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O acordo Macron-Merkel salvará a Europa de um abismo?
Juan Chingo
Paris | @JuanChingoFT

[Desde a França] A pandemia de COVID-19 que teve a Europa como um de seus epicentros, ampliou a divergência entre os países do norte e do sul deste continente, ao mesmo tempo em que converteu alguns de seus membros, como a Itália em crise, no campo de batalha dos Estados Unidos, China e Rússia. A proposta lançada pelo eixo franco-alemão tenta dar respostas a estas contradições que arriscavam a sorte da União Européia.

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A União Européia a beira do abismo

Já fortemente golpeada no momento mais crítico da pandemia, a falta de solidariedade e divergências européias poderia vir ainda mais à tona frente à pesada crise econômica que vem através dos planos de recuperação que cada Estado pretende lançar para salvar sua economia. É que a ausência de uma reação comum corre o risco de favorecer planos nacionais não coordenados que caminhem inclusive em direções opostas. Esta nova situação ameaça trazer novamente a crise do euro que nunca foi superada. A moeda única não permitiu reforçar entre o norte e o sul da Europa e muito menos as medidas adotadas após a crise da dívida soberana (2010-12) a raiz da crise financeira de 2008. Porém, diferente desta última crise européia, a crise atual afeta o conjunto dos países, incluindo os Estados mais fortes.

Os diversos Estados anunciaram planos nacionais de recuperação que são necessariamente desiguais e correm o risco de exacerbar as diferenças, aumentando a fragmentação da zona do euro. Como explica John Springford do Center for European Refor:

Há varias explicações para que a COVID-19 seja mais prejudicial para o sul da Europa [...] Porque os países do sul da Europa tendem a ter níveis mais altos de dívidas e custos mais elevados para empréstimos. Isso os fará menos capazes para usar suas contas nacionais para proteger as companhias da bancarrota ou para estimular a recuperação. Isto significa que as companhias do norte europeu estarão em uma posição mais forte para tomar maiores cotas do mercado quando a pandemia diminuir [1].

Como resultado destas divergências, a dívida soberana também aumentará fortemente, com a perspectiva de que os países já endividados encontrarão muita dificuldade em arrecadar fundos para alimentar seus programas de estímulos. A perspectiva extrema da explosão da moeda comum, através de uma nova especulação contra a Itália que se transmitirá a Espanha e França, não é pura especulação. Ainda que o BCE tente evitá-lo continuando sua intervenção nos mercados, a amplitude da crise levanta dúvidas sobre a eficácia desta estratégia. É neste marco crítico que devemos entender a reação do eixo franco-alemão e o giro da chanceler da Alemanha.

O giro de Merkel: um momento hamiltoneano na Europa?

Berlim resistiu por muito tempo às ambições francesas como oradora dos países do sul de uma maior repartição da carga fiscal, impenetrável aos argumentos de que a estabilidade da eurozona está em perigo sem isso. Neste marco, a proposta franco-alemã de um fundo de recuperação de 500.000 milhões de euros para ajudar a recuperar os danos econômicos da pandemia de coronavírus que inclui inicialmente grandes transferências no lugar de empréstimos às regiões mais afetadas, financiadas pela dívida comum da EU, é uma concessão importante que fala da gravidade da crise.

Para alguns se trata de um momento “hamiltoneano”, em referência ao primeiro secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Alexandre Hamilton, que conseguiu mutualizar a dívida dos estados com os cofres mais balançados pela guerra da independência. Foi essa a referência histórica utilizada pelo ministro de finanças alemão Olaf Scholz defendendo o plano em uma entrevista ao Die Zeit na quarta passada. É certo que, pela primeira vez, as duas primeiras economias da zona do Euro tiveram um acordo em propor um “instrumento de dívida comum” e que para atender e garantir centenas de milhares de milhões de Euros de novos empréstimos por conta própria, a EU necessitará de mais ingressos fiscais do que recebe atualmente, os mais entusiastas vêem que para obter ingressos adicionais, a UE terá que arrecadar novos impostos por conta própria, isto é, impostos pan-europeus que deveriam basear-se em atividades econômicas que transcendam as fronteiras nacionais: por exemplo, os impostos sobre o carbono ou as transações financeiras.

Porém, tratando-se de Europa é recomendável não passar o carro na frente dos bois. Em primeiro lugar, não se trata de uma garantia de solidariedade entre os Estados europeus sobre as dívidas do passado, mas sim de liberar 500.000 milhões de euros de dinheiro novo para lutar contra as consequências sanitárias, econômicas e sociais da crise do coronavírus. Mas importante ainda, o dinheiro não virá sem condicionamentos: segundo França e Alemanha, o apoio da EU estará sujeito a que os recebedores sigam “políticas econômicas sólidas e um ambicioso programa de reformas”. Isso é um retumbante esclarecimento a peregrina ilusão de alguns dos líderes do sul, como o primeiro ministro do Estado Espanhol Pedro Sanchez, de que a Europa será salva a troco de nada. E isso também é assim porque embora seja certo que este dinheiro não será devolvido diretamente pelos governos que o utilizarão e que não se endividarão mais com os mercados, seguem sendo empréstimos tomados pela UE (através da comissão) que devem ser reembolsados.

Por exemplo, Itália que seria um dos principais beneficiados deverá contribuir ao reembolso, ainda que em medida muito menor que a Alemanha (ao redor de 11% e 27% respectivamente). Mas em geral:

Para constituir um verdadeiro momento “hamiltoneano” os Estados membros (da UE) deveriam recorrer um longo caminho e conferir poderes impositivos significativos a União Européia, disse Shanin Vallé, membro do Conselho Alemão de Relações Exteriores. Nada no acordo se aproxima disso [...] Um verdadeiro passo decisivo rumo à união fiscal requereria a entrega de recursos próprios de forma muito mais ampla [...] Uma união fiscal normalmente teria um só ministro de finanças responsável pelos empréstimos e os gastos. Porém, o plano franco-alemão faria muito pouco para mudar o sistema híbrido de governança da União Européia. Assim como a cada vez que se aprovam as despesas da UE a cada sete anos, os capitais nacionais também terão a palavra final no novo modelo de impostos da UE [2].

Entre as fraturas internas da UE e a batalha geopolítica mundial

A realidade que impede avançar rumo a um estado federal é que as diferenças no interior da UE são estruturais. A fratura entre norte e sul é a mais profunda do continente e hoje em dia esta tem como elo débil a Itália e, pelo peso deste país, a toda a construção da União Européia. Como expressou o premiê italiano e ex-comissário europeu Mario Monti: Não se trata da dolce vita. Se trata da vita.

O coronavírus aprofundou a mesma falha tectônica que atravessou a UE durante a crise do Euro, com a débâcle da Grécia como uma espetacular advertência para o futuro. A realidade é que como diz o economista heterodoxo Juan Laborda:

“… o problema de fundo da União Européia é mais profundo, desde suas origens se fez à medida da Alemanha. Por um lado, a entrada do sul da Europa no Euro, com o consentimento de suas elites, acabou destroçando nosso setor industrial que não estava preparado para o livre mercado. Porém não só isso. Alemanha no presente segue sem querer reduzir seus superávits por conta corrente mediante políticas que facilitem um maior consumo de suas famílias. Tampouco quis assumir as consequências do preço de risco dos investimentos de seus bancos. Estes canalizaram o investimento dos alemães para atividades e ativos sem levar a cabo a correspondente análise de riscos, obrigando a espanhóis e irlandeses, por exemplo, a resgatar-lhes mediante a socialização das perdas bancárias. E ainda por cima, para coroar, Alemanha segue sem assumir uma união fiscal que implicaria um processo de mutualização de dívidas dentro da Europa e a imposição nos mecanismos de resolução nos resgates bancários à custa dos credores e não de contribuintes. O euro, definitivamente, e diante do exposto, na realidade se transformou, ao final, em um subsídio do sul da Europa a Alemanha, ao transformar-se em uma mera relação credor-devedor” [3].

Dentro dessa relação desigual, a Holanda diz em voz alta o que a Alemanha pensa, porém não diz. Sua economia está dedicada integralmente à exportação, que representa até 84% da riqueza nacional, frente a 31% da França e Itália, os valores mais baixos da União. O norte europeu, exceto Finlândia, têm porcentagens de exportação superiores a média do PIB, além de ser contribuintes líquidos da receita de Bruxelas. Estão plenamente integrados na economia alemã, no caso holandês, por exemplo, com o fornecimento de grande parte do aço da indústria automobilística e dos bens de consumo através do porto de Rotterdam, um verdadeiro porto de escala alemã a altura de Hamburgo, como e talvez mais que Berlim, portanto não tem nenhum incentivo para mudar o status quo. Seus dirigentes, como o atual primeiro ministro Mark Rute ou o outrora Jeroem Dijsselbloem, mantém como sinalizava recentemente o economista Paul de Gruaxe, “...preconceitos anti-espanhóis, anti-italianos e, em geral, contra os países latinos e periféricos. Estão convencidos de que com seu caixa financiam a festa espanhola e o exagero italiano” [4].

O outro lado desta lição de moral é que este país tem um sistema fiscal que não tem nada que invejar aos caribenhos: ao países baixos são um paraíso fiscal no coração da Europa. Como diz o jornal El Confidencial: “As multinacionais absorvem milhões de euros que deveriam estar nos cofres de diferentes países, quando canalizam os benefícios de suas filiais através da Holanda, antes que esse dinheiro regresse a contas da empresa matriz. O holandês Arjan Lejour, da Oficina de Análise de Política Econômica (CPB) do ministério holandês de Economia, explica que este país é responsável de 15% da evasão fiscal global.

“Supondo que a evasão de impostos corporativos a nível mundial é de uns 150.000 milhões de dólares, uns 22.000 milhões se desviam através dos Países Baixos’, explica o também professor de Finanças Públicas na Universidade de Tilburgo” [5].

No entanto, neste marco estrutural em comparação com a crise de 2010-12, há uma grande diferença. Naquele momento, o epicentro era a periferia: Portugal, Grécia, Irlanda, Chipre. Portanto, Alemanha tratava de limitar os planos de resgate ao estritamente necessário, tinha muito mais poder de negociação para impor reformas em troca da “ajuda”. Na crise atual que afeta ao conjunto da Europa, Alemanha deve manter um difícil equilíbrio: por um lado deve facilitar a distribuição da liquidez na União, em particular para o Sul, para salvar o mercado único, que é o instrumento que permite exportar tanto. Ao mesmo tempo, deve minimizar a partilha da dívida para preservar seu papel de garantidor do último recurso. O giro de Merkel busca responder a essa difícil equação. É por isso que diante dos elogios da imprensa francesa a Macron como mediador do acordo, Merkel confirmou mais uma vez que a Alemanha é líder da UE, graças a sua capacidade única de fazer tratos na Europa devido ao seu tamanho, sua localização geográfica, seu êxito econômico e seu forte consenso geral a favor da UE. A exaltada ressurreição do eixo franco-alemão só serve a Berlim para disfarçar com sotaque parisiense o crescente predomínio alemão sobre a UE. Junto com esse elemento mais global, a perspectiva de colapso da indústria do norte da Itália (mecânica, química, farmacêutica), integrada nas cadeias de valor alemãs, representa um perigo para a grande manufatura teutônica, começando pela indústria automobilística.

Porém, se estes elementos no interior da EU indubitavelmente pesaram na decisão da Alemanha, a batalha geopolítica em curso acelerada pela pandemia pode ter constituído um elemento decisivo. A crise acentuou tendências anteriores: o retorno do gasto estatal keynesiano, a tendência da relocalização de certas produções consideradas estratégicas, a intensificação do enfrentamento entre China e os EUA. Este último elemento dificulta posição de eqüidistância da Alemanha destinada a preservar ambos mercados (em termos de provisões e saídas). Se tão recentemente como no ano passado, Merkel esperava que a Alemanha protegeria melhor os interesses da EU chegando a um entendimento com a China, o COVID-19 demonstrou que tal entendimento é impossível, assim como a eleição do presidente dos EUA Donald Trump havia já demonstrado à chanceler alemã que os EUA havia se transformado em um aliado pouco confiável. Neste marco, o objetivo declarado da França e Alemanha não é simplesmente que a UE resista à crise econômica causada pela pandemia de COVID-19, mas sim que a UE “saia dela mais forte que antes”. Para isso, se propõem atuar “como europeus e unir forças de uma maneira sem precedentes”.

Assim junto com a nova proposta de endividamento comum que detalhamos mais acima, o documento franco-alemão afirma que os desafios do futuro exigem que a União Européia desenvolva uma “economia e uma base industrial resiliente e soberana” – além de um mercado livre e forte” – e propõe que a União Européia seja a verdadeira defensora mundial de “um programa de livre comércio ambicioso e equilibrado com a Organização Mundial do Comércio como eixo central”. De forma ainda mais contundente:

“França e Alemanha fizeram na segunda-feira um estranho acordo político de alto nível para impulsionar a criação dos campeões industriais europeus como parte da recuperação do coronavírus, localizando-se em curso frontalmente contrário à política anti trust da Comissão Européia. Paris e Berlim entram em acordo depois de que Bruxelas bloqueou uma fusão ferroviária entre Siemens e Alstom em 2019 [...] Ao contrário de render-se a Bruxelas, Paris e Berlim estão dobrando a aposta de que a UE mude suas regras de competição [6].”

Entretanto, a pesar destas declarações bombásticas que mostram uma vontade nova de Berlim que busca liberar-se de certos obstáculos, devido a suas contradições e limites estratégicos tanto no plano interno como no externo, o mais provável é que o fará muito lentamente e com grande dificuldade.

Concluindo, a União Européia se debate entre distintas forças internas e externas da qual dependerá seu futuro e em grande medida das relações interestatais nos anos que virão. Se a feroz batalha geopolítica está impulsionando aos Estados europeus a aproximar-se, as forças internas, como os impulsos nacionalistas e os interesses econômicos mais estreitamente definidos de cada um dos Estados membros, estão separando a UE. Como mostramos, as forças internas seguem sendo tremendamente poderosas e não se superarão facilmente. Ao mesmo tempo, ainda que de imediato a frente a Merkel-Macron reforça a estes internamente, em especial ao segundo que vinha muito golpeado em frente ao interno (Gilets Jaunes, greve contra a reforma previdenciária), assim como a catastrófica gestão da crise sanitária, neste período abre uma série de contradições que possam ser aproveitados pelo proletariado com a possibilidade de ter uma política independente.

Essa não é nossa união: pela expropriação da banca na perspectiva de uma Europa dos trabalhadores

Nem bem se fez pública a declaração de Merkel e Macron, a Confederação Sindical Alemã DBG e as cinco centrais francesas CFDT, CFTC, CGT, FO e Unsa lançam uma tribuna de apoio crítico a essa iniciativa. Lamentando “a falta de consulta entre os Estados membros no começo da pandemia que pode ter levado a tomar decisões não coordenadas e inclusive em detrimento uns de outros” e condenando “firmemente os incidentes xenófobos que se produziram na fronteira franco-alemã e que nos recordam com muito temor um dos capítulos mais obscuros da nossa história”, o eixo de sua proposta é a “necessidade de uma estratégia de relançamento eficaz, que deve ir mais além dos 500 milhões de euros anunciados pela França e Alemanha. O plano deve ir acompanhado de um novo quadro financeiro plurinacional ambicioso que abarque pelo menos 2% do PIB europeu”.

Aproveitando o embalo franco-alemão, essas direções sindicais seguem tendo a ilusão reacionária, mostrada inúmeras vezes nos últimos anos, porém que nos próximos meses pode ser fatal, de que é possível “aprofundar a Europa social”, agregando que o apoio ao plano não deve implicar um abandono das “ambições implantadas com um ‘Green Deal’, por uma transição ecológica socialmente justa e um modelo econômico mais justo, mais sustentável e que ponha o ser humano no centro” [7]. Estas distintas variantes de reformismo e da conciliação de classes consideram que é possível a unidade de interesses entre os grandes grupos multinacionais para os quais governa a UE e os trabalhadores. Mais uma vez, não nos cansaremos de dizer, frente ao papel da burocrática Confederação Européia dos Sindicatos (CES), cuja função é cobrir desde o social e o papel reacionário que cumpre a UE – e que diante da magnitude da crise atual só vão se multiplicar – que esta é uma associação de países com interesses antagônicos aos dos trabalhadores, não tem nenhum traço progressivo nem reformável. Em outras palavras, que não é possível melhorar a UE sem modificar seu conteúdo de classe, uma vez que liquidando seu caráter imperialista como já sofrem muitos países do leste, que se integraram de forma semi-coloniais à UE depois da debaclé da ex-URSS , todos aqueles povos da periferia capitalista que, pela política de espoliação dos distintos imperialismos, são obrigados a emigrar para encontrar-se com as fronteiras da “Europa Fortaleza”, quer dizer, construindo outra coisa.

Frente a esta saída abertamente reacionária e frente às falhas da mundialização capitalista, as distintas variantes de soberanismo acreditam ter suas teses confirmadas. Porém o patriotismo econômico das velhas potências imperialistas só pode levar, como no passado, a mais guerras. Incrivelmente se dá o paradoxo que tanto a grande burguesia internacionalizou seu capital e abraçou a bandeira do mundialismo (sem deixar nunca sua base nacional), que os soberanistas apresentam a ideia da nação como uma novidade. No entanto, como dizia Trotsky frente ao surgimento do nacionalismo reacionário da década de 1930 do século passado,

O patriotismo no sentido moderno – ou mais precisamente no sentido burguês – é um produto do século XX... Porém, o desenvolvimento econômico da humanidade, que terminou com o particularismo medieval, não se deteve nas fronteiras nacionais. O crescimento do intercâmbio mundial foi paralelo a formação das economias nacionais. A tendência deste desenvolvimento – pelo menos em países avançados – se expressou no translado do centro de gravidade do mercado interno ao externo. O século XIX esteve marcado pela fusão do destino da nação com o da sua economia, porém, a tendência básica do nosso século é a crescente contradição entre a nação e a economia.

Essa contradição, depois da fenomenal internacionalização das forças produtivas que vem se desenvolvendo desde depois da Segunda Guerra e que se acelerou nas últimas décadas, é incrivelmente aguda. Não por acaso as Merkel, os Macron e outros dirigentes da burguesia, a cada vez que usam a palavra “soberania”, usam-na em um contexto de um aumento da soberania não de França ou Alemanha, mas sim dos europeus. Pensar que é possível voltar aos marcos nacionais, no marco de grandes pólos que dominam a economia mundial, se mostrará tão eficaz para a organização da produção como as fronteiras nacionais que os soberanistas de direita levantaram para evitar a propagação da COVID-19. Porém, esta tarefa não é impossível partindo do grau de europeização das forças produtivas, as conexões supranacionais em muitos níveis, as tendências para a unificação cultural; todos estes são avanços reais que não deveriam ser sacrificados no altar do nacionalismo, o protecionismo e provavelmente também um novo militarismo. Como já dizia Trotsky:

Teoricamente, esta tarefa pode ser levantada como o seguinte: como garantir a unidade econômica da Europa e ao mesmo tempo preservar a total liberdade de desenvolvimento cultural aos povos que a compõem? Como incluir a Europa unificada em uma economia mundial coordenada? Não se chegará a uma solução deste problema deificando a nação mas sim, pelo contrário, liberando completamente as forças produtivas dos freios que lhes impõem o Estado nacional

Só o proletariado, a única classe verdadeiramente universal, é a que pode resolver esta tarefa de forma progressiva e ao serviço de toda a humanidade permitindo uma expansão dos avanços tecnológicos, respeitando a natureza, e a serviço de diminuir a carga de trabalho humano. Este é o sentido da nossa luta por uma Europa unida e socialista, uma Europa dos trabalhadores.

No próximo período, tomando em conta o peso que adquirirá o tema do fardo da dívida e a renda parasitária que obtém o sistema financeiro, devemos levantar alto e forte a expropriação dos grandes bancos privados, fundos de cobertura e seguradoras capitalistas e a estatização do sistema de créditos. Mais do que nunca se revela atual, diante da crise que tem no enorme e monstruoso desenvolvimento do capital financeiro uma de suas facetas salientes, este capítulo do Programa de Transição:

O imperialismo significa a dominação do capital financeiro. Ao lado dos consórcios e dos trusts e frequentemente acima deles, os bancos concentram em suas mãos a direção da economia. Em sua estrutura, 105 bancos refletem sob uma forma concentrada, toda a estrutura do capitalismo contemporâneo: combinam a tendência ao monopólio com a tendência à anarquia. Organiza milagres técnicos, empresas gigantescas, trusts potentes e organizam também a

Vida cara, a crise e o desemprego. Impossível dar nenhum passo sério adiante na luta contra a arbitrariedade monopolista e a anarquia capitalista se as alavancas de comando dos bancos são deixadas nas mãos de bandidos capitalistas. Para criar um sistema único de investimento e de crédito, segundo um plano racional que corresponda aos interesses de toda a nação, é necessário unificar todos os bancos em uma instituição nacional única. Somente a expropriação dos bancos privados e a concentração de todo o sistema de crédito em mãos do Estado colocará nas mãos deste os meios necessários, reais, quer dizer materiais, e não somente fictícios ou burocráticos, para a planificação da economia.

A expropriação dos bancos não significa de forma alguma a expropriação dos pequenos depósitos bancários. Pelo contrário, para os pequenos depositantes a banca do Estado unificada poderá criar condições mais favoráveis que os bancos privados. Da mesma maneira, somente a banca do Estado poderá estabelecer para os camponeses, os artesãos e pequenos comerciantes, condições de crédito privilegiado, quer dizer, barato. No entanto, o mais importante é que, toda a economia, primeiramente da indústria pesada e os transportes, dirigida por um Estado maior financeiro único, sirva aos interesses vitais dos operários e de todos os trabalhadores. Não obstante, a estatização dos bancos só dará resultados favoráveis se o poder estatal mesmo passar das mãos dos exploradores para as mãos dos trabalhadores.

Uma campanha pela expropriação da banca das forças que se reclamam de extrema esquerda permitiria fazer-se uma voz independente frente a burguesia e suas distintas propostas para manter o domínio atual dos grandes financistas e capitalistas como no caso do acordo Merkel-Macron, uma vez que contra os nacionalistas que só acusam a Bruxelas porém para seguir no pior dos casos com a mesma política neoliberal, como foi o caso de Salvini na Itália, ou inclusive na esquerda ao reclamar a “soberania francesa” contra Alemanha, quer dizer, defendendo aos capitalistas nacionais como se estes não participassem da orgia da dívida e da exploração de seus povos, assim como da exploração de colônias e semi-colônias. Uma campanha deste tipo, levada adiante, por exemplo, na França pelo NPA e LO, aproximaria aos trabalhadores a perspectiva de que só um governo próprio possa dar saída a esta situação de catástrofe que, mais além de todos os planos e acordos das cúpulas entre os governos capitalistas, golpearão duramente todo o Velho Continente.

[1] “The EU recovery fund is a historic step, almost”, John Springford, Financial Times 21/5/2020.

[2] "Is the Franco-German plan Europe’s ‘Hamiltonian’ moment?", Financial Times 21/5/2020.

[3] “Cómo el sur de Europa ha financiado a Alemania y Holanda”, Juan Laborda, Vozpopuli 14/5/2020.

[4] Idem.

[5] O mesmo diário agrega: “como se consegue isto? Com o sanduiche holandês. Os fluxos de dinheiro fluem através de empresas fantasmas – escritórios físicos sem empregados nem atividade real – criadas pelas próprias multinacionais nos Países Baixos. Estes fundos desfrutam de um “banho de reconstrução de impostos” totalmente legal aos olhos do Estado. Dado que a maioria dos países europeus tem normas que dificultam o envio dos lucros diretamente a paraísos fiscais, as empresas as transferem primeiro a Holanda, onde são gravadas com impostos... porém muitíssimo menores que os que lhes corresponderiam, se tivessem declarado os ingressos no país da sede real ou nas outras filiais instaladas em outros países. E uma vez legalizadas desta maneira, os lucros já podem ser transferidos ao paraíso fiscal escolhido pela empresa, onde engrossarão o capital limpo. A soma destes impostos perdidos soma ao menos 22.000 milhões de euros”. “Cómo Holanda deja sin impuestos a media Europa gracias a un ’sándwich’”, El Confidencial 29/4/2020.

[6] “Macron and Merkel defy Brussels with push for industrial champions”, Político 18/5/2020.

[7] "Seule une réponse européenne ambitieuse pourra nous éviter des années de croissance morne, voire de récession", Le Monde 20/5/2020.

 
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