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Ataque aos artistas
Bolsonaro e Frias atacam artistas com cortes descomunais nos cachês para projetos culturais
Redação

O governo Bolsonaro oficializou, por meio de uma nova Instrução Normativa (IN), uma série de mudanças na Lei Rouanet. Uma das medidas é a redução descomunal de 93,4% do cachê dos artistas. Bolsonaro, junto com seu ministro Mário Frias, buscam atacar os artistas e trabalhadores da arte que mais necessitam de apoio, seja com cortes nos incentivos, censuras ou perseguições, como foi visto diversas vezes em seu governo, com o objetivo de defender uma arte elitista, mercantilizada e reacionária, a serviço dos interesses das classes dominantes.

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Imagem: Reprodução / Twitter

"Este é um governo voltado para seu povo", tuitou cinicamente Mário Frias, atual ministro da Cultura, ao publicar uma foto ao lado de Jair Bolsonaro assinando o documento.

Algumas horas depois, o ministro usou as redes sociais para postar um vídeo patético, em tom de deboche, com uma "musiquinha nova para os mamadores da Rouanet", como ele descreve, e em que diz: "Rouanet eu quero, Rouanet eu quero, na Rouanet eu quero mamar, me dá dinheiro, me dá dinheiro porque senão vou chorar".

Na realidade, como veremos abaixo, longe de incentivar os projetos culturais e artísticos dos artistas independentes e dos trabalhadores do mundo artístico, que necessitam de incentivos para poderem trabalhar e viver da arte, em um contexto de desemprego, fome, e miséria tanto material quanto cultural e espiritual, o que o governo Bolsonaro faz é dificultar ainda mais para esses artistas e trabalhadores as condições para realmente poderem produzir cultura e arte de qualidade para os demais trabalhadores e povo pobre brasileiro. E não poderia ser diferente, já que o objetivo de Bolsonaro e Mário Frias é incentivar uma arte elitista, reacionária, com valores conservadores, nacionalistas e cristãos, apagando toda a pluralidade da cultura brasileira e seus elementos de resistência e de crítica a esse governo reacionário.

É importante relembrar o horripilante discurso do ex-ministro da Cultura Roberto Alvim, que imitava e copiava um discurso ministro da cultura nazifascista Joseph Goebbels.

A nova IN estabelece, como já vinham sendo anunciadas, desde 1º de janeiro de 2022, pelo secretário Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura, André Porciuncula, em posts no Twitter, redução de 50% no limite para captação de recursos pela lei. Para projetos de "tipicidade normal", o teto cai de R$ 1 milhão para R$ 500 mil. Para projetos de "tipicidade singular", como desfiles festivos, eventos literários, exposições de artes e festivais, o valor fica limitado a R$ 4 milhões. Para aqueles de "tipicidade específica" (concertos sinfônicos, datas comemorativas nacionais, educativos e ações de capacitação cultural, inclusão da pessoa com deficiência, museus e memória, óperas, projetos de Bienais, projetos de internacionalização da cultura brasileira e teatro musical), o valor máximo fica em R$ 6 milhões.

Outra mudança é a alteração na classificação das áreas culturais contempladas pela Rouanet, com uma divisão que inclui "arte sacra" e "belas artes" como categorias distintas, algo que já havia sido previsto por meio de um decreto publicado em julho de 2021. Dentro delas, estão subdivisões por setor. Além dessas categorias, os projetos passam a ser divididos também em "arte contemporânea", "audiovisual", "patrimônio material e imaterial" e "museus e memória".

Também haverá uma descomunal redução no cachê artístico. O limite para pagamento com recursos incentivados passa a ser de R$ 3 mil por apresentação, para artista ou modelo solo. A última IN estabelecia o cachê individual máximo em R$ 45 mil. A nova medida, portanto, representa uma redução de 93,4% nesse valor. Para músicos, o teto fica estabelecido em R$ 3.500, por apresentação. E, para maestros, R$ 15 mil, no caso de orquestras.

O documento também estabelece o limite de R$ 10 mil para o valor destinado a aluguéis de teatros, espaços e salas de apresentação, salvo teatros públicos e Espaços Públicos. Com isso, se impede ainda mais que teatros populares e feitos pela classe trabalhadora e artistas independentes possam se apresentar e levar cultura para os trabalhadores e povo pobre.

Além disso, iniciativas culturais realizadas por estados ou municípios com dinheiro da Rouanet precisarão de aprovação prévia da pasta de Mario Frias. Diz o artigo 55 da nova IN: "A inauguração, abertura ou lançamento de programas, projetos e ações culturais realizados com os recursos incentivados por parte de proponentes, dos Estados, Distrito Federal e Municípios, poderão ocorrer somente com a aprovação prévia da Secretaria Especial de Cultura do Ministério do Turismo".

Os custos de divulgação para projetos beneficiados com recursos também foram alterados. O percentual destinado à divulgação, anteriormente não podia ultrapassar 30% do valor do projeto de até R$ 300 mil e 20% para os demais projetos.

Mas agora, os custos de divulgação, incluindo assessorias de comunicação, não poderão ultrapassar: 20%, para projetos de "tipicidade normal"; 10%, para projetos de "tipicidade singular"; 5%, para de "tipicidade epecial"; e 10%, para projetos de "tipicidade específica" até o valor de R$ 500 mil.

Outro corte tem a ver com o prazo máximo de captação, com eventuais prorrogações, que agora passará a ser até 24 meses. Antes, a captação poderia ser realizada em até 36 meses.

A nova IN também decreta a não possibilidade de execução do orçamento com alterações no valores aprovados. Antes, era possível aprovar, desde valores não alterados, o remanejamento entre itens de despesa. Mas agora, com a alteração, será preciso permanecer com o mesmo orçamento por um ano.

Já no ano passado Bolsonaro tinha decretado um novo regulamento para o Programa Nacional de Apoio à Cultura (PRONAC), mais conhecido como Lei Rouanet, estabelecendo alterações que garantem a possibilidade de que o governo federal possa decidir a dedo sobre os conteúdos dos projetos contemplados, dando ao presidente da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC), que decide os projetos aptos a captar recursos por meio da Lei Rouanet, o poder de tomar decisões sobre os projetos sem consultar os demais integrantes da comissão.

Frente ao fato de não ter sido lançado novo edital para a formação da CNIC desde o fim do mandato de 2019-2020, isso significou que agora as decisões ficam a cargo do secretário André Porciuncula, nada mais nada menos que um capitão da PM da Bahia, diretamente subordinado ao secretário especial de Cultura, o reacionário Mário Frias. O decreto também já dava ênfase aos projetos de belas artes e arte sacra, ordenando a inclusão de especialistas em arte sacra na CNIC.

Para quem tem dúvidas do que isso poderia significar na prática, basta lembrar da censura ao Festival de Jazz do Capão, cuja a organização foi impedida de captar recursos via Lei Rouanet pela gestão de Mário Frias, tendo no início do parecer de indeferimento feita pela Funarte a seguinte frase atribuída ao músico alemão Johann Sebastian Bach, que morreu em 1750: "O objetivo e finalidade maior de toda música não deveria ser nenhum outro além da glória de Deus e a renovação da alma", sendo este, e o slogan do evento que dizia “Festival antifacista e pela democracia”, os argumentos centrais para o indeferimento, banhados pelo racismo bolsonarista e por intolerância religiosa.

Vale lembrar também dos 60 anos de história do cinema brasileiro sendo queimados, isto é, as chamas que tomaram conta do galpão da Cinemateca na Vila Leopoldina - SP. O que foi destruído no incêndio, fazia parte do que sobrou da inundação de fevereiro de 2020. Tal fato não foi uma fatalidade, mas um crime anunciado, como os próprios trabalhadores da Cinemateca definem, cujo os responsáveis sabemos os nomes: Bolsonaro, junto de Mourão e os militares. O mesmo Bolsonaro que, frente ao incêndio do Museu Nacional em 2018, fruto da negligência e dos sucessivos cortes contra a cultura e a educação, disse “já está feito, já pegou fogo, quer que eu faça o quê?”.

Relembre também: Comissão de cultura da Câmara aprova uso de Lei Rouanet para financiar igrejas evangélicas (2019)

Projetos financiados pela Lei Rouanet não poderão usar linguagem neutra (2021)

Também é importante deixar nítido que a Lei Rouanet, criada em 1991 no governo Collor, é desde sua concepção uma forma de mercantilização da cultura. Isso porque ela funciona com base na renúncia fiscal: as empresas deixam de pagar impostos e aplicam essa verba em projetos culturais. Assim, não é o povo e os trabalhadores da cultura que decidem quais projetos serão financiados, mas sim o departamento de marketing das empresas, que utilizam os projetos financiados como propaganda de si mesmas, fazendo da arte e da cultura um instrumento a serviço do lucro. Assim, o que está colocado é um aumento da precarização das condições trabalho e de vida dos artistas, combinada com censura e perseguição aos mesmos, principalmente aqueles que se colocam como oposição ao governo e usam da sua arte para denunciar cada absurdo que vemos, mas também uma maior censura às expressões de arte popular, como aquelas ligadas às raízes de matriz africana, alvos constantes do bolsonarismo.

 
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