas o governo acredita que é uma “grande” medida eliminar nada mais nada menos do que seis zeros da moeda, e busca mostrar que a economia passa por uma “retomada”. Economia essa na qual um punhado de grandes empresários fazem a festa, sobre a base de milhões de pessoas que são jogadas à miséria. É o que temos publicado sobre a Venezuela: emerge uma tragédia econômica no país junto às políticas aplicadas pelo governo de Maduro.

De maneira inédita e sem comparação com nenhum outro país, os salários chegaram a níveis mínimos, foram cortados benefícios sociais por anos trabalhados e as também poupanças. De uma hora para a outra, os trabalhadores tiveram seus direitos mais básicos e foram levados à beira da miséria. As desigualdades já existentes se acentuaram ainda mais, criando um grande abismo dentro do país, com perdas de conquistas históricas da classe trabalhadora.

O pretexto dado pelas autoridades do Banco Central revela a política de um governo que não faz mais do que acentuar a crise. De acordo com o BCV a atual “troca da escala monetária” se apoia no “desenvolvimento da economia digital”, e a considera como um “fato histórico necessário em um momento em que o país inicia o caminho da recuperação econômica”. Este é o mesmo discurso de “recuperação” que precedeu o pacote de 2018.

Esta “recuperação” à qual o governo se refere tem suas bases no rendimento de todo um setor social, as amplas maiorias trabalhadoras e populares. Enquanto os capitalistas aumentam seus lucros com uma brutal super exploração, ganhando em dólares e pagando salários em uma moeda insignificante em um país em que se eliminaram leis trabalhistas para beneficiar a patronal. Sobre essa base de quase escravidão qualquer indicador econômico mostra alguma “melhora”, porém essa melhora é apenas dos grandes empresários, não das grandes massas pobres e assalariadas.

“A introdução do bolívar digital não afeta o valor da moeda, ou seja, o bolívar não valerá nenhum centavo a mais ou a menos. Essa medida só irá facilitar o uso da moeda junto a uma nova escala monetária”, diz o BCV em seu comunicado. Sendo assim, agora haverão notas de 5, 10, 20, 50 e 100 bolívares, todas com o rosto de Simón Bolívar (recriado digitalmente em 2012) na frente, e uma imagem da batalha de Carabobo no verso.

Maduro mostrou que foi incapaz de sustentar a moeda venezuelana, com trágicas consequências para a classe trabalhadora, o que por outro lado também levou à perda de soberania nacional, uma vez que o uso recorrente de dólares dentro do país passou a ser elogiada pelo próprio Maduro. Isso fará com que o país se torne cada vez mais dependente, já que a movimentação do dólar está obviamente ligada à Reserva Federal dos EUA.

Enquanto isso a burguesia comemora a situação. Em meados de julho a vice-presidenta Delcy Rodríguez presidiu como convidada especial a assembléia anual do principal grupo empresarial do país, Fedecámaras, para avançar em seus acordos. Avançam também os acordos entre o governo e a oposição, incluindo até mesmo o setor de Guaidó, e são planejadas reuniões públicas para formalizar tais acordos a partir de agosto no México.

Isso é o que todos os setores do regime já têm acordo, ou seja, o aprofundamento das medidas dos pacotes econômicos contra o povo. Isso é baseado em um grande consenso burguês de uma verdadeira frente capitalista contra a classe trabalhadora, tendo como ganhos a destruição dos direitos e conquistas dos trabalhadores.

Diante de toda essa situação, a questão colocada para os trabalhadores é a de reconquistar sua capacidade de organização e de luta a fim de resistir a todos os ataques em curso e os futuros, e não cair nas armadilhas oferecidas pelos diálogos e pactos que são feitos por cima. Apenas uma frente de independência de classe pode estabelecer as bases para a construção de organizações de trabalhadores e políticos da classe trabalhadora.




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