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As manifestações em Cuba e a defesa da revolução

Facundo Aguirre

As manifestações em Cuba e a defesa da revolução

Facundo Aguirre

Em Cuba, as manifestações populares que acontecem devido ao agravamento dos problemas sociais por conta da pandemia de COVID-19 e a direita pró-imperialista tenta se aproveitar delas. A gravidade da situação suscita um debate sobre como lutar contra o bloqueio e o imperialismo em defesa das conquistas da revolução de 1959.

As manifestações populares em Cuba são o produto das enormes adversidades sociais agravadas pela pandemia. O criminoso bloqueio imperialista é um agravante da situação, impedindo Cuba de ter acesso a suprimentos básicos para a produção de alimentos e remédios, além de petróleo, causando escassez.

No centro dessas manifestações estão as forças sociais nas quais o Castrismo se apoia e tendências hostis criadas pelas políticas restauracionistas realizadas nos últimos 25 anos. O próprio presidente de Cuba, Miguel Diaz-Canel, deve reconhecer a realidade do movimento social ao afirmar que nas mobilizações “nem todos são contra-revolucionários. Há uma minoria de contra-revolucionários que tentou liderar essas ações, mas aqui temos gente, revolucionária ou não, insatisfeita, com confusão, mal-entendidos, com falta de informação e também com vontade de expressar uma situação particular ”.

Sobre o descontentamento popular, se afirma a oposição pró-imperialista e a direita continental para provocar o enfraquecimento do regime.

O bloqueio criminoso

O bloqueio imperialista, que existe há 60 anos, é um fator fundamental para explicar muitas das adversidades do povo cubano. Joe Biden deu continuidade à política de Donald Trump em relação à ilha, que reforçou o bloqueio e as sanções econômicas, pondo fim à política de negociações bilaterais que levou Barack Obama a visitar Cuba em março de 2016. Naquela época, o governo cubano não levantou o fim do bloqueio como condição indispensável para o início das negociações. Em vez disso, ele apresentou como uma vitória a mudança na política externa de Washington, mesmo que o bloqueio criminoso fosse mantido. Esqueceram-se do princípio levantado por Ernesto Che Guevara de que “não se pode confiar no imperialismo, nem um pouco assim, nada”.

A hipocrisia da direita e o imperialismo

A palavra "democracia" nos lábios dos representantes do imperialismo e da direita “cipaya” é a expressão do mais podre cinismo e hipocrisia. Foi o próprio imperialismo que, para frear o impacto da Revolução Cubana nas décadas de 60 e 70 do século XX, promoveu golpes militares e ditaduras genocidas em nome da Doutrina de Segurança Nacional.

O mesmo pode ser dito da direita “cipaya” e atrasada latinoamericana. Para citar apenas um exemplo, o lambedor de botas Mauricio Macri (Ex-presidente da Argentina, que foi enfrentado pelo candidato da FIT-U, Nicolás Del Caño, na disputa eleitoral de 2019) pediu “solidariedade” a Cuba dizendo que “quero apoiar o povo cubano que saiu às ruas para exigir o fim da ditadura e melhorar urgentemente suas condições de vida…

Mauricio Macri fala em melhorar as condições de vida do cubano quando foi ele quem, com a dívida, entregou a Argentina ao FMI e ao imperialismo, condenando a população mais pobre à miséria. Ele fala de democracia quando acaba de ser denunciado por enviar armas e suprimentos para reprimir o povo boliviano, para governo golpista de Añez e os militares que cometeram crimes contra o povo em El Alto e Senkata.

O objetivo do imperialismo e da direita não é outro senão provocar uma contrarrevolução que devolva Cuba à sua condição de semi-colônia dos Estados Unidos e permita à oligarquia expulsa pela revolução de 1959 retomar as propriedades expropriadas.

Burocracia e repressão

As manifestações populares não podem ser explicadas apenas pelas agruras do bloqueio, mas as políticas pró-capitalistas da burocracia também devem ser postas em evidência. A brutal desvalorização da moeda e a liberalização de áreas inteiras de atividades econômicas para a atividade privada são as medidas mais recentes nesse sentido, estimulando ainda mais a desigualdade social e a crescente agitação.

Há pouco mais de duas décadas, a burocracia Castrista vem promovendo uma política de abertura econômica de caráter restauracionista das relações capitalistas que tem levado ao desenvolvimento de forças internas hostis à revolução, principalmente nas próprias fileiras da própria burocracia que controla setores mais lucrativos da economia. São essas forças sociais de pequenos proprietários de terras sobre as quais os vermes pró-imperialista buscam influir para se afirmar nas manifestações. Ao mesmo tempo, o imperialismo espera influenciar os burocratas ricos para quebrar a unidade do regime.

A resposta repressiva da burocracia Castrista não visa combater as ameaças contra a revolução, mas usa a direita pró-imperialista, que o próprio Diaz-Canel define como uma minoria, como uma desculpa para defender seus privilégios de casta e o monopólio do poder por um partido único: o Partido Comunista Cubano (PCC), que sufoca as liberdades do povo cubano.

Defesa da revolução ou defesa da burocracia

Os defensores internacionais da burocracia castrista, como o kirchnerismo na Argentina ou os resquícios do stalinismo, consideram que é preciso limitar-se a exigir o fim do bloqueio e denunciar as mobilizações “gusanas”. Para esses defensores do regime, qualquer crítica à burocracia, principalmente de esquerda, é considerada funcional ao imperialismo.

Lutar contra as forças pró-imperialistas apoiando repressão popular e a política pró-capitalista do PCC é um erro que não defende a revolução. A desqualificação da crítica pela esquerda é uma reiteração da chantagem stalinista para silenciar todo o oposicionismo no campo da defesa da revolução. No passado, o silêncio diante das ditaduras stalinistas do Leste Europeu, da URSS e da China, não impediu sua queda em 1989. O que fez foi impedir que a classe trabalhadora tivesse um ponto de apoio para se opor à sua própria política contra um burocracia que, longe de defender as bases materiais da expropriação da burguesia e dos latifundiários, foi para o campo da restauração capitalista.

Os defensores do Castrismo silenciam ao mesmo tempo que em Cuba as forças restauracionistas têm aliados na Igreja Católica e nas diversas religiões que, desde a visita do Papa João Paulo II, em 1997, têm existência legal, enquanto as forças socialistas ou anti-imperialistas e partidos que se posicionam no terreno de defesa da revolução são proibidos. Mas além disso, esses partidários do regime que lançam injúrias contra as críticas de esquerda, mantêm a boca fechada diante da diplomacia progressista que se limita a criticar o bloqueio, mas não enviou nenhum navio carregado de remédios, alimentos ou óleo para ajudar o povo cubano nessas horas dramáticas.

O pecado original da revolução

O regime burocrático tem sua origem no caráter excepcional da Revolução Cubana onde uma direção pequeno-burguesa e guerrilheira como a do M26, chegou ao poder empurrada pelas massas armadas e submetida à dupla pressão destas e do imperialismo, o que produziu um revolução de contragolpe que expropria a burguesia e os latifundiários, como definido por Che Guevara. Isso deu origem a um estado operário deformado onde o poder, em vez de ser exercido pelas massas auto-organizadas, foi assumido por uma burocracia que defende suas bases materiais, na medida em que isso implicava a defesa de seus interesses e privilégios de casta.

A asfixia de todas as formas de auto-organização e democracia para as massas é uma das características do regime que acabará por se impor sob a influência dos stalinistas e da União Soviética na Revolução Cubana. Um exemplo é o famoso debate econômico sobre a industrialização que coloca Che Guevara contra os stalinistas cubanos.

O debate ocorreu sem a menor participação das massas em algo tão fundamental como a política econômica. Sem criar instituições revolucionárias para que os próprios trabalhadores decidam o caminho a seguir. Guevara foi derrotado porque não exigia a democracia operária camponesa e se situava na defesa do partido único.

A vitória da linha stalinista fez com que Cuba se tornasse um país dependente da monocultura do açúcar, que era trocado por petróleo e produtos industriais para a URSS. Desta forma, a revolução nunca conseguiu tirar Cuba de seu atraso estrutural, que é uma das causas que explicam a fragilidade da economia cubana hoje.

Socialismo em um só país

A aliança com o Kremlin implicou o apoio da burocracia Castrista ao sangrento esmagamento pelo Exército Vermelho da Primavera de Praga em 1968, apontando como uma revolta contra-revolucionária, para o que foi uma revolução política dos trabalhadores e jovens da Tchecoslováquia, a quem eles democraticamente se organizaram para regenerar o estado operário.

Mas também significou para a Revolução Cubana isolar-se dentro dos limites da ilha e abandonar qualquer perspectiva de promoção de revoluções sociais na América Latina, seguindo a (impossível) lógica de que existe socialismo em um único país. Assim, Fidel Castro alinhou-se com a experiência do caminho pacífico do socialismo e da conciliação de classes da Unidade Popular no Chile, e durante os primeiros anos da revolução sandinista fez um apelo para que a Nicarágua não fosse uma nova Cuba que expropriasse a burguesia e os proprietários.

Após o chamado “período especial” do início dos anos 1990, com as políticas restauracionistas já em vigor, o Castrismo alinhou-se ao Chavismo e aos governos progressistas do início do século 21, convocando os trabalhadores e camponeses a se reconciliarem com suas próprias burguesias. e renunciar a todas as tentativas de transformação por meios revolucionários. Muito longe de Che Guevara que, como conclusão da Revolução Cubana, argumentou que as burguesias nacionais eram totalmente submissas ao imperialismo e que a alternativa era uma revolução socialista ou uma caricatura de uma revolução.

Defender as conquistas da revolução de 1959

Em Cuba, os trabalhadores e camponeses precisam propor sua própria saída para derrotar o imperialismo e acabar com o regime burocrático e suas políticas restauracionistas que os mergulham na miséria. Apoiar a repressão ao povo mobilizado é dar a sua liderança às forças restauracionistas pró-imperialistas, que erguem demagogicamente as bandeiras da democracia para regressar ao capitalismo e ao antigo estatuto de Cuba semicolonial.

Bandeiras democráticas não devem ser entregues ao imperialismo e seus agentes, mas, pelo contrário, devem ser combatidas exigindo o fim da repressão, a liberdade dos detidos, fundamentalmente militantes de esquerda, e o aumento da liberdade política e organizacional de massas.

Devemos lutar pela legalização dos partidos de esquerda antiimperialistas e das forças que defendem as conquistas da revolução. Trata-se de levantar as grandes massas contra o bloqueio criminoso, as políticas restauracionistas e contra os privilégios da burocracia. Orientar a luta pela defesa das conquistas que restaram da revolução de 1959, como o direito à moradia, à saúde gratuita e de qualidade, à educação; defender o monopólio do comércio exterior e propor um plano econômico abrangente decidido por trabalhadores e camponeses auto-organizados.

Trata-se de opor uma perspectiva anti-capitalista, anti-imperialista e anti-burocrática de revolução política e social que estabelece o governo dos conselhos de trabalhadores, camponeses e soldados, às forças da democracia pró-imperialista e da ditadura burocrática. A regeneração da revolução cubana será um alento libertador para as massas oprimidas da América Latina.


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