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Acordei

Diego Santos

Detalhe de ilustração no relatório Negro Trauma (Elemento Suspeito). A ilustração é de Miguel Morgado. Crédito: reprodução/Cesec

Acordei

Diego Santos

Publicamos nesta edição a crônica de Diego Santos, estudante do curso de Psicologia na UFMG.

O alarme me acordou num dia banal, com o vento frio invadindo meu quarto e animando o desânimo que, há tempos, fez brigada nesse mortal. Eu não tô a fim de sair, então me enrolo na coberta e rolo de um lado pro outro com uma certeza: não vale a pena encarar esse sistema de tamanha grandeza. Eu preciso mesmo é de um reels engraçadinho, um gato fofo recebendo carinho ou só de alguém jogando de ladinho.

Mas o que eu encontro é um vídeo, infelizmente, nada incomum: a polícia se “excedendo” numa operação, claro, lá no morrão. Seguindo, óbvio, aquele mesmo padrão: matando um jovem negro com uma bala perdida que perfura sempre a pele que carrega consigo os mais de 350 anos de escravidão.

E olha só que coincidência: é a mesma pele marcada pela chibata da precarização; marcada pela cor daqueles e daquelas que lutam diariamente pelo pão fujão que insiste em olhar pra mesa dos trabalhadores e falar não. Aliás, pensando aqui, será que o pão que é fujão ou tem algum burguês por aí passando a mão?

Ah, mas, sinceramente, não vou pensar muito nisso. É só dor de cabeça e, qualquer coisa, deixa com o estado, afinal, não é esse o seu compromisso? Tipo da vez que encarceraram em massa pouco depois de vermos o massacre do Carandiru; olha só se o estado não é um baita dum gabiru! Melhor ainda foi quando respondeu à desigualdade salarial entre negras e brancos com precarização. Esse tal de estado é um brincalhão!

Inclusive agora, com eles protegendo os povos originários com o Marco Temporal. Olha como são hilários! Ou como tão solucionando a disparidade racial na educação com o Novo Ensino Médio… que avacalhação. Tá, talvez esses não sejam bons exemplos, mas, como que o estado respondeu à violência policial? Mandando mais verba! Não foi genial?

Quer saber? Eles não tão nem aí pra gente. Enquanto os lucros se mantiverem, os empresários apontarão o “mi-mi-mi” pro trabalhador sofrer o “dó-ré-fá-sol-lá-si”. No fim, ficar na cama me parece mais desconfortável do que levantar no frio. Sinto mais um alarme tocar, só que dessa vez parece vir daqui de dentro, e é porque tá na hora de lutar.

Lutar pela viúva daquele que morreu por portar um guarda-chuva. Lutar por aqueles que são ameaçados diariamente pelo burguês que só quer plantar semente. Lutar por aqueles que partiram pro caixão por causa de policial fazendo operação. Lutar por aqueles que sonham com uma boa educação. Por fim, lutar ao lado dos trabalhadores pra, finalmente, jogar na lata de lixo da história, o causador das nossas dores


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Diego Santos

Estudante de Psicologia na UFMG
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