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UFRGS
Há alternativa nas eleições da reitoria da UFRGS?
Valéria Muller
Luno P.
Professor de Teatro e estudante de História da UFRGS

As eleições para a Reitoria da UFRGS ocorrem nesta segunda-feira (13). São três chapas concorrendo ao pleito e, para os estudantes que ingressam esse ano na UFRGS, sejam “bem-vindos” a uma eleição onde o voto de dez estudantes vale menos do que o de um professor. A eleição é tão antidemocrática que, após a escolha do mais votado, o presidente da república escolhe a dedo um dos três primeiros colocados. Sim, Bolsonaro pode escolher quem ele bem entender entre os três primeiros nomes. Trata-se de um processo quase feudal...

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Antes da pandemia essas eleições já eram antidemocráticas, visto que os funcionários e estudantes, somados, valem míseros 30% dos votos, mesmo sendo a grande maioria da universidade, principalmente os estudantes. Este modelo, chamado de 70-15-15, é uma forma de manter o controle da universidade nas mãos da burocracia universitária que, com seus salários acumulados, mantém o caráter elitista da universidade, aprofunda a terceirização e conserva os interesses mercadológicos na formação e pesquisa. É essa a eleição que dita os rumos da universidade para os próximos anos. Viemos em primeiro lugar denunciar o absurdo que é o próprio processo, onde o voto dos estudantes e técnicos vale quase nada. Os terceirizados, que movimentam essa universidade, simplesmente não têm direito a voto.

Entretanto, este artigo não tem o intuito de explicar o que os estudantes da universidade já sentem na pele, principalmente os mais excluídos, os cotistas, negros e pobres. A atual reitoria, chefiada pelo reitor Rui Oppermann e pela vice Jane Tutikian, representados pela chapa 2, faz um discurso democrático, de resistência aos ataques e de defesa da universidade pública. Entretanto, na prática, essa gestão vem sendo responsável por escolher onde aplicar os cortes de Bolsonaro, indeferindo cotistas e demitindo terceirizados, por exemplo. Durante a pandemia é quem busca implementar o Ensino Remoto Emergencial, que abre amplo espaço para avançar na privatização e coloca a possibilidade de que essa modalidade de ensino elitista, precário e mercantil se estenda para além da pandemia, sem que o conjunto dos estudantes sequer possa opinar e decidir sobre o tema. Assim ignora também qualquer proposta de girar todos os recursos da universidade para o combate à pandemia.

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A chapa 1, encabeçada por Carlos André Bulhões Mendes, apareceu com o discurso do “meu partido é a universidade”, uma derivação bizarra do velho discurso da direita na UFRGS, também usado por Bolsonaro em 2018 com o “meu partido é o Brasil”. Diz que “a UFRGS precisa mudar”, mas essa mudança se trata de subordinar a universidade ainda mais aos interesses do mercado. Por trás de uma defesa de “mais contato com a sociedade” está a ampliação da participação da iniciativa privada na universidade pública.

A chapa 3 se apresenta como alternativa frente a atual gestão de Rui e Jane. Partimos de estar ao lado daqueles que apontam a atual reitoria como inimiga dos estudantes e trabalhadores. Muitos desses apoiadores, professores, técnicos, estudantes, militantes e independentes se posicionaram em suas redes pessoais contra o ERE e contra a gestão de Rui, porém o programa e as falas das candidatas da chapa 3 não leva adiante o conteúdo expresso por seus apoiadores. A unidade necessária para barrar todos os ataques que sofremos é na luta. Por isso, queremos debater sobre as propostas concretas apresentadas pela chapa 3 em seu programa e sobre essa estrutura de poder arcaica da universidade. Podemos dizer que esta chapa que se apresenta como oposição pela esquerda, tendo o apoio da atual gestão do DCE e de vários CAs e DAs de esquerda, também é incapaz de apresentar uma alternativa à altura dos desafios impostos pelos nossos tempos. Por quê? Vamos ao debate.

Passamos por uma pandemia e graças à política absurdo do governo Bolsonaro o Brasil passou a ser um epicentro mundial do vírus, com mais de 70 mil mortes e mais de 1,7 milhão de infectados. O presidente de extrema direita, além de negacionista, é inimigo declarado dos trabalhadores, estudantes, negros, mulheres, indígenas. Os cortes na educação, que já vinham dos governos anteriores, se aprofundam com Bolsonaro, apontando para um horizonte de privatização e incerteza da continuidade das atividades nas universidades públicas.

Em meio a tudo isso, são poucas as diferenças de programa entre a atual gestão de Rui Oppermann e a chapa 3. Defendem a "democratização" de determinadas instâncias, mas não se enfrentam com os problemas estruturais mais candentes da universidade, como a estrutura de poder burocrática e concentrada na reitoria, ou mesmo a estrutura do Consun (principal órgão de deliberação da universidade) que conta com maioria esmagadora de professores em detrimento dos alunos e técnicos, além de representações empresariais. As terceirizações na universidade, que exploram milhares de trabalhadoras, em sua maioria negras, na limpeza, segurança e alimentação, recebem o silêncio das chapas 1 e 2 e uma abordagem da chapa 3 que se limita a defender uma terceirização mais digna. Nenhuma das chapas se coloca contra as fundações de direito privado que lucram com a universidade, ou as empresas que se utilizam da estrutura da UFRGS para patentear pesquisas e lucrar ainda mais. Ou seja, tudo o que há de mais retrógrado, arcaico e privatista dentro da UFRGS, as três chapas ou defendem abertamente ou se silenciam.

Agora, as exigências do MEC impõem cenários ainda piores. Exigem a retomada das atividades nas universidades, podendo ser de maneira remota. Surge, então, o Ensino Remoto Emergencial (ERE), uma “alternativa” frente ao EaD (Ensino à Distância). Nomes diferentes, conteúdos semelhantes. Num momento de curva ascendente e acelerada da pandemia, o ERE propõe a volta a uma normalidade que não existe, por fora de perceber o papel crucial que as universidades públicas poderiam cumprir neste contexto e excluindo as e os estudantes pobres, negros, indígenas e com deficiência da universidade. Esse projeto é parte de "boiada" de precarização do ensino superior que o governo Bolsonaro vem passando e quer aprofundar. No resto do país, os ensinos remotos vêm servindo como laboratório de EaD, recebendo elogios de magnatas da educação e pessoas como Luciano Huck. É por isso que as gestões dos CAs do curso de Teatro (CADi) e Artes Visuais/História da Arte (CATC), onde a Juventude Faísca está presente junto com independentes, impulsionam um abaixo-assinado contra o ERE, junto com outros quatro CAs e com apoio do DCE, já contando com quase 600 assinaturas, apresentando também alternativas de atividades ligadas ao atual contexto de enfrentamento ao coronavírus. O professor Jorge Quillfeldt, do deparamento de Biofísica, também apresentou uma proposta alternativa chamada de Atividades Complementares de Ensino Remoto, que apoiamos colocando que seu conteúdo precisa estar ligado ao papel que a universidade pode cumprir neste momento crítico do país.

Clique aqui para participar do abaixo-assinado contra o ERE!

Tampouco nesse tema a chapa 3 apresenta uma alternativa real. Em vídeo abordando seu posicionamento sobre o ERE afirmam que:

“Já apresentamos nossas críticas ao modo como a discussão vem sendo feito (…) não somos contra o ERE, nem somos pela obstrução do trâmite formal da proposta, estamos contribuindo desde o início no seu aperfeiçoamento (…) em setembro, quando assumirmos a reitoria, a universidade já estará com atividades em curso (…) a retomada das atividades não pode ser motivo de exclusão social (…) nem ao agravamento do acesso e permanência de públicos vulneráveis (…) o ERE não pode ser motivo de retrocesso”.

O ERE é motivo de retrocesso sim. Independente da posição da futura gestão da Reitoria, a única garantia que temos é que Bolsonaro e seus aliados, como o novo Ministro da Educação, pastor e militar Milton Ribeiro, seguirão atacando a educação pública, abrindo espaço para a privatização. Não há um caminho fácil. É necessário nos posicionarmos fortemente contra o ERE, conformando a partir daí uma ampla unidade entre os estudantes, professores e trabalhadora. Assim é possível se organizar para enfrentes este e todos os ataques colocados pelo governo obscurantista de Bolsonaro, Mourão e dos militares.

Nas universidades e cursos privados, pesquisas indicam que 265 mil estudantes tiveram que abandonar sua formação, enquanto os grandes monopólios da educação lucram milhões. Essa é a realidade da rede privada e na rede pública não será diferente. Encarar uma eleição para reitoria, no momento em que está sendo pautado um grande ataque como o ERE, sem se posicionar diretamente contra, é um grande absurdo. Não podemos ser coniventes, em nenhum centímetro, com isso. A necessidade do momento é batalharmos para superar todos os entraves burocráticos impostos pela universidade, para que sirva no combate à pandemia. Todos os recursos humanos, científicos e materiais deveriam servir para pensar formas de ajudar neste combate.

A Reitoria é totalmente antidemocrática. Os estudantes são a maior parte da comunidade acadêmica, deveriam ter peso de decisão proporcional ao seu tamanho. Junto com os professores e funcionários, poderiam cumprir o papel de colocar a universidade a serviço deste combate. Caso contrário, seguimos deixando a universidade a serviço dos interesses dos capitalistas e do lucro de grandes empresas que se beneficiam de pesquisas bancadas com verba pública.

É necessário abrir todos os livros de contabilidade da universidade para que o conjunto da comunidade acadêmica possa saber a real situação em meio a tantos cortes, e possa ser parte de decidir as prioridades dos recursos. Além disso, os terceirizados são os primeiros a serem demitidos, como já vêm sendo em plena pandemia. Uma campanha que se coloque em defesa da universidade deveria defender a efetivação imediata de todos os terceirizados, sem necessidade de concurso, pois não precisam provar serem capazes de exercer a função que fazem diariamente. Após isso, abrir novas vagas por concurso público, pois muitos postos foram fechados pela atual reitoria, como já citado, aumentando a quantidade de trabalho exercido pelas mesmas pessoas e com um salário de miséria. Essas e outras mudanças importantes e estruturais precisam ser debatidas em novo processo estatuinte, onde defenderíamos uma gestão tripartite com cada setor sendo representado conforme seu peso na universidade, ou seja, com maioria estudantil, eliminando a burocracia acadêmica, a reitoria e seus privilégios. Diferente do que defende a chapa 2, atual gestão, pois depois de anos encastelados na reitoria, agora fazem demagogia falando de uma nova estatuinte, mas visam piorar o atual regime universitário. Seu projeto para a UFRGS, como mostraram em seus anos de gestão, avança na privatização da universidade e descarrega os cortes sobre cotistas e terceirizados.

Isso tudo só será possível com um enfrentamento com o governo federal, em base a uma forte mobilização de todos os setores, que batalhe também pelo Fora Bolsonaro e Mourão e combata o conjunto dos ataques desse governo reacionário. Para isso é necessário unidade com os trabalhadores de dentro e de fora da universidade, a começar por categorias em luta, como os entregadores de aplicativo, que preparam uma nova paralisação para julho. É através da unidade com os trabalhadores que poderemos barrar os ataques de Bolsonaro e dos capitalistas e avançar em um projeto de educação e de sociedade que sirva às necessidades da população e não ao lucro.

Atualização:
Até o momento em que fechamos esta nota, em todas as pesquisas realizadas para se chegar a um posicionamento, não tínhamos localizado nada onde a chapa 3 defendesse a paridade. Após a postagem do presente texto localizamos no site da chapa 3 a reivindicação da paridade como parte do seu programa publicado e o texto que segue é a versão atualizada.

 
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