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CHINA
Consequências da retração chinesa
Paula Bach
Buenos Aires

São múltiplas as interrogações e hipóteses sobre o declínio do crescimento desse gigante asiático. China acelera sua transformação em um novo competidor por espaços de acumulação. A resolução do dilema será um aspecto central na configuração do cenário mundial.

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A diminuição do crescimento da economia chinesa abre múltiplas hipóteses e interrogações. Durante o primeiro trimestre deste ano, a China cresceu a um ritmo anualizado de 7%, que é sua marca mais baixa desde os momentos mais críticos da crise econômica mundial em princípios de 2009. Como observado em outras ocasiões, a China foi um dos fatores contra tendenciais que com maior solidez impediram que a crise que explodiu em 2008 resultasse em um cenário similar àquele da Grande Depressão dos anos 30.

Ao mesmo tempo, seu papel de contenção da crise, permitiu ganhar tempo para converter-se rapidamente na segunda economia mundial, primeira produtor e consumidor mundial de aço, terceiro emissor de inversão estrangeira direta, maior possuidor do mundo de reservas em moeda estrangeira e recente fundador do Banco Asiático de investimento em infraestrutura (BAII) já aderido por 45 países como o Reino Unido, Alemanha e França. O papel da china durante as últimas décadas e seu acelerado crescimento tornou-se, ao mesmo tempo, fonte de uma aguda tendência para o excesso de acumulação de capital.

O declínio do crescimento de sua economia está inevitavelmente ligado a este processo e a transforma em um novo competidor mundial pelos espaços de acumulação ampliada do capital. Suas aquisições externas que incluem as empresas imperialistas como Pirelli, os crescentes investimentos e acordos de investimento e financiamento de obras de infraestrutura na América Latina e o recente lançamento do BAII, são claros sintomas desse fato. Os Estados Unidos estão reconhecendo este acontecimento, como pode ser visto em sua reação frente ao lançamento do BAII e na política recentemente implementada na Cúpula das Américas. As formas de resolução aprovadas deste dilema, se traduzirão em um elemento central da configuração do cenário mundial, durante o próximo período.

Perda de Altitude

Um artigo recente do The Economist questiona se o declínio do crescimento chinês prevê um pouso suave ou tempestuoso. Refere-se a um novo distrito da metrópole de Zhengzhou, no lado oriental, que aparecia em 2013 no programa de TV norte americano “60 minutos” como “cidade fantasma”, protótipo da bolha imobiliária chinesa. O semanário britânico assinala que quando os governos provinciais e municipais deslocaram ali muitas de suas empresas, essa suposta cidade fantasma se tornou real. Ele aponta que o desenvolvimento de Zhengzhou desmente por um lado alguns dos piores temores sobre o investimento chinês excessivo. Mas por outro lado, marca um ponto de virada da economia. O crescimento do PIB da cidade caiu a 9,3% no ano passado de uma média de 13% ao longo da década anterior. A tendência de queda continua. Como a capital de Henan, uma das províncias mais pobres do país, Zhengzhou se constitui como a última região de rápido crescimento. Seu amadurecimento indica que a desaceleração da economia chinesa não é apenas uma desaceleração cíclica, mas uma redução na marcha estrutural.

De modo que, novamente de acordo com o The Economist, a questão não é se o crescimento chinês se recuperará ao ritmo de dois dígitos do passado, mas se sua desaceleração será gradual – acompanhada de certa agitação por alguns momentos-, ou se se tratará de uma queda de forte impacto. A resposta dessa pergunta não é uma questão menor. Se a China cair submergida em uma crise aguda, dificilmente poderá brigar por consolidar seus traços imperialistas que vem desenvolvendo no último período. Além de que muito provavelmente se transformará em um elemento catastrófico para a situação econômica mundial. Se em vez disso, a China buscar conter suas tensões internas dando passo ao processo de desaceleração gradual, mantendo-se o cenário atual não catastrófico da economia mundial, isso poderia render um novo período de carência para fortalecer-se.

Segundo o The Economist

De acordo com o semanário britânico, embora com os sinais de retirada de capitais, as finanças públicas sob pressão e as dívidas incobráveis estão subindo, estes aspectos não dariam conta da situação como um todo. A China também tem fortalezas subjacentes muito sólidas e uma nova determinação para regular suas distorções mais prejudiciais. As principais nuvens negras estão pairando sobre o mercado imobiliário sendo que impactam desde a fabricação de aço até a produção de móveis e representa o impulso de quase um quinto da economia. Esse motor, se dispõem agora a diminuir o crescimento.

No último ano, os preços de habitação sofrerão sua pior queda desde que começaram os registros. Mas o semanário adverte que ainda que estes problemas sejam reais, os prognósticos de desastre se apoiam em um diagnóstico errado. A ideia de que a China está sentada em uma montanha de imóveis sem vender é um exagero. As vendas de imóveis residenciais foram 20% mais altas que em 2009, embora seja verdade que os projetos em curso mais que duplicaram desde então, segundo os dados oficiais. Muitos desses projetos seriam, não obstante, pouco mais que buracos no chão.

O mercado imobiliário na China não está prestes a entrar em colapso sob o peso de um excesso de oferta, mas o problema é que o crescimento deste mercado está estagnado. As siderúrgicas chinesas haviam criado capacidade para 1,2 bilhões de toneladas por ano, além dos 820 milhões de toneladas produzidas no ano passado, e é provável que constituam um teto. A propriedade imobiliária está se convertendo em um motor lastro para a economia chinesa.

É verdade que a China poderia reviver seu mercado injetando novo dinheiro em sua economia como fez em 2008, mas sua dívida total passou de 150% do PIB em 2008 a mais de 250% na atualidade e a dívida é normalmente a precursora de turbulências financeiras. Ademais o sistema financeiro também é muito mais complexo do que era em finais de 1990. Se os bancos estatais foram responsáveis por quase todos os empréstimos na época, desde a crise sua participação foi reduzida a menos de dois terços. Os mal regulamentados “bancos-fantasma” constituem na atualidade praticamente o outro terço. Não existe obstante, segundo o The Economist, uma lei férrea de que um grande aumento da dívida deva dar lugar a crise.

Depende muito de como se administrem os passivos. A China teria várias vantagens nesse campo. Entre elas, é que a grande maioria de suas dívidas são realizáveis no próprio país. Em muitos casos, os devedores e os credores respondem a um mesmo comando, o governo. Nesse contexto, uma crise aguda seria pouco provável, ainda que o prognóstico continue sendo ruim.

Segundo o The Economist a desaceleração da China ainda conta com espaço para o crescimento e uma razão importante é que se trata de uma economia de tamanho continental, que desfruta de muito mais do que uma ou duas indústrias.

Duplo resultado

Mesmo que o prognóstico em que parece se apoiar o semanário britânico tenha sido correto, a China deveria vencer, não obstante, muitos outros obstáculos chaves no caminho de consolidar seus traços imperialistas. Além do baixo nível tecnológico de sua economia, deveria superar um PIB per capita muito baixo como também assinala o The Economist, atingir um nível médio de renda. Com um valor de 12.000 dólares, a paridade de poder aquisitivo não chega a dois terços do da Turquia e representa apenas um terço do da Coréia do Sul. Nesse contexto, o tantas vezes proclamado giro para o mercado interno apenas começou e o investimento como porcentagem no PIB que chega a 50%, encontrando-se acima da Coréia do Sul e do Japão em suas fases de crescimento mais intenso. Embora o incremento do investimento, como indica o semanário, tenha se reduzido à metade durante os últimos anos, o crescimento do consumo se manteve estável durante a crise, esta variável deve contribuir com uma porcentagem notadamente maior.

Mas se este foi o caminho, e de acordo com o que foi dito acima, seria de esperar uma evolução combinada com um menor crescimento chinês com a continuidade de uma política mais agressiva pela conquista de espaços para a acumulação de capital. De modo tal que por um lado a China contribuiria para um menor crescimento mundial, contribuindo assim para o aprofundamento daquilo que as grandes seções de teoria econômica burguesa definem atualmente como estancamento secular. E por outro lado, regiões como por exemplo a América Latina tenderiam a transformasse mais ainda em um cenário de batalha dos distintos capitais.

Estes resultados começaram a se tornar mais aparentes, no contexto da Cúpula das Américas. As brechas que criam os conflitos entre os países, diretamente imperialistas ou entre um país imperialista e outro que tenta ser, como é o caso dos Estados Unidos e da China, deixa sempre uma margem significativa para ação. Como por exemplo a decadência da Grã-Bretanha e a ascensão dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, no contexto do estabelecimento das condições reformistas iniciadas pelo boom do pós-guerra, abriu-se espaço para que os outros países, como a Argentina, tivessem acesso a um desenvolvimento burguês relativamente independente.

Um contexto muito distinto, marcado por condições de estagnação secular e ausência de reformismo, e marcado por múltiplas contradições entre os distintos estado imperialistas e outros que, como China, buscam reafirmar seus traços, poderia dar lugar – em regiões como a América Latina – a um maior fortalecimento e protagonismo da classe trabalhadora e o resto dos setores populares, muitos deles ameaçados pelos ciclos econômicos que mostram seu fim, podendo questionar as tênues vitórias da última década.

 
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