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USP
A USP produz testes para a covid, mas não testa seus trabalhadores
Redação

Desde o dia 12 de janeiro os trabalhadores do restaurante universitário central da USP, conhecido como bandejão, estão paralisados depois que um surto de contaminações pela nova variante ômicron que acometeu cerca de 40% do quadro de funcionários dessa unidade no mês de janeiro. Esse aumento do número de contaminados na USP foi agravado pela ausência de testagem e de uma política sanitária séria para garantir a segurança sanitária da comunidade USP.

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Foto: Revista Fapesp

O caso do bandejão não é exceção na universidade. No Hospital Universitário o aumento das contaminações pode ser sentido com a sobrecarga de trabalho e a ausência de contratações desde 2014. No Centro de Saúde Escola Butantã a situação não é diferente. Essas unidades de trabalho essencial, juntamente com laboratórios e biotérios, se mantiveram trabalhando durante toda a pandemia. No entanto, pouca coisa foi feita para garantir a segurança sanitária dos trabalhadores. Mesmo nessas unidades de saúde é possível sentir a ausência de testagem periódica para os funcionários. Além disso, a diminuição do quadro funcional de trabalhadoras da higienização e limpeza coloca em risco a segurança de pacientes e funcionários do hospital.

Desde o início da pandemia, a necessidade de testagens massivas era levantada pelos profissionais da saúde como uma forma de conter o contágio. A Organização Mundial da Saúde reitera a necessidade de testagens como uma das medidas para conter o contágio. O Brasil, no entanto, ocupa as últimas posições em relação a testagem da população. Para fins de comparação, de acordo com a Our World in Data, no último período o Brasil realizou 0,01 teste para cada mil habitantes. Portugal, por exemplo, realizou 23,78 testes para cada mil habitantes. A Áustria 78,37 testes. Esses dados apontam que o número de subnotificações da covid no Brasil é gigantesco.

Em janeiro do ano passado, a Universidade de São Paulo divulgou no Jornal da USP que pesquisadores do Instituto de Química de São Carlos desenvolveram testes rápidos para covid que teriam um custo 5 vezes menor que os testes vendidos nas farmácias. Em março do mesmo ano a diretora do Instituto de Medicina Tropical da USP, Cássia Mendes Corrêa, em entrevista ao Jornal da USP no Ar, reafirmava que os trabalhadores da linha de frente devem ser testados para o coronavírus de forma periódica tanto para triagem (sintomáticos e assintomáticos) quanto para que os infectados sejam isolados de suas atividades caso haja confirmação da infecção. No final de 2021, com a variante ômicron, o infectologista Álvaro Furtado Costa, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, também em entrevista ao Jornal da USP indicava a testagem como estratégia importante para frear a disseminação do vírus.

Esse pequeno recorte de declarações de pesquisadores da Universidade de São Paulo, publicados pelo seu veículo de imprensa oficial, o Jornal da USP, mostra que a universidade estava bastante ciente da importância da testagem periódica, inclusive desenvolvendo pesquisas importantes que aprimorassem as técnicas existentes e barateassem seu custo. Mas, há uma imensa separação entre a pesquisa na universidade e o tratamento dado aos trabalhadores e à população.

É possível imaginar uma universidade funcionando sem trabalhadores técnicos-administrativos e operacionais? Esse tem sido o projeto das duas últimas gestões da USP, em consonância com os ataques ao funcionalismo perpetrados pelos governos federal e estadual. Além do congelamento de contratações desde 2014, aumento da terceirização e precarização das relações de trabalho, arrocho salarial, chama a atenção como, na pandemia, os trabalhadores foram sistematicamente ignorados pelo ex-reitor Vahan Agopyan. Em um discurso na abertura de uma das sessões do Conselho Universitário o então reitor agradeceu os dedicados pesquisadores e médicos que arriscavam suas vidas no combate a pandemia. Propositalmente ignorou os trabalhadores do HU e Ceseb, as trabalhadoras terceirizadas da higienização e limpeza e todos aqueles que se mantiveram trabalhando, arriscando suas vidas em atividades essenciais que tornavam possível o funcionamento da USP presencialmente (sem falar do trabalho remoto que garantiu que a USP não parasse em meio a pandemia).

O tratamento bastante desigual destinado aos funcionários da universidade gerou revolta entre funcionários, professores e estudantes. No final de 2020 a reitoria, para testar a eficácia de bolhas sanitárias, determinou o retorno às atividades presenciais apenas de funcionários. Os contratos com as empresas terceirizadas que cuidam da limpeza foram reduzidos e as trabalhadoras terceirizadas das unidades foram demitidas. Foi preciso a deflagração de uma greve sanitária para impedir que os trabalhadores fossem tratados dessa forma, sem que houvesse nenhum tipo de planejamento em relação ao retorno, nenhuma medida tomada, nenhum plano de testagem. Novamente em 2021, a reitoria repetiu a mesma postura desigual de tratamento determinando o retorno às atividades presenciais de funcionários sem sequer receber o Sindicato dos Trabalhadores da USP, o Sintusp, para discutir as medidas necessárias para garantir o retorno seguro ao trabalho. Sem testes, sem protocolos de segurança sanitária, com o quadro funcional de trabalhadores da limpeza reduzido, sem contratações para o Hospital e aparelhos de saúde.

O projeto privatista de universidade, levado a cabo pelos governos do PSDB de Doria em consonância com as políticas privatizantes de Bolsonaro e Paulo Guedes, cria aberrações como a que vemos na USP. Uma universidade que pesquisa e produz testes, mas que não são destinados aos trabalhadores. O renomado projeto Genoma USP, que funciona dentro da universidade no Instituto de Biociências, tem oferecido testes à população com preços semelhantes ao do mercado privado. Com financiamento da Fapesp e da JBS, a gigante da indústria frigorífica, o projeto COVID-19-Genoma tem preços diferenciados para a comunidade USP: Funcionários e docentes pagam 80 reais, estudantes 30 reais. Não há nenhuma menção aos trabalhadores terceirizados que são parte da comunidade USP.

É no mínimo de se questionar por que a universidade desenvolveu testes que poderiam custar R$30,00, enquanto oferece testes para a população por 120,00 reais. E mais ainda, por que, sendo capaz de produzir testes e considerando eles essenciais para barrar a disseminação do vírus, a USP nega aos seus trabalhadores um plano de testagens periódicas? Já são mais de 3 semanas de paralisação dos funcionários do bandejão da USP sem que a reitoria tenha sequer recebido os representantes do Sintusp. Nem mesmo a reivindicação elementar de suspender o trabalho presencial no restaurante até que diminua o índice de contaminação, que hoje encontra-se no pico, dado o alarmante número de 40% de contaminados testados positivo e com sintomas no restaurante tem sido suficiente para que a reitoria rompesse o silêncio e o descaso com a vida.

É nesse sentido que a demanda por testagens também coloca na mesa o debate a serviço de quais interesses está a universidade. Com a pesquisa cada vez mais submetida aos interesses das grandes corporações, dos grandes empresários, a fuga de cérebros, alardeada pela burocracia acadêmica como desculpa para aumentar o próprio salário, não significa fortalecer a pesquisa para que esta seja aplicada aos brasileiros. Ou, pelo menos, não aos trabalhadores brasileiros, só ao empresariado.

Por isso é fundamental seguir a luta em defesa da universidade pública contra os ataques do Bolsonaro, mas também de Doria e dos patrões, cercando de solidariedade os lutadores do bandejão da USP, defender o hospital universitário e os aparelhos de saúde, para que abram contratações de trabalhadores efetivos de todas as áreas e que ele possa atender a comunidade USP e toda a população da zona oeste. É urgente que nós na USP nos unifiquemos às lutas do funcionalismo contra os ataques aos serviços públicos, à saúde e educação. E nesse caminho questionar a estrutura de poder e o projeto de universidade pública para colocar a USP verdadeiramente a serviço dos trabalhadores e do povo pobre.

 
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