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Transição com Alckmin | Da Fundação Lemann ao Itaú, transição de Lula é com os articuladores da Reforma do Ensino Médio

A educação foi uma das áreas mais afetadas pelos anos de governo Bolsonaro, que combinaram uma significativa ofensiva ideológica contra professores e universidades a profundos cortes orçamentários, da Educação Básica às pesquisas na Pós-graduação. Segundo alguns dados, na educação básica, entre o primeiro ano do governo Bolsonaro e o orçamento previsto para 2023, há um corte de 34%. A área também sofreu os efeitos do Teto de Gastos e das reformas aprovadas desde o golpe institucional em 2016, sendo a Reforma do Ensino Médio a primeira delas. Agora, na equipe de transição chefiada por Alckmin, o que vemos é o protagonismo dos representantes dos fundos bilionários da educação privada e dos grandes articuladores dessa Reforma e da nova BNCC, que encabeçaram grandes ataques à educação nos últimos anos.

quinta-feira 10 de novembro de 2022 | Edição do dia

A transição de Lula reafirma o que o petista vem dizendo: não será um governo do PT, mas de uma ampla frente com a direita, na qual Alckmin é um dos grandes representantes, coordenando esse processo. Simbolicamente, essa transição tem à frente uma figura histórica do tucanato que impulsionou com o PSDB paulista uma ampla reestruturação da educação no estado que hoje é "símbolo" da implementação mais avançada da Reforma do Ensino Médio, da nova BNCC e da precarização do trabalho docente, à base de dura repressão aos lutadores.

Assim, se, em diversas áreas da transição, a frente ampla se reafirma, como com Tebet, do Teto de Gastos, na Assistência Social, ou com economistas neoliberais como Pérsio Arida, representante do Plano Real, na educação isso é ainda mais chamativo. Articulistas como Rodrigo Ratier, ao UOL, definem: "no microcosmo da educação, por exemplo, os primeiros sinais são de que o barco vai para a direita".

Se o sentido não será impulsionar as propostas conservadoras da extrema direita como homeschooling ou Escola sem partido, que deram o tom do discurso da extrema direita ao último governo e de sua chamada "ala ideológica", trata-se de privilegiar os chamados "reformadores empresariais da educação", que também encontraram seu lugar ao sol neste regime político cada vez mais à direita, com auxílio histórico das políticas petistas e recentemente ancorados no Conselho Nacional de Educação, nunca deixando de lucrar com a educação. Pelo contrário, foram dos maiores privilegiados pela implementação do Ensino à Distância durante a pandemia, aproveitando-se dela para precarizar a qualidade do ensino e as condições de trabalho dos profissionais da educação.

Quem são os setores do capital financeiro que ditam os rumos da educação na transição de Lula?

Em síntese, de acordo com Ratier, há três grandes protagonistas que emplacaram 18 dos 46 nomes divulgados na equipe de Transição, convocada por Fernando Haddad e coordenada por Henrique Paim, ex-ministro de Dilma Roussef. São eles o Itaú/Unibanco, representante de um setor do capital financeiro que tem buscado abocanhar uma parcela cada vez maior da educação pública do ensino básico ao Superior, avançando em convênios com universidades; a Natura, da Neca Setúbal, financiadora da REDE e entusiasta da Reforma do Ensino Médio; e Jorge Paulo Lemann, o segundo homem mais rico do Brasil, ex-financiador do reacionário movimento Vem pra Rua, que ajudou a destituir Dilma, e aquele que definiu que a pandemia gerava "oportunidades" para seus negócios na educação. Com nomes como Priscila Cruz, presidente-executiva e cofundadora do Todos pela educação, e Denis Minze, da Fundação Lemann, os chamados "reformadores empresariais da educação", também grandes articuladores do golpe institucional de 2016 e abriram espaço a Bolsonaro, dão o tom da equipe de transição. Não à toa, a FGV tem, sozinha, 7 vagas, enquanto as 63 universidades federais do país possuem apenas 3.

Não é exagero dizer que a cara da transição remete aos anos do golpista Temer, colega de partido de Tebet. A comparação está sendo realizada por inúmeros especialistas da educação. Afinal, Mendonça Filho, ministro da Educação de Temer responsável por enfrentar ocupações de universidades contra o Teto dos Gastos e avançar com a Reforma do Ensino Médio, tornou-se consultor na Fundação Lemann, agora super-representada na equipe escolhida. Foi também esse governo que avançou contra o limitado Plano Nacional de Educação de 2014, que agora essa equipe diz que tem como meta retomar, mas que nunca saiu efetivamente do papel. Em 2015, Dilma cortou 10,5 bilhões da educação, equivalente a 10% do orçamento da pasta, sinalizando que ia ao caminho oposto do que estipulava o texto do PNE transformado em Lei em seu governo.

Ao mesmo tempo, também é reveladora dos sentidos da política de conciliação de classes dos governos petistas já nos anos 2000. O “Compromisso Todos pela Educação” foi o manifesto de lançamento do movimento “Todos pela Educação”, em 2006, que abriga o maior movimento empresarial de disputa das políticas educacionais no país até os dias de hoje. Entre seus fundadores, encontramos as Organizações Globo, o Itaú/Unibanco, o Bradesco, o Banco Interamericano de Desenvolvimento, o Grupo Votorantim, a Odebrecht, a Telefônica e a própria FIESP, só para ficarmos entre os mais notáveis. Já ali seu objetivo era propor um programa de reformas educacionais. Haddad está entre seus sócio-fundadores. Em 2021, um de seus diretores-executivos declarou que “a reforma do Ensino Médio, apesar de suas limitações, é uma medida que aponta no caminho correto”. Então, se Daniel Cara, ex-candidato ao Senado de São Paulo pelo PSOL e representante da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, diz que "durante a reunião, ninguém teve coragem de defender a reforma do ensino médio, todo mundo reconheceu que pelo menos aperfeiçoamentos devem ser realizados", esses empresários com quem compartilha a transição indicam o contrário. "Aperfeiçoamentos" podem ocorrer, mas no interior da reforma que eles promoveram, mantendo a essência do seu projeto. Também Rantier afirma: "na transição, a tendência é que esse grupo crie uma espécie de cordão sanitário em defesa da BNCC e da reforma do Ensino Médio". A Reforma do Ensino Médio e a BNCC vieram para adequar a formação dos filhos da classe trabalhadora a um mercado de trabalho muito mais precário, marcado pela Reforma Trabalhista, pelo avanço da uberização e da Terceirização Irrestrita, reformas que o PT pretende manter intocadas.

Veja mais: A precarização da educação no governo Bolsonaro: Por que enfrentar o novo ensino médio?

A chave é que, após anos de um política para o Ensino Superior calcada na expansão do setor privado, com a conformação de monopólios como a Kroton-Anhanguera e Estácio, fruto das políticas de isenção fiscal e transferência de renda nos governos petistas, esses fundos bilionários vêm cada vez mais avançando em direção ao Ensino Básico, e o PT demonstra que será um auxiliar dessa política. Não à toa, Haddad gosta de se vangloriar que foi em seu mandato como Ministro da Educação que esses monopólios multiplicaram seu tamanho, dizendo-se o impulsionador da maior parceiria público privada (PPP), da história do país.

Qual o caminho para enfrentar os ataques à educação?

Ao mesmo tempo, chama a atenção de alguns as "notáveis ausências" da Transição, em particular as organizações sindicais de trabalhadores da educação e do movimento estudantil. Trata-se de mais uma mostra de que, para gerir esse governo de joelhos aos capitalistas, a frente ampla terá de passar por cima de bandeiras históricas dos lutadores pela educação e de pautas elementares, como a própria revogação das reformas e da BNCC aprovada. Foram esses mesmos setores que apoiaram as reformas da Previdência e administrativas estaduais, que precarizaram ainda mais as condições de trabalho dos professores, expostos a jornadas extenuantes de trabalho, com menos direitos, salas superlotadas e salários arrochados.

A defesa do sufrágio universal contra qualquer golpismo bolsonarista é uma tarefa da esquerda revolucionária, mas ser parte de um governo de transição com empresários e a direita não. Por isso, longe de "disputar a transição", como vários sugerem ou diretamente ser parte da mesma como faz o PSOL também buscando chegar a acordos com esse setor empresarial que veio avançando na destruição da educação no país, essa equipe apenas reforça que precisamos em primeiro lugar defender a independência política dos trabalhadores em relação ao novo governo eleito e exigir que as grandes centrais sindicais, a UNE e a UBES, dirigidas pelo PT e PCdoB, organizem a luta contra todos os ataques e reformas. O enfrentamento contra os monopólios do ensino privado deve ocorrer através da auto-organização e sem nenhuma confiança nas instituições desse regime, como única saída para os que querem defender a educação das garras dos empresários. Para revogar todos os cortes e as reformas integralmente, como um ponto número zero para avançar em outro sentido na educação, do ensino básico ao superior, apenas nossa luta independente, com uma ampla aliança entre estudantes secundaristas, de Licenciatura das universidades, futuros professores, e os trabalhadores da educação que hoje sentem na pele uma profunda reestruturação a serviço dos que lucram com a educação. Apenas assim, podemos enfrentar os grandes monopólios privados do ensino superior ao básico, defender o acesso irrestrito da juventude à universidade e um conhecimento a serviço da classe trabalhadora e do povo pobre. Um governo repleto de neoliberais e de conciliação de classes poderá abrir novos espaços para extrema-direita, impedindo o acesso a direitos básicos e elementares, como uma educação 100% pública, universal, laica e de qualidade para todes, com condições de trabalho e ensino para professores e todos os profissionais da educação.




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