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Declaração Política
O povo venezuelano não tem nada a ganhar com as eleições parlamentares ou com a "consulta" de Guaidó
Liga de Trabajadores por el Socialismo (LTS)
Fração Trotskista (FT-QI)

Publicamos a seguir a declaração política da Liga dos Trabalhadores pelo Socialismo (LTS) - partido irmão do MRT na Venezuela - sobre as próximas eleições parlamentares em 6 de dezembro (6-D) e a "consulta" convocada pelo setor de oposição de direita referenciada em Juan Guaidó.

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O país continua em uma catástrofe econômica e social sem precedentes em um quadro nacional dramático sem paralelo em nossa história. Em todos os parâmetros da vida as calamidades que enfrenta a classe trabalhadora apenas tem se acentuado, desde a saúde, a educação, a alimentação, os serviços mais essenciais como água, eletricidade, combustível, comunicação, habitação, transporte, cultura, etc. e uma hiperinflação que deixa em terra arrasada qualquer renda extra que se obtenha, tornando-se nada tudo que chega às nossas mãos. Não há nenhum país no mundo onde o salário mínimo tenha sido oficialmente destruído, atingindo níveis inexistentes de menos de um dólar por mês; tamanha é a catástrofe e o Governo nem mesmo a anuncia formalmente.

Um país em colapso total em todos os sentidos da palavra, onde um governo em clara decomposição nada mais faz do que acentuar o sofrimento promulgando leis entreguistas e privatizações, ao mesmo tempo que elimina outras, como praticamente fez com a Lei do Trabalho. Tudo isso junto com uma repressão contra quem reclama e protesta, onde além da ação da polícia com seus esquadrões como a FAES, os sinistros serviços de inteligência do Estado atuam contra os trabalhadores, os grupos paraestatais fazem isso abertamente nas principais cidades do país. Eles são aqueles que podem se salvar em um laissez faire onde o capital privado e sua ganância por lucro apenas se aproveitam.

Do outro lado está uma oposição que clama pelo intervencionismo e a intervenção imperialista, aplaudindo sanções e o confisco de bens extraterritoriais do país, com planos de soluções para a situação prevalecente que nada mais são do que rendição ao neoliberalismo com todo o direitismo dos seus apoiadores, admiradores de Trump.

Neste contexto, um Governo decomposto apoiado pelas Forças Armadas com um sistema repressivo e quase ditatorial, um estado de exceção permanente e que atenta contra os direitos democráticos mais elementares, realiza uma eleição parlamentar fraudulenta chamada à sua medida. Como parte de seu repertório autoritário contra os partidos de oposição (seja de direita ou de esquerda), interveio judicialmente, à esquerda chavista, o PPT, Tupamaros e UPV, para ceder o controle desses partidos e sua legalidade eleitoral às frações que aceitarem estar subordinadas ao Governo do PSUV. Fez isso por meio do TSJ, que funciona como braço judiciário do Executivo para legalizar ou banir partidos e candidatos conforme sua conveniência. A mesma intervenção judicial recaiu sobre vários dos principais partidos de oposição de direita, para ceder o controle destes às frações que se dispõem a ir ao processo eleitoral nas condições estabelecidas pelo Governo.

É toda uma orquestração que se montou após a imposição da fraude "Constituinte" de 2017, elegendo uma Assembleia que se proclamou supraconstitucional e plenipotenciária, mas que nada mais foi do que um instrumento das frações bonapartistas dirigentes, e que mesmo hoje não se sabe nem com quantos votos cada deputado foi eleito. Ainda recentemente, foi o próprio Maduro quem anunciou que tal órgão encerraria suas atividades em dezembro, quando nem mesmo os supostos constituintes sabiam de tal coisa. Uma fraude realizada em estado de exceção permanente (que deu mais rédea solta à violência discricionária dos órgãos repressivos), com a proscrição de partidos (tanto à direita como à esquerda), proibição do movimento operário de eleições sindicais (pelas vias de fato), fortes restrições às mobilizações operárias e populares e ao direito à greve, sob pena de ser reprimido ou preso (“ninguém pode bloquear uma rua”, disse Maduro); e com critérios eleitorais criados pelo Governo para garantir antecipadamente a maioria através do controle estatal das instâncias “comunais” e do falso “poder popular”.

Mas são tantas as calamidades e sofrimentos para os trabalhadores que menos de duas semanas antes das eleições, a maior apatia reina sobre eles, e até o clima eleitoral não reina no país. As pesquisas indicam os menores números de participação eleitoral em um país onde em outras eleições os níveis de participação foram bastante elevados, apesar do voto não ser obrigatório. Os trabalhadores, os pobres, os camponeses e os habitantes das comunidades dos grandes bairros concentram o seu tempo na tarefa de conseguir o que comer, onde se encontram as maiores preocupações.

A “consulta” de Guaidó: um novo parapeito para o golpe fracassado e a oposição pró-intervenção

Depois de toda a ofensiva golpista desde janeiro de 2019, que durou boa parte daquele ano, e do fracasso total em impor o fantoche de Washington, Juan Guaidó, a oposição de direita mais uma vez se dividiu e vive uma crise profunda. Sua ofensiva no ano passado, pela qual todo o arco da oposição se reuniu, desvaneceu rapidamente. É nesta situação que os principais partidos de oposição, como Primero Justicia, Un Nuevo Tiempo, Voluntad Popular, Acción Democrática, entre tantos outros de considerável visibilidade como Vente Venezuela de María Corina Machado, Alianza Bravo Pueblo de Antonio Ledezma - decidem não participar dessas eleições com o argumento de que não são "livres ou democráticas".

Mas é preciso ficar claro que, para esses atores de direita, o que menos lhes interessa é a democracia. Depois de tentar derrubar o governo por um golpe e até reivindicar uma intervenção imperialista no país para se estabelecer no poder, e até endossar incursões militares com mercenários americanos, eles não têm moral para discutir questões democráticas (eles endossaram e apoiaram golpes como o da Bolívia). A sua não participação tem o fundamento central de toda uma política pró-imperialista, de intervencionismo e de exigência de mais sanções econômicas que oprimam mais o povo, a par de todos os seus planos do mais caduco neoliberalismo - e que neste último se aparenta com a política de Maduro como se vê com a lei "anti-bloqueio". Esse é o programa de não participação desse bloco de oposição para dar lugar aos seus planos, como vimos ao longo do ano passado.

A resposta do setor de direita ainda referenciada em Guaidó tem sido propor a sua própria “consulta popular”, por oposição às eleições organizadas pelo Governo. Consulta que ocorreria a partir de 7 de dezembro e terminaria em 12 de dezembro. É uma espécie de reedição, com muito menos ímpeto e força, do plebiscito de 16 de julho de 2017, em meio à crise política nacional e onde a oposição colocou grandes mobilizações nas ruas. Desta vez a oposição não tem na rua nem a sombra daqueles que chamou, mas os objetivos são semelhantes.

Naquela época era a resposta ao apelo à farsa constituinte. Diante dessa manobra autoritária do governo diante da ofensiva da direita para retirá-lo do poder, mas também diante de sua crescente falta de apoio popular, a oposição tentou levantar o argumento democrático convocando por conta própria, e organizou sob seu controle, um plebiscito, não só para rejeitar a Assembleia Constituinte de Maduro (pergunta 1), mas também para fazer avançar a sua pressão sobre as Forças Armadas para provocar um movimento militar que tiraria Maduro do poder (questão 2) e permitir que a oposição formasse um eventual novo governo com seus aliados (questão 3). Diante da tentativa de reforçar o bonapartismo de Maduro, que utilizou o argumento "democrático" da "Constituinte", à direita se respondeu com o argumento "democrático" do plebiscito para forçar e legitimar um eventual golpe militar e a formação do seu próprio governo.

Leia mais: O plebiscito da MUD: uma manobra com objetivos reacionários

Nesta ocasião, as questões da "consulta", também totalmente controlada pela direita, visam tanto ignorar o governo de Maduro e o acontecimento do 6-D, como legitimar um amplo leque de medidas intervencionistas. A primeira pergunta é se você deseja a “cessação da usurpação” e a realização de “eleições presidenciais e parlamentares livres, justas e verificáveis”. A segunda é se as eleições 6-D forem rejeitadas "a comunidade internacional seria solicitada a ignora-las". E a terceira é se os eleitores “ordenam” que se tomem as medidas necessárias perante a “comunidade internacional” para “resgatar a democracia, enfrentar a crise humanitária e proteger as pessoas dos crimes contra a humanidade”.

É uma manobra alinhada com toda a política de intervencionismo imperialista. Buscar dar cobertura de “apoio popular” à política que o governo Trump já traçou de comum acordo (resta saber se o governo Biden a dará continuidade), das principais potências europeias e dos governos de direita latino-americana: manter o descontentamento com Maduro, diante das eleições 6-D e continuar com medidas de intervencionismo para pressionar afim dos objetivos das potências imperialistas e de setores da direita local.

Por outro lado, outro setor menor da oposição vai participar, que são aqueles organizados na chamada Aliança Democrática formada pelos partidos Avanzada Progresista (conglomerado formado por dissidentes do Podemos, Pátria Para Todos, Povo Emergente e Partido Socialista Unidos de Venezuela (que tem como principal figura Henri Falcón), Esperanza por El Cambio (do evangelista Javier Bertucci), Cambiemos, além da Ação Democrática e da Copei interpostos judicialmente. Participam também o MAS e a Soluciones, liderados por Claudio Fermín, onde se junta a Redes, o partido de Juan Barreto, banido pelo Governo. Há também a Venezuela Unida composta centralmente por pessoas do Primero Justicia e outros grupos da direita, tem entre suas figuras o deputado dissidente da PJ, Luis Parra. A maior parte desses são setores que chegaram a acordos com o governo de Maduro, mesmo em outro momento chegaram a formar mesa de negociações após as reuniões entre os partidos mais fortes (o chamado bloco dos quatro) da oposição, sendo o mais emblemático Luis Parra que, junto com o PSUV, tentou constituir uma Assembleia Nacional paralela à liderada por Guaidó, para a qual obviamente contava com o apoio de Maduro, reconhecendo-o automaticamente. É uma oposição que o Governo tem vindo a construir a seu favor, onde muitos são de partes intervenientes do Supremo Tribunal de Justiça, dando-lhes reconhecimento jurídico.

Os trabalhadores devem virar as costas à farsa “democrática” do 6-D e à “consulta” pró-intervenção de Guaidó

Como escrevemos acima, há uma grande apatia em relação a essas eleições, mesmo as últimas pesquisas revelam que quase 70% dos que têm direito a votar não irão às urnas. Uma pesquisa da Consultores21 descobriu que 78% da população afirma que não votará nas eleições parlamentares do 6-D. Mas também não é que estejam entusiasmados com a "consulta" de Guaidó. Outra pesquisa divulgada nos últimos dias indica que aqueles que têm total certeza de que vão votar no 6-D estariam mesmo em torno de 15%, e apenas 8% afirmam que vão participar da de Guaidó.

Se o povo está farto do governo, isso não significa um avanço no apoio à oposição de direita, é o que explica o declínio total deste setor que está longe de mostrar força nas ruas. De acordo com uma pesquisa recente da Datanálisis, 62,2% dos venezuelanos não apoiam o governo de Nicolás Maduro ou a liderança da oposição. “Nem o governo nem a oposição estão atraindo ou convencendo”, conclui o referido pesquisador. É o tédio diante de uma situação que não cede mais, e a descrença nessas eleições assim como na consulta a Guaidó.

É que a situação está insuportável. De vez em quando surgem focos de explosão social em várias partes do país devido à falta dos bens mais básicos, como água, luz, gás doméstico, enquanto o Governo tem coragem de propor o uso da lenha para cozinhar. Os trabalhadores saem e querem sair e protestar contra as inclemências em que vivem, onde perderam todos os seus direitos trabalhistas, e o mais elementar, o direito ao salário, sem falar no acesso à saúde, com cada vez mais gente morrendo por não contar com o essencial da assistência médica, morrem por não poderem comprar um medicamento que os possa salvar. Protestar é um direito negado. Não reprimem mais apenas a polícia oficial, mas também grupos paraestatais (parapoliciais) que impedem os trabalhadores de se manifestarem, além das ações descaradas de serviços de inteligência como SEBIN, DGCIM, que prendem trabalhadores por protestarem e os mantêm presos por anos sem sequer direito a julgamento como é o caso de Rodney Álvarez, preso por 9 anos por um crime que não cometeu e tudo para encobrir setores da alta burocracia chavista, como o ex-governador Rangel Gómez. Isso sem falar nos grandes bairros, onde uma força repressiva de extermínio como a FAES atua com licença para matar, mantendo registro das execuções, principalmente de jovens e pobres. É repressão para aqueles que querem se rebelar.

E diante disso temos a oposição de direita, uma das mais lambe-botas do imperialismo. Seu pulso não treme quando se trata de exigir mais intervencionismo e sanções. Não é uma oposição que tem que chegar ao governo para mostrar sua verdadeira face. Já está escancarado. Em meio à pandemia, tem exigido o aumento das sanções sabendo que afetam diretamente os trabalhadores, as grandes maiorias populares, os pequenos agricultores do campo, as mulheres e os jovens. Eles são participantes do confisco de bens do país que potências estrangeiras fazem, querendo assim aumentar o cerco econômico e político. É uma forma direta de atingir todo o povo para chegar a seus objetivos de tomar o poder e avançar para uma maior semicolonização. É por isso que também têm uma forte rejeição por parte de setores importantes da população trabalhadora e pobre, e isso apesar do papel desempenhado pelas burocracias sindicais ligadas aos seus partidos. Eles são os que mais enganam com sua demagogia e cinismo da pior espécie.

Tanto as eleições feitas sob medida para o bonapartismo oficial, quanto a oposição pró-imperialista, ambos são um engano para as aspirações democráticas do povo. Além disso, ambas as estratégias são baseadas em programas profundamente reacionários. A eleição de Maduro e as Forças Armadas pactuadas com um setor da direita, visa dar passos para "virar a página" da profunda crise política, para avançar em uma "saída" do colapso através da mais aberta rendição ao capital estrangeiro, uma ofensiva privatização e destruição de salários e direitos dos trabalhadores já conquistados. Guaidó e o outro setor da direita segue o roteiro de impor uma mudança de regime sob medida para os EUA, para que seja ele quem proteja (e tenha primazia) na ofensiva de semicolonização do país por parte do grande capital transnacional, com privatizações e mão de obra quase gratuita. Todo o arco burguês contempla para o país uma maior desnacionalização da economia, maior controle do capital privado, estrangeiro e nacional, e avançar na conquista que para todo o capital significa a destruição das conquistas da classe trabalhadora.

Com esses programas de subjugação dos trabalhadores e do povo por trás de cada artimanha "democrática" que nos oferecem, a possibilidade de fazer valer a vontade do povo trabalhador passa pela possibilidade de recuperar a sua capacidade de luta e mobilização. O que permitiu ao governo, burocratas corruptos e empresários de todos os matizes, destruir as condições de vida do povo, e claro contra a nossa vontade, é uma correlação de forças em que a luta dos trabalhadores não pesou no cenário nacional e popular, com suas próprias demandas e métodos de luta. Sem essa força, sem recuperar aquela capacidade de luta, não haverá possibilidade de fazermos valer a nossa vontade: a chave é encontrar formas de nos levantarmos para lutar por um programa econômico emergencial popular e dos trabalhadores.

É por isso que nestas eleições, desde a Liga dos Trabalhadores pelo Socialismo (LTS) vamos acompanhar os trabalhadores e as pessoas que mostram descrença em relação a estas eleições e quem as organiza, bem como manifestam a falta de expectativa de que nem estas eleições, nem as opções concorrentes poderão resolver as calamidades, e isso poderá manifestar-se com sua abstenção; e aos que são obrigados a votar e temem perder o emprego, pedimos que expressem seu descontentamento votando nulo. Da mesma forma, apelamos a dar as costas à manobra de Guaidó, em face da qual também existe uma vontade quase nula de participação por parte dos trabalhadores. A descrença e o desânimo do povo são expressos em relação aos mecanismos supostamente “democráticos” oferecidos por ambos os polos. Por isso, perante esta situação, levantamos a luta por uma verdadeira Assembleia Constituinte Livre e Soberana onde se possam discutir os problemas fundamentais do país, como explicaremos a seguir.

Por que devemos lutar por uma verdadeira Assembleia Constituinte Livre e Soberana

Como já desenvolvemos em muitos artigos, o governo de Maduro montou uma fraude “Constituinte” que era praticamente nada mais do que um ministério, onde todas as ordens vinham diretamente do Executivo. Além de ser uma decepção total, foi um chute para toda a sua virada bonapartista reacionária com seu pilar central das Forças Armadas e para o avanço de todo um regime repressivo e quase ditatorial. A recente "votação" da lei "anti-bloqueio" na suposto "constituinte" constituiu a mais aberração, sendo que os deputados nem sabiam o texto votado. Nenhum dos formulários foi atendido.

Mas enquanto por um lado o Governo de Maduro continua com as suas eleições fraudulentas e a sua medida para fazer avançar os seus planos anti-operários e repressivos e a direita com a sua demagogia das eleições apoiadas por Trump e a direita continental, tendo em comum que toda esta catástrofe econômica e social é paga pelo povo - os trabalhadores podem lutar, na perspectiva de um governo operário, para impor uma verdadeira Assembleia Constituinte livre e soberana.

É que se queremos realmente ir ao fundo dos problemas e ao exercício da “vontade popular”, devemos ir a uma Assembleia Constituinte, verdadeiramente livre e soberana, onde se discutam todos os problemas do país e do povo, onde possamos lutar pelas nossas reivindicações, que sirva para desenvolver a mobilização operária e popular contra todos os fatores de poder, que só apresentam miséria, autoritarismo, repressão e ingerência, e que quer decidir nossos destinos.

Uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana onde se dissolvem o poder presidencial e outros poderes, exercendo funções executivas e legislativas, onde uma das primeiras medidas deve ser a implementação de um plano de emergência operário e popular que vá até o final nas causas desta profunda catástrofe econômica, social e a saúde que vive o país e para que os capitalistas paguem pela crise. Onde toda aquela casta de juízes corruptos que ninguém elege é eliminada, para que não acabem sendo mais apêndices dos outros poderes com seus altíssimos salários e regalias, e que todo juiz seja escolhido pelo povo através do voto universal e recebendo como um trabalhador médio. Que decida uma verdadeira nacionalização dos nossos recursos naturais e das empresas estratégicas do petróleo, da mineração, das indústrias básicas, que devem ficar sob o controle de seus trabalhadores e sob a supervisão do povo organizado. Onde de uma vez por todas se resolva o problema da moradia para milhões que ainda vivem em casas precárias ou praticamente não têm onde morar, e avançar para uma verdadeira revolução agrária e se resolva o problema do campo. Que vote pela nacionalização dos bancos, constituindo um único banco estatal para atender aos interesses fundamentais, bem como o monopólio do comércio exterior. Uma Assembleia Constituinte onde os representantes do povo possam ser revogados se não cumprirem os seus compromissos e que ganhem como um trabalhador qualificado ou como um professor.

É claro que uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana de que falamos só pode ser imposta pela mobilização popular e no calor do desenvolvimento dos órgãos de autodeterminação, pois não haverá outra forma de defesa que garanta o direito democrático ao exercício da soberania por meio de um constituinte com plenos poderes e emanado da decisão do povo. A luta por esta Assembleia Constituinte Livre e Soberana também contribui para a luta por um governo dos trabalhadores, pois poderia aproximar os trabalhadores da convicção de que a única solução fundamental é tomar as rédeas do país em suas próprias mãos, estabelecendo um autogoverno dos trabalhadores e dos pobres, com base nas organizações de luta.
Pois bem, ao lutar pelos direitos democráticos mais plenos, os órgãos de autodeterminação podem ser a base para a conquista de uma solução definitiva para a miséria que nos é imposta pelos setores em conflito, ou seja, a miséria capitalista, que só pode ser alcançada com um governo dos explorados e oprimidos.

Por que não apoiamos o APR?

Se mesmo neste contexto, de eleição fraudulenta, sob a decomposição autoritária do regime político, se apresentasse uma opção eleitoral que expressasse uma posição de independência política da classe trabalhadora, de nossa corrente poderíamos considerar progressista chamá-la ao voto. Porém, este não é o caso da Alternativa Popular Revolucionária (APR), liderada pelo PCV e pelo PPT. Muitos lutadores e militantes honestos acham nesta aliança uma alternativa genuinamente comprometida com as lutas dos trabalhadores - porém, não se trata disso.

A APR continua a ser uma expressão do chavismo, que não é um projeto político da classe trabalhadora para derrubar a burguesia e acabar com o capitalismo, mas sim de colaboração de classes: defende que explorados e exploradores possam coexistir em paz, com alguns reformas para uma suposta “justiça social”, mas mantendo a mesma sociedade com empresas privadas, banqueiros e latifundiários, ou seja, a divisão de classes onde as classes proprietárias vivem da exploração dos trabalhadores e dos pobres; em suma, capitalismo. Como esta é a base concreta do “desenvolvimento nacional” proposto pelo Chavismo, é uma promessa de desenvolvimento capitalista, com lutas e uma certa autonomia dos capitais imperialistas, mas capitalista mesmo assim. E é esse projeto de conciliação de classes que, além disso, em seu fracasso e degeneração nos conduziu ao desastre histórico atual.

Nesse sentido, a partir do LTS entendemos a expectativa que se gera em alguns setores, pois o APR se apresenta questionando algumas das políticas mais regressivas do governo (destruição de salários, privatizações, despejo de camponeses, etc.) - é uma expectativa da esquerda no sentido que se opõe à trajetória de direita do governo. Mas tem o grande limite que isso seja questionado por reivindicar o mesmo projeto político burguês de que o regime atual é uma expressão: como já explicamos em outros textos, embora neste ponto o governo de Maduro e as Forças Armadas diferem em muitos aspectos. Pelas políticas do tempo de Chávez, este governo não surgiu como uma “traição” ao legado de Chávez, mas sim, em condições muito diferentes das de Chávez, e testemunhando a problemática e contraditória herança que o próprio Chávez lhes deixou, desenvolvendo exponencialmente os aspectos regressivos que já estavam incubados no Chavismo na época de Chávez.

Isso não é pouca coisa, porque justamente a tragédia histórica da classe trabalhadora venezuelana - e com ela da população pobre como um todo - nestes 20 anos, foi sua dissolução política no projeto expresso por Chávez, a ausência de alternativa política própria da classe trabalhadora. Na verdade, essa subordinação foi expressa até recentemente pelos principais partidos do APR, que continuaram a apoiar politicamente o governo de Maduro e as Forças Armadas em todos esses anos de ajustes econômicos reacionários e avanços profundamente repressivos, incluindo o apoio à farsa do "Constituinte" (de onde foram aprovadas leis tão nefastas como a "lei contra o ódio", a lei do investimento estrangeiro e a "lei anti-bloqueio"), e até o golpe que tentou em Janeiro passado à AN em aliança com grupos desfeitos da oposição de direita.

Este apoio ao governo burguês de Maduro também foi expresso no sentido de que esses partidos não batalharam por nenhuma política para que a classe trabalhadora desenvolvesse sua luta de classes para enfrentar o governo e derrotar seus planos.

A política deles era: para os trabalhadores que eles influenciam, mantê-los (na FNLCT) isolados e separados dos outros setores de trabalhadores em luta que confrontavam abertamente o governo; e limitar as “lutas” a meros comícios de manifestação perante o Ministério do Trabalho, a “Constituinte” ou outra instituição, onde os trabalhadores declarassem o seu apoio ao governo e pedissem algumas medidas favoráveis. Claro que nada disso representou qualquer problema ou desafio sério para o governo, que continuou a subjugar os direitos da classe trabalhadora.

Em outras palavras, os partidos da APR têm uma parcela de responsabilidade por termos chegado a esse ponto da situação e por que a classe trabalhadora chegou tão derrotada. Do qual eles não fazem nenhuma autocrítica, então presume-se que eles justifiquem essa política. O que poderia explicar que Óscar Figuera, candidato à reeleição como deputado e secretário-geral do PCV, principal partido do APR, ainda agora em plena campanha e "separado" do governo, continue defendendo que o governo deve se "retificar"?

Por tudo isto, embora tenhamos denunciado e rejeitado todos os ataques furiosos que a APR recebeu do PSUV/governo, incluindo a gritante censura à comunicação (embora dê espaço aos partidos de direita), e embora entendamos que alguns setores de trabalhadores, ativistas e militantes de esquerda consideram expressar sua rejeição ao governo desta forma, não podemos acompanhá-los em seu voto por esta opção. É claro que continuamos a propor que coincidam em espaços de luta comum, enquanto desenvolvemos a discussão sobre as lições a serem tiradas da experiência do chavismo.

 
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