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A 54 anos do seu assassinato: Che Guevara contra a quinta roda do imperialismo
Facundo Aguirre

Esta nota foi originalmente publicada no La Izquierda Diário argentino.

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A figura de Ernesto Che Guevara simboliza o ideal da rebeldia contra a injustiça e da revolução contra a ordem dominante. Em qualquer lugar do mundo, sua imagem estampada em camisetas, pôsteres ou bandeiras acompanha as mobilizações sociais como um estandarte.

Che Guevara ultrapassou as fronteiras da morte para transformar-se em um mito. E, como todo mito que desperta esperança nos explorados, sua figura é utilizada por movimentos políticos hostis ao que Che defendia em vida. Por exemplo, pelos partidos comunistas que, em seu tempo de vida, foram inimigos do questionamento pela esquerda que o guevarismo representava. O chavismo, que significou uma reedição do nacionalismo burguês, o incorporou como parte da herança do autoproclamado “socialismo do século XXI”. O kirchnerismo na Argentina, por sua vez, colocou a figura de Che na Galeria dos Patriotas, enquanto mantinha suas forças de ocupação no Haiti a mando da política imperialista.

Quanto à razão da tentativa de apropriação da figura de Che, é preciso buscá-la na necessidade dos reformismos e dos políticos burgueses “nacional-populares” ou “progressistas” de tomar para si o símbolo das lutas revolucionárias e anti-imperialistas e, assim, esconder em seu discurso as suas capitulações ao imperialismo e à premissa de harmonia entre o capital e o trabalho. No entanto, na América Latina, a Revolução Cubana demonstrou há muito tempo que apenas o poder dos trabalhadores e campesinos pode derrotar o imperialismo, e que não há lugar algum para a colaboração com as burguesias nacionais.

A derrota ideológica do reformismo

Um dos profundos significados da Revolução Cubana foi ter expressado uma derrota ideológica contundente do dogma stalinista da “revolução em etapas” e da conciliação de classes com a burguesia na América Latina. Tornou clara a impossibilidade, como sustenta a teoria da revolução permanente, de que a burguesia nacional pudesse cumprir as tarefas de libertação nacional do imperialismo e de transformação revolucionária da propriedade de terras.

Até a Revolução Cubana, era hegemônica entre a esquerda a ideia stalinista que proclamavam os Partidos Comunistas, de que a revolução social na América Latina não era possível, atuando contra ela. Os PCs defendiam que em nossos países era necessária uma revolução antifeudal e anti-imperialista que necessariamente deveria ser encabeçada pela burguesia nacional. A classe operária e o campesinato deveriam subordinar seus interesses aos da “causa comum” com a burguesia e reduzir seus objetivos, conquistando certa democracia formal e algumas reformas sociais. A esquerda teria, para tal fim, que se aliar politicamente aos partidos burgueses democráticos e, no melhor dos casos, nacionalistas. Como consequência, a violência revolucionária, a insurreição, a independência de classe e a revolução socialista estavam longe do horizonte militante desta esquerda.

A experiência cubana foi um importante golpe contra este tipo de concepção. Em Cuba, a política original de aliança com a burguesa do Movimento 26 de Julho (M26) havia voado pelos ares, e a revolução expropriava o latifúndio e as fábricas das mãos dos capitalistas.

Por sua vez, a Declaração de Havana que defendia que “o dever de todo revolucionário é fazer a revolução” era um golpe contra a política dos partidos comunistas de conciliação com a burguesia, contra a coexistência pacífica pregada por Moscou e contra a subordinação das massas ao nacionalismo burguês.

Guevara e a luta contra a burguesia nacional

Che Guevara foi contrário ao etapismo e, consequentemente, um ferrenho opositor a depositar qualquer confiança na burguesia nacional. Havia passado pela experiência na Guatemala do nacionalista Jacobo Árbenz, que fora derrotado pelo coronel Carlos Castillo Armas, apoiado pelos EUA, em junho de 1954. Com seus próprios olhos, Che assistiu à capitulação de um governo progressista que se negou a resistir à reação e a armar o povo trabalhador e campesino; Perón fez o mesmo diante do Golpe Gorila em 1955 na Argentina, e o preço desta capitulação vergonhosa foi pago pela classe trabalhadora e o povo pobre.

Durante a Revolução Cubana, o M26 buscou governar junto à burguesia opositora a Fulgencio Batista, com quem havia firmado o Pacto de Caracas. Desde o início, Che se opunha a tal pacto. No entanto, foi o desenvolvimento da revolução que alinhou a burguesia e os proprietários de terra ao imperialismo, antes que fosse possível uma revolução que melhorasse, às suas custas, as condições de vida do povo.

A conclusão de Che foi de que “Nas atuais condições históricas da América Latina, a burguesia nacional não pode encabeçar a luta antifeudal e anti-imperialista. A experiência demonstra que em nossas nações, esta classe, mesmo quando seus interesses são contraditórios com os do imperialismo ianque, foi incapaz de enfrentar-se com o mesmo, paralisada pelo medo da revolução social e amedrontada pelo clamor das massas exploradas” (E. Guevara, A Guerra de Guerrilhas).

Revolução agrária e libertação nacional

Para Che, a revolução latino-americana enfrentava a burguesia nacional em seus motores fundamentais: a luta contra o imperialismo pela terra.

Explicando a revolução agrária em Cuba, defendia que “Na Reforma Agrária, estão apresentadas as condições da luta pela libertação do país e também os grandes dilemas que esta Revolução evidenciou. [...] Quais eram estes dilemas? [...] Nossa Revolução vai contra o antigo direito de propriedade; irá rompê-lo e aniquilá-lo, porque nossa Revolução é, acima de tudo, antifeudal e antilatifundiária, e deve romper primeiramente com estas relações sociais… Agora, ao fazer esta Reforma Agrária [...] tivemos o primeiro e mais sério dos choques contra os capitais estrangeiros que haviam se apossado do território nacional…” (Discurso no Banco Nacional, 29 de janeiro de 1960). Como se pode ver, Che compreendeu que a revolução agrária enfrenta não apenas o latifúndio, como também o direito de propriedade e o próprio imperialismo, personificado no capital estrangeiro. Além disso, compreendeu que a burguesia nacional não poderia constituir um freio à dominação imperialista e chamava a opor a revolução socialista à liderança da burguesia nacional: "As burguesias autóctones perderam toda sua capacidade de oposição ao imperialismo, se é que a tiveram algum dia, e não são nada além de suas seguidoras. Não há mais trocas a fazer; ou a revolução socialista ou a caricatura de uma revolução” (Mensagem aos Povos do Mundo Através da Tricontinental).

A quinta roda

O chavismo, o kirchnerismo, os progressismos latino-americanos, todos partidários da conciliação de classe, são agentes políticos de uma pretensa burguesia nacional e, portanto, a quinta roda do imperialismo.

O kirchnerismo que se colocava na Argentina como oposição à ofensiva reacionária dos anos de governo Macri soube ser um bom agente do imperialismo. Em vida, Néstor Kirchner foi responsável por apresentar o pagamento da dívida externa ao capital financeiro como um ato de soberania. Foram impulsores da colaboração direta com a política exterior estadunidense, como no Haiti ou elevando como política de Estado as acusações do falecido Alberto Nisman contra o Irã. O governo de Cristina Kirchner levou adiante a entrega dos recursos minerais e petrolíferos aos tentáculos imperialistas, assim como apoiou copiosamente patronais estrangeiras como Lear e Gestamp contra os operários que lutavam por seus direitos, como uma mostra de sua submissão. E hoje, após quatro anos de macrismo e o aumento da dependência do FMI, o governo de Alberto Fernández faz acordos com este organismo para pagar a dívida ilegal e fraudulente, enquanto aplica ajustes aos trabalhadores e aos setores populares.

A tarefa da libertação nacional e social segue pendente, e apenas poderá ser conquistada por uma classe operária que rompa politicamente com os representantes da burguesia nacional, levando a cabo uma revolução que construa o poder dos trabalhadores e campesinos.

 
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