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ENTREVISTA | Cia. Estável apresenta "A Exceção e a Regra" na CPTM

A Cia. Estável de teatro está apresentando a peça "A Exceção e a Regra" nas linhas de trem (CPTM) na grande São Paulo. A redação do esquerda diário entrevistou Nei Gomes, da Estável, sobre esse projeto e sobre a trajetória da Companhia até hoje. Confira as próximas datas de apresentações na linha turquesa da CPTM.

segunda-feira 6 de abril de 2015 | 00:00

Esquerda Diário: O que é a Cia Estável de Teatro? Contem um pouco sobre a trajetória de vocês.

Nei Gomes: A Cia. Estável de Teatro é um coletivo que tem como premissa de sua pesquisa a criação em conjunto com a comunidade onde está inserida. O primeiro projeto deste coletivo foi o AMIGOS DA MULTIDÃO, realizado no teatro distrital FLÁVIO IMPÉRIO em Cangaíba, zona leste de SP, onde, por intermédio do edital de Ocupação dos Teatros Distritais em 2001 e da Lei de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo, desenvolveu uma programação diária com oficinas, espetáculos artísticos, saraus e apresentações de peças de seu próprio repertório. Dentre elas, o espetáculo INCRÍVEL VIAGEM, de Doc Comparato e direção de Renata Zanetha, que também foi apresentado no projeto FORMAÇÃO DE PÚBLICO da Secretaria Municipal de Cultura. Foram montados também os espetáculos FLÁVIO IMPÉRIO, UMA CELEBRAÇÃO DA VIDA, de Reinaldo Maia e direção de Renata Zanetha, e QUEM CASA, QUER CASA, de Martins Penna e direção de Nei Gomes. Foi também dentro desse projeto que nasceu o espetáculo O AUTO DO CIRCO, de Luis Alberto de Abreu e direção de Renata Zhaneta, que fez temporada em diversos espaços em São Paulo, teve apresentações em Guarulhos e Santo André e participou em 2006 do FESTIVAL DE TEATRO DE CURITIBA e em 2007 do JANEIRO DA COMÉDIA, em São José do Rio Preto.

Ainda em 2006, contemplada novamente pela Lei de Fomento com o projeto VAGAR NÃO É PRECISO, a Cia. Estável de Teatro passou a fazer residência artística no Arsenal da Esperança, casa de acolhida que abriga mil e trezentos homens em situação de rua localizada ao lado do Museu do Imigrante, no bairro do Brás. Dentro do espaço, uma lona de circo foi armada servindo de picadeiro e de lugar de convivência dos acolhidos. A relação entre a companhia e os albergados foi desde sempre mediada pelas ações previstas no projeto: estudos, debates, intervenções, apresentações de espetáculos e oficinas.

Uma nova etapa se iniciou com o projeto de pesquisa VAGAR NÃO É PRECISO - MONTAGEM, contemplado pela Lei de Fomento ao Teatro e pelo prêmio Myriam Muniz, para a pesquisa e montagem do espetáculo HOMEM CAVALO & SOCIEDADE ANÔNIMA, que teve sua estreia em setembro de 2008. O espetáculo, que demandou um longo período de pesquisa, abordava fundamentalmente as relações entre o modo de produção capitalista e a exploração do trabalho. Em 2009, o espetáculo foi convidado a participar do FESTIVAL FLASKÔ FÁBRICA DE CULTURA e do encontro estadual do MST em Itapeva.

Em 2009, novamente contemplada pelo Programa Municipal de Fomento, a Cia. Estável dá continuidade ao trabalho dentro da Arsenal da Esperança com o projeto SOBREPOSIÇÕES – INTERFERÊNCIA ARTÍSTICA COMO INSTRUMENTO DE PROVOCAÇÃO, tendo como objetivo aumentar exponencialmente o fluxo de informações e atividades estéticas e reflexivas dentro da casa. Como parte dessas ações, o grupo criou quatro edições do TERRITÓRIOS, uma publicação voltada para o registro das reflexões geradas durante o processo de pesquisa. Em 2010, o grupo apresenta o espetáculo HOMEM CAVALO E SOCIEDADE ANÔNIMA na Escola Nacional Florestan Fernandes e participa com este mesmo espetáculo da quinta MOSTRA DE TEATRO DE RUA LINO ROJAS. Nesse mesmo ano, a companhia é mais uma vez contemplada pela Lei de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo e também pelos prêmios Proac e Myrian Muniz, iniciando as ações do projeto TERRITÓRIOS e a montagem de seu mais recente espetáculo A EXCEÇÃO E A REGRA, de Bertolt Brecht, com direção de Nei Gomes e Andressa Ferrarezi. Em 2011, o grupo cumpre temporada do espetáculo e realiza uma circulação pelos seguintes espaços: Espaço Clariô, na MOSTRA DO GUETO; Fábrica Ocupada Flaskô, no II FESTIVAL FLASKÔ; Centro Cultural Monte Azul, na XIX MOSTRA DE TEATRO MONTE AZUL; na Cidade Dutra, na MOSTRA DO BEIÇOLA da Cia. Humbalada; em Santos, na Praça Mauá a convite da Trupe Olho da Rua; no Sacolão das Artes, a convite da Brava Companhia; no espaço Universo Cultural da Matilde em São Caetano do Sul; na Praça do Campo Limpo, no VI FESTCAL; na Unifesp de Guarulhos, na programação da SEMANA DE HISTÓRIA.

Ainda em 2011, o grupo completa 10 anos e realiza uma mostra de seu repertório. Também lança o livro DAS MARGENS E BORDAS – RELATOS DE INTERLOCUÇÃO TEATRAL. CIA. ESTÁVEL 10 ANOS. Nele publica textos críticos produzidos por integrantes do grupo e colaboradores, o roteiro do espetáculo HOMEM CAVALO & SOCIEDADE ANÔNIMA e extenso material iconográfico.

Em 2012, o coletivo é convidado pela Cia. Antropofágica para a INTERVENÇÃO 22 - 90 ANOS DA SEMANA DE ARTE MODERNA; em junho deste ano, é chamado pela Companhia do Latão para participar da MOSTRA DE PROCESSOS DE TEATRO DE GRUPO, como parte do projeto de ocupação do Teatro de Arena Eugênio Kusnet, da Funarte (SP). Ainda em 2012, participa, juntamente com a Cia. Teatro de Narradores da homenagem a Augusto Boal no Sesc Pompéia, sob coordenação de Alessandra Vanucci, apresenta o espetáculo CABARÉ ANTROPOFÁGICO junto a Cia. Antropofágica e recebe o convite da Companhia Ocamorana para desenvolver, em caráter de pesquisa formal, cenas baseadas em três formas distintas de agitprop tendo como base a temática “Diretas, já!”, ponto de partida para o próximo projeto DESTERRO – POÉTICAS VERMELHAS contemplado também pela 21ª. Edição do Fomento. O interesse do grupo em aproximar-se da experiência do agitprop veio ao encontro de diversas necessidades do coletivo. A mais importante delas é a busca por formas eficazes no diálogo com a classe trabalhadora. A companhia acredita que esta forma de teatro, de caráter artístico-pedagógico, possa resultar em intervenções bastante potentes para qualquer espaço.

Em 2013, o grupo reestreia o espetáculo A EXCEÇÃO E A REGRA, com novos
integrantes no grupo, e convida Renata Zhaneta para fazer uma nova direção do trabalho. Dentro dessa atual configuração, a peça é apresentada dentro do ARSENAL DA ESPERANÇA e circula por ruas e praças da cidade de São Paulo, participando da VII MOSTRA DE TEATRO DE SÃO MIGUEL PAULISTA, da I MOSTRA PELA PAZ, da III FEIRA TEATRO DE RUA EM SOROCABA E VOTORANTIM, do FESTIVAL DE 10 ANOS DA FLASKÔ e da MOSTRA DE TEATRO DE RUA E DE FLORESTA, no Acre, durante encontro da Rede Brasileira de Teatro de Rua. Neste mesmo ano o coletivo, juntamente com a COMPANHIA ESTUDO DE CENA, promove dentro da casa uma mostra de trabalhos de grupo em celebração ao PRIMEIRO DE MAIO.

Ao longo de 2013 e do primeiro semestre de 2014, a companhia realiza apresentações e mostras de processo de seus estudos de Agitprop. São os espetáculos SEPARADOS PELA GANÂNCIA, a partir do estudo do melodrama, NO MUNDO COMO GAÉLICOS, do estudo da opereta, e diversos exercícios cênicos.

Em 2014, a cia. apresenta a cena ACORDUS na I FEIRA ANTROPOFÁGICA DE OPINIÃO. Realiza também, em parceria com a Cia. Estudo de Cena e ao Coletivo da Albertina, a II CELEBRAÇÃO TEATRAL 1º DE MAIO. O espetáculo A EXCEÇÃO E A REGRA participa da VIII MOSTRA DE TEATRO DE SÃO MIGUEL PAULISTA e é contemplado pelo prêmio Myriam Muniz de circulação, sendo apresentado em abril nas cidades de Dourados e Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, e no mês de julho em Fortaleza e Solonópole, no Ceará.

ED: O que é a peça "A Exceção e a Regra"? Por que decidiram montá-la atualmente?

NG:A Cia. Estável de teatro, ao longo de seus 14 anos, tem como principal característica de sua pesquisa a busca constante da relação entre suas atividades artísticas e os locais (e seu entorno) onde desenvolve residência artística. O início dos trabalhos da Cia. Estável de Teatro no bairro de Cangaíba, zona leste da cidade de São Paulo, dentro do Teatro Flávio Império, mobilizou a comunidade durante 6 anos com espetáculos, oficinas e outras atividades. Atualmente com sede no Arsenal da Esperança, instituição que abriga 1500 homens em situação de rua, a Cia. Estável de Teatro vem aprofundando sua pesquisa nas relações da rua e outros espaços públicos como locais de difusão e circulação cultural. Com o espetáculo A Exceção e a Regra, a relação com o entorno ganha amplitude ao buscar interlocução com o público em locais de passagem e transição de grande número de pessoas. O espetáculo conta a história de uma viagem realizada por duas expedições no deserto, as relações entre patrão e empregado são levadas às últimas consequências nesta viagem. Associando a relação da viagem e da expedição ao caminho percorrido pelos trabalhadores diariamente nas viagens de trem, foi feito um estudo das possíveis estações cobertas pela CPTM que a Cia. Estável de Teatro pudesse buscar verticalmente este diálogo com o trabalhador.

ED: Por que vocês decidiram fazer os espetáculos nas estações da CPTM? Já tiveram alguma experiência assim? Qual a expectativa que têm?

NG:A primeira partida nessa busca foi a rua, que entendemos ser um posicionamento político. Nosso interlocutor é a classe trabalhadora e a rua, como lugar aberto e de passagem, é o local que está possibilidade se verticaliza. Você pára se quiser e se puder, não paga por isso e muitas vezes interfere no espetáculo, como costuma acontecer. Escolhemos as saídas de trem da CPTM por serem locais de passagem dos trabalhadores e trabalhadoras, além de tentarmos sempre um horário que as pessoas possam acompanhar o maior tempo possível. Sempre buscamos locais onde essa interlocução possa acontecer da melhor forma possível, acreditamos que por ser um transporte dos trabalhadores e trabalhadoras e os dias e horários de maior volume de retorno para casa serão possibilidades de alcance de muita gente!

ED: O que acham da política do Estado brasileiro e dos atuais governos para a arte? Como acham que isso deveria ser?

NG:Vivemos avanços que ficaram estagnados, como a Lei de Fomento ao Tetro para a Cidade de São Paulo, em geral não dão conta do volume de trabalhadores da cultura e público que poderia ser atendido. Algumas leis, como a lei Rouanet, que prevê isenção fiscal das empresas para investimento em obras artísticas acabam regrando a forma como esse dinheiro será investido, em geral em benefício da própria empresa como estratégia de marketing. Estamos vivendo uma barbárie com a Cultura atualmente com vários cortes e atrasos nos editais públicos. É um setor que fica totalmente desprotegido, se fazendo necessária a luta constante dos trabalhadores e trabalhadoras da cultura para que os projetos sejam minimamente mantidos. Exemplos como o Fundo Nacional de Cultura com dotação orçamentária própria e manutenção de núcleos estáveis com grande período de existência já seria um grande adianto, porém as pautas são levadas em banho Maria pelo poder público que não veta e não aprova, fazendo as ações serem cada vez mais difíceis para o diálogo.

ED: Para vocês, qual a importância do teatro e da arte para os trabalhadores? Vocês acham que a arte tem a ver ou deve ter a ver com a política? Como?

NG:Para nós, toda obra artística é política. Talvez o problema não seja entender se teatro é político ou não, que para nós sempre é, mas sim entender o que é política. A palavra já vem carregada do imaginário partidário, politica para nós são ações que refletem na vida das pessoas. O teatro é um espelho da vida, onde as relações são mostradas para serem refletidas. As questões de trabalho geralmente são de interesse da classe trabalhadora, por isso é importante que seja feita para os trabalhadores. Não é interessante para a classe dominante que as relações de exploração sejam desnaturalizadas, por isso vamos em busca do dialogo com a classe que fazemos parte, a classe trabalhadora.

Confira as próximas datas de apresentação de "A Exceção e a Regra":

10/4 Estação Ribeirão Pires
17/04 Estação Mauá
20/04 Estação Santo André
27/04 Estação São Caetano
Sempre às 20h


Temas

Teatro    Cultura



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