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A questão do gozo: agonia do Eros ou desconstrução do sexo?
Clara Aldea

Nos últimos anos, a irrupção em cena das demandas das mulheres tornou evidente que a questão erótica ainda tinha muito mais para oferecer, e voltou à tona a partir das exigências nas ruas por uma nova tomada de discussão sobre a vida sexual.

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O movimento de mulheres, que gira a questão sexual para a exigência de um direito marcado pela desigualdade, vê-se rapidamente confrontado com um problema de múltiplas causas. Já não se trata de sustentar o desejo feminino como um valor num mundo eminentemente masculino, mas também que a piora das condições de vida torna-se evidente como uma das limitações impostas às condições em que toda a atividade erótica se desenvolve, a funcionalidade reprodutiva é diversificada pelo aumento dos trabalhos precários associados ao cuidado e à criança, e entra abertamente em jogo o papel da mercantilização do sexo e do corpo feminino dentro da dinâmica produtiva. Como resultado, as formas de vínculos de todos os tipos são objeto de elaborações teóricas que elevam a questão da sexualidade acima das necessidades concretas, e que dão origem a tentativas práticas de romper com um esquema tradicional de família. É evidente que esta incursão no terreno das provas individuais alternativas, influenciada pela performatividadequeer de uma sexualidade dissidente [1], se dá muito lentamente tendo em conta que dispor das possibilidades de colocá-la em prática, assim como entrar em contato com as demandas das mulheres que não alcançaram a massividade que, por exemplo, o direito ao aborto atingiu, se apresenta como condição que apenas um setor social reduzido possui.

Paralelamente, a vida sexual da maioria que acaba se tornando objeto dessa questão descobre que suas condições concretas demoram muito tempo para ser uma variável relevante na discussão. Os “usuários práticos” da sexualidade e as possibilidades reais sobre as quais ela se apoia terminam por se deparar entre duas grandes tendências gerais. Por um lado, existe um pessimismo que se limita a anunciar a morte do erotismo face a uma progressiva desumanização das relações interpessoais. Por outro lado, com uma reivindicação abstrata e massiva do gozo que se eleva acima da sua prática para se afirmar no discurso, valendo-se do imperativo do prazer como promessa de um mundo onde o exercício totalmente livre da sexualidade é possível.

Desejar em plena “agonia do eros”

A questão do gozo delineia um setor de intelectuais preocupados com o dilema sexual, que desde já excedem as elaborações feministas que em certo sentido marcaram a agenda, e que não têm como sujeito uma juventude hipersexualizada que rompe com cânones morais obsoletos, mas antes estão ancoradas no fenômeno da apatia erótica e da superficialidade dos laços interpessoais. Para além da pretensão de atribuí-las à estruturação da vida em torno das tecnologias de comunicação, como se fosse uma força autônoma onde a despersonalização é um preço a se pagar por desfrutar dos seus benefícios objetivos, há quem compreenda que se trata da expressão individual de uma atomização intersubjetiva que não apenas tem uma longa história, mas que também responde a interesses concretos. Em um contexto onde a precariedade da vida se traduz em um distanciamento do que nos é próprio, as vozes mainstream que começaram a ganhar relevância nos últimos anos, como a de Byung-Chul Han como expoente, estão plenamente inseridas no aparente paradoxo entre o pessimismo que conduz pensar em uma sociedade composta por indivíduos exaustos e impotentes [2] diante das investidas de um capitalismo desumanizante, e o aparente otimismo que reflete sua proposta de uma ruptura com o esquema erótico vigente por meio da recuperação da alteridade na interação social.

Mesmo àqueles, como Han, que ancoram seu discurso em avaliações abstratas, a vida cotidiana de milhares que não dispõem de tempo nem condições para um desenvolvimento afetivo real, exige uma resposta à questão do abandono do gozo. Muito da fama de Han, que ultrapassa os limites da academia e se apresenta – em grande parte contra sua vontade – como um filósofo acessível às massas, decorre de colocar nomes alarmantes em um problema visível. Fala de habitar superficialmente uma “mera vida”, um ensimesmamento desesperado pela única subsistência que impede direcionar o desejo para um fora de si, sustentada por jornadas de trabalho que restringem a vida fora do trabalho e assinam uma lógica de permanente atrito e competitividade que faz com que para o ser humano a única resposta afetiva não venha senão de si mesmo [3].

O fato de Han ter que abandonar o campo da abstração para pensar sobre a sexualidade ancorada na concretude cotidiana implica que ele tenha que abordar a expressão real do capitalismo atuando como o principal agente da restrição erótica. O confinamento narcísico em busca da subsistência individual expressa que o “apenas sobreviver” já é acessível a poucos, e que a exaustão que restringe o plano de gozo é absolutamente palpável.

No entanto, embora à primeira vista pareça que os grandes discursos pretendem se voltar para a concretude por pressão humana direta, é evidente que eles estão tentando salvaguardar uma aparência de combatividade que começa a se manifestar em todo o seu ceticismo. No que diz respeito aos discursos do desastre, como em Han, é relevante destacar como o giro imanente da atualidade se insere em uma lógica que constitui quase uma identidade dos novos pessimistas. Em Han, tal expressão se enquadra em um contexto tal que o pessimismo em que se insere tende a dar um giro para a imanência, traduzida em uma individualização das pressões sociais, incluindo aquelas inegavelmente compartilhadas, como as que se derivam das relações humanas. Quando Han afirma que “o sujeito do rendimento, como empresário de si mesmo, sem dúvida é livre na medida em que não está submetido a ninguém que o comande e explore; mas não é realmente livre, porque explora a si mesmo, por mais que o faça com plena liberdade” [4] mantém um duplo enclausuramento na imanência. Por um lado, o homem é o sujeito de seu rendimento independentemente de sua real exploração laboral, que ele abertamente decide deixar de lado para compreender a precariedade erótica, e sua limitação erótica está dada apenas pela internalização das restrições de um exterior abstrato. Por outro, está claro que, como afirma algumas páginas depois, a saída de tal autolimitação se dá exclusivamente dentro de si mesmo, buscando em si mesmo a afirmação da existência do outro, de modo que uma política do Eros aparece negada desde o início.

É, sem dúvida, necessário considerar que a superação daquilo que nos é permanentemente tirado no terreno da realidade requer além do mais um trabalho sem pausa em uma autoconsciência que, como consequência da desagregação do ser humano com respeito a suas interações sociais, não é a verdadeira consciência de si, mas do eu mesmo enviesado. No entanto, e ao contrário do que as tendências imanentistas parecem encerrar explícita ou implicitamente, pode-se pensar em efeito uma saída para fora, mas não como consequência da introspecção, porém o contrário. São as capacidades efetivas concretas da humanidade que a permitem pensar a si mesma. Está claro que conhecer os alcances do trabalho como transformador implica sair da esfera subjetiva e passar a pensar o ser humano como agente na realidade, mas não de tal forma esta seja produto de elaborações epistemológicas específicas. É, ao contrário, uma ruptura com o indivíduo agente da imanência, para que a ação seja realizada pelo sujeito social como o único capaz de intervir naquele exterior que intimida os pessimistas e os leva a se dirigirem a si mesmos como o limite do possível. Nenhuma imanência, portanto, constrói perspectivas para a ação; o maior escopo possível do ensimesmamento reside na plena compreensão individual de si, mas resulta em todo sentido impotente se tal compreensão não resultar na recuperação de nossas próprias capacidades intrínsecas de intervir no curso dos acontecimentos.

A ação nos marcos do pessimismo

A crítica central a Han nesse sentido é que a virada imanente aparece não no princípio, como um pontapé para o desenvolvimento de um método, mas em seu flanco mais propositivo. Se a sua intenção é impulsionar um sujeito que sai de si mesmo, entendendo a alteridade como um valor insuprimível para o desenvolvimento do erotismo, mas que usa como via a introspecção e a distância das tendências sociais “mais corrosivas para o pleno desenvolvimento de sua humanidade”, encontra-se de mãos atadas. Seu sujeito erótico continua sendo vítima da retração individualista que ele critica como arma fundamental desse sistema, e sua abertura a uma certa alteridade depende inteiramente de que as relações sociais que os indivíduos envolvidos estabelecem disponham das condições necessárias, a saber: ter suas necessidades básicas resolvidas para poderem ser independentes do que Han entende como mera vida e, como consequência dessa segurança econômica, ter os recursos para dedicar tempo à reflexão sobre o “voluntário esvaziamento de si mesmo” [5].

O problema de Han para o estabelecimento de um sujeito é que se trata de um indivíduo disfuncional para levantar um processo de ruptura com o sistema que impede seu pleno desenvolvimento, não apenas por encerrar por si um problema estratégico para tal fim, mas porque a perspectiva do sul-coreano é antes de mais nada cética de uma sociedade diferente. Um sujeito que supera as barreiras da limitação erótica capitalista, atomizante e agente de uma desumanização que aflora em toda a sua crueza nas misérias que o sistema oferece, não o faz, como a própria realidade mostra na sua história, para romper com as bases dessa limitação, mas sim para que quem possa se permitir consiga saltar para uma fase que ultrapassa as atuais formas de vínculos.

Um indivíduo isolado, que encontra as suas capacidades de ação cerceadas, entende a imanência como factível em termos de uma resistência cuja impotência não é a única coisa óbvia, mas também a sua inaplicabilidade, apenas partindo de fazer uma leitura do sistema de opressões onde as forças operantes se diluem no modo em que cada indivíduo adota suas restrições. Conseguindo destacar os mecanismos concretos pelos quais a vida e as relações interpessoais são precárias, tanto Han quanto toda reivindicação impessoal de gozo optam por entender o capitalismo como uma força que carece de incidência exceto ideologicamente, sem considerar a dimensão econômica real que lhe dá força e benefício. A forma pela qual seu afeto é compreendido no cotidiano é a adoção individual de parâmetros comportamentais estabelecidos, chegando a tal ponto que Han se permite denunciar o papel da jornada de trabalho na impropriedade com que se vive a vida afetiva sem mencionar quem se beneficia de enquadrar toda interação social em sua função estritamente produtiva, nem como a exploração internalizada só é possível se ela responde a uma determinação social e econômica que ultrapassa o ser humano. Só diluindo responsabilidades concretas é possível propor “rupturas” segmentadas, movidas por uma dignificação parcial da vida, por meio de tentativas de resistência a um poder sem rosto. Nomear, como grande parte dos atribuídos a uma outra necessidade de retorno ao gozo, o capitalismo como agente, não basta. Se o capitalismo é um conceito que cumpre a função de abarcar múltiplos tipos de violência, à maneira de um quadro ideológico que determina toda a vida, se deturpa o modo como o indivíduo fica preso na fetichização de suas próprias relações de trabalho que lhe permite naturalizar sua própria mercantilização. Justamente não ver que o único beneficiário dessa separação do que pertence genericamente ao ser humano é aquele que concentra em si a acumulação de lucros é um dos grandes sucessos desse sistema, e o que leva Han a pensar que não é capaz de postular uma ação coletiva. Se a internalização dos valores capitalistas é tida como a única forma de restrição à cotidianidade, o inimigo nada mais é do que uma porção do próprio eu que se combate saindo de si em busca de uma alteridade que permita ensaiar um erotismo autêntico [6]. Não é viável pensar em uma projeção de desejo fora de si se ainda há um “eu” a recuperar, se a vida a que se pode ter acesso está parcializada e a própria natureza social interativa do ser humano é alheia na medida em que sua sociabilidade se reduz às margens da troca. O que parece um abandono gradual da abstração é, na realidade, uma resposta conjuntural, onde a realidade da maioria ainda não surge como uma variável que determina as múltiplas formas de vínculos. E, claro, tampouco entra em consideração a organização das mulheres em prol da constituição de uma nova sexualidade, que determina a tendência mais otimista, e que na verdade é uma tentativa real de pensar socialmente a superação da restrição erótica.

Uma tendência oposta?

Partindo do mesmo sujeito individualizado e em crise quanto às suas próprias possibilidades transformadoras de interação social, como fruto das relações de trabalho que se valem da atomização de seus trabalhadores, surgem de diferentes latitudes leituras abertamente otimistas sobre o futuro sexual de uma juventude que, estando aparentemente restrita à sua individualidade como campo de ação, converte-a no mais alto nível de resistência contra a apatia indevida. Desde o feminismo, em particular, a valorização do prazer como um objetivo desejável em si mesmo se apresenta como uma afirmação proto-revolucionária que muda a forma como as mulheres combatem a multiplicidade de opressões que caem sobre nossas costas diariamente. Embora, como adverte Luciana Peker, uma das principais referências argentinas do feminismo do gozo, não se trata da reiteração de esquemas sexuais mercantis onde o corpo feminino é um produto intercambiável, mas de uma abertura para uma “desconstrução do desejo”, a encruzilhada quando se trata de pensar sobre uma práxis sexual diferente, não está muito longe daquela do pessimismo. Onde está o agente de atomização afetiva e de diferenciação entre homens e mulheres nesse processo? De que forma é possível romper, por meio da proposta compartilhada de constituição de uma intersubjetividade real e motorizada pelo afeto genuíno, o cerco da individualização? E acima de tudo, se os interesses dos fiadores dessa falta erótica não são esclarecidos nem há mais sujeito do que o indivíduo e sua vida isolada para contrariá-los, o que ambas as tendências têm para aqueles que, após tentativas frustradas de uma performatividade alternativa, descobrem que os fatores condicionantes de sua sexualidade estão fora de si mesmos e fora do círculo egocêntrico da interação entre poucos pares?

Está claro que o que se apresenta de forma oposta acaba sendo semelhante quando se trata de esclarecer os agentes concretos por trás da dinâmica sexual privativa, bem como às possibilidades autênticas de combatê-la. É preciso, no entanto, diferenciá-los de acordo como influencia – ou não – o movimento de mulheres no momento de problematizar a vida erótica. O feminismo do gozo, como se reivindica desde autoproclamação como tal, embora dilua sua agência na internalização individual de cânones restritivos como se não fosse institucional e sistematicamente sustentado, encontra no patriarcado um responsável direto pela atomização sexual. Da mesma forma, e consequentemente com uma visão que vem da demanda das mulheres na rua, encontra justamente na organização das oprimidas uma vertente muito mais real do que um indivíduo separado de sua concretização de agente [7]. Em outras palavras, fica evidente como uma tendência que vem de dentro das demandas concretas precisa sustentar o sujeito das demandas no centro de sua estratégia. Porém, encontra-se uma contradição inerente a qualquer proposta que, tomando como pontapé o movimento de mulheres, acaba encontrando na “desconstrução” ou em uma gradativa performatividade alternativa os limites do passo para a ação, que nada mais é do que a pretensão de resolver individualmente um problema cuja dimensão social já foi afirmada. O resultado de tal contradição é claro: resistir aos ataques do patriarcado com práticas reduzidas ao setor que pode realizá-las não exige buscar responsáveis materiais concreto pela desagregação sexual que todas pessoas sofrem e cujas consequências nós mulheres pagamos mais do que qualquer coisa, nem ratificar uma ação de massas que questione o capitalismo como fiador da alienação do que nos é própria em todos os aspectos da vida cotidiana. Sinteticamente, apresenta-se como a abertura a um feminismo que, como no caso de Virginie Despentes [8], uma de suas principais bases teóricas, pode apresentar a si mesma como uma crítica do capitalismo, elevando-se acima das formas com que efetivamente ele atua e oferecendo o plano da desobediência individual como a mais avançada das possibilidades, mesmo admitindo que a restrição sistemática transcende o cotidiano de cada sujeito particular.

Pode-se dizer, portanto, que para um feminismo do gozo, que se pretenda ou não anticapitalista, o enclausuramento do sujeito em si mesmo (ou em si mesma) em resistência é um limite que reduz a batalha à uma luta por paliativos individuais, que além disso, quando a realidade pressiona e os inviabiliza por falta de tempo ou de ferramentas para sustentar uma prática contraditória com uma subjetividade moldada pela desumanização, ou bem insiste em sua práxis tornando também desumanizante, ou bem se resigna a um pessimismo que encurta muito mais a distância com a tendência que, como começa a ser percebida, não é totalmente antitética.

Nem resignação à prática individual nem fuga à abstração

Ambas as tendências não esgotam todo o panorama da discussão sobre o desejo, mas são tidas como expressões gerais de uma nova onda de questionamentos da vida privada que resulta em tentativas reais que seguem em debate com experiências como “poliamor”, o lesbianismo político, e outras formas que buscam constituir-se como alternativa a uma norma restritiva. É preciso ter em mente que há respostas de fato para a necessidade de discutir as práticas sexuais, mas a partir de críticas sem agente, elas ficam, em certo sentido, imobilizadas. Uma nova leitura dos quadros relacionais inseridos em um mecanismo sistemático de desumanização ganha força rapidamente quando a vida da maioria mostra a relevância dos efeitos subjetivos da precariedade, mas está a meio caminho quando é encarnada em uma proposta que não vai além do cuidado afetivo do outro sem levar em conta as desigualdades estruturais que limitam qualquer tentativa de ruptura com a forma sexual tradicional. Em última instância, e como consequência de um fechamento metodológico à consideração das evidências concretas oferecidas pela realidade, as políticas sexuais de inovação acabam se baseando na reiteração, sob outra perspectiva, das dessemelhanças de gênero. As consequências de não se levar em conta que as propostas de realização erótica individual surgem de um recorte segmentado do mundo que vem da reflexão imanente e não da experiência social não são a impossibilidade de colocar em prática testes antes anárquicos – em termos de eliminação de toda determinação formal nos vínculos – mas uma vez realizados o fardo de continuar a reproduzir a lógica individualista recai inteiramente e de forma silenciosa sobre as mulheres e os dissidentes. É continuar buscando formas de se adaptar a uma dinâmica sexual de acordo com uma forma mercantil, onde os corpos das mulheres são intercambiáveis sob a premissa abstrata do prazer sem restrições, uma exigência que não se sabe como, se as necessidades básicas não estão resolvidas para a maioria, nós mulheres suportamos essa pressão econômica e os sentidos comuns que a acompanham. Não se trata de tentar, nas condições que o capitalismo oferece “muito generosamente” saídas do automatismo erótico a que somos submetidos pelos ritmos laborais de exploração que não são suficientes para garantir a subsistência em múltiplas experiências distantes dos critérios familiares tradicionais. Trata-se de compreender como a realidade é particularmente hostil para com as mulheres, e que não se resolve com uma resistência perpétua sustentada em provas contra a corrente, que pressionam desde múltiplos flancos de opressão e exploração.

Falar em gozo não implica, portanto, falar em buscar caminhos para a realização erótica. O problema de quem, reivindicando-se pessimista mesmo velado, retornam sobre a questão erótica, é, principalmente, a oferta de paliativos que não são tais, que revelam a profundidade do ceticismo quanto às possibilidades reais de apropriar-se da dimensão do prazer. E que, sem atentar para a real ancoragem das opressões, oferece tentativas frustradas, mudanças introspectivas e uma duplicação tanto do trabalho para neutralizar os efeitos da precariedade erótica como da frustração ante seu fracasso, que se dirige socialmente às mulheres como responsáveis por construir novas afetividades com base em um “permanecer suportando”.

Aqueles que hoje retomam o problema do gozo sem enquadrá-lo na impossibilidade material que determina sua realização não pode ir além de uma individualidade introspectiva. Sem se apoiar nas formas embrionárias de coordenação entre todos os setores que não querem abrir mão de aspectos fundamentais de sua vida cotidiana, só pode crescer uma visão cética sobre as possibilidades inerentes à humanidade de tomar parte de sua própria história. Trata-se de sair do campo da abstração que constrange o desejo entre variantes de resignação, tendo como pontapé o único método que o recolocou na ordem do dia: a organização de milhares para a restituição do que é sistematicamente retirado de nós.

 
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