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POLÊMICA
MNN e a defesa explícita de uma aliança com a burguesia anti- PT
Bruno Gilga

É fato que grande parte da esquerda tem capitulado ao impeachment da direita. O Movimento Negação da Negação foi até o final, e tem defendido com todas as letras que a esquerda faça um acordo com a burguesia e os organizadores do ato do dia 13/3 para atuar em comum contra o governo. Nada mais distante do marxismo, que dizem defender.

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Imagem: Cartazes do MNN e PSTU colados na “cozinha gourmet” da FIESP pelos “manifestantes” do acampamento pró-impeachment da direita

Os trabalhadores brasileiros estão diante de ao menos três perigos principais, como analisamos em artigos como esse. Resumindo: o plano do PT de constituir um “novo governo” com Lula e Dilma, com mais condições para aplicar os ajustes e ataques contra os trabalhadores, apoiando-se inclusive em maior repressão. Mas os outros dois, além de acelerar e aprofundar esses mesmos ajustes e ataques,representam ainda um recrudescimento autoritário do sistema político que não podemos minimizar, pois se voltariam contra nós trabalhadores: o impeachment, com fortalecimento da direita, num governo Temer-PSDB; e o fortalecimento do Judiciário, com suas ligações com o imperialismo, junto a instituições como a Polícia Federal, e do uso de medidas cada vez mais arbitrárias e autoritárias, a serviço de uma reconfiguração reacionária do regime de partidos,

O primeiro erro do MNN é ignorar completamente estes últimos dois inimigos. Para eles, é preciso "ir derrotando um inimigo burguês de cada vez", "enfrentar todos de uma vez é estupidez", e "o principal inimigo é o PT". Consideram que, como o PT é o maior freio da classe trabalhadora, a queda do governo necessariamente favorece o movimento de massas. De outro lado, como a direita não tem a mesma inserção no movimento operário, seu governo seria necessariamente mais débil. Esse formalismo não admite nem como hipótese aqueles outros perigos, já claramente estabelecidos na realidade política, de um fortalecimento da direita e/ou do judiciário, e das ilusões populares nesses setores, que só têm como objetivo atacar os trabalhadores.

Combater o bonapartismo... com a Polícia Federal!

De ignorá-los, o MNN passa imediatamente a elogiar esses outros inimigos. Para o MNN, fortalecer os atos e ações de outras alas e projetos burgueses estaria justificado, “a serviço de combater o bonapartismo”. Mais que isso, para o MNN, “O projeto de Lula, contido em 1980, em sua política de controle da classe trabalhadora, começa a efetivar-se hoje. Trata-se de um projeto autoritário, com características que apontam para o fascismo, para combater a classe operária.”. Apresentar a ameaça do fascismo (cuja principal característica é a destruição física da organização da classe trabalhadora) pra justificar uma política sem princípios não é algo original, o governismo tem feito a mesma coisa. Mas essa versão, invertida, feita pelo MNN não deixa de ser “criativa”, pelo grau do absurdo.

Porém,vão além: como o MNN quer combater o autoritarismo de Lula, que apontaria para o fascismo? Exigindo sua prisão! Que obviamente se daria pelas mãos de Sergio Moro, da Lava Jato e da Polícia Federal! Para eles, “o risco de caminharmos para uma forma de governo autoritário nos próximos anos, sob o controle de Lula – uma forma de bonapartismo – é real. A mobilização atual de setores vinculados ao PT, materialmente dependentes do Estado burguês, em defesa de Lula, já indica isso. A questão agora é barrar ao máximo possível esse caminho para uma forma mais aguda de autoritarismo burguês. “Que Lula seja preso!” Isso disseram não apenas em um artigo,em tom elogioso à Policia Federal e ao MPF, logo após a condução coercitiva de Lula. Mas inclusive com uma campanha agitativa de cartazes, difícil de acreditar, por toda a região metropolitana de SP, assinada por sua agrupação de juventude (TL).

Com esses instrumentos querem “combater o bonapartismo”. A única medida que criticaram foi o pedido de prisão preventiva contra Lula, mas com o mesmíssimo argumento da direita: “A acusação contra Lula parecer mera perseguição política, neste momento, favorece o vitimismo retórico de Lula”.

Os atos que só o MNN viu nos dias 13 e 18

O próximo “erro” do MNN é confundir completamente o que ocorre nas ruas. Já houve todo um debate sobre quem e quantos estiveram nesses atos. Não surpreende que o MNN engula as estimativas burguesas e diga que havia 1 milhão de pessoas só na Paulista. Mas insistem em dizer que houve adesão de trabalhadores (“a partir das 16h”), e ainda pior, que foi continuidade de Junho de 2013! E onde estava a juventude e as demandas sociais?!

Mas vejamos a “criativa” narrativa que criam a partir dessas “impressões”.
Em suas palavras: “Eis então que em determinado momento, insustentável, de crise econômica e social, irrompe na cena a maioria da população trabalhadora. (...) O mundo da pequena-burguesia é suspenso da noite para o dia. Bate-lhe um desespero no peito; ela olha para o amanhã e não vê nada. É então que ela corre para os mantenedores da ordem e se torna ela própria conservadora. É o que ocorre hoje e ocorreu neste dia 18/03.”.

O leitor, ao menos a maioria não iniciada no “negacionismo”, é obrigado a parar estupefato: Então a pequena burguesia “desesperada” estaria representada pelos setores que compareceram ao ato do dia 18/3 na Paulista, e não pelos que, a mando da Rede Globo e endeusando Sergio Moro, urravam contra o PT, o bolsa família e “o comunismo” no famigerado dia 13?1 Ao contrário, esses últimos são a “irrupção na cena da maioria da população trabalhadora” que assustou a pequena burguesia?!

"Que se vayan todos" ou "Que venha Macri (e contra o bonapartismo!)"?

Poderia parecer apenas um caso de miopia política, mesmo que beirando a cegueira, a impedir o MNN de enxergar os atos de 13/3 por todos os seus fatores essenciais: o contexto internacional e nacional; os convocantes; a base social amplamente majoritária; as demandas; etc. Mas é mais grave.

No ano passado, analisando as eleições na Argentina, disseram:“A vitória de Macri em novembro, se se realizar, constituirá um fenômeno político interessante a ser analisado, pois se tratará da primeira derrota das forças de tendências bonapartistas num país economicamente relevante da América Latina” que “pode iniciar um processo de maior luta de classes no continente, na medida em que realiza a queda do kirchnerismo e enfraquece seu aparato de controle da classe trabalhadora.”

É a mesma lógica que aplicam aqui. Macri, um empresário que enriqueceu na ditadura, representante da “direita gorila” (ou seja pró-imperialista), venceu. Agora, uma de suas medidas mais famosas é um “protocolo antipiquete”, uma duríssima criminalização das manifestações e protestos. Uma violência sem precendentesem anos recentes contra o movimento de trabalhadores, mas que o MNN acredita ter ajudado a “derrotar o bonapartismo”.

O PTS, nossa organização irmã na Argentina, que encabeçou a FIT com Nicolás delCaño, combateu em todos os momentos a ideia do “mal-menor” levada a cabo pelos Kirchneristas, com uma grande campanha pelo voto nulo. Agora, achar a vitória do direitistaMacri algo “interessante” já é outra história. E vê-la como “derrota do bonapartismo”, já é outra estratégia. Poderiam ter aprendido com o erro... se ao menos o vissem como tal.

Enfim, “acordos com a burguesia” e a aliança platônica com a direita pró-impeachment

Eis que, aprofundando seus erros a cada passo, o MNN chega a defender abertamente um acordo com os setores burgueses e pequeno burgueses que se levantam contra Dilma e o PT.

“É preciso saber “sujar as mãos”, ensinou Lenin; fazer acordos com setores burgueses para aproveitar-se das brechas da burguesia e, assim, mantê-la paralisada e favorecer a ação do proletariado. Numa conjuntura como a atual, no Brasil, é evidente que a esquerda revolucionária deveria saber aplicar essa tática de Lenin; fazer acordos e compromissos com setores pequeno-burgueses ou democrático-burgueses, por mais vacilantes que sejam, e ir derrotando um inimigo burguês de cada vez.”

Lênin nunca disse nada que tivesse a ver com o que defende o MNN . Voltaremos a isso abaixo, por ora sigamos com o MNN.

“Para barrar Lula e o PT, a esquerda não pode ter medo de sujar as mãos. É preciso saber fazer acordo com os setores pequeno-burgueses descontentes que hoje mobilizam importante parcela da população. É preciso saber aliar-se, ir às ruas conjuntamente, para paralisar, cercar e prender o bonaparte Lula. Há de se combater o fascismo entre esses setores pequeno-burgueses, mas sem ignorar que o maior risco de fascismo hoje vem do caminho de Lula. Para a esquerda e para as organizações da classe trabalhadora, aliar-se a esses setores pequeno-burgueses é hoje uma questão de vida ou morte.”

Alguém poderia suspeitar que o MNN se sentou numa mesa com o MBL, o PSDB e a FIESP, e demais organizadores do ato do dia 13, que discutiram, apertaram as mãos e disseram "temos um acordo, podemos atuar juntos!". É evidente que não.

Mas é exatamente isso que estão propondo, com todas as letras!Em suas palavras: "Por mais importante que seja um ato com 10 mil pessoas na Av. Paulista para se construir um "terceiro campo", muito mais importante seria participar, nem que fosse com a metade dessas pessoas (5 mil militantes) de um ato de setores pequeno-burgueses e burgueses. (...) Em última instância, seria preciso fazer um acordo com os organizadores do ato para viabilizar a nossa presença."

E quem são os organizadores dos “atos de setores pequeno-burgueses e burgueses” contra o governo? PSDB, DEM, FIESP, MBL, Vem Pra Rua, Revoltados On-line... pra citar os principais, ainda que entre seus convocantes também estejam Bolsonaro e grupos que reivindicam a intervenção militar.

Defendam o que quiserem, mas não em nome do marxismo

O MNN tenta justificar sua proposta de “aliar-se” com a burguesia pró-impeachment e fazer “acordos” com as organizações da direita...com Lênin e o legado da III Internacional sobre a tática de frente única(!). Mas não à toa aquela tática se chamava “frente única operária”. Lênin se referia às organizações de trabalhadores. E quando fala de “manobras para explorar os antagonismos de interesse entre os nossos inimigos”, a própria citação do MNN mostra que Lênin está falando da guerra, e condenando os esquerdistas por rechaçarem a priori acordos feitos pelo Estado operário soviético. Lênin se referia a um proletariado que tinha enorme força organizada, havia tomado o poder, e buscava conservar o Estado operário. O MNN compara isso com um acordo das pequenas organizações da esquerda com a FIESP e o PSDB, em nome do impeachment! Se querem defendê-lo, que seja, mas não comprometam o Leninismo.

O resultado da ação depende de como e por quem é realizada

Uma questão elementar para o marxismo é que o resultado de uma tarefa depende do sujeito que a realiza. Se o governo é derrubado pela classe trabalhadora em luta com seus métodos e por seu programa, o resultado é um. Se é derrubado pela FIESP, pelo PSDB/DEM, congresso, STF, Polícia Federal, e grupos a la MBL, com seus métodos e seu programa, o resultado é outro. Não somente “longe do ideal”, “podia ser melhor”, “não é exatamente o que queríamos, mas já é um primeiro passo”. Ao contrário, neste último caso, o resultado é reacionário.

Em anos recentes, provavelmente embalados pela euforia do lulismo que estava no seu auge, o MNN abraçou totalmente a tese do “Brasil potência”. Seu principal teórico, Hector Benoit, tentou dar explicações “históricas” para justificar que o Brasil não seria mais, ou nunca havia sido, um país acossado pelas potências imperialistas; quase como se não fizesse parte da América Latina.

Esse tipo de teorização parece útil agora para que o MNN possa fechar os olhos para os grandes interesses imperialistas por trás de Sérgio Moro, da Lava Jato e da turma do impeachment. Conveniente para um grupo que, sempre de maneira “descolada”, quer surfar na onda da opinião pública e ser a ala esquerda do movimento impeachmista, sem se importar para onde esse movimento aponta. Não surpreende então que o MNN possa dizer, literalmente, que“Não importa que o impeachment é tocado por Cunha e um Congresso de picaretas e corruptos”

  •   “Fazer o jogo da direita" é uma acusação que nos últimos 13 anos o PTismo lançou contra qualquer um que critica o governo. Mas no caso do MNN ela serve bem, não porque critique o governo, mas porque defende exatamente a mesma política da direita, a construção de atos com a direita, inclusive a realização de acordos com as organizações da direita, e ainda sem nenhuma linha de critica à direita, em nenhum de seus artigos. O MNN, platonicamente, se juntou à direita... E o que é pior: estão orgulhosos disso
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    P.S.: TL e a “crença no Estado” (ou “Lava Jato, sim! Educação Pública e Cotas, não!”)

    É curioso que isso venha de um grupo que afirma que “defender estatização das universidades particulares é uma crença servil no papel do Estado atual”. Com esse argumento, o “Território Livre” (agrupação de juventude do MNN) chega a se contrapor abertamente à defesa da educação pública em geral. Coloca-se também contra a defesa de mais verbas pras universidades e do fim do vestibular, e diz que “A única e verdadeira educação que o povo deve ter hoje é a educação da luta, mas ela passa muito longe das salas de aula” e que "não lastimamos o seu desaparecimento [da universidade], pelo contrário, o comemoramos". No mesmo sentido, em outro texto dizem “não defendemos cotas porque pensamos que essa é uma perspectiva dentro dos marcos do capital”.

    Não deixa de ser impressionante que um grupo que faz formulações tão sectárias, no pior sentido do termo, e que acusa de “crença servil no Estado atual” aqueles que defendem a direitos elementares como a educação pública, que a juventude e as massas desejam legitimamente, e que lhes são totalmente negados, demonstre, ele sim, uma crença tão servil no Estado, e justamente no seu aspecto essencial, o da repressão de classe organizada em instituições como o judiciário e a Polícia Federal.

    O TL chegou a sair em campanha agitativa com cartazes pela cidade pedindo a prisão de Lula. Ao argumento do combate ao autoritarismo, juntou outros igualmente esdrúxulos:

    “Considerando que o PT não aproveitou-se do poder e da situação econômica relativamente favorável para criar uma mínima política progressista nacional (burguesa) que mudasse a forma como o país se insere no mercado capitalista mundial (ou seja, o PT aprofundou rapidamente a desindustrialização; submeteu ainda mais o país ao rentismo parasitário; ampliou em forma jamais vista a destruição de recursos naturais para fins privados do agronegócio);
    (...)
    CONSIDERANDO TUDO ISSO O TL DECLARA QUE COMEÇARÁ NAS PRÓXIMAS SEMANAS UMA CAMPANHA PELA PRISÃO DE LULA E PELA QUEDA DO GOVERNO DILMA!”
    .

    Seria uma capitulação ao Estado lutar por educação pública e por cotas raciais... Mas exigir a prisão de Lula em meio à Lava-Jato e às conduções coercitivas de Lula, isso sim seria combater o autoritarismo (para além de fundamentar a prisão com o argumento de que o PT desindustrializou o país, que caberia bem à FIESP, se ela não fosse lúcida demais pra dizer algo assim).

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