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Entrevista com Débora Diniz: “As mulheres que morrem por abortos clandestinos têm cor, região e escolaridade”

Reproduzimos aqui a entrevista com Débora Diniz, realizada por Letícia Parks em seu canal no Instagram. Débora Diniz é feminista, professora da Faculdade de Direito da UnB, ativista de direitos humanos e uma referência na luta pela legalização do aborto. Atualmente mora nos Estados Unidos após precisar sair do Brasil devido às ameaças recebidas pelo bolsonarismo.

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Letícia Parks: Eu sou a Letícia, quem está me seguindo já me conhece, a gente faz algumas produções de conteúdo aqui [no meu Instagram] debatendo o tema da questão negra, das mulheres, LGBTs, a luta dos trabalhadores contra todos ataques que estamos vivendo, e hoje a gente está recebendo a professora Débora Diniz, e é um orgulho enorme poder estar com você Débora, te ouvir, conversar com você. Quer dar seu oi personalizado?

Débora Diniz: É um prazer imenso ter esse momento de conversa com você Letícia, eu sigo você, eu leio seu conteúdo, torço muito pela sua carreira política. Então estou aqui para me somar, para aprender com todas as pessoas que estão aqui com você, certamente as suas perguntas vão me ajudar a pensar melhor.

L.P.: Legal! A gente já está em um dia hoje tristemente blindado pelo tema, logo cedo já tivemos a notícia dessa portaria aprovada pelo governo. Eu assisti um vídeo seu, já vi quatro vezes, explicando um pouco sobre o que significa essa portaria que acrescenta termos aos casos de aborto legal no Brasil. Queria que você comentasse um pouco o que significa essa portaria, qual o conteúdo dela. Às vezes é difícil entender para quem não tem uma leitura mais jurídica, se puder comentar um pouco essa questão.

D.D.: Claro. Eu posso ser bastante simples, não posso? Às vezes tem gente que conhece já toda história do aborto, do ponto de vista legal, outras pessoas não. Então quero começar pedindo desculpas se algumas pessoas que estão aqui conosco sabem ainda mais do que tudo que a gente vai conversar, mas talvez valha a pena a gente ir pedacinho por pedacinho, pode ser?

L.P. Claro, fica à vontade!

D.D.: Então vamos lá, a gente tem no Brasil, quando dizemos que o aborto é um crime, e isso é muito importante, ele é um crime de uma lei de um código, chamado Código Penal, que é de 1940. Então estamos falando de algo que tem quase um século no Brasil, mas o aborto é um crime por esse código. Nesse momento da história, quando esses excelentes homens que o fizeram - homens brancos, homens de elite, homens que iam para a universidade - nesse código eles disseram que o aborto é crime. Mas há duas situações em que a mulher e o médico - então o aborto no Brasil é um ato médico - não vão ser presos. Ou seja, é um crime sem pena, mas continua crime, isso importa muito para as mulheres. Porque mesmo aquelas, a menininha de dez anos, as mulheres que sofrem violência, elas tem que se enfrentar com esse estigma da lei. Mas vamos lá, é um crime sem pena: em caso de estupro e caso de risco de vida para a mulher. Quando a constituição de 1988 chegou, houve muito debate no Brasil, para um lado e para o outro sobre como enfrentar o aborto, mas esse tema não entrou na constituição. E nem precisaria, porque nós temos princípios constitucionais, que é aquela abertura na constituição que diz que nós temos direito à saúde, direito à igualdade, à estar livre de tortura, e aqui essas palavras são muito importantes.

Bem, todas as vezes que a gente tem uma lei, precisa-se de uma política pública para garantir que as pessoas tenham acesso, se não essa é uma lei que fica vazia, porque as mulheres não estão conseguindo acessar o direito à saúde. E o aborto é um tema que não é controverso para todas as mulheres não, Letícia, é feito um escândalo dele, uma controvérsia, especialmente pelo patriarcado. As mulheres comuns fazem aborto nas suas vidas, porque são necessidades de vida. Então, o que nós temos é o Ministério da Saúde, que é o órgão, um dos poderes de uma república, tem o legislativo, o executivo e o judiciário, e aqui é o executivo operando, que diz “eu tenho uma lei, e eu preciso regulamentar o acesso”. Poderia ser uma pergunta bonita e importante, se a pergunta fosse protetora para as mulheres, quer dizer, para proteger as mulheres, diminuir o estigma, diminuir as barreira, não aumentar requerimentos. Mas o que essa portaria fez? A anterior e a nova, de hoje. O Código Penal diz que não se pune a mulher, certo? Então bastaria ela ir ao hospital e dizer que sofreu uma violência. Certamente deve ter gente que vai dizer “mas e a mulher que mente?”, mas por que a gente vai acreditar e partir dessa definição de ser humano, de que as mulheres mentem? As mulheres comuns sabem onde comprar um remédio e fazer um aborto em casa, sem botar a cara-à-cara com um médico, um assistente social, uma enfermeira, um atendente no hospital. Quando essa mulher sai da casa dela, toca na porta de um hospital e diz “eu fui estuprada”, essa mulher já passou por inúmeras barreiras, inclusive a de conseguir fugir do agressor e de estar viva. Então, a gente ainda imaginar que essa mulher mente, é uma falta de imaginação sobre as mulheres incrível para mim, mas tem que imaginá-las sob [os olhos do] o patriarcado. E o que essa portaria fez? Ela fez uma pergunta diferente. Ela diz: “ah, eu tenho uma lei que não pune? Como é que eu aumento barreiras? Como é que eu faço ser ainda mais difícil para a mulher? Como eu deixo ainda com mais estigma, com mais medo, com mais perseguição?”. Então a portaria diz o seguinte, que quando uma mulher chega ao hospital, o médico que vai atendê-la vai se comportar como policial. O que mudou da versão de hoje para a anterior foi que tirou a palavra “obrigatoriedade”, mas lá diz que tem o dever. Tá brincando né? Tirou o qualificador, mas ainda tem que denunciar, e faz o amparo em uma lei criada no governo Bolsonaro, que diz que os profissionais de saúde tem que notificar o sistema de justiça.

Eu sei que estou falando muito, mas queria só fazer essa marca. Porque eu não quero demonizar os operadores da segurança pública, as mulheres que sofrem violência precisam da proteção da segurança pública. A pergunta é como, quando, onde e de que forma. O hospital é o lugar para cuidar dessa mulher, ela chegou ali depois de uma cena de estupro. Ela está doída, está com medo, o agressor pode estar na casa esperando, porque essa é a história das mulheres, especialmente das mulheres negras no Brasil, quanto mais jovens elas forem. É o vizinho, é alguém da rua. A coisa do estupro cruento, que você está andando e na esquina alguém pega você acontece com as mulheres negras, com as mulheres da periferia, mas quando falamos nesse genérico “mulheres”, é a casa, é a vizinhança. Então essa mulher, chegando ao hospital, tem que ser acalentada, inclusive contar quem é o agressor dela. E aí se trabalhar com ela como pode ser a melhor maneira, depois de cuidar dela, de abrir um processo de proteção policial e de proteção de investigação. Mas você entende que quanto mais frágil essa mulher, dentro dos regimes de desigualdade do Brasil, quanto mais pobre, uma mulher negra, uma mulher da periferia você for, menos razões você tem pra acreditar na polícia protetora e cuidadora. E aí quando você bota os dois juntos, nesse em quem ainda tinha alguma esperança para essas mulheres muito frágeis, de que é alguém que cuide dela, essa mulher começa a ficar com medo. Então ela vai ter medo do agressor e medo de quem vai cuidar dela.

Então, em resumo, o que essa portaria de hoje faz? Ela mantém sim a obrigatoriedade, o dever dos profissionais de saúde de notificar [um caso de aborto legal] à autoridade policial em até 24 horas. 24 horas! Ela ainda nem saiu do hospital cuidada, e já estão dizendo a ela que a polícia está vindo para tomar o depoimento. O que se tirou da versão anterior, [...] era um artigo torturante, que dizia que essa mulher, ou essa menina, tinha que olhar para a tela da ultrassonografia e ver o desenvolvimento do feto. Isso já é maus tratos, porque não tem nenhuma justificativa médica. Isso caiu, e a gente chega em um ponto tão horrível da nossa política, que daí a gente celebra, porque os maus tratos saíram de cena. Entende a confusão que a gente está vivendo?

L.P. Eu fiquei pensando bastante também, Débora, você falou que a gente ta vivendo uma confusão né, uma tentativa de inversão de valores. O bolsonarismo, a Damares, falam em defesa da vida, mas na verdade a gente sabe que o aborto clandestino, a única coisa que faz, justamente, é matar as mulheres, em especial as mulheres negras, que são três a cada quatro das mulheres mortas por abortos clandestinos. Eu queria que você comentasse mais um pouco, porque essa portaria, toda essa ofensiva anti-aborto tem um estopim no caso daquela meninda de dez anos. Vinha um debate acontecendo, mas a implementação das políticas passou a vir a partir desse evento. Então também é uma inversão, porque foi um evento que gerou uma reação social de defesa dessa menina, enquanto uma pequena minoria foi à porta do hospital tentar impedir que ela abortasse, e a inversão de valores do bolsonarismo e da Damares é justamente sair com uma portaria como essa e inclusive, como foi revelado por reportagens, a tentativa da própria ministra de impedir, convencer a menina de que ela não devia abortar e na verdade deveria fazer uma cesárea. Eu queria que você comentasse um pouco, e eu sei que da um pouco de nojo, a gente tem que tapar o nariz pra falar dessa gente, mas como você vê esse caso específico dessa garota de dez anos, como você vê o posicionamento da Damares, e também como que está a situação com você, porque a gente viu que teve uma ameaça de processo da parte dela em relação a você, como que está essa situação?

D.D.: Talvez tenham três momentos na sua pergunta que são bastante importantes: o primeiro é de que mulheres nós estamos falando quando a gente fala de clandestinidade do aborto no Brasil, repetir e repetir quem são essas mulheres; o segundo é quando você toca no que foi a história dessa menininha e da onde vem essa resposta; e o terceiro, o menos importante, que é falar do fascínio que ministra Damares tem por mim e que vamos conversar sobre isso, ela me chama de “dona Débora”. Em uma democracia o mais fácil é respeitar as partes, e respeitar até na linguagem, isso é mais fácil, quando você não consegue é porque está tudo muito perdido. Ela não consegue, não consegue pronunciar meu nome, eu não preciso de título nenhum, mas é porque está doendo, ta doendo fundo, e quanto mais doer, mais eu vou falar.

Então vamos lá, você diz o seguinte: quem são essas mulheres? Primeiro vou começar com uma afirmação e que eu tenho ciência, para quem quiser perguntar: essa mulher é a mulher comum brasileira. Uma em cada cinco... quero que vocês contem 5 mulheres aos 40 anos que conheçam, pensem na avó, na mãe, tia, prima, filha, vizinha, colega de trabalho com 40 anos, quem for… uma em cada cinco já fez um aborto. O que diz a Damares e os que querem a criminalização é que essa mulher deveria estar na cadeia, passar pela cadeia. É meio milhão de mulheres por ano, é uma mulher por minuto. Mas ela tem cor, ela tem escolaridade e ela tem região. Esse meio milhão tem uma concentração no norte e no nordeste, nas mulheres com menor nível de escolaridade, e nas mulheres pretas e pardas, as mulheres negras. O que a gente ta falando? Que ela é a mulher comum da cara da desigualdade brasileira. Porque o Brasil é desigual. É 1%, ou sei lá, 5% das elites que estão fora das que tem que se submeter às regras do Estado para ter os seus direitos garantidos, para ter acesso à saúde. As mulheres com a minha cor, com a minha escolaridade, elas não abortam? Elas abortam. Só que elas vão na clínica, pegam avião. Elas não correm risco. Então essa é uma lei que tem cor, que tem classe, que tem os privilégios da sociedade brasileira.

Então essa inversão de valores, quando eles falam, às vezes eu tenho dificuldade de entender o que isso significa, de verdade, e não estou fazendo ironia, eu tenho muita dificuldade quando eu vejo aquelas pessoas gritando na porta daquele hospital, para uma menininha de dez anos, negra, de uma família que vivia do auxílio emergencial durante a pandemia, ou seja, a cara mais perversa da desigualdade brasileira, e aquelas pessoas vão à porta de um hospital para gritar para esse corpo, em total desamparo, “assassina”. O que é isso? Eu não canso de fazer essa pergunta a mim mesma, porque eu preciso entendê-los, o que são esses fanáticos que perseguem um corpo em tamanho desamparo, como era essa menininha anônima, criada junto de uma avó. E aqui não há nenhum julgamento a quem foi essa mãe ou esse pai, porque assim são as famílias, ao contrário do que disse o ministro da educação hoje, “famílias desajustadas”. Não, essas são as famílias comuns. Então, nós estamos falando da mulher comum, e essa mulher comum que tem suas camadas de precarização injustas da sociedade brasileira, e quem os fanáticos perseguem.

E aí você me perguntou o que aconteceu com essa menininha, com a história dessa menininha, que eles saíram com essa perversidade dessa portaria. A minha própria história responderia que se eles são como alegorias, me permita essa imagem, de um redemoinho, um furacão, em que eles juntaram forças muitos diferentes na parede desse redemoinho, que é onde tá o barulho, onde tá o vento, aonde tá o ruído, eles juntaram os que defendem armas, os que fazem flexão de braço, os que são militares, os que por razões diferentes se juntaram nesse redemoinho de ódio que é o bolsonarismo. No centro desse redemoinho, que é a lógica dessa força, ela é silenciosa. Ele deixou de ser silencioso com o caso da menininha. Damares nunca foi um personagem somente burlesco, ela sempre esteve no olho desse redemoinho. Porque isso que uniu esse redemoinho juntando forças tão diferentes foi a perseguição às mulheres, a perseguição às minorias, a questão da sexualidade e de gênero. Nunca foi outra pauta. Armas, eu consigo explicar à você como isso está colado a um modelo de patriarcado colonial, racista. É onde está a propriedade que toca: a terra, a casa, as mulheres e as crianças… e a senzala. Então não deixa ser. Damares nunca foi um personagem acessório, burlesco, azul-rosa. Ela externa o que era esse olho desse redemoinho. A menininha passa a ser a vítima de uma comoção, de um ponto de virada em que as pessoas passam a fazer uma pergunta sobre aborto que elas não fizeram antes, que era “o que tá acontecendo aqui? Eu não sou essa pessoa que vou à porta de um hospital gritar ‘assassina’ à uma mulher, muito embora talvez quando perguntada, eu diga ‘sou contra o aborto’, não, eu to falando de outra coisa”. Então as pessoas começaram surpreendentemente a fazer um pergunta, que é “o que é que está acontecendo aqui, que eu não sou essa pessoa”. Eles sentiram. E por isso tão rápido essa portaria veio.

E aí eu passo à sua pergunta final, sobre a pergunta de quem é a Damares, ao contrário de todas as vezes em que eu escrevo, e eu escrevo com muito respeito sobre ela - isso não quer dizer que eu não escreva a interpelando sobre o espaço de poder que ela ocupa, e a interpelando porque não bastam mulheres na política, nós precisamos de mulheres feministas na política. Nós não precisamos só de corpos, não me convoquem a uma sororidade a mulheres que representam o patriarcado. Então não basta a sexagem, ou viver o gênero como uma mulher, para mim, ter uma sororidade ou um encontro. Nós precisamos de mulheres como é você, como são tantas que estão aqui, com vozes críticas. Então Damares para mim, eu vou até o última dia em que ela estiver no poder, me manter como uma ativista de direitos humanos sob o programa de ativistas de direitos humanos ameaçados, do ministério dela, porque é isso que eu sou. A cada nova ameaça eu informo a ministra das ameaças que eu sofro. E elas não são ameaças de “você é boba”, elas são ameaças de massacre a universidade, de me matar, de matar a minha família, de tornar a minha vida impossível de entrar em sala de aula, com o dever de cuidar das outras pessoas. Tanto que eu não podia mais trabalhar sem escolta policial, e eu acredito que a polícia tenha mais o que fazer do que proteger um corpo, e que é incapaz de proteger. Então ao mesmo tempo em que eu sou uma ativista protegida pelo ministério da Damares, ela me chama de “dona Débora, venha fazer caridade na minha igreja”. O sarcasmo é um sinal a mim do desrespeito a atividade de direitos humanos e a proteção dos direitos humanos, o que nós já sabemos que está aqui. Então quando Damares faz o gesto burlesco dela de dizer que vai me processar por repercutir a matéria da Folha de SP, a única coisa que eu posso dizer é que estou esperando o seu processo, ministra, e vou esperar. Mas eu quero saber, e eu espero que ela esteja nos ouvindo, porque ela gosta de me ler, quero que ela me responda: senhora interveio ou não no direito dessa menina ao aborto? A sua equipe foi ou não àquela cidade? A senhora mandou ou não médicos àquela cidade? É só isso que precisa responder, e com a verdade, porque a mentira não combina com a democracia.

L.P. Débora, coloco aqui toda minha solidariedade à você, porque de fato é inaceitável que a repercussão de uma matéria jornalística gere uma ameaça como essa, e também todas as ameaças que você tem sido vítima. Alguns anos atrás, quando surgiu aquela denúncia, a gente também se colocou ao seu lado, como grupo de mulheres Pão e Rosas, e seguimos juntas!

Eu queria comentar um pouco, eu gostei muito dessa sua análise sobre como que o que eles veem no caso dessa menina é surgir um setor debatendo o direito ao aborto de forma progressista, a gente vê bastante nas redes o pessoal comentando muito nesse sentido também. Eu fiquei pensando que, para além dos efeitos sobre o debate do aborto que a gente esse governo caminhando, também é um governo que ataca de distintas formas o direito reprodutivo das mulheres. A lei do teto dos gastos, que vem desde o golpe institucional, que impede o acesso das mulheres à saúde e a uma educação plena; também as ameaças contra a educação livre, que é o que permitiria, por exemplo, que a gente tivesse direito à educação sexual, o que me parece uma questão fundamental pra poder debater o direito ao próprio corpo. Ou fato de que a gente viu essa semana uma série de ataques contra os trabalhadores dos Correios, que vem de uma greve, e um dos ataques do Tribunal Superior do Trabalho é justamente retirar dois meses da licença-maternidade dessas trabalhadoras. Eu acho que é um absurdo enorme tudo isso que a gente ta vivendo desde o golpe institucional, que também ta representado nesses ataques em relação ao aborto, em relação ao ódio às mulheres e LGBTs. Você falou um pouco sobre quem são as mulheres que abortam, mas queria que você comentasse um pouco também sobre o que tá junto com o que seria o direito ao aborto e o direito ao próprio corpo. Como a gente pode conectar? As mulheres que abortam, você mesma falou que as que morrem são as mais pobres, as negras, periféricas. Queria que você comentasse um pouco sobre a sua pesquisa em relação a situação do aborto pras mulheres brasileira, quais as implicações mais globais de classe e raça que estão em torno dos dados de mortes por abortos clandestinos. Pensando como essas reformas e ataques dos governos se relacioncam com isso, e não só isso, mas também o direito ao próprio corpo, direito à saúde, à educação, direito a se conhecer, direito a se proteger. Quem são as mulheres que morrem por aborto clandestino?

D.D.: Eu acho que a sua pergunta tem uma coisa importantíssima. Eu até acho que é uma pergunta de gente que quer cuidar de mim, [me falam] “mas Débora, por que ficar falando tanto de aborto? Tem tantas coisas importantes, por que aborto, você não pode calar um pouco a boca e deixar sua vida ficar um pouco melhor?”. Letícia, se eu tenho que fazer alguma coisa nessa vida com os meus testamentos merecidos, de ser uma mulher branca, socializada em valores embranquecidos, eu não nasci feminista, foi com muito esforço que eu fiz as perguntas para me fazer feminista, com muito esforço e seguindo pessoas como você e como tantas outras mulheres. Entender os efeitos das minhas marcas perversas da branquitude, o racismo, e aí eu posso aumentar a minha lista para você do beliscão que a vida tem que me dar sobre o que eu vou fazer com meus testamentos merecidos. Porque são testamentos merecidos, e aqui eu não estou falando de testamentos financeiros, mas de não ser um corpo que a polícia grita “ei!” e eu não vou me tremer toda.

Então o que fazer com isso? Por que o aborto? Eu nunca fiz um aborto, nunca passei por essa experiência, mas sei que se precisasse passar por essa experiência, eu não viveria o que essas mulheres vivem, porque eu teria tido dinheiro e acesso à informação durante a minha vida reprodutiva. E o aborto é uma das questões da mulher comum que toca em várias dimensões da vida, não foi à toa que sua pergunta saiu de 1) licença-maternidade; 2) trabalho; 3) cuidado de crianças; 4) mortalidade; 5) nós podemos dizer a manutenção da mulher no trabalho; 6) reconhecimento dos cuidados como a condição de sobrevivência humana, quem é que cuida?; 7) creches; 8) você falou de educação sexual nas escolas… a gente pode começar a fazer uma lista sobre o que está orbitando o aborto, porque quando a mulher toma a decisão de quando, como, com quem ela vai ter um filho, ela está falando sobre projetos, sobre futuro, sobre ser uma mãe, sobre exercitar a maternidade, sobre atualizar o cuidado. Se é a mulher comum quem faz o aborto, essa mulher tem filhos, ela tem religião, ela sabe o que é a maternidade, e ela sabe que em algum momento da vida ela não pode ter outro filho. As razões só ela sabe, só ela tem. E por que isso é tão importante? Porque quando estamos falando de meninas e mulheres, nós estamos falando de permanência na escola, estamos falando de mobilidade social em uma sociedade tão desigual quanto a nossa. Mobilidade social é sair de uma determinada origem de classe da sua família e com a escolarização conseguir, porque não é só mérito no Brasil, com diversos outros “acúmulos” de oportunidades, conseguir ir fazendo a migração de classe. E com muita resistência do outro lado.

Então o aborto é exatamente por ser um tema de tanto fanatismo de perseguição às mulheres, e tão central à vida das mulheres, que ele nunca me abandonou e eu nunca abandonei ele. Muito embora ele não tenha sido [algo que vivenciei], mas não precisamos. Nós temos a vivência das nossas questões de militância, das nossas questões de pesquisa, nós temos uma voz adicional, uma voz muito forte para enunciá-la como uma demanda do justo. Quando essa voz falta, como é o meu caso que não tenho a experiência do aborto no meu próprio corpo, eu fiz a minha vida integralmente em torno disso, com todas as minhas ferramentas, para conseguir ter aquilo que me faltava, que era a experiência, que eu nem tive da maternidade e nem tive do aborto. Então eu vou ouvir histórias, ver filmes, vou conversar, vou ensinar, vou fazer ciência, numa tentativa de dizer se eu vou servir para algo nos meus privilégios, para me lançar dentro do que deveria ser simplesmente uma proteção de saúde às mulheres comuns. O aborto toca tanto porque ele toca, em termos sociológicos, a reprodução biológica, mas a reprodução social da vida. Quando nós controlamos os corpos com capacidade reprodutiva, os corpos que tem útero, que nós chamamos como categoria sociológica de mulheres, nesse debate para facilitar a conversa, mas os corpos trans estão aqui incluídos… controlar essas mulheres é controlar o projeto de filiação, de família, de reprodução, de reprodução de patrimônio, de regime de classe, de trabalho, de ascensão das mulheres, de aparição das mulheres, até na política.

[...]

Vou contar aqui uma coisa pra você. Há duas semanas fez dois anos que eu saí do Brasil. Eu não vou celebrar tristeza, a gente tem que celebrar a vida, o que tiver de vida. O que a gente vai viver, a vida na sobrevivência, a vida no que a gente tem. Dois anos atrás eu tinha um monte de coisas que eu achava importante, eu achava meus livros importantes, e eu vim sem livro. Eu continuo achando importante coisas que eu não posso ter nesse momento, como ir ver meus pais, que são idosos, tenho que explicar para eles essa confusão toda. E quando eu saí do Brasil foram meses que eu pensei muito o que eu ia fazer inclusive com o privilégio de poder viver esse desterro e não sucumbir. Então essa afirmação da sobrevivência tinha que ser pra me lançar no mundo. Então eu entrei no Twitter, nunca tinha entrado, entrei no Instagram, eu fui conhecer pessoas, pensei em conhecer um mundo já que eu não posso [fazer outra coisa], não posso tocar nas pessoas, não posso mais conversar com as pessoas, eu não posso ir pra sala de aula, não posso dar aula. E quando eu digo que não posso é porque o poder perverso desse tipo de ameaça é transformar a vítima, e essa é uma expressão dos estudos, em radioativa. Porque na hora que eu vou e vem uma ameaça, as pessoas questionam se eu não estou botando ninguém em risco ali. Esse é o poder. Você vai me perguntar se eles iam me matar. Não sei. Mas qual o poder do contágio de alguém que grita “assassina” pra uma menininha. Então o que eu podia e decidi deliberadamente foi dizer que se eu falo de aborto, eles me perseguem, então eu vou falar sem parar. Sem parar. Onde for possível, eu vou estudar sem parar esse tema, onde eu puder. Eles vão me transformar mais ainda em quem eu já era. A perseguição também tem isso pros perversos que perseguem, eles acabam criando mais força ainda. Se a intenção é silenciar, isso é uma possibilidade, mas o medo não pode fazer isso com a gente. Isso é o que o fascismo faz. Talvez algumas pessoas aqui não queiram usar o conceito de fascismo, que usem o autoritarismo. [To falando sobre] o que fazem essas pessoas que operam pelo medo, que dizem que vão processar você, como fez a Damares. [A intenção era para eu] dizer que agora vou pedir desculpas, vou calar minha boca, e não vou falar mais. Não, eu falei no Instagram, falei dois dias seguidos, fiz quatro publicações. Eu não vou faltar ao respeito com ela. Mas eu não vou faltar.

[...]

L.P. Na verdade é isso né Débora, o fato de existirem esses políticos, esses representantes de uma política de medo, de ataques, de reformas, é justamente pra buscar impedir que a gente se mobilize, porque o que eles sabem é que a gente tá disposta a se mobilizar. Se não tivesse a polarização política, se não tivesse crise, crise orgânica, que é essa crise onde as pessoas já não se sentem representada por nada, começam a querer sair pra rua, fazer suas mobilizações, se não existisse tudo isso não tinha a necessidade nem de Bolsonaro, nem de Mourão, nem de Damares, nem de Moro né, porque o judiciário cumpriu um papel bem importante de golpismo… E eu acho que justamente, eu vejo muito como você, cada ameaça tem que fazer a gente gritar mais alto, buscar se organizar mais, buscar se fortalecer, criar esses debates, essas reflexões, buscar transformar em processo de luta.

E eu queria te perguntar com relação a essa questão da luta, porque a gente tá perto do dia 28 de setembro, dia latino-americano e caribenho pela legalização do aborto, e é um dia que em alguns anos foram processos internacionais de luta bem emocionantes. Ano passado tava no meio do debate sobre a legalização do aborto na Argentina, teve manifestações bem fortes aqui no Brasil. E eu queria te perguntar, porque a gente até comentou sobre isso, tem a Damares lá, que é uma ministra, mulher, de direita, tem a Sara Winter, que convocou os fundamentalistas para estarem na frente do hospital. São duas mulheres de direita que representam os interesses de ataques contra os trabalhadores. E a gente teve a experiência também de mulheres que entraram no poder através de se apoiarem no movimento de mulheres, como foi a própria experiência da presidência da Dilma Roussef aqui, que na verdade por mais que fosse um governo que veio potencializado pelos movimentos de luta das mulheres e de trabalhadores, no final das contas acabou assumindo um governo de negociações com a bancada evangélica, que depois se tornou uma das principais bases do bolsonarismo também. Então essa questão pra gente, do Pão e Rosas, é muito importante, de que pra gente não é uma no poder, mas milhares pelas ruas, milhares lutando, se organizando para conquistar os nossos direitos, essa ideia de que o patriarcado não vai cair, a gente vai ter que derrubar ele. Então queria te perguntar como que você vê isso, essa questão da organização, dos processos de luta, que impacto você vê que tem isso nos estudos de história da luta pela legalização do aborto, que você faz, enfim.

D.D.: Essa pergunta é muito importante. Eu fui à Argentina nos dias da votação no Congresso, há exatos dois anos, era na mesma semana em que estava no STF no Brasil, e ali era uma imagem inesquecível. Mais de um milhão de mulheres e meninas na rua com esse lenço [mostra o lenço verde que se tornou um símbolo da luta pela legalização do aborto na Argentina], que ele tem história. Essa bandana tem uma história linda, com o lenço branco das avós da Praça de Maio, que eram aquelas mulheres que queriam saber dos seus filhos [desaparecidos] pela ditadura. E aquele era um momento de tanta esperança, ocupar as ruas, esse milhão de mulheres nas ruas. Então eu acredito que esse feminismo dos 99%, que é a luta das 99% do mundo, e não do 1% mais ricos, que ficaram mais ricos ainda com esse capitalismo neoliberal, inclusive durante a crise, esse feminismo, especialmente da tradição argentina, tinha isso de ocupar as ruas, ocupar o espaço público, porque as ruas nos pertencem.

Qual o nosso desafio agora com a pandemia? É que nós precisamos nos reinventar nas nossas formas de assembleia. Eu chamo 150 pessoas nos assistindo, às 19h, em plena quinta-feira, que nós estamos em uma assembleia. Eu consigo imaginar cada uma das pessoas que estão aqui, e nós estamos juntas, conversando. 150 pessoas, mais tantas outras que ainda vão ver. Isso nós precisamos convocar com nomes, porque nós não podemos mais fazer assembleia na esquina como fazíamos. Mas que nomes nós damos a isso? Pra essas lutas que vão se formar, com as vias das tecnologias, com essa forma de comunicação de pessoas que não se encontrariam, talvez, de outra maneira, como o exemplo de nós duas, se não fosse as redes sociais, as lutas que se encontram em ecossistemas, e eu acompanho você, eu sei que a sua questão central é a questão do trabalho, da desigualdade de classe, e nós nos encontramos. Nós vamos ter vocabulários diferentes, mas nós temos algo que tá nos fazendo nos encontrar aqui para falar disso, dessa mulher que é mais vulnerável... e ok que em outros momentos nossos ecossistemas se distanciam, mas eles não são opostos, eles se distanciam. Então quando eu vejo você falando sobre a luta dos entregadores antifascistas eu tenho que fazer aonde eu converso me aproximar, porque aí é onde estão as mulheres que fazem aborto. Aí é onde estão as mulheres que precisam de estrutura para cuidar dos seus filhos, é aí em que estão as mulheres que sofrem violência. Quanto mais eu conseguir ouvir sobre a precarização do trabalho, mais eu consigo ouvir sobre a realidade das mulheres, e assim vai.

O que estou querendo dizer, se fizer sentido: nós temos que continuar com nossos vocabulários, luta, encontro, representação, assembleias, e pensar se essa vida dessa paratopia, dessa ausência de uma geografia comum que nós estamos vivendo, fico pensando se esse momento não é uma assembleia. E se sim, como nomear essas assembleias políticas. O que nós fazemos com elas? Como nós fazemos com que nossos movimentos disputem narrativas? Porque disputar é importante. Eu falo muito de uma esperança feminista, mas não é um platô, não, nós vamos disputar permanentemente. E ok. E até com essas divergências que nós vamos construir esses encontros do ecossistema. Que podemos chamar de aliança, podemos chamar de encontro. Eu estou aberta a como quiser. Mas nós temos que dizer. O que não podemos fazer, eu acredito, é operar pelo ódio como eles operam, porque o ódio é intimidador, o ódio é fragmentador de uma maneira que não permite os ecossistemas de se encontrarem. Não sei se faz sentido.

L.P. Demais! Me faz pensar bastante que essas mulheres que abortam são mulheres de todos os tipos, a gente falou aqui algumas vezes como a clandestinidade é um dado comum para todas as mulheres que abortam. Viver essa experiência de não ser dona do próprio corpo, de repente receber a notícia de um médico, ou de um teste de farmácia, e o seu corpo não é mais seu, seu corpo agora é do Estado e o Estado regula o que vai acontecer dentro do seu útero. Essa experiência que a gente divide todas como mulheres, que eu acho que é muito importante que nessa unidade na luta a gente saiba que tem algumas de nós que vivem essa realidade de forma mais dura, que é a realidade dessas mulheres negras e trabalhadoras. Isso não faz com que a gente não possa estar juntas, mas com que a gente possa estar junta dizendo sobre todos esses problemas e inclusive os outros problemas que atingem a classe trabalhadora e que são parte de compor essa constelação de dilemas de direito ao próprio corpo, como você estava falando, a questão das reformas, dos ataques à saúde, à educação, tudo isso compõe essa realidade de miséria de várias… da grande massa de mulheres que a gente tá falando. Eu até quero te dar o recado que a Diana Assunção, que é autora de alguns livros sobre a questão do feminismo e marxismo, mandou um beijo pra você. Eu sou leitora muito assídua dela, ela te admira demais também, e eu tava me lembrando justamente de um debate sobre isso com ela, em que ela fala da importância que tem de a gente reconhecer o lugar do patriarcado na existência desse sistema social que a gente vive que é o capitalismo, que atua diminuindo os salários das mulheres, precarizando o trabalho das mulheres, associado com o racismo fazendo com que as negras recebam 60% a menos que os homens brancos, em média, no Brasil e nos Estados Unidos. Enfim, esses aspectos que movimentam um pouco a maneira como a gente pensa.

D.D.: Eu queria dizer que você definiu tão bem uma coisa, que é o seguinte. Nós temos uma clivagem de classe, que é uma clivagem racial na questão do aborto, sobre quem vai morrer, quem vai viver, quem vai correr mais riscos e quem não vai correr, mas há uma unidade aqui que quando se criminaliza, mesmo essa mulher branca da elite vai viver o estigma da criminalização, ou do pecado se ela for uma mulher de fé, que é a mulher comum brasileira. Então nós temos uma unidade de partida que o crime faz isso, mesmo aquela mulher que pega o avião vai ter que negociar com essas simbologias comum, que é do pecado e do segredo, ela não deve falar sobre esse aborto mesmo oito anos depois de ter feito, mesmo que com segurança, porque ela pode levar um processo penal.

Mas você diz o seguinte. Essa unidade está ali e ela vai tendo as suas amplificações de precarização a depender de que mulher nós estamos falando. E aí a gente pode dar um exemplo concreto disso: está tendo a pandemia da covid, com as respostas dadas pelo patriarcado, um patriarcado capitalista que não coloca a saúde sexual e reprodutiva, ou o cuidado das crianças, ou o trabalho do cuidado no centro de uma resposta econômica e social. Essa é uma escolha, eles não colocam. Falam em recuperar a economia, mas e o trabalho do cuidado? Vou te dar um exemplo concreto. O Brasil é o país do mundo em que as mulheres mais morrem na gravidez, parto e puerpério (42 dias seguintes ao parto) relacionado à covid. É o país no mundo em que as mulheres mais morrem! Os estudos vão mostrar que essas mulheres sofreram em extremo sofrimento. Todos os dias, como artista plástica eu mantenho um álbum lá no meu Instagram que se chama @reliquia.rum, em que eu conto a história de uma mulher que morreu por dia, desde o início da pandemia, com a primeira história da dona Cleonice no Rio de Janeiro, ela era empregada doméstica e que morre com essa história que nós estamos falando aqui. E então somos o país que mais morre, mas quem é essa mulher grávida que morre, relacionado ao covid? É a mulher negra das regiões mais periféricas do Brasil. Ela não tem acesso ao serviço de saúde, ou ela vai tardiamente, ou ela não acredita que está doente, nós não sabemos claramente as razões, mas nós sabemos que ela é a cara da vulnerabilidade brasileira. Letícia, você tem ideia do que é uma mulher morrer na gravidez? É a morte mais sem sentido, é uma mulher sonhando com a vida, não importa se essa gravidez foi planejada ou não foi, esse é um momento da vida em que a mulher está vivendo um sonho sobre o futuro, e ela morre em extremo sofrimento, sem acesso a uma UTI, ela morre sem ar. Ela morre de uma pandemia que nós podemos chamar de pandemia do desalento. O desalento é a desproteção do Estado que tem que ser protetor. Então talvez a maneira de nós contarmos o que esse patriarcado racista entranhado ao capitalismo faz com as mulheres com covid seja: ele mata. O país do mundo que mais mata mulheres na gravidez, parto e puerpério, que mais mata mulheres negras, mulheres pobres, somos nós. Porque não colocamos as mulheres e meninas no centro de uma resposta. Quando eu digo mulheres e meninas é só para nomear um corpo, e o que vem com a sua constelação de existência: trabalho de cuidado, a precarização do trabalho, e aí nós vamos pros dados. Mesmo as mulheres que estão no topo da estratificação, as mulheres brancas, aqui nos Estados Unidos, são as mulheres que agora menos retornam ao mundo do trabalho. Porque as demandas sobre relações de cuidado que foram terceirizadas às mulheres imigrantes, não documentadas, negras e latinas, mesmo essa é uma economia que está em crise pelos deveres de distanciamento. É um colapso inclusive das formas das mulheres das elites de sobreviverem no topo da estratificação.

L.P. Débora, quero dizer que estou muito feliz [com essa entrevista] e que, apesar das circunstâncias muito tristes que te levaram a vir para as redes sociais, que a gente tenha se encontrado nelas e possa ter feito essa conversa!

D.D.: Sim! E diga à Diana Assunção que eu vou imediatamente sair para lê-la, porque é um campo que eu tenho que estudar mais. [...]

L.P. Ela vai ficar muito feliz, te admira muito! Débora, quero muito te agradecer, você quer ainda dar uma palavra final para encerrarmos?

D.D.: Não, quero só dizer às pessoas que [esse ano] nós temos eleições. É muito importante elegermos mulheres, mas mulheres feministas, mulheres que nomeiem as desigualdades. Nós precisamos de mulheres na política não apenas pela representatividade, representatividade importa, mas ela importa pelo que elas trazem. Covid nos mostrou e agora todo nosso luto pela juíza Ruth Ginsburg nos Estados Unidos é isso, quando às vezes uma única mulher, mas uma mulher com uma consciência do que significa a desigualdade de gênero, a desigualdade nos regimes de poder, ela pode transformar o mundo. Uma vereadora bem escolhida tem poderes de transformação, atrás de você tem o nome da Marielle [faz referência ao cartaz atrás de Letícia], nós sabemos disso na nossa história. E nós não podemos viver esse desencantamento da política. Esse é um momento de afirmação de que cada um de nós vale igualmente para eleger, e esse é o momento de eleger mulheres, mulheres negras, mulheres indígenas, mulheres com os marcadores dos quais representam uma diferente paisagem nas aparições do poder e da política.

Assista abaixo a entrevista na íntegra:

 
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