Na foto, trabalhadores da fazenda
Os trabalhadores saíram de suas cidades no interior do Rio Grande do Sul com a promessa de emprego na serra catarinense. Eles colhiam maçãs em uma fazenda da região. Tiveram seus documentos retidos pelo fazendeiro, que lhes mantinha em alojamentos precários e sem higiene, sem receber salários há pelo menos dois meses. Eles não conseguiam chegar nem até a cidade mais próxima, São Joaquim, a 40km da fazenda. Também não tinham nenhum meio de transporte disponível e não tinham como retornar para suas cidades.
Em seu parecer em setembro de 2016, a juíza caracteriza os trabalhadores como "esse tipo de mão de obra resgatada pelos auditores fiscais do trabalho que, na realidade, causa dano à sociedade." Ela acusa os trabalhadores de gastarem todo seu dinheiro com drogas e álcool e não retornarem ao trabalho, se tornando um perigo à sociedade. Por isso a juíza defendeu a retenção da carteira de trabalho deles e anulou as infrações registradas pelos auditores contra o empregador.
Hérika ainda reprimiu os auditores responsáveis por retirar os trabalhadores dessa situação, dizendo que permitiram que eles retornassem aos vícios, bebidas, drogas, crack e crime, com "o Estado passando a mão na cabeça." Ela pediu que a Polícia Federal investigue os auditores fiscais, que supostamente teriam forjado os fatos para caracterizar trabalho escravo.
Não é necessário manipular os fatos para comprovar a existência de trabalho escravo em uma fazenda onde os trabalhadores não conseguem nem chegar nas cidades próximas. Sem dinheiro, sem documentos, amontoados em alojamentos sujos e mal estruturados, em uma das regiões mais frias do país. Distantes de suas cidades, não tinham como retornar nem como buscar outro emprego.
A auditora fiscal que coordenou a ação, Liliane Rezende, diz que não teve oportunidade de defesa pois não foi ouvida pela juíza. Ela recorreu ao Conselho Nacional de Justiça e à Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), vinculada à Secretaria de Direitos Humanos do Ministério da Justiça. O dono da fazenda é Henrique Córdova, que foi governador do estado em 1988 e deputado entre 1982 e 1983 pelo Partido Democrático Social, criado a partir de ex-membros da Arena durante a ditadura militar.
A absurda decisão da juíza não só favorece o fazendeiro responsável por manter em situação de escravidão os trabalhadores, mas responsabiliza os próprios trabalhadores pela ação do empregador. Os acusa de "gastar todo o dinheiro em álcool e drogas," sendo que os trabalhadores sequer recebiam salário há meses. Segundo reportagem da época eles foram retirados de suas cidades sob promessa de receber R$15 mil por caixa de fruta colhida, porém ao chegar ao local foram informados de que receberiam um salário mínimo, e nem isso lhes foi pago em dia.
A decisão da juíza abre precedentes para que mais latifundiários seja inocentados frente à situações de trabalho escravo. Em 2016, seis anos depois do caso, o processo culpa os trabalhadores, reprime os auditores responsáveis por libertá-los e inocenta quem mais se beneficiou com o trabalho escravo, como se tivesse feito um favor à sociedade mantendo as pessoas em condições degradantes. Se o PL 3842/12, que modifica a definição de trabalho escravo, chegar a ser aprovado, essas práticas se difundirão cada vez mais, com o aval da justiça burguesa desde já.
Algumas informações extraídas dessa matéria da Carta Capital e outras fontes.
Abaixo, fotos do local
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