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A LITERATURA DE ISAAC BÁBEL
Isaac Bábel, um escritor revolucionário
Afonso Machado
Campinas

Quem quiser converter o verbo em pólvora, carregar com frases de alto calibre poético o revólver da linguagem, necessita de 2 coisas: imaginação e uma escrita direta. O escritor russo Isaac Bábel tinha pra dar e vender ambas as qualidades, indispensáveis para um autor de esquerda.

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Quem quiser converter o verbo em pólvora, carregar com frases de alto calibre poético o revólver da linguagem, necessita de 2 coisas: imaginação e uma escrita direta. O escritor russo Isaac Bábel tinha pra dar e vender ambas as qualidades, indispensáveis para um autor de esquerda. Nos 90 anos da obra prima O Exército de Cavalaria (mais carinhosamente conhecida como A Cavalaria Vermelha), refletir sobre o legado literário de Bábel é uma oportunidade para abastecer a cozinha dos escritores socialistas com ingredientes contrastantes: a tensão do concreto e o delírio da abstração, a exposição épica e o cotidiano patético, a sensibilidade frente ao detalhe e a brutalidade do relato.

O melhor formato para cozinhar este prato é o conto, habitat literário que permitiu a síntese dos acontecimentos vividos por um autor que testemunhou a luta revolucionária: Isaac Bábel foi correspondente de guerra em 1920, na Sexta Divisão do Primeiro Exército de Cavalaria, durante a Guerra russo-polonesa. Os horrores cotidianos e a luta de classes vista sob a ponta da baioneta, serviriam de material para uma escrita enraizada na blasfêmia e no retrato da decomposição ideológica da ordem estabelecida. O escritor judeu nascido em 1894, que já ensaiava os seus primeiros passos literários na adolescência, encontrou seu aprendizado no processo revolucionário russo, atuando junto ao Exército Vermelho. Os contos que integram a obra O Exército de Cavalaria, publicada em 1926, seriam o resultado retumbante desta escrita explosiva.

O reino da prosa pode atrair aventureiros da literatura, que instalados numa narrativa redundante nem sempre estão à altura dos acontecimentos políticos. Este não é o caso de Bábel: informado sobre os procedimentos estéticos de vanguarda, o autor caminha sobre a lama gelada do realismo, mas não deixa de olhar para o horizonte e fazer um uso progressista da imaginação. Como nos falam Aurora Fornoni Bernardini e Homero Freitas de Andrade, na apresentação da edição O Exército de Cavalaria feita pela Cosacnaify em 2006, o autor, numa tensão crescente, concebe o concreto em sua complexidade e oferece abstrações reveladoras. Ou seja, o realismo de Isaac Bábel incorpora atmosferas expressionistas, oníricas, pra lá de modernas. Deste modo, o cotidiano das ações militares, historicamente marcado pelas circunstancias hostis da luta revolucionária, é invadido por imagens atrevidas: o sol caindo no horizonte como uma cabeça decepada, desfiladeiros das nuvens, balas que perfuram a cabeça enquanto os olhos caem no chão, silencio de teia de aranha, musgo úmido que floresce feito mármore, biscoitos com cheiro de crucifixo, uma abelha que não pica Cristo porque ele é “ da classe dos carpinteiros “, sangue dos cavalos pela tarde, etc. Isso e muito mais aparece nos 36 contos que compõem O Exército de Cavalaria; obra que como apontou Boris Schnaiderman , traz o narrador imerso naquilo que ele narra.

Isaac Bábel foi uma ardente referencia para os escritores comunistas da primeira metade do século passado. Porém, quando o stalinismo colocou a literatura no matadouro da censura, as letras foram trituradas e a cultura virou carne moída. Acusado de promover uma literatura que só considerava os “ aspectos negativos da vida “, Bábel foi marginalizado durante os anos 30 e fuzilado no início dos anos 40. A escrita direta de um autor que se recusa a simplificar a realidade, traz uma margem de liberdade, de invenção e de crítica que são intoleráveis para o stalinismo.

Durante o Primeiro Congresso dos Escritores Soviéticos, em 1934, estava claro que Bábel não iria se curvar ao Realismo Socialista. Na ocasião, o escritor afirmou que privado do direito de “escrever mal“ ele aderia ao novo gênero do silêncio. Talvez a saída não poderia ter sido mesmo outra, já que a burrice e o controle burocrático passaram a determinar o estilo dos escritores.

Hoje, a obra de Isaac Bábel é da maior importância para se pensar e discutir a literatura revolucionária. Seu estilo é por si só uma resposta devastadora contra críticos e intelectuais que procuram confundir, com pérfida intencionalidade, arte revolucionária com o Realismo Socialista. O lirismo de Bábel é combustível poético para a esquerda.

 
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