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JORNADA DE LUTA 15M | Burocracia sindical e esquerda no Brasil e na Argentina

Como parte da jornada de luta contra os ataques à classe trabalhadora convocada por centrais sindicais, movimentos sociais e organizações políticas para o dia 15/04, o portal digital Esquerda Diário busca contribuir para que seja ouvida em todo o país e na América Latina a denúncia da responsabilidade de Dilma, Lula, do PT e da CUT nos ataques em curso no país, tanto pela retirada de direitos e como pelo aprofundamento da terceirização.

Daniel MatosSão Paulo | @DanielMatos1917

quarta-feira 15 de abril de 2015 | 00:00

No último dia 31 de março houve uma paralisação nacional na Argentina contra o imposto que o governo desconta do salário dos trabalhadores. Dito imposto abate 30% dos rendimentos acima de 15 mil pesos (que no Brasil seria equivalente a 5 mil reais), atingindo cerca de 10 a 15% dos assalariados. Esta paralisação foi convocada por direções sindicais opositoras ao governo sem um programa que responda às demandas da maioria esmagadora dos trabalhadores que recebem menos que 15 mil pesos, sem assembleias na base dos sindicatos e sem um plano de continuidade da luta.

Existem muitas diferenças entre o que ocorre na Argentina e no Brasil, mas também existem alguns pontos de contato que ajudam a refletir sobre as perspectivas da esquerda em nosso país.

Na Argentina, que passa por uma situação econômica menos crítica que o Brasil, o imposto ao salário é uma forma do governo “tomar de volta” aquilo que foi obrigado a conceder através dos aumentos salariais conquistados por inúmeras lutas nos últimos anos. No Brasil, que passa por uma situação econômica mais crítica, o governo, em conjunto com a oposição tucana, vem implementando ataques maiores, como a retirada de direitos previdenciários e trabalhistas e o aumento das terceirizações.

Na Argentina, a burocracia sindical opositora aderiu à paralisação do dia 31, e a burocracia ligada ao governo “liberou” suas bases para participarem da ação. No Brasil, a burocracia opositora da Força Sindical, hoje ligada ao PSDB, está apoiando a nova lei que amplia a terceirização. A direção governista da CUT, por sua vez, para não ficar mal com suas bases, faz parte da convocatória da jornada de luta do dia 15 junto ao MTST, o MST e as organizações da esquerda antigovernista.

Cinismo compartilhado

Apesar dessas diferenças, em qualquer um dos dois países o cinismo das burocracias sindicais não é muito distinto. No país vizinho, já é a quarta paralisação nacional sob o segundo mandato do governo de Cristina, demonstrando a importante disposição de combate da classe operária. Entretanto, essa mesma burocracia, que até pouco tempo atrás era base de sustentação do governo de Cristina, vem convocando essas medidas de mobilização como forma de aliviar a pressão de descontentamento de suas bases e canalizar essa insatisfação em direção a uma ou outra alternativa burguesa frente às eleições que ocorrerão em outubro deste ano. Ou seja, nenhum interesse em verdadeiramente mobilizar a classe trabalhadora em defesa de suas demandas.

Nas terras tupiniquins, apesar da classe trabalhadora vir dando enormes demonstrações de luta nos últimos anos, protagonizando a maior onda de greves desde a década de 80, a CUT não organizou nenhuma medida séria de luta, seja para cercar de solidariedade as greves que resistem às tentativas de ataque ou para colocar de pé um grande movimento nacional capaz de barrar os ajustes implementados pelo governo. Pelo contrário, com todo o cinismo que lhe é característico, convoca medidas isoladas e sem mobilização de massas para cobrir-se pela esquerda com um discurso de “luta”.

A burocracia cutista utiliza seu cinismo para amortecer o choque entre a insatisfação popular e os ataques do governo petista. Sua participação na jornada de luta do próximo dia 15 está a serviço impedir que a mesma adquira um claro caráter de enfrentamento contra o governo do PT. Fazem de tudo para que a jornada não denuncie o governo Dilma e o próprio Lula como responsáveis pelos ataques em curso. Tratam Levy como se esse não fosse um funcionário sob as ordens de Dilma e Lula. Tratam Dilma como se fosse uma pobre vítima do “reacionarismo” do Congresso. Fingem que Dilma não ordenou seu ministro Levy a negociar com o PSDB e o PMDB os termos da lei em tramitação. Escondem que no mesmo dia em que a bancada de parlamentares do PT votou contra a lei de ampliação da terceirização, Dilma atribuiu maiores poderes ao PMDB dentro do governo nomeando o vice-presidente Michel Temer como novo ministro da articulação política; o mesmo PMDB que garantiu a aprovação deste ataque votando junto com os tucanos no Congresso.

Essa operação política tem como objetivo criar uma cortina de fumaça com a qual o PT e a CUT pretendem preservar a si mesmos das medidas mais direitistas de Dilma para não perder suas bases nem comprometer seu desempenho nas eleições municipais de 2016, as quais influenciarão nas próximas presidenciais de 2018, para as quais existe a possibilidade de Lula se candidatar. Buscam esconder que durante os últimos 12 anos de governo do PT, Dilma e Lula foram responsáveis pelo um enorme aumento do trabalho precário no país. Foi nesse período que 90% dos empregos criados pagam de um a dois salários mínimos e 20 milhões de brasileiros por ano sofreram com a rotatividade do trabalho.

Golpeando juntos e marchando separados na Argentina

A esquerda trotskista na argentina começa a recuperar uma das tradições fundamentais do movimento operário revolucionário do século XX, conhecida como tática de frente única operária. Nesta, a esquerda revolucionária faz uma unidade na ação com as direções reformistas do movimento operário para resistir aos ataques do capital, dentro da qual luta por um programa e uma estratégia independente da burocracia para levar a luta ao triunfo e fortalecer as perspectivas revolucionárias em detrimento da estratégica de conciliação com os patrões.

Na paralisação nacional de 31 de março no país vizinha, a esquerda trotskista foi uma ala claramente diferenciada da burocracia sindical. Por um lado, a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT) – uma frente eleitoral entre as principais organizações da esquerda que obteve de 5 a 10% dos votos nas últimas eleições e possui deputados federais, estaduais e vereadores – deu projeção superestrutural nos meios de comunicação de massa e no parlamento à luta dos trabalhadores. Por outro lado, a presença dos militantes operários do Partido de Trabalhadores Socialistas (PTS) em parte relevante das principais fábricas e serviços estratégicos do país cumpriu um papel chave para mobilizar um setor minoritário, mas ativo da classe trabalhadora que através de métodos combativos de luta fez aparecer uma voz independente da burocracia sindical em meio à paralisação.

Essa combinação entre projeção superestrutural da FIT e militância operária do PTS permitiu que a esquerda protagonizasse ações que na prática golpeavam o governo junto com a burocracia sindical na luta contra o imposto ao salário, mas marchando separado, agitando seu programa e sua estratégia. Nos piquetes operários que cortaram as principais rodovias do país com o apoio dos estudantes e na intervenção dos dirigentes operários do PTS e dos parlamentares da FIT nos grandes meios de comunicação, o programa de defesa dos trabalhadores mais precário do país, o método das assembleias de base e a batalha pela continuidade das medidas de luta apareceram como uma voz minoritária da realidade política nacional.

Essa localização assenta as bases para que a esquerda trotskista emerja como uma força política decisiva ligada aos próximos ascensos do movimento operário argentino.

A batalha por golpear junto e marchar separado no Brasil

No Brasil, nem o PSOL nem o PSTU se propõem a cumprir o mesmo papel que a esquerda trotskista na Argentina. O PSOL se nega a colocar seu peso parlamentar a serviço das lutas operárias, e quando se propõe a uma unidade na ação com a burocracia sindical, como ocorrerá no dia 15/04, se nega a dar a batalha necessária para que se expresse para as massas um programa e uma estratégia independente da burocracia. O PSTU, da mesma forma, se por um lado aceita a unidade na ação com a CUT para o dia 15, por outro lado se nega a agitar um programa e uma estratégia independente da burocracia; se nega a abrir o caminho para uma política operária independente desmascarando o cinismo desses dirigentes sindicais vendidos na base dos sindicatos que dirige.

Os militantes do Movimento Revolucionário dos Trabalhadores (MRT) em São Paulo buscaram organizar trabalhadores da USP, metroviários, professores, carteiros, bancários, operários industriais e estudantes para participarem ativamente do dia nacional de luta marcado para 15/04, batalhando por assembleias de base e por um programa independente da burocracia sindical para enfrentar os ataques e dar continuidade para a luta. O Sindicato dos trabalhadores é um dos poucos sindicatos que organizaram uma paralisação de suas bases como parte da jornada de luta. Essa batalha vai se expressar no bloco antigovernista formado pela Conlutas, o PSTU e correntes do PSOL no ato que ocorrerá ao final da tarde em São Paulo, a partir do qual o qual o MRT fará uma agitação de massas denunciando a responsabilidade de Dilma e Lula na retirada de direitos e no aumento da terceirização, e defendendo um plano de luta independente da burocracia sindical para barrar os ataques, no qual os trabalhadores assumam o protagonismo da batalha a partir de sua organização de base nos locais de trabalho.

O Esquerda Diário, como seção brasileira de um diário digital latino-americano, buscará expressar em todo o país e para a esquerda latino-americana essa pequena mas importante batalha que se levará à cabo em São Paulo.




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