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"DEMOCRACIA" | Dia-a-dia de Brasília: Casa Grande, manobra e corrupção

Em uma mesma semana familiares do falecido Eduardo Campos foram indicados a cargos por seus herdeiros políticos, e também familiares. Secretários do Rio e o ministro da saúde saíram de seus cargos para votar em Picciani. A semana termina com sinal verde para o troca-troca dos partidos.

Leandro LanfrediRio de Janeiro | @leandrolanfrdi

sábado 20 de fevereiro de 2016 | 00:00

Foi promulgada nesta quinta-feira, em sessão conjunta do Congresso Nacional (quando se reúnem juntos a Câmara e o Senado), o Projeto de Emenda Constitucional 91. Com ele, a partir de hoje, qualquer parlamentar ou detentor de cargo representativo pode trocar de partido a bel-prazer sem risco de perder seu mandato.

Segundo a lei vigente um parlamentar só poderia trocar de partido sem perder seu cargo mediante três possibilidades: caso surja um novo partido, se comprovar que seu partido não está mais cumprindo seu programa ou, por último, se comprovar estar sofrendo algum tipo de perseguição. Ou quando surge uma janela como esta que durará 30 dias a partir de hoje.

Às vésperas das convenções partidárias para definir candidaturas nas prefeituras, de olho em seus negócios pessoais e no desgaste sofrido por suas legendas, está aberta a temporada onde os parlamentares vão onde acham que há melhores ventos para seus negócios (de costas a qualquer necessidade dos trabalhadores e do povo).

Este troca-troca atingirá o PT, muito desgastado pelos agressivos ajustes contra os trabalhadores e pela operação Lava-Jato, mas também deve atingir em menor medida o PSDB, um sinal já foi dado pelo importante senador Álvaro Dias do Paraná temendo o desgaste do governador Beto Richa e com promessa de candidatar-se a presidente assumiu as cores do PV. Esta “janela” de troca de partido deve atingir sobretudo o “centrão fisiológico” do país, acostumado a esta democracia de propinas e negociatas, seja ela comandada pelo PT ou pelo PSDB.

Pequenas, médias ou grandes legendas, o que importa são os negócios

Como exemplo do afluxo a “novos” partidos, sem contar a Rede de Marina com algum sopro de ideias por trás do vasto financiamento empresarial, vimos em uma escala muito maior a debandada de parlamentares do antigo PFL (atual DEM) para o PSD do ex-prefeito paulista Kassab anos atrás. Motivação de fundo: alinhar-se mais com o petismo e angariar fundos (legais ou não).

Depois disso muitos parlamentares rumaram a outra legenda que não se sabe qual seriam suas posições políticas além do fisiologismo tradicional de todos partidos políticos do país, esta segunda legenda foi o PROS criado para que a família Gomes do Ceará controlasse. Tanto o PSD, como o PROS, foram alentados pelo petismo para enfraquecer a oposição.

Perdendo controle de sua base fisiologista e em negociatas para possível candidatura presidencial, agora a família Gomes está no PDT. De olho na candidatura à prefeitura da capital paulista, Martha Suplicy trocou o PT pelo PMDB (o que não impede o vice-presidente Temer de manter sua filha como secretária do prefeito petista Haddad).

O último e mais escandaloso exemplo de troca de partido em grande escala pelo surgimento de um “novo” partido foi o chamado “Partido da Mulher Brasileira” que angariou rapidamente 20 parlamentares federais, sendo somente duas mulheres (!). Um membro deste partido que tem como programa que a mulher “volte a seu lugar” (à casa) é o pastor Ezequiel Teixeira do Rio de Janeiro, recém exonerado do cargo de Secretário de Direitos Humanos do governo Pezão (PMDB) após defender a “cura gay” e praticamente extinguir o programa Rio sem Homofobia.

Nos cafés do Congresso brasileiro e nas redações dos grandes jornais há numerosas especulações sobre o resultado final deste troca-troca em meio a continuidade da Lava Jato, da crise econômica e como grande manobra preparatória das movimentações rumo a 2018, que incluem até mesmo especulações de que Alckmin e Serra mudariam de partido caso não consigam desbancar Aécio na candidatura presidencial tucana.

O que já pode-se saber é que o resultado destas movimentações de um parlamento conhecido por escândalos de corrupção, suborno, fisiologismo só pode ser contra os interesses dos trabalhadores. Mostramos a seguir outra cara desta democracia degradada que ficou patente nesta mesma semana.

Democracia de camarilhas políticas: manobra e engano como método

Em meio à disputa pela liderança do PMDB o governo Dilma e seus aliados cariocas o governador Pezão e o prefeito Eduardo Paes adotaram em grande escala uma manobra já utilizada duas vezes em menos de três meses, exoneração de cargos para retorno relâmpago ao parlamento para imediato retorno relâmpago aos cargos para garantir seus interesses de camarilha contra a camarilha rival agrupada em torno de Eduardo Cunha. Tudo isto para que Leonardo Picciani, herdeiro político do presidente da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro e irmão do secretário de transportes do mesmo estado, derrotasse o candidato opositor. Nesta manobra contra o arqui-manobreiro Cunha, está em jogo as nomeações do PMDB para a comissão que apurará a admissibilidade do impeachment, bem como outras benesses de nomeações de cargos.

A nova manobra, o Deputado express, ri em alto e bom som do sufrágio dado pelos eleitores a estes deputados e mostra o descaso com os cargos ocupados, mero fisiologismo e utilização da máquina estatal para realizar campanhas políticas e enriquecimento próprio e de empresários amigos.

Dilma exonerou o ministro da saúde Marcelo Castro (PMDB-PI) em meio à crise do vírus Zika e sua possível relação com a microcefalia para voltar ao congresso e votar em Picciani. Também exonerou outro votante de Picciani, o ministro de Ciência e Tecnologia Pansera (PMDB-RJ). Pezão por sua vez devolveu o filho do ex-governador Cabral, o jovem secretário de esporte do Estado, com seus 25 anos de idade, para votar em Picciani. Paes exonerou seu pré-candidato a prefeito, o agressor de mulheres Pedro Paulo para dar o mesmo voto.

Com estas manobras Picciani e Dilma conseguiram derrotar o candidato de Cunha. Manobras e contra-manobras em nome de cargos e negociatas. Uma democracia onde é moeda corrente passar ao governo ou a oposição conforme o jogo dos cargos e cifras ganhou novas modalidades de manobras na disputa desta semana.

Democracia dos herdeiros e da Casa Grande

As manobras de Picciani e Dilma para garantir a maioria do primeiro já mostravam outro traço marcante da “democracia” brasileira. A grande quantidade de filhos de políticos que seguem os caminhos de seus pais. Assim é o caso do Leonardo Picciani, filho de Jorge Picciani presidente da Alerj, e irmão do deputado e secretário Estadual Rafael. Cabral emplacou seu filho. Renan fez de seu filho governador. Sarney sua filha. E assim vai.

Esta semana ganhou o noticiário de Recife a indicação da filha de Eduardo Campos a um cargo municipal e a indicação do jovem filho de Eduardo Campos, com tão somente 22 anos ao cargo de chefe de gabinete do governador Paulo Câmara. O governador, herdeiro político de Eduardo Campos é também primo do indicado de hoje.

Eduardo Campos, por sua vez que também tinha sido nomeado chefe de gabinete muito jovem, assumiu este cargo no governo de seu avô Miguel Arraes. Esta matéria do GGN ilustra o número de cargos das famílias Arraes e Campos em Pernambuco, que vieram substituir a família Cavalcanti que dominou o estado por anos.

Este traço de “hereditariedade” na política remete também às poderosas famílias que dominam a política e as finanças dos estados, algumas delas traçando às velhas Casas Grandes e fazendas.

Aécio Neves, neto de Tancredo Neves não deixa de ilustrar o mesmo fenômeno.
Este poder se mostra não só nestes estados com tradição escravocrata como Rio, Bahia antes dominada pelos Magalhães, Minas Gerais, ou Pernambuco, mas país afora. Tanto que no Congresso a maior bancada não é a da bala, a da Bíblia ou do Boi, mas a dos herdeiros políticos de outros políticos.

Segundo pesquisa recente publicada pelo site Congresso em Foco mais de metade do congresso é composto por “herdeiros” de outros políticos. Segundo a mesma fonte, este fenômeno é nacional, ocorre com 63% dos congressistas do Nordeste, 52% do Norte, 44% no Centro-Oeste e Sudeste e outros 31% no Sul. No senado, casa dos oligarcas (e da Casa Grande por excelência) os números são ainda mais gritantes: Sul, Sudeste e Centro-Oeste tem todos 67% dos senadores como “herdeiros”, o Nordeste tem também expressivos 59%.

Contra a democracia das propinas, dos herdeiros e das manobras

Dia-a-dia a classe trabalhadora é bombardeada com mais e mais notícias de corrupção, de nepotismo, de privilégios como auxilio-paletó, gravata, etc. A paralisia imposta a classe trabalhadora pelas burocracias que controlam os grandes sindicatos que falam em “defender a democracia” mas não questionam esta democracia degradada e sua corrupção intrínseca leva a uma descrença na política. A direita se aproveita desta descrença. Bolsonaro e outros se alimentam do clima “anti-político”. Uma parte da esquerda brasileira acha que discutir corrupção é cair em um “lacerdismo”. Entregam, sem combate, as classes médias à direita. Deixam a burocracia da CUT, CTB falar, sem combate, em nome da democracia.

É preciso lutar contra estas burocracias, para organizar a força da classe trabalhadora para lutar não só contra os ajustes, mas também contra a “podridão do que está aí.” O Esquerda Diário luta pela mais completa democracia, uma democracia dos trabalhadores que se apodere dos meios de produção e rompa o poder da elite nacional e estrangeira assentada em suas polícias, tribunais e também azeitada pela formação de maiorias parlamentares através de grandes esquemas de corrupção. A grande maioria dos trabalhadores ainda não concorda com isto. Por isto propomos que se querem “defender a democracia” não o façam blindando privilégios e a corrupção, mas que junto a nós defendamos que todo político, dos cargos comissionados aos parlamentares e juízes, ganhe como uma professora ou um operário, sejam eleitos e revogáveis a qualquer momento.




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