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USP
O DCE da USP precisa organizar um plano de lutas contra o PL do Doria e as demissões dos terceirizados
Redação

Entrevistamos Clara Gomez, diretora do CAPPF (Centro Acadêmico Professor Paulo Freire), e Laura Scisci, diretora do CAELL (Centro Acadêmico de Estudos Linguísticos e Literários), e militantes da Juventude Faísca sobre o processo de demissões em massa que os funcionários terceirizados da USP vem sofrendo em meio a crise pandêmica.

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Laura e Clara, já se passaram 5 meses desde o início da pandemia no país, que foi parte de aprofundar uma crise econômica e sanitária de gigantes proporções, impactando em diversos âmbitos, como na economia, política e educação. Como vocês enxergam esse momento?

Laura: Então, trata-se de um período em que vemos uma dura realidade para a população e para a juventude em meio ao avanço dessa pandemia, que já totaliza mais de 100 mil mortes e cujo desenvolvimento se deu, principalmente, devido ao próprio negacionismo e pela política genocida do Bolsonaro. Nem mesmo ações elementares, como a emissão massiva de testes foram promovidas pelo governo. Na realidade, o que mais vimos nesses últimos meses, foram suas diversas declarações subestimando essa situação e menosprezando as vidas perdidas pela COVID-19. Além disso, tem uma postura extremamente reacionária, como demonstrou recentemente ao ameaçar de agressão a uma jornalista ou ao endossar toda a onda de seus seguidores, como Sara Winter, para hostilizar e ameaçar verbal e fisicamente uma criança de 10 anos que tinha realizado um aborto na semana passada, fruto de um estupro por seu tio. Esse cenário também se combina com um conjunto de ataques econômicos que vêm sendo lançados nas costas dos trabalhadores e da juventude, em que mais de 9 milhões de brasileiros perderam seus empregos nos últimos 3 meses da pandemia. Nessa situação, a população trabalhadora se vê espremida entre as centenas de milhares de contaminações pela COVID-19 ou a miséria e a fome causadas pelas demissões, que são resultados dos ataques pelas MPs, como a 936, a tal da MP da morte, apoiada pelos militares, Congresso, STF e, inclusive, pelo nosso governador aqui em São Paulo, João Doria. Agora, o governador quer implementar um ataque duríssimo ao conjunto do funcionalismo público: o PL 529 que, se aprovado, vai significar a privatização de diversas fundações e autarquias públicas, para além de nos afetar diretamente aqui na USP, já que quer retirar o superávit acumulado pelos reitores, em base a ataques aos trabalhadores, estudantes e professores que vimos nos últimos anos, ferindo enormemente a autonomia universitária.

Clara: Sim, é um ataque bem absurdo esse do Doria e faz parte de todo um plano bem alinhado com o governo federal de precarizar o funcionalismo público de conjunto, como a gente pode ver no ataque que está acontecendo aos trabalhadores dos Correios. Para além de querer privatizar a empresa, estão retirando todos os direitos desses funcionários. A gente já denunciou esses ataques no CAELL e CAPPF. Para nós, da Faísca, é muito urgente que todos esses setores do funcionalismo se unifiquem para lutar contra isso. É o que achamos que o DCE da USP deve buscar fazer agora, se unificar com os sindicatos de trabalhadores do funcionalismo que serão atacados nesse momento. Por isso, temos defendido que o DCE precisa fazer um plano de luta contra esse PL do Doria e as absurdas demissões dos trabalhadores terceirizados que estão acontecendo na USP. Nós vamos, com certeza, colocar nossas entidades a serviço disso. Inclusive, frente a ofensiva dos bolsonaristas contra algo que deveria ser um direito elementar das mulheres, nós, que também fazemos parte da agrupação internacional de mulheres Pão e Rosas, estamos impulsionando uma campanha pela legalização do aborto, de forma segura e gratuita, batalhando por essa posição em diversos espaços, como na recente assembleia de 700 estudantes da UNICAMP, onde propomos e foi aprovado o posicionamento pelo direito ao aborto legal, seguro e gratuito, por exemplo.

Sobre a situação mais em geral, vejo que tanto Bolsonaro, como os governadores, o Congresso, os militares e o STF nutrem do mesmo descaso com a saúde e a vida da população, e partem do mesmo princípio de que, em meio a essa crise, quem deve pagá-la são os trabalhadores e a juventude. Todos ocuparam e vêm ocupando papéis importantes na aplicação de ajustes econômicos direcionados aos trabalhadores e, tanto Bolsonaro como Doria e Witzel, vêm incentivando a reabertura do comércio sem nenhuma garantia de proteção à saúde da população. Como já tinha dito, no estado de São Paulo isso se reflete com esse PL que vem para aprofundar a enorme precarização e desmonte do serviço público, sobretudo da educação. São diversas denúncias nesse sentido em diferentes categorias, como os professores estaduais que estão há 4 meses sem receber salário, ou os metroviários que vão ter diversos direitos retirados e só depois de 6 meses serão compensados por essas perdas.

E como vocês veem essas questões se expressando nas universidades, e na própria USP, tanto do ponto de vista do ensino quanto em relação ao trabalho?

Clara: Na Universidade de São Paulo, o reitor Vahan Agopyan conflui com a lógica privatista e negligente de João Doria. Sabemos que dentro da universidade, assim como fora, os primeiros atingidos pela crise são os setores mais precários de trabalhadores e estudantes. Hoje, isso se reflete nas demissões massivas que estão acontecendo aos terceirizados da USP, que se soma às demissões anunciadas no dia de ontem de todos os trabalhadores de uma fundação da faculdade de Odontologia, como foi denunciado aqui no Esquerda Diário. Para além disso, vimos como o reitor vem sendo responsável pela implementação de um ensino privatista e precário aos estudantes e pela precarização do trabalho aos diversos setores que compõem a comunidade da USP. Nesse contexto, vimos o avanço dessa forma de ensino totalmente precária e elitizada, que é o EaD, ao mesmo tempo que se agravam ainda mais as dificuldades já existentes á permanência estudantil, como a infraestrutura débil de várias localidades do CRUSP, onde os estudantes estão passando por diversos problemas em sua lavanderia coletiva, com falta de fogões nas cozinhas, e limitações de acesso à internet, além de outras questões fundamentais para o convívio e estudo. Além disso, em meio a pandemia, foi aprovado o artigo 4° da lei complementar 173, resolução 7955/2020, que suspende a contratação de professores efetivos na universidade até 31 de dezembro de 2021, o que piora ainda mais a situação da falta de professores que já impactava diversos cursos, precarizando mais profundamente o ensino por meio da implementação de contratos temporários, no qual os professores recebem baixos salários e têm estruturas precárias de trabalho. Isso porque, nos últimos anos, muitos estudantes se depararam com salas cada vez mais lotadas, e encontram dificuldades para se formar, pois determinadas disciplinas simplesmente não têm professor para ministrá-las.

Laura: Sobre essa questão, essa situação de ataques também está colocada para as universidades que têm previsões de cortes na educação. O avanço do ensino a distância em diversas universidades e escolas exclui milhares de estudantes, principalmente os pobres e negros, que são os que mais sofrem com a falta de acesso ao EaD precário imposto pelas reitorias e governos. Na USP de conjunto, é extremamente revoltante a forma como isso se expressa. No Hospital Universitário, houveram inúmeras denúncias de descaso envolvendo falta de testes e EPIs para os funcionários, além da não liberação daqueles que são parte do grupo de risco. Mas o setor mais duramente atingido em meio a essa crise, como a Clara falou, foram os trabalhadores terceirizados, que são em sua maioria mulheres e negros, cujas condições precárias de trabalho se intensificaram ao seguirem cumprindo suas funções sem equipamentos de proteção, o que ocasionou 6 óbitos, sendo que 2 eram parte do grupo de risco e não tinham sido liberados. Ainda assim, isso não é o suficiente para a reitoria. Há dois meses, a mesma publicou uma portaria que aplica um corte de 25% no valor dos contratos com as empresas terceirizadas, implicando em demissões em massa de trabalhadores dessa categoria.

Frente a esse ataques aos trabalhadores e aos estudantes, como vocês vêm atuando enquanto militantes da Faísca e do Quilombo Vermelho, assim como pelo CAELL e CAPPF, e o que defendem?

Laura: Nós, da Juventude Faísca e Quilombo Vermelho, acreditamos que para conseguir enfrentar essa situação precisamos nos aliar com os trabalhadores e professores dentro da USP, estando ao lado dos terceirizados nessa luta que enfrentam. Assim como nos solidarizarmos e nos aliarmos com os trabalhadores e demais setores oprimidos, como os trabalhadores dos Correios, sobretudo porque a precarização do trabalho, em meio a esse sistema explorador que vivemos, é uma perspectiva iminente para a juventude e que repercute inclusive na própria precarização do ensino. Afinal de contas, as demissões em massa de terceirizados não vêm acontecendo somente na USP, mas também avança em outras universidades, como na UNICAMP. Por isso defendemos, ainda mais frente a precarização que avança com a terceirização dos serviços, que todos os trabalhadores terceirizados sejam efetivados sem a necessidade de concurso público, e em todas as universidades que a juventude Faísca está pelo país levantamos não só essa demanda, como estamos impulsionando uma campanha nacional em defesa dos direitos e do emprego, contra as demissões que têm acontecido.

Clara: Por isso que nas entidades em que estamos à frente, como os Centros Acadêmicos da Letras e o da Faculdade de Educação da USP, trouxemos o debate sobre a precarização do trabalho, que hoje se expressa na campanha contra a dura e cruel realidade indignante de dezenas de terceirizados que estão sendo demitidos. Na Universidade de São Paulo, viemos nos organizando para enfrentar os diversos ataques aos trabalhadores e estudantes, realizando reuniões virtuais nos cursos, denunciando a situação de centenas de estudantes prejudicados pelo ensino remoto, vinculando com essa situação terrível que passam os trabalhadores na universidade, inclusive participando das mobilizações desses setores, como foram as diversas ações no Hospital Universitário. Mais recentemente viemos impulsionando campanhas contra as demissões dos terceirizados, por meio de iniciativas como campanhas de fotos; live chamada pelo CAELL em conjunto com o Coletivo Negro do curso da Letras, no qual contou com a presença de trabalhadoras precarizadas da universidade; e por meio de idas aos institutos da USP para conversar com os terceirizados, com o intuito de saber mais sobre essa situação e denunciar desde os Centros Acadêmicos que dirigimos. Também viemos buscando outras entidades e organizações de esquerda como o PSTU, a Subversiva e o Juntos para se somarem a essa luta conosco, sendo parte de uma exigência ao DCE para que organizem a luta contra essa situação que está colocada.

Tratando-se de problemas que envolvem tantos setores diferentes, quais são as saídas que vocês veem para sua superação?

Clara: Estamos vivendo uma crise histórica, cuja resposta para superá-la passa pela reflexão do papel que as entidades de trabalhadores e de estudantes podem cumprir. O DCE da USP, entidade que representa todos os estudantes da universidade, e que hoje é dirigido pelo PT, PCdoB e Levante Popular da Juventude, vem tendo uma atuação que não coloca a entidade enquanto uma ferramenta de mobilização para os estudantes. Isso porque os seus métodos se concentram em reuniões diretas e conciliatórias com a reitoria por fora de promover a organização entre esse setor. Diante do recente ataque do Doria, o PL 529, aposta numa saída de confiar que por meio de uma carta direcionada aos deputados da ALESP o projeto vai ser barrado, mesmo quando a maioria dos deputados são justamente apoiadores de Dória. Como já tínhamos dito, o papel dos estudantes passa fortemente por se aliar aos trabalhadores no enfrentamento dessa situação, mas se pensarmos no papel que as principais entidades operárias, como a CUT e CTB, e estudantis, como a UNE, dirigidas por essas mesmas organizações, vêm cumprindo ao longo do governo Bolsonaro, vemos que não buscaram organizar a força dos estudantes, esses que ano passado, no 15M e 30M, saíram às ruas e fizeram o país tremer nos primeiros meses do governo Bolsonaro, mostrando a potência que teria para barrar os ataques privatistas e reacionários. Pelo contrário, vimos essas organizações separando as lutas contra os cortes na educação das lutas contra os ataques aos trabalhadores, nos levando a uma situação de precarização do estudo e do trabalho cada vez mais aguda. Isso enquanto o PT, nos estados onde governa, aprova ataques aos trabalhadores e a juventude, e nessas eleições, em diversos lugares, repete a mesma lógica de sempre de alianças com a direita.

Para nós, é necessário que essas entidades rompam com essa lógica de atuação, organizando os estudantes e trabalhadores de diferentes categorias para enfrentarmos juntos esse projeto de desmonte, privatização e ataques generalizados á população. No caso da USP, torna-se urgente que o DCE organize os estudantes para enfrentarmos esse ataque brutal que vem sendo aplicado aos terceirizados e contra o PL 529.

Laura: Ao mesmo tempo, nós também vemos que os demais Centros Acadêmicos e organizações de esquerda podem cumprir um papel importante nesse enfrentamento. E por isso também fazemos um chamado às correntes de esquerda que se colocam como oposição ao DCE, como PSOL, PCB e Correnteza, que estão na direção de diversos Centros Acadêmicos da USP, a não somente fortalecerem a luta em defesa dos setores mais precários da universidade, que hoje estão sofrendo com as demissões, mas também para conformar um polo antiburocrático e independente da reitoria, apostando em saídas que barrem de fato os ataques colocados à universidade, ao ensino e trabalho. Para nós, o papel que os setores que se dizem a esquerda das burocracias podem cumprir é fundamental para fortalecer essa luta e tantas outras fora da universidade. Nesse sentido é que também viemos destacando que para barrar os ataques precisamos confiar nas nossas próprias forças, e não repetir o mesmo caminho que o PT trilhou durante todos esses anos de alianças com a direita. Infelizmente, vemos o PSOL em diversas cidades pelo país se aliando ou apoiando o PT, como foi em Campinas, onde nossa companheira do MRT, Livia Tonelli, retirou sua candidatura por filiação democrática pelo PSOL por conta dessa aliança. O PSOL, inclusive, tem não somente se aliado com o PT mas também com partidos burgueses, como foi o caso no município de Cachoeirinha, onde irão sair em conjunto com um candidato da REDE, partido da golpista Marina Silva. Nos posicionamos de forma extremamente crítica as alianças eleitorais que alguns desses partidos, como o PSOL, vêm articulando nessas eleições municipais com os setores da direita, ou mesmo com as próprias burocracias.

Sobre isso, inclusive, vimos que o MRT está lançando candidaturas democráticas pelo PSOL aqui em São Paulo, assim como em outras cidades do país. Podem falar um pouco sobre isso?

Laura: Sim, estamos saindo com candidaturas nossas por filiação democrática pelo PSOL em Contagem, com a Flávia Valle, no Rio com a Carolina Cacau, em Porto Alegre com a Valéria Muller e aqui em São Paulo estamos construindo uma bancada revolucionária de trabalhadores com Diana Assunção, Marcello Pablito e Letícia Parks, sendo que os 3 têm uma forte trajetória militante bastante vinculada a nossa universidade. A Diana e o Pablito trabalham há anos na USP e foram parte das principais lutas que travamos nos últimos anos. Com certeza a juventude Faísca vai estar 100% ao lado dessa bancada, que nessas eleições está apresentando um programa de enfrentamento a crise, que busque atacar o lucro dos capitalistas para que sejam eles a pagarem por essa conta e não os estudantes e trabalhadores. Esse programa está expresso no recente manifesto do MRT que soltamos aqui pelo Ed, dando ênfase para pontos que consideramos fundamentais, como a batalha pelo não pagamento da dívida pública; contra esse último ataque do Doria, o PL 529; e a luta por uma reforma urbana radical.

Clara: Sim, com certeza vamos estar ao lado dessa bancada revolucionária de trabalhadores. E só para terminar, acho que é importante colocar também a saída política mais de fundo que queremos apresentar de enfrentamento a crise que está colocada. Para nós, a luta dos trabalhadores e da juventude precisa ser contra os ataques que estão colocados, mas também contra esse regime político do golpe institucional. Ou seja, achamos que temos que batalhar não somente contra o governo, mas contra o regime de conjunto que hoje tem uma participação cada vez maior dos militares. Por isso, defendemos a luta por uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, que possa revogar todas as reformas, assim como a lei do teto de gastos e todos os ataques à educação e à universidade.

 
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