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ESTADOS UNIDOS
Um espectro ronda a convenção do Partido Republicano
Redação

O primeiro dia da Convenção Nacional do Partido Republicano foi definido tanto por acusações de comunismo quanto por incentivo a racismo, na medida em os republicanos se fortalecem utilizando dos elementos mais reacionários de sua base eleitoral enquanto também buscam apoio nas classes médias dos subúrbios.

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Um espectro rondava a primeira noite da Convenção Nacional do Partido Republicano: o espectro do comunismo. Toda a base de Trump entrou em uma sagrada comunhão para exorcizar tal espectro. Desde veteranos militares, congressistas eleitos, donos de pequenos negócios, anfitriões da Fox News, republicanos em ascensão, e um exagerado palestrante imigrante cubano, os oradores da primeira noite da convenção centraram fogo nesse espectro.

Se alguém comprasse as falas dos republicanos, esse alguém acharia que a revolução socialista está muito próxima, logo ali na esquina. De fato, a descrição dada sobre Joe Biden e Kamala Harris como marxistas obstinados foi uma amostra de uma realidade alternativa em que muitos de nós queríamos estar vivendo. O poder da esquerda nos Estados Unidos foi superestimada ao extremo na convenção republicana, ao ponto de estar completamente à parte da realidade, com alegações como “a ‘esquerda radical’ tomou conta do Partido Democrata”. Isso é obviamente ridículo, dado que os democratas estão, e sempre vão estar firmemente atrelados ao grande capital, e que Biden foi capaz de derrotar toda a ala progressista do partido e foi nomeado candidato.

A estratégia de “red-baiting” (acusar de comunista) demonstra que os republicanos estão explicitamente se colocando contra programas sociais, como saúde pública universal. Apesar de isso não ser estranho, já que os republicanos nunca foram simpáticos a programas sociais, é importante ressaltar que, no meio da crise econômica e sanitária os republicanos triplicaram a rejeição a programas governamentais como uma forma de resolver a crise. Parece que se Trump for reeleito, nós veríamos uma continuação de rejeição a esses programas assim como um aumento das privatizações. No meio de uma pandemia, os republicanos estão levando à frente uma programa que iria engendrar ainda mais ataques à classe trabalhadora e degradar as condições de trabalho e de vida, o que iria impactar de forma desproporcional trabalhadores não-brancos. Um sinal chave desse plano é a frequente referência à “escolha escolar” - uma outra palavra para privatização e anti-sindicalismo - como um elemento central à plataforma de Trump.

“Red-baiting” não foi a única tática que os oradores tomaram. “Race-baiting”, que é basicamente incitação ao racismo, e fomento ao medo também fora táticas chave, já que os oradores tanto selaram seus lábios para não falar da morte de George Floyd enquanto também culparam o movimento Vidas Negras Importam pela desestabilização do momento atual. Nikki Haley, em seu discurso, foi longe o suficiente para dizer que a “América não é um país racista”. Isso é uma representação de uma crença fundamental dentro do Partido Republicano, expressa não somente por Haley, mas também por Tim Scott e outros oradores: o racismo foi praticamente resolvido, exceto por algumas poucas maçãs podres, e agora esses democratas-marxistas-anarquistas que estão nas ruas deixaram tudo muito pior com a sua cultura de cancelamento e seus protestos.

Interessantemente, a convenção republicana arranjou várias pessoas não-brancas para explicar como, na verdade, Trump está do lado das pessoas negras, apenas não estaria do lado desses “anarquistas” causando tumulto nas ruas. Vários oradores negros falaram sobre o péssimo histórico de Biden em relação a racismo para justificar que Trump é aquele que na realidade ajuda a comunidade negra. Essa tentativa de mostrar, contra todas as evidências, que Trump não é racista e está do lado da população negra é uma clara tentativa de acalmar a consciência dos eleitores dos subúrbios que podem votar nos republicanos. Trump está tentando dialogar com os votantes que não se consideram racistas, mas ainda não querem que os protestos nas ruas vão “longe demais”. Os republicanos também estão tentando uma cínica tentativa de apelar a um setor da comunidade negra que vê através das pretensões dos democratas de ser um partido dos oprimidos, como também a um setor reacionário da burguesia negra.

Orador atrás de orador, eles trouxeram a “violência”, “destruição”, e “anarquia” como um motivo para dar suporte a Donald Trump. A mensagem foi clara (e se tornou explícita com Charlie Kirk): Donald Trump irá defender a “civilização ocidental” desse movimento pela libertação negra.

O exemplo mais explícito dessa incitação ao racismo foi quando falou o casal McCloskey, que já haviam aparecido nos jornais por brandir armas de fogo aos protestantes do Vidas Negras Importam. No discurso deles na Convenção Nacional do Partido Republicano, eles definiram suas ações como “legítima defesa”. Eles foram além e argumentaram que “O que vocês viram acontecer conosco poderia facilmente ter acontecido com qualquer um de vocês que estão nos assistindo de suas calmas vizinhanças ao redor do país.” O uso de “quieto” como um eufemismo para “branco” não deve ser deixado de lado.

Entretanto, na parte provavelmente mais reveladora do discurso deles, o casal disse que Joe Biden e os democratas queriam “abolir os subúrbios”. Essa alegação é claramente absurda, mas foi um momento interessante de falar a parte silenciosa de em alto e bom som. Os republicanos estão pintando os democratas, o movimento Vidas Negras Importam, e o crescente movimento pelo socialismo como se fossem uma ameaça inerente à chamada “cultura branca” nos EUA.

Os republicanos continuaram voltando ao medo do movimento Vidas Negras Importam, e absurdamente dizendo que os democratas apoiam os levantes. Por exemplo, Jim Jordan disse em seu discurso que “os democratas não irão deixar que vocês vão à igreja, mas irão permitir que vão a protestos. Democratas não lhes deixarão trabalhar, mas lhes deixarão fazer tumultos. E os democratas não lhes deixarão ir à escola, mas lhes deixarão participar de saques.”

Para qualquer ativista que esteve nas ruas de uma cidade grande, essa acusação é muito mais que hilária. Na maior parte das cidades foram os democratas que enviaram gás lacrimogêneo, balas de borracha e a Guarda Nacional para reprimir os protestos. Certamente, os democratas não eram mais amigos dos movimentos do que os republicanos.

Dar aos democratas mais créditos do que eles merecem foi um tema central da convenção republicana. Por exemplo, a corrida para ver quem é o mais xenofóbico em relação à China continuou na segunda-feira, com múltiplos oradores argumentando que Biden seria brando com a China - contrastando com a acusação idência que Biden fez a Trump. Em um momento em que as tensões entre a China e os EUA continuam a aumentar, é incrivelmente perigoso e revelador que Biden e Trump pareçam estar em uma corrida sobre quem será mais “duro” com a China.

Há uma razão para que os oradores na Convenção Nacional Republicana continuassem a falar sobre “tumultos” nas ruas, assim como fazer um “red-baiting” tão explicitamente: eles querem ganhar setores das classes médias brancas que correm risco de desertaram para Biden. Para tanto, eles estão optando por pintar o partido democrata como o partido dos tumultos e da revolução, e os republicanos como o partido da estabilidade, progresso, lei e ordem. Ambos os partidos capitalistas estão respondendo à atual crise capitalista com uma retórica de polarização, em uma tentativa de cobrir a falta de reais diferenças entre eles. Nisso é interessante notar que ambos os partidos estão, até um certo ponto, se apresentando como um “mal menor”. Para os democratas, eles estão se apresentando como a última linha de defesa contra o fascismo. Para os republicanos, eles estão afirmando que são a última linha de defesa contra o comunismo. Por exemplo, um imigrante cubano que falou na convenção comparou Biden a Fidel Castro. Ambos os partidos aumentam as apostas nas eleições como uma questão de vida ou morte, e é claro que os dois partidos capitalistas estão lutando contra a crescente desilusão em suas lideranças e lutando para manter o equilíbrio no meio de uma crise social e econômica que só piora.

A verdade é que os dois partidos têm um grande acordo político, apesar de uma grande polarização retórica. Tanto Biden quanto Trump se opõem fortemente ao “Medicare for All” (saúde universal), ambos se opõem a cortar o financiamento da política, ambos apoiam a “escolha escolar”, ambos aparentam estar em uma corrida para ver quem é o mais anti-China, e ambos não apresentam soluções para a atual crise além de forçar que a classe trabalhadora pague por ela.

Trump e o Partido Republicano continuam a atender à base racista de Trump e à extrema direita. Através de sua constante incitação ao medo sobre o movimento Vidas Negras Importam e seu “red-baiting” contínuo, eles tentam se estabelecer como um partido de um certo tipo de reacionarismo. Se a primeira noite da Convenção Nacional do Partido Republicano é um indicativo do que está por vir, a eleição se tornará ainda mais desagradável, cada vez mais à direita, e um motivo ainda mais claro de que a classe trabalhadora precisa de um partido próprio.

 
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