×

VIOLÊNCIA RACISTA | Chacina policial contra jovens negros em bairro pobre de Salvador

segunda-feira 2 de março de 2015 | 11:00

“Todos estavam com as mãos para cima, outros com a mão na cabeça. Foi quando um PM obrigou um dos rapazes a sair com eles. Antes, o garoto foi quebrado na porrada” (…) “De repente, ouvi rajadas. Me abaixei. Quando ouvi que não tinha mais nada, todos os rapazes estavam no chão”, contou a testemunha.1

Essa poderia ser a narrativa de muitas situações com a polícia brasileira como sujeito dos tiros, mas refere-se ao escandaloso caso que tomou lugar em Cabula, bairro da região metropolitana de Salvador – BA. No dia 06 de fevereiro, durante a madrugada, uma operativo de policiais encurralou 18 jovens e, após espancar todos eles, descarregou suas armas sobre os corpos desses meninos, dos quais apenas 4 sobreviveram. Desses, 1 segue detido e 3 hospitalizados, um deles em risco de vida.

Não é de hoje que a polícia se vê acima da própria lei que diz cumprir. Ao contrário de seguir o critério dessa lei, que reconhece que “todos são inocentes até que se prove o contrário”, a polícia civil e militar reconhece-se acima do direito ao punir, ali mesmo, com suas próprias mãos, aqueles que considera “bandidos”.

Esses 12 jovens, assim como os milhões de mortos pela polícia brasileira no curso de sua história, jamais puderam contar com o direito básico de poderem se defender como presumidos inocentes, até que se prove o contrário, e encontram nas mãos da polícia a pena de morte, penalidade máxima utilizada pela última vez oficialmente apenas até 1889.

A verdade é que, para manter as principais ilusões que mantém os trabalhadores e os negros carregando a democracia sobre suas costas, a burguesia propaga leis e direitos que existem apenas no papel, ao passo que financia verdadeiros órgãos de extermínio e agências de genocídio encomendado, como o são o conjunto das policiais brasileiras.

Para manter essa prática intacta, a burguesia, pela via dessas mesmas leis, garante direitos irrestritos para que a polícia sinta-se segura para assassinar aos montes os jovens negros das periferias brasileiras, ou seja, para praticar seu esporte favorito. Um forte exemplo desses incentivos reside na manutenção dos autos de resistência, uma qualificação de morte por bala policial onde o policial responsável pela bala alega que aquele indivíduo foi morto por “resistir à prisão” ou por “ameaçar a vida de um policial”. A verdade é que uma parcela gigantesca dos autos de resistência, quando reanalisados, revelam mortes causados por tiros pelas costas, vindos de cima, a clássica execução, onde o policial faz a pessoa agachar à sua frente e a baleia na cabeça pelas costas. Um outro fator determinante é a imunidade do policial, que mesmo que seja considerado culpado por um assassinato, recebe exoneração por parte do Estado garantido o direito a ser um oficial de reserva, que a qualquer momento pode ser reconvocado pelo Estado brasileiro, e que segue recebendo uma parcela de seu salário sem trabalhar. Quando presos, esses policiais sem vêm recolhidos em uma penitenciária militar, com qualidades de convívio infinitamente superiores aos depositos de negros e pobres que são as prisões brasileiras.

Noa dia 03 de Fevereiro deste ano, a ONU divulgou um relatório onde denuncia que, no Brasil, a taxa de homicídios entre a população de até 19 anos aumentou em 194,2% entre 1980 e 2012, ou seja, entre a restauração da “democracia” e os dias atuais. O assassinato sistemático escolhe cor, e enquanto a população branco viu 32,3% de queda na morte de seus jovens, os jovens negros morreram 32,4% a mais. Quando não são assassinados, os jovens pobres, negros e trabalhadores em nosso país não chegam nem perto das condições humanizadas dos presídios militares, e no mesmo documento, a ONU denuncia que métodos de tortura advindos da ditadura massificaram-se, tornando-se a ação de praxe por dentro dos presídios.2

A prática policial, advinda da ditadura, jamais encontrou qualquer bloqueio a sua ação pela via da democracia burguesa. Pelo contrário.

O Partido dos Trabalhadores, fundado em meio a luta pela democratização no ano de 1980, desde aquele momento carregado de contradições internas, impõe pela via de sua influência de massas em figuras como o Lula, uma transição à democracia compactuada pelos setores mais intrínsecos a ditadura militar, criando figurões ditatoriais inquestionáveis, como segue até hoje Sarney e sua família e as dezenas de militares anistiados por política do governo PT.

34 anos depois de tal pactuação criminosa, a política para qual o PT se formou ganha seu patamar mais escancarado na postura do atual governador da Bahia, Rui Costa, eleito nas eleições do ano passado. Em relação à chacina, declara que “o que diferencia os homens de bem daqueles que escolheram o mundo do crime para enriquecer ou pra fazer maldade e perversidade com outro ser humano, o que diferencia é o cumprimento da lei. Nós tenderemos, assim como um bom artilheiro, a acertar mais do que errar. Vocês terão sempre, e podem ter certeza disso, um governador disposto a não medir esforços a defender desde o praça ao oficial. A todos que agirem com energia necessária, mas dentro da lei.”

Essa declaração do governador do PT, além de soar profundamente parcial – ele claramente já escolheu um lado para defender, independente das investigações levadas adiante pelo Ministério Público – toma a cartada branca do genocídio, os autos de resistência, como lei oficial e inquestionável, e garante ao policial o seu direito mais contraditório e antidemocrático: o de fazer justiça com as próprias mãos.

Essa profunda adaptação política do governo PT somada às recentes nomeações de ministérios e anúncios de cortes de gastos em saúde e educação, são as expressões mais agudas de que longe de ser um Partido de Trabalhadores, o PT está na verdade para defender os interesses da mais alta burguesia nacional e internacional, estas as mais interessadas na manutenção do genocídio da população negra e sua consequente precarização do trabalho e da vida.

Contra essa política assassina e genocia, apoiamos integralmente os atos convocados pelos familiares e moradores de Salvador, que desde o dia 08 se aglomeram para exigir justiça aos seus jovens levados pelas balas da polícia. Nos colocamos contra toda forma de repressão levada adiante pelo governo do PT, que durante todas estas mobilizações, como a do dia de 8, amedrontou os trabalhadores em protesto ordenando a polícia violentas dispersões, que segundo relatos de moradores do da Cabula, criaram o seguinte cenário: “com raiva, os policiais desceram a Vila Moisés batendo em todo mundo, invadindo as casas”, “Eles davam tapas em todo mundo. Não perdoavam mulheres nem crianças”, “Xingavam todo mundo, como se tivéssemos que aceitar a barbaridade que fizeram.”

Junto com esses moradores, familiares e amigos dos jovens assassinados na chacina da Cabula, dizemos: “Mas não vamos nos calar. Ontem (segunda) foi o primeiro de muitos protestos que virão”.

Não nos calaremos, e nenhuma morte passará em vão!

Para dar corpo a essa luta, nos somamos a ela levando a necessidade de que se acabe imediatamente com as forças policiais, e que os trabalhadores, familiares e moradores de cada bairro que sofreu com as centenas de chacinas em nosso país, tenham direito de julgar os policiais envolvidos e definir a pena que devem receber pela dor de levar seus entes queridos. Assim como, o direito a que cada jovem, tanto os 40% que seguem presos em penitenciárias sem julgamento, até os que receberam julgamentos injustos, possa receber novos espaços de julgamento, onde possam ser julgados por seus pares para que seja garantido seu direito de plena defesa e julgamento justo.

Adriano Souza Guimarães, 21 anos;

Caíque Basto dos Santos, 16 anos;

Everson Pereira dos Santos, 26 anos;

Bruno Pires do Nascimento, 19 anos;

Ricardo Vilas Boas Sila, 27 anos;

Natanael de Jesus Costa, 17 anos;

João Luiz Pereira Rodrigues, 21 anos;

5 jovens não identificados, mortos também em Cabula:

PRESENTES!

Todos os jovens assassinados pela polícia, Amarildo, Claudia, operários e jovens militantes reprimidos e assassinados durante greves e lutas:

PRESENTES!

AGORA E SEMPRE!

1 Trecho de entrevista de testemunha da chacina do Cabula (Salvador – BA) extraído da Revista Fórum, matéria de 8 de Fevereiro de 2014.

2 http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2015-02/relatorio-apresentado-onu-denuncia-encarceramento-e-exterminio




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias