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COLUNA
Educação made in Paris
Lina Hamdan
Mestranda em Artes Visuais na UFMG

Em meio à crise capitalista, à pandemia, a precarização da educação, quais aproximações costumam ser feitas e quais devemos fazer entre a vida estudantil de jovens franceses e brasileiros?

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Como estudante de artes no Brasil, muitas vezes durante a graduação nos deparamos com comparações esdrúxulas com o ensino superior francês. Professores que tiveram a oportunidade de ir estudar na França ressaltam como, no país europeu, a rigidez e a exigência são muito superiores da que "enfrentamos" no Brasil, muitas vezes deixando implícito que o problema daqui não ser a França é porque damos menos peso para a educação, num sentido individual de que o brasileiro "pega leve demais da conta".

Essa comparação de um suposto jeitinho brasileiro de educar e ser educado passa longe de refletir as causas do atraso educacional do Brasil, fruto de uma sociedade que divide quem entra e sai da faculdade com critérios de raça e classe, e que fundamenta o que pode ser estudado ou elaborado na universidade, de acordo com uma lógica muito mais produtivista e individualista do que social. Mas essa comparação também passa longe de entender os problemas sociais que se desenvolvem na educação francesa.

Fruto da crise de 2008 aprofundada pela pandemia, vemos as economias internacionalmente capengando para se recompor, sendo que no Brasil, sobretudo após o golpe de 2016, se aprofunda um claro projeto de transformar o país em fazenda do mundo, no qual a educação em geral (quem dirá a educação artística) deve ser reservada para uma parcela ainda menor do que é hoje. Mas a educação brasileira já estava sentindo seus cortes mesmo antes do golpe, nos governos do PT: uma resposta necessária ao capital financeiro, aquele que de fato nos governa.

Na França, nação erguida sobre as costas negras dos trabalhadores de suas colônias e que segue explorando com suas multinacionais os países do "terceiro mundo", conseguiu às custas de seu imperialismo construir uma educação gratuita para a maioria da sua população, exportada mundo afora como de excelência. Mas os frutos da crise, que agora se agravam após um ano de pandemia, lá também recaem na educação. Não há mistério nessa semelhança. Os governos do capital financeiro, com mecanismos e discursos diferentes, passam a mão naquilo que gera menos lucro. E tira direitos primeiro daqueles que são subjugados socialmente. Negros, mulheres, imigrantes. Enquanto injetam bilhões para salvar empresas e os bancos continuam lucrando em meio à pandemia. Até quando?

A cena das centenas de estudantes franceses esperando em fila na gelada noite de Paris para receber comida de uma ONG não dão margem para enganos: em todo mundo, querem que a crise seja paga pela juventude. Querem que disputamos entre nós um emprego precário para não morrer de fome, para conseguir pagar o aluguel. Enquanto isso, na Sorbonne, estudantes saem às ruas e são reprimidos pela polícia por protestar contraa precarização de suas vidas e a pressão produtivista que está levando jovens ao suícidio.Se inspiram nos trabalhadores franceses que seguem se organizando contra os ataques do capital como vimos na histórica greve do transporte contra a reforma da previdência em 2019 e agora contra as demissões na multinacional Total(que, diga-se de passagem, usa de um discurso "ecológico" para conseguir demitir, enquanto quer comprar refinarias da Petrobrás que Bolsonaro vende a preço de banana).

Essa geração de juventude, que cresce imersa na crise e "sem futuro", questiona os assassinatos de jovens negros, tendo erguido na França enormes manifestações por justiça a Adama Traoré, influenciados pelo maior movimento social que já existiu na história dos Estados Unidos. Uma juventude que se ergue contra as leis que buscam legitimar a repressão policial e o ataque à liberdade de imprensa.

Nosso questionamento em relação à educação não pode e não vai ser limitado pela reivindicação da educação de um país imperialista, como a França. Reivindiquemos não os aspectos de pressão acadêmica francesa e sim, a energia de jovens que se organizam e questionam pela raíz a situação dos estudantes e trabalhadores em todo o mundo.

O capitalismo rompe suas camadas mais superficiais a cada crise. Explora da mais nefasta divisão entre estudantes e professores, entre racializados e brancos, entre jovens e adultos, entre terceirizados, contratos precários e efetivos, tentando se recompor. Reproduz desigualdades ao ponto de internacionalmente vermos os estudantes queimando seus cérebros e sua saúde mental, lutando para conseguir ter o que comer.

Questionemos nossa educação a partir da origem estrutural de seus problemas. No Brasil e na França, na UFMG ou na Sorbonne, a crise é capitalista. A solução não é meritocrática, é socialista. Rompamos com a lógica individual e produtivista. A crise forja a hora de abrir caminho para ideias revolucionárias.

Lina é estudante de Artes Visuais na UFMG. Em 2020 foi à França para acompanhar a greve dos trabalhadores do transporte da região parisiense, compartilhando a experiência com os trabalhadores e jovens militantes do Révolution Permanente, jornal francês da mesma rede internacional que o Esquerda Diário. Nesta coluna, irá abordar brevemente sobre temas ligados à arte e à juventude, tentando conectar o que acontece no Brasil com outros locais do mundo.

 
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