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COMITÊ ED NORDESTE | DENÚNCIA: Prefeitura no interior da Bahia persegue trabalhadores da saúde e demite contratados

Recebemos no Esquerda Diário uma série de depoimentos de trabalhadores da saúde do município de Conceição do Jacuípe, interior baiano, denunciando a prefeitura por aproveitar a pandemia para descontar a crise sobre os trabalhadores da saúde, fragilizando o já precário atendimento à população.

quarta-feira 6 de maio de 2020 | Edição do dia

Em meio a um anúncio de que diversos sistemas de saúde regionais estão falindo, como no Ceará, em Manaus, Belém, essas medidas são um descaso com a sobrevivência desses trabalhadores durante a crise, responsáveis por garantir a vida frente a pandemia.

A prefeitura de Conceição do Jacuípe estaria demitindo contratados contra um Decreto promulgado pela própria prefeitura, que colocava os serviços de saúde como essenciais. Nesse sentido estariam proibidas demissões, o que torna criminoso esse tipo de medida, sobretudo por que atenta contra a vida desses trabalhadores e da população.

Compartilhamos aqui as denúncias desses trabalhadores da saúde, ocultando os nomes originais, frente a perseguição que denunciam sofrer. Uma delas, tratada aqui como Olga, trabalhadora efetiva do município, indica ter sido coagida a assinar um documento que determinava sua suspensão - com efeito de corte salarial - após reivindicar condições adequadas de atendimento à população no local onde foi designada a trabalhar e por ter se recusado a realizar atividade contrária às normas deu sua função.

Situações como essas certamente não são exclusivas a esse município. O Esquerda Diário se coloca à disposição de cada trabalhador e jovem que está sofrendo abusos, demissões, trabalhando sem equipamentos de segurança e higiene, que envie sua denúncia ao site, para fortalecer a sua voz, frente a tragédia que os patrões e os governos estão nos deixando com a pandemia.

No município de Conceição do Jacuípe, a prefeita decretou situação de Emergência Pública no Município de Conceição do Jacuípe e estabeleceu medidas para enfrentamento de emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (COVID-19). O Decreto da Prefeitura Municipal de Conceição do Jacuípe foi instituído somente e em consequência da necessidade de articulação com as medidas nacionais de enfrentamento do Covid-19, que tornou a atividade de assistência à saúde essencial e que foram originadas pelo Decreto Federal no 10.282, de 20 de março de 2020, que regulamenta a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.

Com respaldo na legislação federal e das necessárias ações que deveriam ser desenvolvidas nos estados e municípios que a referida Prefeita de Conceição do Jacuípe editou decretos, dentre eles os destinados a renovar contratos de servidores temporários e revogar licenças e férias e servidores da saúde pública com a finalidade de enfrentar a pandemia.

O que era para ser uma ação de enfrentamento da pandemia, de acordo com os relatos dos trabalhadores do município, tem se tornado um terror para as suas vidas. São submetidos a condições precárias de trabalho, alguns contratos temporários são revogados indevidamente e punições ilegais são perpetradas, como no caso da Olga.

Servidora pública efetiva do município, Olga teve sua licença prêmio revogada e foi direcionada a uma unidade de saúde da família, segundo ela, desprovida de recursos e equipe necessária para o funcionamento de um local, ainda mais por estar atendendo a demandas não apenas da zona rural onde está estabelecida a referida unidade, mas também de outras duas unidades satélites que tiveram o trabalho encerrado e estavam fechadas por força de Decreto municipal.

Após reclamar sobre as condições contrárias à legislação e ao código de ética da sua profissão e por ser manifestamente contrária à realização de atividades de caráter administrativo, que, segundo Olga, são contrários à sua função e aos regulamentos da sua profissão. Por este motivo ela foi punida por um integrante da coordenação de saúde do município, através de procedimento que imediatamente a impedia do exercício legal de sua função, cargo e profissão. Foi-lhe aplicada uma medida disciplinar antagônica ao que determina o Estatuto dos servidores públicos do município. Através de instrumento particular foi imposta uma indevida suspensão de Olga, alegando-se insubordinação e, alega a trabalhadora ter sido coagida a assinar tal documento impositivo, que não lhe deu direito a se defender e, ciente da ilegalidade da ação, recusou-se a assiná-lo e buscou medidas legais para proteger os seus direitos e a sua saúde.

Consultada a legislação do município foi possível verificar que servidores, tanto efetivos, quando temporários, só podem ser punidos através de processo administrativo, devidamente instaurado pelo chefe do executivo, com condições para que o acusado tenha direito ao princípio do contraditório e ampla defesa – como também determina a Constituição Federal – e só poderá um servidor ser suspenso após concluída e determinada a punição através de ato legal, que somente o prefeito(a) tem poder de assinar e, desde que publicado em diário oficial poderá ter valor efetivo.

Na prática, a suspensão ilegal de um trabalhador do município através de um documento fora do que determina os marcos legais e regulatórios funciona da seguinte maneira: uma vez impedida de comparecer ao seu local de trabalho por um tempo determinado pela medida constrangedora, o único procedimento que pode ser aplicado são faltas, com automático desconto no salário do servidor. A “suspensão” aplicada, dessa maneira, é um método que não atende ao regime legal do município. Não pode ser sequer publicada em diário oficial, por ser um procedimento ilegal. Nas palavras de Olga: “constitui-se em ameaça e cerceamento de meu direito, pois fui impedida de exercer minha profissão que se soma ao agravante fato da proibição ilegal de exercer minha função e cargo público neste momento em que minha atividade se enquadra como atividade essencial, por conta da pandemia do coronavírus. Tal prática põe em risco o próprio serviço de saúde disponibilizado à população do município, ataca os meus direitos como trabalhadora, fere minha dignidade pessoal e afeta minha saúde mental”. Olga afirmou ainda que, em consequência do constrangimento foi colocada em condição de risco à sua saúde a ponto de ter ela sido afastada do trabalho por determinação médica. Destaca-se, por último, que para suprir uma atividades por ela exercida, pacientes e colegas entraram em contato com ela para indagar-lhe o motivo da sua ausência ao trabalho e, depois, para informar que, para substituí-la foi retirada do isolamento social uma servidora que estava afastada por ser considerada do “grupo de risco”, cuja contaminação pelo coronavírus pode ser letal.

Situação similar também nos foi relatada por Amélia. Ela também já foi submetida a procedimento contrário à legislação com fins punitivos e constrangedores. No seu caso, Amélia foi ameaçada por uma advertência, cujo documento privado ela foi obrigada a assinar, não sendo lhe dado o direito à defesa. Revela ainda que não recebe insalubridade na sua função de odontóloga, cujo pagamento é de direito, obrigatório e tem sido efetivado para outros profissionais da saúde no município.

Brenda, que é servidora temporária foi mais uma denunciante que afirma ter recebido e obrigada a assinar uma das penalidades, sob a ameaça de demissão. Reitera-se que o regime jurídico que sustenta o trabalho dos servidores temporários do município prevê que os mesmos, para que possam receber penalidades, devam ser submetidos ao devido processo administrativo, delimitado pelo Estatuto dos Funcionários Públicos de Conceição do Jacuípe.

Outra grave situação perpetrada contra os trabalhadores temporários pode ser verificada nas denúncias de Jonatan e Kelly. Por conta do Decreto Municipal que declarou a situação de emergência do município de Conceição do Jacuípe, a Prefeita determinou, através de decreto, a renovação de todos os contratos temporários dos servidores, levando em consideração, especificamente, o estado de emergência de saúde pública, decretado em função das medidas de enfrentamento do Coronavírus.

Acontece que, o que era para ser uma renovação a ser aplicada a todos, especialmente os servidores vinculados à atividade essencial de assistência à saúde, tem sido um procedimento seletivo. Revela o servidor temporário da saúde, que deveria ter a sua renovação assegurada, Jonatan, que ocorrera, sem aviso prévio e com comunicação verbal - afirmada em período posterior, via aplicativo WhatsApp, que não teria direito à renovação e que seu contrato estava rescindido. O mesmo aconteceu com Kelly, que nos afirmou ter sido desligada intempestivamente de uma das funções consideras essenciais de assistência à saúde. Assim, fica evidente que a medida que levou as exonerações é totalmente contrária ao que propõe a política nacional de enfrentamento do Coronavírus, razão da origem do Decreto municipal que renovou os contratos, além de ocorrer em um momento em que se determina que demissões não devem ser feitas sem um devido acordo individual ou coletivo, em alguns casos devendo ser homologado pelos sindicatos das categorias. Nos casos relatados a possibilidade de rescisões, no entendimento dos denunciantes é ilegal e sequer deveria se cogitar acordo ou desligamento considerando o próprio Decreto que renova os contratos. A renovação, que deveria atender a todos, está sustentado em uma fundamentação que não corresponde à realidade, portanto, torna-se antagônica ao pressuposto que levou à sua promulgação na forma de Decreto Municipal. Se este Decreto seletivamente privilegia a alguns e opera em detrimento de outros deveria, então, perder o seu valor, ser revogado, pois utiliza um argumento legal e uma suposta preocupação com a saúde das pessoas, mas exclui os profissionais, de maneira ilegal e irresponsável do trabalho a que teriam direito de exercer.

Todos os denunciantes afirmam que além de se posicionar imediatamente contra as medidas, ao procurar diálogo com a prefeitura para pedir retração diante das práticas consideras ilegais, não lograram sucesso. O atendimento presencial está suspenso e os canais de comunicação não fornecem respostas, ao que tudo indica devido ao fato de todos os servidores não enquadrados nas atividades essenciais do município foram colocados em férias coletivas até o mês de maio.




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