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Debate
Congresso do PSOL vota subordinação à política do PT
Vitória Camargo

Ocorrido em 26 e 27 de Setembro, o 7° Congresso do PSOL aprofunda a crise estratégica e política pela qual passa esse partido, em sua rápida perda de sentido de existência em face à subordinação à política do PT.

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No país da fome e dos mais de 600 mil mortos, governado por Bolsonaro, e diante das eleições de 2022, com Lula reabilitado com seus direitos políticos pelo regime golpista e à frente das pesquisas eleitorais, apresenta-se um cenário que tem aprofundado as crises do PSOL. Somente neste ano, duas de suas principais figuras romperam pela direita, atestando a “inviabilidade” do partido, tanto para poder abraçar diretamente o PT, no caso de Jean Wyllys, quanto o golpista e burguês PSB, no caso de Marcelo Freixo. O que as resoluções do 7º Congresso do PSOL confirmam, em meio a polêmicas e divisões no plano da tática, é que esse partido votou por aprofundar seu caminho de diluição no PT e avançar em sua perda de sentido de existência.

Debateremos aqui com ambas as alas do PSOL que se expressaram no Congresso. Mas, em relação à ala majoritária do partido que defendeu essa subordinação política ao PT de forma contundente, é necessário um chamado a que rompam com essa política. À ala que não aprovou a resolução vencedora, na qual se encontram companheiros e companheiras do ex-Bloco de Esquerda Radical do PSOL, com algumas correntes que hoje compõem a Oposição de Esquerda ou o Movimento de Esquerda Radical, e também a todas e todos os ativistas que defendem verdadeiramente a bandeira do socialismo, chamamos, apesar de nossas divergências, a que busquemos experiências de articulação e unidade real a serviço da luta de classes, com o objetivo de impulsionar a reorganização da vanguarda à altura dos nossos desafios no próximo período.

Foi nesse sentido que respondemos afirmativamente ao chamado que o PSTU e outros lutadores fizeram quanto à necessidade de um polo socialista no Brasil e também chamamos as organizações de esquerda a construir blocos classistas no último 2 de Outubro. Achamos que é preciso unir nossas forças no sentido da resistência aos ataques do governo de Bolsonaro e Mourão, de todo o regime e dos patrões, exigindo das centrais sindicais pela unidade de classe de que precisamos, bem como pela solidariedade e coordenação das lutas que surjam. Essa é uma tarefa urgente à qual precisamos avançar em unidade.

Um partido com sentido de existência nas eleições: com Lula e a direita neoliberal

Como costuma se dar no caso de partidos cujo centro é a intervenção nas eleições, a principal polêmica que permeou o 7º Congresso do PSOL foi em torno da tática eleitoral para 2022. Há, basicamente, duas alas no partido. De um lado, o bloco “PSOL de todas as lutas”, formado pela Primavera Socialista (corrente de Juliano Medeiros, presidente do PSOL), Revolução Solidária de Boulos, Resistência de Valério Arcary e parte da Bancada Feminista de São Paulo, Subverta e Insurgência. De outro, o chamado bloco da “Oposição de Esquerda”, composto pelo MES de Luciana Genro e Sâmia Bomfim, APS, CST, LS e Fortalecer. Com 56% dos delegados, o primeiro bloco, que defendia não lançar candidatura presidencial e, na prática, estar com Lula desde o início, saiu vencedor. Mas o que está por trás dessa decisão?

A resolução eleitoral vencedora no Congresso começa reafirmando a luta do PSOL pelo impeachment de Bolsonaro e sua inelegibilidade, com a ressalva de que “isso depende de fatores que não estão totalmente sob controle”, mas afirmando que o partido tem feito sua parte lutando pela unidade da oposição "no Congresso Nacional” e nas ruas. Em seguida, postula etapas: em primeiro lugar, derrotar Bolsonaro em 2022, e, “a partir de 2023”, “lutar pela superação da profunda crise social, política, econômica, sanitária e ambiental”. Portanto, defende que o PSOL não apresente uma pré-candidatura porque, para assegurar a derrota da extrema direita, precisa da unidade entre os “setores populares”. Segundo a decisão majoritária, “esse processo de diálogo deve envolver elementos programáticos, arco de alianças e não pode ser uma via de mão única”.

Na prática, sem projeto próprio, toda a política do PSOL está desde já subordinada às alianças e ao programa que a candidatura de Lula vai costurar para 2022, enquanto a crise imposta pelos capitalistas e suas instituições no regime, que gera fome e desemprego, ficaria “na geladeira”, para ser “enfrentada” apenas em 2023. Inclusive, partidos como o PSB de Freixo e Tábata Amaral, que votaram e implementaram reformas como a da Previdência, assim como o PDT de Ciro e a golpista Rede de Marina, além do próprio PT e PCdoB, tiveram espaço para participar e saudar a abertura do Congresso do PSOL, após já terem sido parte do arco de alianças eleitorais desse partido em suas candidaturas em 2020.

Agora, em nome da “governabilidade”, o PT busca a frente eleitoral mais ampla possível, com a direita neoliberal apoiadora do golpe de 2016, com um Lula que busca Kassab, Sarney e demais caciques do Nordeste, com pontes de diálogo no Centrão e no agronegócio inimigo dos indígenas, assim como nas Igrejas evangélicas, elogioso a empresárias como Luiza Trajano. Assim, como um satélite do PT, o PSOL será parte não somente de ajudar a revitalizar as ilusões das massas no projeto de país do lulismo, que foi responsável por abrir espaço ao golpe e à extrema direita, agora em uma situação de crise mais aguda. Mas principalmente legitimará, cobrindo pela esquerda com um nome “socialista” (sic), alas burguesas ajustadoras. Sobre isso, evidentemente, a resolução congressual vencedora não tem o que dizer, e já está claro que o PSOL estará bastante distante de uma “Frente de Esquerda” com Lula e um programa anticapitalista, metas que existem somente nos delírios ilusórios e oportunistas de correntes como a Resistência. A verdade é que o que não se verá serão os interesses dos “setores populares” nessa frente.

Isso se expressa desde já na política do PSOL. A questão é: o que agora se debate em termos de “unidade de ação” com partidos da burguesia opositora a Bolsonaro, iludindo as massas de que a saída para crise se dará com atos ordeiros a cada um mês, junto à direita que nos ataca, por um impeachment que colocaria Mourão no poder; para 2022 se discutirá em termos de alianças eleitorais, as mais amplas que o PT conseguir, para governar perdoando os ajustes e avançando em novos ataques. Ou seja, desde agora, essa legitimação de uma franja de partidos opositores, mas que votaram todos os ataques com Bolsonaro e têm interesses opostos às massas que passam fome, está a serviço de Lula 2022.

Isto é, sem força para enfrentar eleitoralmente a extrema direita e ser uma alternativa para administrar o Estado capitalista, cada vez mais, a majoritária do PSOL decide recorrer a Lula, às figuras do PT, ao programa do PT, à campanha do PT, às alianças espúrias do PT… Para isso, já existe o PT. Não se sabe para que de fato serve a existência do PSOL com essa política levada pela direção majoritária.

Uma oposição na tática, mas unificada no projeto de partido

Isso não significa que o bloco derrotado no Congresso do PSOL, encabeçado pelo MES, que veio defendendo uma candidatura própria com Glauber Braga, representasse uma alternativa de independência de classe à política de subordinação ao PT pela majoritária. Apesar da importância da defesa de uma candidatura própria no plano da tática, essa ala restringiu suas diferenças a esse terreno eleitoral, inclusive garantindo, de antemão, que, caso Lula pudesse ganhar no primeiro turno, retiraria a candidatura. A verdade é que a pré-candidatura de Braga não apresentou um programa que apontasse a um projeto de país de fato alternativo ao lulismo, que combatesse o programa e as alianças petistas.

Pelo contrário, com longa trajetória na política burguesa, do PSB ao apoio à neoliberal Marina Silva, o programa de Braga, apesar de dizer abstratamente que pretende “superar a exploração capitalista”, não se propôs nem mesmo a enfrentar o regime político do golpe institucional, que marcou os últimos anos da história do país, significando mais autoritarismo judiciário e ataques. Essa inflexão foi cabalmente ignorada em sua plataforma. No máximo, Braga apresentou um programa pequeno-burguês, contra o rentismo e neoliberalismo, que não se choca com os principais mecanismos de subordinação do Brasil pelo imperialismo, como a dívida pública, legitimando-a em grande parte - uma dívida que o PT pagou fielmente em seus 13 anos de governo. Ao contrário do que diz a CST, o programa de Braga passa longe da batalha pela independência de classe, que, nesse caso, é apenas “organizativa” (uma candidatura por um partido diferente), mas não política, sendo uma réplica "de esquerda" do programa petista.

Um programa para enfrentar os ataques capitalistas não pode esperar até 2023, como quer o PSOL. Esse debate foi um grande ausente do Congresso, em um momento em que o alto custo dos alimentos, o desemprego e o trabalho precário exigiriam que qualquer partido que se reivindique socialista debatesse seriamente qual programa oferecer às massas contra o lucro capitalista, como o reajuste automático dos salários de acordo com a inflação, a divisão das horas entre empregados e desempregados, sem redução salarial, o não pagamento da dívida pública, etc. A ausência de qualquer debate programático é mais uma expressão da subordinação desse partido ao PT, que, na prática, se expressa quando o PSOL administra cidades, como no caso de Belém com Edmílson. Chegou ao ponto de congelar salários e ameaçar uma Reforma da Previdência, para não enfrentar a lei de responsabilidade fiscal e todos os mecanismos de subordinação dos orçamentos aos lucros dos banqueiros. Para que serve um partido de esquerda que aplica o programa da direita, em nome da governabilidade? Também para isso já existe o PT.

Além disso, hoje por hoje, tanto a ala majoritária, quanto a ala que foi derrotada no Congresso, estão unificados em torno do impeachment e convivem pacificamente com as burocracias sindicais, dirigidas majoritariamente pelo PT e pelo PCdoB, responsáveis por manter a ordem no país e desmoralizar as forças dos que querem enfrentar Bolsonaro seriamente. Nenhuma dessas alas está disposta a unir forças para exigir das centrais sindicais uma unidade de classe, a frente única operária, capaz de unificar os interesses dos trabalhadores, das mulheres, negros, indígenas, LGBTs e juventude, desenvolvendo um plano de luta para avançar a uma greve geral contra Bolsonaro, Mourão e todos os ataques.

No lugar disso, a ala majoritária comemora a “unidade de cúpula” com as centrais sindicais, agora batalhando pela inclusão da direita, e, por consequência, a exclusão das massas trabalhadoras, sem auto-organização desde cada local de trabalho e estudo e isolando os focos de resistência que estão surgindo. Isso tem coerência com a tática eleitoral votada, já que exigir das centrais que o PT dirige e enfrentar os ataques neoliberais poderia minar possibilidades de alianças eleitorais com esse partido e a direita. Por sua vez, buscando novamente uma separação organizativa, o MES chegou a construir, com os stalinistas da UP e do PCB, a Assembleia Povo na Rua, mas que não se baseou de fato em buscar aglutinar todos os setores que querem exigir um plano de lutas das centrais e impulsionar a auto-organização, e sim não passou de uma diferença de calendários e sem construir espaços democráticos abertos à vanguarda, que pudessem transformar esse setor em um polo orgânico alternativo às direções majoritárias. Por isso, reforçamos nosso chamado a colocarmos um polo anti-burocrático de pé.

Desse ponto de vista, apesar das diferenças centradas na tática eleitoral, o MES e esse bloco não defendem um projeto de partido e uma política verdadeiramente independente do PT e do regime político, ou seja, não é de independência de classe, já que não tem como centro se enraizar nos locais de trabalho, estudo e movimentos sociais construindo correntes revolucionárias e anti-burocráticas, com um programa para que os capitalistas paguem pela crise, e termina se adaptando ao limite do PSOL de ficar no terreno de como se posicionar melhor eleitoralmente, dirigido por figuras e sem nenhuma aposta na luta de classes ou questionamento de fundo ao projeto de partido que leva a tamanha diluição no petismo. Assim, esse setor do PSOL vai se debilitando dentro do partido, que vai sendo cada vez mais hegemonizado pela avalanche lulista e por setores oportunistas que querem uma política ainda mais eleitoralista e sem lastros numa perspectiva socialista.

A Frente de Esquerda e dos Trabalhadores - Unidade argentina e o Congresso do PSOL

Ambas as alas do PSOL, em última instância, alimentam a terrível ilusão nas massas de que a extrema direita vai ser derrotada em 2022, diante do resultado eleitoral, sem ver que não somente persistirá um setor de massas da extrema direita, mesmo se Bolsonaro for derrotado nas eleições, mas também uma aguda crise social e econômica que imporá condições completamente distintas para um possível governo Lula. Lula terá de aplicar ajustes, como estamos vendo com Alberto Fernández na Argentina, numa situação econômica nacional e mundial muito distinta da que atravessou a América Latina na década de 2000.

A subordinação do PSOL ao PT, ao contrário de preparar a classe trabalhadora e todos os setores oprimidos para enfrentar seriamente a extrema direita e a crise desde já, na prática as desarma e abre espaço para que suas ilusões no projeto petista hoje, justificadas pelas péssimas condições de vida no governo Bolsonaro, tornem-se derrotas, desilusão e desmoralização.

Esse é o oposto do que faz a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores Unidade (FITU) argentina, diante do governo peronista. Lá, onde diferentemente do Brasil, ainda não se desenvolveu uma extrema direita como o bolsonarismo, a Frente de Esquerda tem conseguido fincar uma posição como terceira força nacional, com uma política e programa claros de independência de classe. Ou seja, ter um projeto claramente socialista e revolucionário, que se ancora em uma força orgânica por baixo, com centro nas lutas, elevou a influência política da FITU e permitiu que a Frente de Esquerda se posicione melhor diante das rupturas com o peronismo fruto de seus ajustes, sob as botas do FMI, e da quebra de expectativas com o reformismo em tempos de crise. Esse é o oposto do caminho que trilha o PSOL. A FITU é uma experiência única que não foi nem mesmo mencionada na resolução internacional do Congresso, já que o PSOL caminha para o lado oposto (para o lado dos reformistas do Podemos espanhol, que acabou dilacerado depois de conformar um governo nacional com o PSOE).

Precisamos construir um partido revolucionário internacional, que se forje no calor das experiências mais avançadas da luta de classes e das batalhas pela independência política dos trabalhadores, que é o que nós da Fração Trotskista batalhamos na Argentina, Chile, França e diversos países, numa luta por um Movimento por uma Internacional da Revolução Socialista. Um partido revolucionário no Brasil terá que surgir de um processo que supere a fragmentação da esquerda socialista brasileira em várias pequenas alternativas que não se consolidam com peso e independência de classe à esquerda do PT. Neste momento, consideramos que, a batalha política correta nesse sentido no Brasil, passa pela luta pelo fora Bolsonaro e Mourão e para impor uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, contra todo o regime. Num processo como esse, os capitalistas não assistiriam de braços cruzados à defesa de um programa para as maiorias exploradas e oprimidas, contra seus interesses, e o impulso à auto-organização abriria espaço à batalha por um governo de ruptura com o capitalismo. Essa é nossa perspectiva.

 
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