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ORIENTE MÉDIO
O verdadeiro medo do Ayatollah
Caio Reis

Muito mais do que qualquer intervenção imperialista norte-americana, o que aterroriza o regime iraniano é o ódio crescente entre a própria população. Novos protestos explosivos contra a violência do Estado e o histórico de lutas contra o regime são indicativos de que levantes maiores virão.

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Foto: Arquivo VOA News

Em 22 de fevereiro, as forças armadas iranianas abriram fogo contra um grupo de transportadores de combustível no Sistão-Baluchistão, na fronteira com o Paquistão, uma das províncias mais pobres do país. A onda de protestos explosiva desencadeada, a solidariedade nacional contra as forças armadas e o histórico recente de lutas contra o regime são indicativos de que o regime do Ayatollah pode ter os dias contados.

Antes de qualquer comentário sobre a crise atual no Baluchistão iraniano, é importante entendermos o contexto geral em que essas revoltas ocorrem. Em 2019, acompanhamos o inegável retorno mundial da luta de classes, que teve grandes expressões na França, Argélia, Sudão, Líbano e outros países, entre eles o Irã. Esse país do Oriente Médio, porém, já vinha com fortes protestos desde 2017 contra os ajustes econômicos capitalistas e o regime teocrático repressivo do Ayatollah, agudizados pelos efeitos das sanções imperialistas dos EUA. Os ventos internacionais combativos só reforçaram aquelas lutas, e em 2019 houveram mais de 3.500 protestos registrados no país, uma média de 10 por dia - impulsionados pela indignação com o aumento dos combustíveis.

Para entender mais sobre a história do Irã e sua relação com o imperialismo estadunidense, veja: Cinco momentos em que os EUA interveio no Irã

E 2020, o ano 1 da pandemia, também não passou isento de grandes episódios de luta no Irã, mesmo com o país sendo fortemente atingido pelo coronavírus. Em agosto, mais de 38 centros industriais e diversas categorias participaram de uma onda de greves. Essa mobilização operaria se configurou como a maior ação coordenada desde a Revolução Iraniana, há 42 anos atrás, e teve o apoio de organizações de aposentados, estudantes, mulheres, entre outras. Apesar do regime extremamente opressivo, onde não há direito de sindicalização livre e a tortura, o açoite e o assassinato de opositores são uma realidade comum, os trabalhadores iranianos deram uma grande mostra de seu potencial para liderar o embate contra o Ayatollah e o oficialismo corrupto da Guarda Revolucionária.

Das 20 regiões mais pobres do Irã, 14 estão na província fronteiriça de Sistão-Baluchistão. Os baluchis vêm sendo perseguidos e tratados pelo regime como contrabandistas desde que a atividade de venda de diesel se popularizou com os efeitos das sanções norte-americanas. O combustível custa 11 vezes mais no Paquistão, e em uma província fronteiriça e economicamente miserável, a única atividade rentável se tornou levá-lo do jeito que der até o outro lado. Enquanto isso, a nata de oficiais das Forças Armadas e do governo, próximos do Ayatollah Khamenei e da GR, mantém o controle de bem mais da metade da riqueza do país. Essa tensão explosiva irrompeu quando, no último dia 22 de fevereiro, as forças armadas na alfândega abriram fogo contra a população baluchi que vive do transporte e venda de combustíveis de um lado para o outro da fronteira, encarando filas quilométricas.

A revolta diante do fuzilamento bárbaro na fronteira foi imediata, com delegacias, postos militares e a sede do governo local sendo invadidos pela população. Os protestos se espalharam com velocidade surpreendente pela província e tiveram apoio nacional, com diversos pequenos comércios fazendo greve em solidariedade nas principais cidades. A tensão social no Irã é tamanha que, em 25 de Fevereiro, o governador do Sistão-Baluchistão, Mohebati, lançou um comunicado ao governo central e as demais autoridades: Se os protestos se tornarem uma revolução, “secos ou molhados, linha-dura ou reformistas, todos os oficiais vão queimar juntos”, indicando também a crise entre os de cima para governar.

É com esse medo em mente, e com o veredito de que as forças de repressão locais foram insuficientes, que o governo cortou o acesso da população à internet e está enviando reforços, veículos blindados e helicópteros para a região. A repressão e a perseguição política já deixaram ao menos 23 mortos e um número indeterminado de presos e feridos.

Apesar da exibição violenta de poder do regime, a luta de classes permanece latente no Irã. As cenas da população se enfrentando de mãos vazias contra a repressão lembram a revolução de 1979 contra o Shah, quando cada tiro disparado pelo exército só gestava mais ódio para derrubar o regime de Reza Pahlavi.

Ainda parece ser demasiado cedo para prever com segurança os caminhos que o povo persa trilhará. Porém, é certo que uma revolução vitoriosa contra a teocracia capitalista do Ayatollah, que se defenda contra a ameaça imperialista norte-americana e que leve adiante as demandas mais profundas dos trabalhadores, da juventude, das mulheres e do povo pobre do Irã, precisará de uma classe trabalhadora na linha de frente, organizada em um partido revolucionário que tire as lições e balanços da revolução 1979 e que sustente uma perspectiva socialista e internacionalista, sob o risco de ser derrotada novamente pela contrarrevolução interna ou pelos falcões que voam sobre suas cabeças.

 
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