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RIO DE JANEIRO
Entrevista com Gizele Martins, moradora e comunicadora comunitária da MARÉ
Redação Rio de Janeiro
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Diante do aumento do número de mortes e infectados e das graves condições sanitárias e sociais das favelas do Rio de Janeiro e do Brasil, nós do Esquerda Diário temos denunciado a negligência, o racismo estrutural e o aumento das medidas violentas por parte do Estado nas favelas, enquanto garante o lucro dos grandes empresários. Entrevistamos Gizele Martins, moradora e comunicadora comunitária da MARÉ para dar um relato sobre a realidade direto de um dos maiores complexos de favela do país.

Esquerda Diário: Gizele, sabemos que você junto a outros moradores do Complexo da Maré, tem feito ações de solidariedade e conscientização sobre o COVID-19 e campanhas de arrecadação de alimentos e produtos de higiene para os moradores. Gostaríamos que você comentasse sobre essas iniciativas.

Gizele Martins: Diante dessas faltas o que a gente tem feito de forma autônoma nas favelas é uma campanha de comunicação, uma campanha de orientação para tirar dúvidas, com carro de som e faixas. Também uma campanha de distribuição de alimentos e material de higiene, sabendo que a gente não vai atingir toda população porque nós somos autônomos né? A gente tem feito toda campanha a partir de doações, então não é todo mundo que a gente vai atingir na Maré, infelizmente, mas é grande a necessidade, então é uma campanha que a gente quer dar continuidade, até isso tudo acabar. Que a gente consiga passar por mais essa aí de forma coletiva na favela, um pensando no outro, também na solidariedade, é um momento difícil mas a gente pretende continuar aí mesmo sem qualquer tipo de recurso.

ED: Essas ações por iniciativa dos moradores, tem acontecido em várias favelas e periferias no país. Elas tem demonstrado a organização e solidariedade entre os moradores e coletivos de favelas, mas também revelam um descaso profundo dos governos que sempre existiu e que se intensifica ainda mais nessa situação. Você poderia comentar qual tem são os pontos graves de negligência dos governos frente à crise do COVID-19?

"Para gente que mora na favela, falta direito a casa, ao lazer, a cultura, a moradia, a saúde e educação, a segurança, o governo sempre oferece pra gente polícia né?"

GM: As negligências do governo em relação ao que a gente chama de favelas e periferias sempre foi constante né? A falta de direitos já é algo continuo para gente que mora na favela, falta de direito a casa, ao lazer, a cultura, a moradia, a saúde e educação, a segurança, o governo sempre oferece pra gente polícia né? A militarização, o racismo, nunca oferece direito, direito a vida por exemplo, aí quando a gente chega no momento de pandemia como essa que o mundo está parado, a gente vê o quanto a gente ainda carece de direitos básicos, saneamento básicos. Água? Nós não temos direito a água, muitas favelas e periferias não tem direto a água. Sendo essa a principal recomendação do ministério da saúde e OMS que é lavar a mão né? E a gente não tem direito de lavar a mão. A gente também fala da alimentação momento como esses os moradores de favelas, mais precários, estão tendo que trabalhar sem escolha, ou trabalha para não sentir fome, ou pega o vírus, é basicamente isso que tem acontecido nas favelas. Com isso vemos o número de moradores infectados, morrendo né? É uma negligência histórica, é uma falta de atenção a esses moradores que sustentam toda economia toda cidade, uma falta de atenção a gente que mora na favela.

ED: Nessa situação tem aumentado o número de denúncias que alertam para o cenário grave de propagação do Covid-19 nas favelas, por conta das condições estruturais de falta de água, ausência de saneamento básico, concentração de casos de doenças crônicas, altos índices de trabalhos precários e informais. Essas condições precárias e estruturais são resultado um projeto político racista que se intensificou nos governos de Bolsonaro e Witzel, e se expressam na violência extrema das ações policiais, que nas operações policiais que assassinaram mais de 1800 pessoas ano passado. Você poderia comentar como está vida dos moradores da Maré antes e o que piorou com o Covid-19.

GM: O governo abre um aplicativo para doar 600 reais, 600 reais não dar para comprar pagar aluguel, não dar pra comprar comida, não dar pra comprar um gás, obvio é um apoio, mas não faz com que a população continue em casa, queira ficar, queira entre aspas, queira ficar em casa e não ir trabalhar. A gente vê aí a negligência em relação a vida das populações que moram nas favelas, é o desafio do trabalho, é o desafio financeiro, é o desafio também da falta de direitos básicos a saúde, a gente está passando aí por um momento desde do ano passado, passando por um sucateamento do SUS, os postos de saúde, clínica da família das favelas e periferias, sendo fechadas, profissionais demitidos sem receber, aí a gente se depara com uma pandemia e aí de novo os mais atingidos somos nós, populações empobrecidas da cidade e do país.

ED: No Rio está decretado o processo de quarentena e isolamento social, tendo em vista o inevitável colapso da saúde pública, que já vinha passando por um processo de privatização, precarização e cortes nos últimos anos. Como a crise da saúde tem impactado na saúde dos moradores da Maré?

GM: As populações chegam no hospital, nas clinicas, não tem testes, não tem remédios, não tem atendimento, não tem vaga, isso é de novo a necropolítica né? Isso é de novo racismo estampado na nossa cara como se houvesse vagas só para alguns, alguns aqueles que tenha condições, isso é muito difícil, a gente saber que a gente não tem lugar nos hospitais.

ED: Bolsonaro tem demonstrando toda sua irracionalidade e fidelidade aos empresários fazendo demagogia com os trabalhadores informais. Também temos visto que após as declarações dele diminuindo a crise do coronavírus, aumentou a circulação das favelas e periferias. No entanto, isso se dá também pelo impacto financeiro dessas pessoas que tem tido sua renda diminuída. Você pode comentar como o negacionismo do governo, das Igrejas e de esses outros fatores tem influenciado na Maré?

GM: A favela tem uma cultura de rua e festa, de troca, de um visitando o outro, de aglomerações isso é normal na favela, e aí o que a gente tem hoje é uma favela tentando ficar em casa, tentando não circular e sim as igrejas tem ajudado muito nisso, tem fechados os dias de cultos, tem feito culto online, tem feito carro de som para a favela, tem suas campanha de orientação de recomendação para que a população fique em casa, isso é muito importante em um momento como esse, tem as associações e organizações orientando a população e lembrar que a Maré tem 140 mil moradores é importante que tenha o máximo de campanhas que vai atingindo esse público, é um público muito grande.

ED: A política de quarentena estabelecida pelos governadores e defendida com muito afinco por Witzel, tem se mostrado ineficiente, primeiro porque muitos trabalhadores sequer tem opção de fazer quarentena, mas principalmente pela falta de medidas como a garantia de teste massivo para todos aqueles que apresentam sintomas ou tiveram contato com pessoas infectadas. Nós do Esquerda Diário temos impulsionado uma campanha nacional para que o estado garanta testes massivos e isolamento social para aqueles que não tem condições de fazê-lo em sua própria moradia sem demissões e com renda de 2.000,00 no mínimo para aqueles que necessitam. Qual a importância de uma campanha de teste massivo para o Complexo da Maré? Na sua opinião quais deveriam ser as medidas de emergência para as favelas?

GM: As medidas de emergências deveriam ser primeiro o abastecimento de água, alimentação, direito ao gás, o direito a comida, água, o direito as populações mais vulneráveis de qualquer trabalhador informal ou formal tem o direito de ficar em casa, então tem que atingir todos os públicos né, partindo do público nem todo mundo pode ficar em casa, não é todo mundo que pode escolher ficar em casa ou ter o direito de ficar em casa. A outra medida é dando atenção nas clinicas da família, postos e UPA’s dentro das favelas, ter direito ao testes também é muito importante, mas também tem que ter direito à alimentação, ter o direito das favelas serem limpas a todo momento, enfim, isso seria muito importante pra gente dentro da favela, atenção básica seria de extrema importância no momento como esse, poderia tá fazendo uma campanha de comunicação governamental, enfim, isso também ajudaria bastante.

 
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