A Colômbia vive nesta quarta-feira um novo dia de mobilizações convocado pelo Comitê Nacional de Paralisação e diferentes organizações a nível nacional.
O dia começou em Bogotá com vários bloqueios de estradas e o fechamento de algumas estações de transporte coletivo Transmilenio no sul da cidade.
Ocorre poucas horas depois da brutal repressão ocorrida na cidade de Tuluá, que tirou a vida de pelo menos um jovem e deixou dezenas de feridos. O ataque das forças repressivas em Tuluá, pertencente ao departamento de Valle del Cauca, é responsabilidade direta do presidente Iván Duque, que com suas ameaças públicas se propôs a desobstruir as estradas e vias que estão bloqueadas a qualquer custo. Há uma semana ele ensaia este discurso que visa tentar separar os manifestantes que em diferentes cidades bloqueiam as estradas como forma de protesto, chamando-os de "vândalos" e "terroristas", enquanto mantém institucionalmente uma série de mesas de diálogo que contam com o apoio da oposição política e das lideranças sindicais agrupadas na Comissão Nacional de Desemprego.
O ataque em Tuluá
A repressão e os atentados desta terça-feira em Tuluá terminaram com o incêndio do Palácio da Justiça. Imediatamente, o governo e o ex-presidente de extrema direita Álvaro Uribe culparam os manifestantes que durante o dia tiveram que suportar uma repressão policial brutal. Porém, nas redes sociais muitos denunciam as ações dos paramilitares e a cumplicidade da polícia no incêndio do Palácio da Justiça.
A cidade veio de semanas de protestos tranquilos e bloqueios de estradas para tornar suas demandas visíveis. Porém, o Governo, com sua política de eliminação de bloqueios de estradas, enviou o Esquadrão Móvel Anti-Motim (ESMAD), que atua de forma brutal em todo o país.
Durante o dia, foram denunciados os corpos de pelo menos três jovens assassinados.
Soma-se a isso a repressão da ESMAD iniciada pela manhã, quando prenderam cerca de vinte pessoas, inclusive alguns menores, “de forma preventiva após a recuperação da mobilidade nas áreas norte e sul da cidade” que haviam sido bloqueadas. Em outras palavras, seguindo as orientações de Duque ao pé da letra. O dia terminou com o assassinato brutal do estudante de Direito, Camilo Arango.
A própria missão das ONU pediu para "esclarecer a morte violenta" do jovem estudante de direito Camilo Andrés Arango García. “Expressamos muita preocupação com Tuluá. Estamos em contato com autoridades e sociedade civil. Lembramos que os direitos humanos e o diálogo são a maneira de superar esta situação”, disse o comunicado da ONU.
Aviso da CIDH
Por sua vez, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) emitiu uma dura declaração na terça-feira condenando as graves violações dos direitos humanos no contexto dos protestos na Colômbia.
No documento, a CIDH “expressa sua preocupação pela grave crise que atravessa a Colômbia e condena as graves violações dos direitos humanos ocorridas durante os protestos sociais. Nesse sentido, insta o Estado a respeitar os mais elevados padrões em matéria de liberdade de expressão, uso da força e devida diligência, bem como permitir à CIDH realizar uma visita de observação ao país, honrando sua tradição com compromissos internacionais em direitos humanos”.
Em contraste com os dados fornecidos pelo governo Duque, a declaração afirma que "a Comissão destaca que em pelo menos 1.038 manifestações houve casos de mortes, desaparecimentos, feridos e agressões sexuais em consequência do uso desproporcional e ilegítimo de força. Esses eventos foram registrados, especialmente, em cidades como Bogotá, Cali, Pereira, Popayán e Yumbo, e tiveram efeitos especiais sobre os povos indígenas, mulheres e afrodescendentes”.
Segundo a ONG Temblores, que denuncia os casos de violência policial, as forças repressivas já são responsáveis por pelo menos 43 homicídios ocorridos durante os protestos que começaram no dia 28 de abril.
Ultimato de Duque
O governo Duque avançou em suas ameaças contra os manifestantes que bloqueiam as estradas. Esta terça-feira viajou ao Porto de Buenaventura na companhia do Ministro do Interior e uma comissão de delegados do governo. Lá em um discurso ele destacou que “Na Colômbia não existe o direito de bloquear estradas, não existe o direito de afetar os outros, portanto, temos visto um grande empenho da cidadania e também da força pública nisso nesta cidade, para o bem da Colômbia, para o bem do sudoeste, para o bem de toda uma comunidade, é preciso restabelecer não só o fluxo do comércio, mas também as atividades diárias e cotidianas."
O “compromisso das forças de segurança” mencionado pelo presidente é atacar os manifestantes que bloqueiam estradas com borracha e chumbo, caminhões hidrantes, gás lacrimogêneo e bombas.
Esta metodologia de protesto tornou-se a mais preocupante para o governo Duque, pois no caso do porto de Buenaventura implica a paralisação de 50% do comércio via porto do país.
Ou seja, enquanto as lideranças sindicais convocam uma “greve nacional” por semana, que na verdade são dias de mobilizações sem preparo nem com o objetivo de paralisar os principais mananciais da economia do país para obrigar Duque a recuar e até renunciar, a maioria são jovens que estão nas estradas, a chamada primeira linha, ou que enfrentam uma repressão policial brutal todas as noites em várias partes do país, que preocupam verdadeiramente o Governo colombiano.
As lideranças sindicais agrupadas no Comitê Nacional de Paralisação, junto com as organizações políticas de oposição, já aceitaram a política de Duque de estabelecer mesas de diálogo sobre o sangue dos manifestantes assassinados, ou no máximo esperam que o Governo enfraqueça apostando em um substituto em as eleições de 2022. Mas a rebelião é hoje, não em 2022, e não pode ser canalizada através de uma mesa de diálogo em que o Governo nem esteja disposto a reconhecer a brutalidade policial.
A juventude é um fator chave nos protestos atuais, porque muitos não enxergam outro futuro que não seja a miséria, o desemprego e a precariedade. Por isso são eles que mais sofreram com a repressão e os assassinatos. Hoje a denúncia das políticas do governo Duque é tão necessária quanto o apoio e solidariedade aos setores que estão sendo atacados. A organização dos setores em luta, junto com os trabalhadores das principais atividades econômicas, os indígenas e todos os oprimidos, é essencial para avançar um plano de luta e uma verdadeira paralisia nacional que pode acabar com Duque e suas políticas.
|