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ESPANHA
PODEMOS: a crise da “máquina institucional”
Diego Lotito
Madri | @diegolotito

A interna em Madrid, as disputas entre Errejón e Iglesias, a relação com o PSOE e a estratégia a seguir. A crise que abala a “máquina institucional”

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Em um artigo publicado segunda feira passada em El Diario.es, Andrés Gil tentava resumir os contornos simbólicos mais visíveis da crise interna em Podemos: “O punho ou o V de vitória, a pedra ou a tesoura, o fio roxo ou a pós-modernidade, a camisa suada ou a jaqueta; o discurso mais duro ou o discurso mais amável. Iglesias ou Errejón. ”

Uma leitura dicotômica que não nos convence – já explicaremos o porquê -, mas que dá conta, ao menos de um ponto de vista simbólico, do enfrentamento que transcorre na cúpula do Podemos. Posições que se visibilizaram com impacto midiático em uma troca de tweets entre o nº1 e o nº 2 de Podemos, mas que vem de antes. O balanço dos resultados eleitorais do 26J, a interna aberta em Madrid - com “traições” e punhaladas incluídas-, as crises em várias comunidades autônomas, a relação conflitiva com IU-Unidos Podemos, a cinza atuação institucional, a organização interna e os espaços de poder, etc.

Posições e alinhamentos que, no marco da crise política, hoje se concentram na possibilidade de terceiras eleições e qual deve ser a relação com o PSOE. A possibilidade de apoiar uma posse do PSOE, a abstenção sem mais, a integração do PSOE às “Prefeituras pela mudança” (uma orientação que já implementou Ada Colau, prefeita de Barcelona) ou a crise dos acordos com os socialistas como em Castilla-La Mancha ou Aragão, são alguns dos debates que transcorrem portas adentro.

A estratégia do “medo” ou a “estratégia da sedução”?

Nesses termos se instaurou o debate na arena midiática, com Iñigo Errejón como defensor de um PSOE 2.0 que “seduza” aos votantes mais moderados, frente a um Pablo Iglesias que retorna aos gestos esquerdistas, em defesa da confluência com IU e a pose “intransigente com os poderosos”.

A realidade é que, tanto um como outro, apesar de suas matrizes, encabeçaram o “giro a centralidade” de Podemos – o famoso “nem de esquerda nem de direita”-, abandonaram toda referência a um programa questionador do regime, formataram o partido em uma “máquina eleitoral”, buscaram pactos com o PSOE e saudaram a capitulação de Syriza ante a Troika, para marcar alguns feitos dos últimos anos.
Ainda assim, as diferenças na tática a seguir e o discurso mais conveniente para o próximo período existem. As conclusões as quais se chegaram nas altas esferas podemistas da perda de um milhão de votos nas últimas eleições foram diferentes e abriram espaço para a guerra interna.

Para os errejonistas, a crise da “hipótese Podemos” se conjuraria levando até o final a trajetória socialdemocrata do último ano, se aproximando ao PSOE sem contrapartidas e mimetizando seu discurso com aquele para “seduzir” seus eleitores. No fim das contas, para eles, a “confluência” e a aproximação ao IU, demonstrou seu fracasso no 26J.

“Temos que oferecer garantias e certezas e nosso trabalho nas instituições oferece garantias e certezas porque a grande maioria dos cidadãos confiam na ordem e nas instituições”. Essas foram as palavras de Errejón no seu discurso de abertura da Universidade de Podemos na Complutense (fórum de debate e formação realizado pelo partido). Podemos deve aprofundar o abismo que vem levando nos últimos meses: de ser uma “máquina eleitoral” a se consolidar como “maquina institucional”.

Segundo Errejon o dilema de Podemos é optar entre ser “força hegemônica ou força de resistência”. Ou seja, “uma força que se opõem, que protesta e que não chegue seu momento”, de resistência, ou uma força hegemônica, em contraste, que “toma a situação em que vive, assume que a transformação não é fazer tabula rasa”.

Outra curiosa interpretação do conceito de hegemonia, tão caro ao pensamento dos marxistas russos da Segunda e da Terceira Internacional Comunista, de cujo progresso Antonio Gramsci se familiarizou com o conceito e o aplicou posteriormente a suas reflexões teórico-políticas.

Entretanto, para Lenin, Trotsky, e o próprio Gramsci, a ideia de hegemonia estava associada ao problema de como a classe operária se transformava em classe hegemônica e que alianças estabelecia com outros grupos explorados para a conquista do poder político, não à justificação de uma aliança com os social-liberais para “oferecer garantias e certezas” para preservar “a ordem e as instituições”.

Ante esta deriva – que tampouco é tão extravagante, apenas a conclusão lógica da orientação do Podemos nos últimos anos-, Pablo Iglesias busca pôr um freio e voltar a se localizar no campo da esquerda reformista, evitando perder todo seu espaço à esquerda. Ou pelo menos isso pode interpretar-se de suas últimas declarações públicas.

No encerramento da Universidade de Podemos expressou-se claramente essa orientação: “Minha sensação depois daquela campanha”, a do dia 26J, “é que perdemos credibilidade quando tratamos de nos apresentarmos como moderados nas formas”.

Na Europa triunfaram os discursos beligerantes e destituintes. São os que estão abrindo fissuras no sistema. São fortes, são duros, são muito mais duros que nós”, acrescentou, consciente de um fato evidente faz tempo: a extrema direita “antissistema”, como a denominou em uma oportunidade Perry Anderson, é muito mais radical que formações como Podemos ou o Syriza.

Nesse propósito de retomar a radicalidade, Iglesias também polemizou com Errejón sobre a relação entre a intervenção e os movimentos sociais: “Sobre se os movimentos sociais devem ser espaços de apoio ao institucional, ou se os espaços institucionais devem ser um instrumento político de mobilização social e popular, eu opto pelo segundo”, disse no fechamento de sua Escola.

Se a estratégia de Errejon é um movimento para acelerar a dissolução de todo vislumbre de identidade de esquerda em Podemos e consolidar sua normalização como um novo jogador do regime político – trajetória que até agora vinham levando adiante entre ambos de forma exitosa-, Iglesias encara um giro tático para pôr freio a queda e recuperar terreno perdido no campo da esquerda.

Mas isso não implica tampouco uma mudança de estratégia para dar “medo aos poderosos”, que nunca passou de um recurso retórico em Podemos, para além das ilusões que despertou em suas origens.

Até a poucos meses Iglesias defendia a assimilação completa de Podemos à política institucional burguesa com uma frase antológica: “Nós aprendemos em Madrid e Valencia que as coisas se transformam a partir das instituições, essa estupidez que dizíamos quando éramos de extrema esquerda de que as coisas se transformam nas ruas e não nas instituições é mentira”.

O que mudou entre essas declarações e hoje é que as lutas de poder internas em Podemos se intensificaram e, para Iglesias, a hegemonia não é mais que a “luta entre chefes pela melhor narrativa”. Antes, para sustentar uma regeneração democrática nos marcos do estado burguês, “a última esperança dos povos”, como lhe disse uma vez o Chantal Mouffe. Agora, para o mesmo objetivo, mas antes preservando seu poder como chefe de Podemos.

Um apêndice a mais do regime

En un artículo publicado hace poco en Diagonal, Aleix Romero señalaba la contradicción entre la magnitud de la crisis política y la falta de intervención de los movimientos sociales y los sindicatos, en un momento donde las “ilusiones” en la vía institucional están cayendo, ante la experiencia frustrante del último año.

“El mutismo de los agentes sociales –especialmente de los dos sindicatos mayoritarios, que no parecen estar por la labor de plantear conflicto– está resultando tanto más clamoroso en cuanto que vamos percibiendo mejor el desgaste de la vía institucional para el cambio.”

Em um artigo publicado há pouco em Diagonal, Aleix Romero assinalava a contradição entre a magnitude da crise política e a falta de intervenção dos movimentos sociais e os sindicatos, em um momento onde as “ilusões” na via institucional estão caindo, diante a experiência frustrante do último ano.

“O mutismo dos agentes sociais- especialmente os dos sindicatos majoritários, que não parecem estar dispostos a se colocar na luta- fica ainda mais evidente, à medida que vamos percebendo melhor o desgaste da via institucional para a superação”.

A tática de Podemos foi “ uma estratégia kamikaze”, assinala Romero, e conclui que “ a crise política é passageira porque instituições seguem funcionando; a crise de Podemos, em contraste, se aprofunda numa crise existencial, pois de instrumento de mudança passa a ser mais outro apêndice do regime”. Nada mais, nada a menos do que isso.

Como dissemos tantas vezes, a crise de Podemos é o subproduto das misérias próprias de uma organização tributária da “videopolítica”, uma estratégia socialdemocrata e sem nenhuma inserção orgânica na classe trabalhadora e nos setores populares.

Diante do murchar das ilusões, uma pergunta longa para terminar: começarão a surgir setores que, havendo feito um balanço de dois anos de podemismo, se recoloquem a necessidade de que surja uma nova hipótese de esquerda, que volte a pôr no centro a luta de classe e não as instituições da democracia liberal? A isso apostamos, porque não há tempo a perder.

Tradução: Yuri Marcolino

 
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