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ELEIÇÕES 2018 | As afinidades eletivas de Bolsonaro com a cúpula do Exército

O pensamento colonialista e escravista da cúpula do exercito fez o alto comando gravitar para a candidatura do ex-capitão de forma natural. Mas nem tudo são flores nesse casamento.

quinta-feira 25 de outubro de 2018 | Edição do dia

Não é novidade que a alta cúpula do exercito tinha restrições à candidatura de Bolsonaro, que foram sendo vencidas aos poucos. As preocupações incluíam a preocupação com a politização das forças armadas, com o estilo incontrolável e fanfarrão de Bolsonaro e como um futuro governo identificado com os militares no caso de fracasso pode prejudicar a boa imagem que o exército tem hoje, sendo a instituição mais respeitada segundo as últimas pesquisas.

Quando o comandante do exército, General Villas Boas, afirmou que a candidatura Bolsonaro venceu as resistência dos militares e tem grande apoio na caserna, fez questão de frisar a independência do exercito em relação a essa candidatura. Que Bolsonaro, nisso desautorizando Mourão, não é “um dos nossos” mas apenas um ex militar que já está há muito tempo na política, sendo apenas um político ainda que identificado com as demandas dos militares.

Que os incautos e ingênuos acreditem nessa frase e vejam uma suposta neutralidade do Alto Comando. A verdade é que cúpula do exercito está apoiando decididamente a candidatura de Bolsonaro e as afinidades de pensamento são escabrosas, e parecem vir diretamente das elites do século XIX. Esse apoio no entanto não pode ser entendido como uma simples adesão.

Já de cara soa inusitado que os generais que compõe o grupo que traça as estratégias de um futuro governo Bolsonaro se vejam como subordinados do ex capitão. O grupo é formado por três generais de 4 estrelas, pelo menos um general de três estrelas, dois brigadeiros da reserva e outros oficiais das forças armadas. Mourão que é um dos generais de quatro estrelas com mais relações com os militares da ativa não integra formalmente o grupo.

Oswaldo Ferreira teria sido o primeiro quatro estrelas a se integrar na campanha, e depois atraiu o general Augusto Heleno, primeiro comandante das tropas da Onu da ocupação do Haiti. Oswaldo Ferreira é cotado para o ministro de infraestrutura (que seria criado com a fusão das pastas de transporte, Portos, Aviação Civil e Minas e Energia, inimigo de qualquer controle ambiental e saudoso da época da ditadura quando não havia “nem Ibama nem Ministério Público”, defende reativar as obras de Angra 3 e é tido como devoto do desenvolvimentismo de Geisel. Já Heleno saiu da ativa em meio às polemicas quando criticou a demarcação de terras do governo Dilma e se especializou no Haiti em invasões a favelas. Ambos os generais são muito próximos e como todo o Alto Comando compartilham a visão de uma democracia tutelada, onde os militares tenham a prerrogativa de intervir para afastar o caos. Nesse quesito quem mais tem tratado de hipóteses de golpe é o vice de Bolsonaro, Mourão, que foi apara a reserva em meio a declarações e ameaças golpistas, mas mesmo assim foi efusivamente elogiado por Villas Boas.

O general Alessio Souto é o mais cotado para o minuisterio de ciência e tecnologia que seria unificado com o ministério da educação. O general defende ideias avançadas para as escolas. Uma delas é ensinar o criacionismo junto com a teoria da evolução de Darwin. Pretende também alterar o currículo escolar e banir os livros que falam de “golpe militar”, dando preferencia para aqueles que tratam o golpe como movimento contra o comunismo. Seu foco e uma das prioridades seria combater o que enxergam como viés de esquerda do currículo escolar. Querem a volta da famigerada disciplina educação moral e ética. Com ideias assim podemos esperar que maus dias aguardam professores e estudantes de escolas e universidades.

As outras ideias comuns ao grupo são a de tipificar todo tipo de invasão de propriedade como ato terrorista, o que colocaria na mira da lei antiterrorista manifestações de MST, do MTST, do movimento estudantil e do movimento operário, que tem como parte dos seus métodos históricos de lutas as ocupações de terras, de predios, reitorias e fabricas. Isso, num momento em que os organismos de espionagem estarão nas mãos de uma instituição governamental, a Força Tarefa de Inteligência, a cargo de Sérgio Etchegoyen. Também é um patrimônio comum do grupo a ideia de que os policiais devem ter liberdade para matar e impunidade garantida.

O ódio ao povo e aos pobres, aos índios, aos negros, vistos como nada mais do que burros de carga que devem trabalhar sem reclamar, são um patrimônio comum dos militares e de Bolsonaro. Seu pensamento elitista, que supõe que o povo e a classe trabalhadora são incapazes de se autogovernar e necessitam da mão forte do exercito para evitar o que identificam como a dissolução da ordem, deita raízes nas elites coloniais e escravistas. A adesão geopolítica aos EUA e a aversão à China e a Russia, segue a tradição de um ministro da ditadura Jutahy Magalhaes que ficou famoso com a frase “o que é bom para os EUA é bom para o Brasil”.

As afirmações da família Bolsonaro, e das alas mais estridentes que apoiam o ex capitão, porém, não são do agrado da cúpula do exercito. Até mesmo Mourão, tido como um general boca aberta demais, não vai tão longe como os Bolsonaro. Os militares se incomodam com a defesa tão aberta do “excludente de ilicitude” que faz Bolsonaro por que dizem, pode dar o entendimento de que os militares terão carta branca para matar e impunidade garantida. Eles querem impunidade garantida, mas não pode parecer, tudo tem que ser feito às sombras. Também não é do agrado do Alto Comando afirmações como a do filho de Bolsonaro ou do coronel da reserva contra o STF, de cunho descaradamente golpista. Preferem preservar a capacidade de intervenção do exercito para momentos de maior agudização da luta de classes e querem, quando for necessário uma maior intervenção do exercito, que está possa estar protegida com o manto da legalidade.

Em matéria da revista Exame, ressaltam como os generais do grupo de elaboração programática se comportam de forma diferente de Bolsonaro, sendo corteses e formais – a melhor maneira de esconder a brutalidade anti popular do seu projeto, que o forma tosca de Bolsonaro e até mesmo de um Mourão, escancaram. Os generais estão ali, ainda que se coloquem apenas como técnicos a serviço do comandante (que seria Bolsonaro), para “moderar o candidato intempestivo”. Entre os generais contidos e “moderados” na aplicação do seu projeto colonialista e autoritário e o popular e tresloucado capitão reformado existe uma queda de braço que já veio a tona durante a campanha e deve ressaltar ainda mais durante o provável governo Bolsonaro.

Há que lembrar que o traço mais marcante do regime político é o autoritarismo judicial, avalizado pelas Forças Armadas - com quem o órgão máximo da justiça burguesa tem relações privilegiadas, na medida em que o principal assessor do presidente do STF é um general da reserva, Azevedo e Silva (esse, por sua vez, que tem ótimas relações com Oswaldo Ferreira, Mourão e Augusto Heleno).

Até onde estas diferenças serão contidas no marco de um mesmo projeto – que tem contradições também entre a política ultra privatista do núcleo econômico de Paulo Guedes e os militares mais contidos nesse quesito – e até que ponto essas diferenças abrirão espaço para divergências maiores não só entre Bolsonaro e os militares mas também dentro do Alto Comando do exercito, ainda veremos. O que podemos ter certeza é que cada vez mais as tensões politicas vão se infiltrando na caserna que dificilmente vai deixar de se identificar e ser identificada com os possíveis fracassos de um governo Bolsonaro.




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