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SEXUALIDADE
Cena de sexo gay é exibida em novela da Rede Globo
Adriano Favarin
Membro do Conselho Diretor de Base do Sintusp

A noite de 12/07/16 entrará pra história da teledramaturgia brasileira como o dia da primeira exibição de sexo gay em rede aberta. A telenovela das 23horas da Rede Globo, “Liberdade, liberdade” foi palco do protagonismo de Caio Blat (como fidalgo André) e Ricardo Pereira (como Coronel Tolentino) nesta sensível encenação.

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A trama se passa no início do século XIX, quando o Brasil ainda era colônia portuguesa e o Rio de Janeiro tinha recém se tornado sede do reino de Portugal. Os personagens são dois homens solitários que vivem seus próprios conflitos e desenvolvem, desde o início, uma relação de companheirismo. Com o tempo, a atração começa a existir e a relação entre eles vai oscilando entre picos de carinho e de brutalidade.

Vai ficando evidente que essa brutalidade é um escudo para resistir à atração que um sente pelo outro. Não é por menos, afinal, na época, esse tipo de relação era considerado crime de sodomia e passível de morte. O medo (fobia) do julgamento social era o motor da brutalidade com a qual, especialmente Tolentino, buscava recusar a atração.

[Até o final do século XIX não existia o conceito de homossexualidade, e as relações e práticas sexuais entre dois homens ou duas mulheres eram julgadas como crimes religiosos da mesma forma que qualquer outra prática ou relação sexual entre um homem e uma mulher que não se orientasse para a reprodução.]

A cena, os próximos capítulos e a Rede Globo

Nessa cena do autor Mario Teixeira, dirigido pelo diretor artístico Vinicius Coimbra, o Coronel Tolentino esta frustrado após o intendente de Vila Rica, Rubião (interpretado por Mateus Solano), tê-lo humilhado pela fuga. André o consola e, entre palavras carinhosas, os dois se olham profundamente e se entregam a cena de pouco mais de 2 minutos. O início do beijo é sofrido, desesperado, como uma represa que estoura de tanto acúmulo. Em seguida os dois tiram a roupa bem devagar e, nus, se aproximam e se tocam. As próximas tomadas mostram o casal na cama, suado e entrelaçado, entre afagos.

Com essa cena a Rede Globo busca se "redimir" da concessão que fez durante a novela “Babilônia”, de 2015, quando, após receber inúmeras críticas conservadoras sobre o beijo das personagens idosas Teresa (Fernanda Montenegro) e Estela (Nathalia Timberg), resolveu vetar novas sequências de carinhos e práticas homoafetivas na novela.

Ainda não se sabe ao certo qual o rumo que o autor Mario Teixeira vai dar para esse romance proibido, mas sites e revistas antecipam que o Coronel Tolentino irá entrar em um processo de negação do ocorrido, dirigirá seu ódio em violência contra prostitutas do cabaré e passará a viver com uma delas, Gironda (Hanna Romanazzi). Ainda de acordo com sites de entretenimento, André irá atrás do Coronel, e após um bate-boca, os dois terminam se beijando. Gironda que observara tudo denunciará apenas André como criminoso para o intendente, que o condenará a forca. A partir daí não se sabe se Tolentino permitirá que André seja condenado a morte ou se buscará alguma forma de salvar a vida de seu amante.

Lembrando que a Rede Globo ficou famosa em 1998, na “Torre de Babel”, após o autor Silvio de Abreu decidir matar o casal de lésbicas Leila (Sílvia Pfeiffer) e Rafaela (Christiane Torloni), na explosão do shopping devido à rejeição ao relacionamento delas de parte conservadora do público.

A homofobia do passado séc XIX esta ainda presente no séc XXI,

Nas redes sociais o impacto dessa cena foi direto. Na noite de ontem a hashtag #Liberdade,Liberdade chegou a ficar em primeiro lugar nos trending topics do Brasil e várias pessoas elogiaram a trama e a forma como o amor entre os dois persoinganes foi tratado. Ao mesmo tempo, desde que foi anunciada essa cena de sexo gay, alguns grupos religiosos se manifestaram contra a novela dizendo que “dia 12, o demônio agirá, por meio desta emissora, que transmitirá cenas de sexo gay numa de suas novelas! Você, católico, não pode servir a dois senhores”.

Essas movimentações conservadoras e as dificuldades e atraso em transmitir na teledramaturgia brasileira uma cena de beijo ou sexo entre dois homens ou duas mulheres refletem o quanto o Brasil ainda permanece mais próximo da sociedade interpretada na trama do início do século XIX do que realmente de uma sociedade livre e igualitária. O espancamento, no mesmo dia da transmissão dessa cena, da modelo transexual Viviany Beleboni, que realizou encenações críticas à postura homofóbica das Igrejas e das bancadas parlamentares evangélicas nas ultimas Paradas de Orgulho LGBT de São Paulo, é simbólico sobre isso.

Se hoje no Brasil as práticas e relações homossexuais não são tipificadas pelo Estado como crime religioso e passível de morte, também não é menor a violência que as LGBT’s sofrem de grupos homofóbicos organizados que contam com o silêncio cúmplice do Estado – que se nega a criminalizar a homofobia – e com a bênção das Igrejas – que permanecem perpetuando o mesmo ódio e discriminação do inicio do séc. XIX. O tratamento recorrentemente discriminatório da mídia avaliza esse cenário. É necessário mais naturalidade na representação das diversas formas de identidades, relacionamentos e práticas sexuais nas telenovelas; é necessário educação sexual e de gênero nas escolas; e é urgente a separação da Igreja do Estado.

 
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