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UNESP
Permanência Estudantil na Unesp: entre conquistas dos estudantes e a sabotagem da Reitoria
Ana Carolina Fulfaro
Henrique Nascimento

Com o avanço da crise econômica e política nacional, a realidade das universidades públicas brasileiras e, mais especificamente, a realidade da Unesp, vem se aprofundando em seu sentido mais elitista, racista e excludente. A total negligência com as políticas de permanência estudantil é uma demonstração disso.

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A luta por políticas efetivas de permanência estudantil vem sendo uma luta histórica travada pelo Movimento Estudantil da Unesp. Entende-se por políticas de permanência estudantil direitos como Restaurante Universitário com preço acessível, moradia estudantil em condições dignas, bolsas, acesso ao Centro de Convivência Infantil para que as estudantes mães possam estudar (e pais também, mas sabemos que na maior parte das vezes quem fica responsável pelo cuidado das crianças são as mulheres) e garantia da segurança, além de esporte, cultura, lazer, etc.

Muitos olham essas pautas e pensam que os estudantes estão pedindo demais, que, afinal, se querem estudar, que trabalhem para se manter. Não veem que o acesso ao ensino superior deveria ser um direito real para a população - sobretudo para essa que sustenta a universidade pública dia a dia através dos impostos, mas que, em geral, só consegue adentrar no espaço para ocupar postos de trabalho precários. Isso porque existe o filtro social do vestibular, mecanismo de exclusão utilizado para barrar a classe trabalhadora das universidades.

Então, porque quem teve condições de estudo durante a vida toda e tem condições de se manter na universidade tem o direito de estudar, e quem não tem tais condições não pode?

Acesso e permanência estudantil: conquista dos estudantes, sabotagem da Reitoria

Após a greve estudantil de mais de 10 campi da Unesp em 2013, com duas ocupações de Reitoria e ocupações de direções das unidades, o PIMESP [1] elitista foi barrado e assim conquistadas as cotas na Unesp.

São cotas graduais: em 2014, 15% das vagas foram reservadas para as cotas, em 2015, 25%, em 2016, 35%, em 2017 serão 45% e, em 2018, 50%, sendo que parte destas são reservadas para estudantes negros, pardos ou indígenas. Uma conquista importantíssima como essa, que vai no sentido da democratização do acesso ao ensino superior, se esbarra na falta de políticas efetivas de permanência estudantil. Assim, na prática, não se trata de um acesso pleno à universidade pública.

Também foi através de diversas lutas travadas pelo M.E. que as políticas de permanência foram e estão sendo conquistadas. Na história de cada moradia e R.U., estão mobilizações estudantis. Mas ainda são extremamente insuficientes, como podemos ver: existem Restaurantes Universitários em apenas dez unidades da Unesp, sendo que, de acordo com dados da Comissão Permanente de Permanência Estudantil (CPPE), todos os restaurantes servem, em média, 3.514 refeições por dia.

Além disso, 13 campi possuem moradias (dentre esse número também é contabilizado casas de aluguel), sendo que no total são 1.240 vagas. No ano de 2015 houveram 743 auxílios aluguel.

O número total de alunos de graduação da Unesp é de 37.388. Ou seja, nem 10% dos estudantes tem acesso aos restaurantes e às moradias! Ao passo que o acesso de estudantes com maior necessidade de políticas de permanência cresce principalmente pela política de cotas, há um corte na verba para a permanência: em 2015 foi reservado para permanência estudantil a quantia de R$14.631.000, sendo que para o ano de 2016, de acordo com estudos da própria COPE o orçamento estimado para que a demanda por bolsas fosse totalmente atendida foi de R$18.086.820. No entanto, com a justificativa de ’contenção de despesas’, a verba se manteve a mesma que em 2015! Na prática, isto significa corte, já que a demanda aumenta a cada ano.

Alguns exemplos pelo estado…

Além disso, estamos vendo um total descaso por parte das diretorias com o que já tem: vazamento de gás na moradia de Assis, além de uma lista de espera de 150 pessoas para a bolsa de auxílio socioeconômico, alagamento na moradia de Araraquara. Em Marília, são vários problemas estruturais: rachaduras, portão quebrado, alagamento, falta de eletrodomésticos, falta de acessibilidade, além da superlotação frequente (em um quarto que cabem duas pessoas, atualmente estão morando até quatro). No Instituto de Artes, em São Paulo, os estudantes enfrentam problemas com a burocracia na seleção de moradores para as casas alugadas pela direção (paliativo para moradia).

No caso dos restaurantes universitários, os trabalhadores passam por uma enorme sobrecarga de trabalho, tornando-se necessário a diminuição do número de refeições.

Por exemplo, na Faculdade de Filosofia e Ciências de Marília, o restaurante oferece 300 refeições no almoço (o jantar foi fechado) e frequentemente por necessidade de afastamento por parte dos funcionários, o número de refeições tem sido diminuído para 200, 100 até 50, sendo que o total de estudantes do campus é por volta de 3.000.

Isso, para não falar da grande maioria dos restaurantes que são terceirizados e que, com certeza as condições de trabalho são ainda piores, mas como não há estabilidade alguma, os trabalhadores acabam tendo que se manter em tais condições para garantir o posto de trabalho.

E se já não bastasse, está havendo aumento do valor das refeições em diversos campi! Em Jaboticabal já está R$5,50, em Franca R$4,00, em Assis R$3,50, em São José do Rio Preto, R$4,00, em Araraquara o restaurante está fechado para reforma há mais de um ano, e por aí vai.

Se a permanência é insuficiente na maioria dos campi, nas unidades experimentais, que são unidades com pouca estrutura, é ainda pior: praticamente não existe. Em campus como Ourinhos e São Vicente, que possuem licenciaturas, o perfil socioeconômico dos estudantes é baixo e a necessidade de permanência é grande.

… mas também exemplos de luta!

Os estudantes já se levantam contra a Reitoria e mostram que não aceitarão de cabeça baixa estes ataques. No campus de Ourinhos, após a divulgação do resultado do processo de seleção que deixou 60% dos inscritos sem auxílio, foi deliberada uma paralisação e ocupação de sala de aula que durou uma semana (de 6/4 a 13/4), reivindicando o atendimento total da demanda pelas bolsas de auxilio socioeconômico.

Os ecos dessa paralisação foram sentidos e durante essa semana, diversas assembleias foram realizadas pelo estado. Estudantes de Assis e Franca também paralisaram as atividades na quarta-feira, dia 13, para discutir a questão da permanência estudantil e em solidariedade a Ourinhos. O resultado foi praticamente imediato: na quinta-feira, dia 14, logo pela manhã, a direção de Ourinhos recebeu um comunicado da COPE, em que foram disponibilizadas 19 bolsas emergenciais, indicando mais uma vez o caminho que o movimento estudantil deve seguir para ter suas pautas atendidas!

Também no dia 14/4, foi realizado um entraço no R.U. de Marília, campus onde também acontece o 4º Movimento de Ocupação por Moradia, ocupando salas de aula reivindicando a expansão e melhores condições na moradia.

Contra o elitismo e racismo institucional das universidades estaduais paulistas e do governo do estado de São Paulo

Quando a Reitoria e governo do estado dizem implementar o sistema de cotas na Unesp (denominado por eles de Sistema de Reserva de Vagas), o fazem pela pressão gerada em torno do PIMESP em 2013, e ao não investir proporcionalmente em permanência estudantil, demonstram seu caráter demagógico, já que “garantem” o acesso mas não garantem a permanência. É necessário retomar o exemplo da luta vitoriosa de 2013 na Unesp que abriu caminho para as cotas, na qual cada setor do Movimento Estudantil estava unificado, os que precisam de moradia, os que constroem os cursinhos, os que precisam de RU, e várias outras demandas, unificados em um punho só, e o movimento estudantil conseguiu através de sua independência e seus métodos de luta não ficar à reboque dos movimentos de outras categorias.

Dessa forma, a Estrutura de Poder [2], machista e elitista “até os ossos”, sabota as estudantes de escola pública, negras e indígenas. A vida universitária, que já é um verdadeiro teste de resistência por conta dessa estrutura racista e elitista, se torna um pesadelo ainda maior diante da impossibilidade de concluir o curso por falta de permanência. Poderemos enxergar, concretamente, daqui a alguns anos quantos destes estudantes terão conseguido se formar no curso que ingressaram, e quantos terão sido empurrados para fora da universidade. As condições que encaramos hoje, para este horizonte, não são nada animadoras.

Esta é uma questão que está para além da Unesp. Podemos ver na luta do movimento negro na USP e UNICAMP, pela implementação das cotas, a reação das reitorias e governo do estado, encastelados na Estrutura de Poder que busca manter uma relação claramente feudal dentro das universidades.

Essa realidade de profunda exclusão da juventude trabalhadora e pobre do acesso ao ensino de qualidade e precarização, está cada vez mais colocada para as universidades e demais setores da educação. Por isso, nós, que construímos a Faísca, juventude anticapitalista e revolucionária, defendemos que a luta do movimento estudantil e da juventude deve necessariamente passar pela construção de uma alternativa independente dos governos à crise política, que combata o impeachment e o reacionarismo da direita, e que também trave uma profunda luta contra os ajustes dos governos do PT e PSDB.

[1] O PIMESP (Programa de Inclusão com Mérito no Ensino Superior), era uma política do governo do Estado que, em linhas gerais, iria adiar as cotas imediatas na universidade, fazendo com que os estudantes oriundos da escola pública e dentre eles os “PPI´s” (Pretos, Pardos e Indígenas) tivessem de passar por um curso de 2 anos à distância (os chamados “colleges”) para que apenas depois tivessem acesso às cotas nas Universidades Estaduais Paulistas. E esse acesso só se daria para os que obtivessem um rendimento de no mínimo 70% nesses dois anos de curso, que possuía matérias como “Serviços e Administração do Tempo”, “Profissionalização, Inovação e Empreendedorismo” e “Liderança e trabalho em Equipe”.

[2] Na Unesp, o peso das decisões nos órgãos colegiados são divididos com base no 70/ 15/ 15: professores tem 70% do peso de decisão, enquanto que estudantes e trabalhadores possuem 15% cada. Além disso, disso, a Unesp possui um Regimento Disciplinar datado da época da Ditadura Militar, que pune lutares baseado em artigos que proíbem afixar cartazes nas paredes, proíbe a organização política e preza pela “boa moral e bons costumes”.

 
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