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230 anos da Revolução do Haiti
Os Jacobinos Negros e a luta pela liberdade, há 230 anos da Revolução do Haiti
Renato Shakur
Estudante de ciências sociais da UFPE e doutorando em história da UFF

Hoje se completa 230 anos da Revolução do Haiti, uma revolução dirigida e impulsionada por negros escravizados que impôs a França o fim da escravidão e inspirou e incendiou revoltas por todo mundo atlântico, mas não só. Ainda hoje é uma fonte inesgotável de inspiração e de como os negros e negras podem ser inspirar para lutar contra o capitalismo e o racismo.

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Há 230 anos atrás as plantações na colônia de São Domingos amanheceram queimadas, a vasta propriedade de brancos escravistas foram atacada por negros revolucionários que a partir daquele dia, 21 de agosto de 1791, não daria nem sequer um passo a trás na luta por sua liberdade. Tinha início uma das mais brilhantes histórias da humanidade, uma revolução de negros contra a escravidão.

Quem narra esses acontecimentos foi C.L.R. James em sua obra “Os Jacobinos Negros”, onde minuciosamente expõe o desenvolvimento dessa luta desde as revoltas e as tensões entre os proprietários e burgueses seja na colônia ou na metrópole francesa. Esse marxista negro e fundador da IV Internacional Comunista junto a Leon Trotski, deu muita ênfase no papel revolucionário que os negros cumpriram na luta por emancipação e pelo fim do cativeiro. A IV Internacional via como fundamental conhecer os processos históricos em cada país e as demandas democráticas dos negros, das mulheres e dos povos oprimidos, tanto James, como Trotski e outros trotskista sempre foram comprometidos em refletir profundamente a questão negra no nível de importância que ela no terreno da luta de classes, como parte da revolução proletária em países capitalistas centrais como os EUA. Sem sombra de dúvidas, “Os Jacobinos Negros” fazem parte fundamental desse legado.

Precisou os momentos cruciais dos debate da Assembleia Constituinte na França e como os negros iam se armando e se organizando frente ao desfecho mais provável entre os burgueses de ambos os lados do Atlântico que era de conferir direitos políticos aos negros livres e manter a escravidão intacta. Nesse processo, surgiram líderes revolucionários genuínos, Toussaint L’ouverture e Dessalines são apenas dois de uma série de outros que lideraram revoltas, exércitos inteiros e entregaram a vida pela liberdade.

A luta pela liberdade vinha de antes, a medida que se aproximava os dias da revolução mais e mais negros escravizados fugiam para os quilombos, a intensidade dessa atividade era um termômetro de que algo mais profundo estava sendo construído. Nem mesmo as revoltas e organização de contingentes massivos para degolar, envenenar e se rebelar contra seus senhores foi algo exclusivo da revolução. Essas formas de resistência vinham de bem antes, mas foi na Revolução do Haiti que esta luta pode se desenvolver até o final, com uma organização prévia e com um exército valente. Mas os proprietários de terra não viam a potência dos escravizados, nas palavras de James:

“No mês de julho de 1792, [Toussaint] tinha pouco menos de quinhentos homens consigo, os melhores da tropa revolucionária. Esses, e não perorações no Legislativo seriam decisivos na luta pela liberdade. Mas ninguém dava muita atenção a Toussaint e seus seguidores negros. Feullians e jacobinos na França, brancos e multados e São Domingos continuavam a ver a revolta dos negros como uma imensa baderna que deveria ser sufocada a tempo, uma vez que a divisão entre os senhores de escravos estava encerrada.” (p.199)

Os burgueses, sejam eles girondinos ou jacobinos não enxergavam a dinâmica dos acontecimentos, ou melhor não queriam ver que muitos negros escravizados, na verdade embebidos do racismo até a alma, não enxergaram que enquanto debatiam nas assembleias o destino dos escravizados, os próprios negro é quem escreviam sua própria sorte. Isso porque mesmo dirigindo a Revolução francesa em 1789 e defendendo o lema liberdade, igualdade e fraternidade, isso teria um limite bem claro, ou seja, a propriedade, a escravidão, da onde vinha os lucros da metrópole.

Esse desfecho que os escravistas de todos os tipos fechavam os olhos, eram construídos a cada luta, desde um desenvolvimento próprio onde os escravizados perceberam fizeram experiência com seus métodos de luta, suas direções e com a necessidade de derrubar o regime escravista e os senhores de terra para conquista a liberdade. A liberdade só poderia ser conquistada por uma insurreição de negros escravizados que se desenvolveu ao ponto de conquistar também a independência da colônia e direitos políticos pros ex-escravizados e libertos.

Essas são ideias bem fortes do livro de James, além de tantas outras que ele desenvolve, os acontecimentos da Revolução do Haiti desde a Teoria da Revolução Permanente. Hoje também se completam 81 anos do assassinato de Leon Trotski por um sicário stalinista e é fabuloso o legado dessa teoria-programa desenvolvida por ele ao longo de vários anos e que foi chave pra uma compreensão revolucionária da Revolução haitiana.

Por fim, não poderíamos esquecer a participação das mulheres negras nessa revolução, algo não mencionado por James, mas que era de extrema importância para Trotski, sobretudo, sendo a questão de gênero um aspecto fortíssimo da Teoria da Revolução Permanente. Sobre esse tema, o livro “Mulheres Negras e Marxismo” nos traz reflexões importantes:

“As mulheres negras têm muito mais importância nesses processos revolucionários do que realmente é relatado. Na Revolução Haitiana, elas eram líderes religiosas e também guerreiras nas batalhas, eram responsáveis pelo cuidado das tropas, tinham um conhecimento ávido sobre venenos e ervas de cura que eram decisivos no tratamentos dos feridos e nas ações de envenenamento planejada contra os generais.” (p.65)

As mulheres negras cumpriram um papel chave tanto nos campo de batalha quanto na organização da luta pela liberdade. Elas tinham o mesmo trabalho que os homens nas lavouras, sofriam coerção sexual de seus senhores, eram separadas de seus filhos e companheiros, sofreram estupros e muitas vezes eram obrigadas a se prostituir. Não foi à toa que eram a linha de frente contra o sistema escravista junto com seus irmão negros oprimidos. Há 230 anos da Revolução do Haiti não podemos deixar de lembrar dessa bravas mulheres que lutaram em unidade com negros escravizados por sua liberdade, a independência da colônia e a igualdade entre negros e mulatos. E esse é um aspecto bastante importante da revolução, em primeiro lugar que a independência foi obra dos próprios escravizados, algo que distingue e muitos os processo de independência nas Américas (ainda que escravizados e libertos participaram ativamente em vários processos como este). Outro aspecto é que essa revolução superou um problema que o colonialismo impunha e aprofundava que era a segmentação social através da tonalidade de pele. Essa insurreição colocou na ordem do dia que não haveria mais divisão entre racial e social, todo haitiano era negro e todo negro no mundo é haitiano. Isto é, os negros haviam acabado com a segmentação social racial e social imposta pelo colonialismo e essa era um conquista dos negros no mundo todo.

Também não podemos deixar de reviver essa história tão importante frente aos acontecimentos mais recentes do Haiti. O povo haitiano hoje se encontra numa situação extremamente angustiante com mais um terremoto que ocorreu na ilha e que já registra mais de 2 mil mortos e milhares de feridos e desabrigados. Recentemente vimos também, trabalhadores haitianos saírem às ruas contra o ex-presidente Jovenel Moise assassinado no mês passado. A luta dos revolucionários negros do Haiti que imporam a Franças e aos proprietários de terras e escravos na colônia de São Domingos, servem de inspiração para o povo haitiano hoje e também todos os negros e negras que lutam contra o racismo. Essa história fantástica que ficou registrado na obra Os Jacobinos Negros é fonte de inspiração para uma geração que também inspirados pela fúria negra norte-americana no black lives matter também que por fim ao sistema capitalista e as opressões que lhe servem.

 
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