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ASSASSINATO DO ÍNDIO GALDINO
Há 23 anos, índio Galdino era assassinado na Asa Sul
Letícia Parks
Pedro V
Comitê Esquerda Diário DF/GO

Se completam hoje 23 anos desse crime que marcou o Brasil. Foi no dia 20 de abril de 1997 que Galdino recorreria ao precário acolhimento de um ponto de ônibus da Asa Sul de Brasília, Distrito Federal, pois se viu sem lugar para passar a noite após ir ao evento indígena realizado no Congresso, do qual participaria devido ao dia do índio, agendado em todo 19 de abril.

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Crédito da imagem: Bruna Bez

Na madrugada dessa noite, um carro passaria com cinco coisas - impossível chamar de pessoas - decididas a tacar fogo no que lhes parecia ser uma pessoa em situação de rua. Os moradores do Plano Piloto Antônio Novely Vilanova, na época com 19 anos, Max Rogério Alves, 19, Tomás Oliveira de Almeida, 19, Eron Chaves Oliveira, 18 e G.A.J., 17, jogaram álcool sobre o cacique do povo indígena Pataxó Hã-hã-Hãe do sul da Bahia. Galdino Jesus dos Santos, aos 44 anos, faleceria devido à violência das queimaduras e golpes.

Depois, frente ao escândalo exposto, um dos assassinos diria ao público "desculpa, pensei que era um mendigo", como se essa "confusão" justificasse de algum modo o ocorrido. Como se queimar vivo e matar "mendigos" fosse aceitável.

Dos cinco assassinos de Galdino, quatro viraram servidores públicos. O quinto se formou em direito e atua em um importante escritório de advocacia da cidade. Visto que os assassinos foram condenados por um crime hediondo, deveriam cumprir pelo menos um sexto da pena antes de terem direito à liberdade. No entanto, em 2002, a 1ª Turma Criminal do TJDFT concedeu aos acusados o benefício de estudar fora da penitenciária e prestar expediente em órgãos públicos. Em 2003, três deles foram flagrados bebendo em um bar antes de voltarem à Papuda, dirigindo os próprios carros e sem passarem por revista. No ano seguinte, todos conseguiram direito à liberdade condicional e passaram a cumprir o resto da pena já nas ruas, com pouquíssimas restrições.

Um deles, G.A.J., decidiu virar policial civil duas décadas depois de atear fogo em um ser humano. Ele foi aprovado em um concurso para agente da Polícia Civil do DF, em 2014. Passou por todas as etapas até chegar à análise de vida pregressa e a candidatura foi barrada pela corporação. O atual governador de brasília, Ibaneis Rocha, presidente da OAB à época, se prestou ao papel de advogado do playboy assassino, e disse na ocasião “Não existe penas e, principalmente, penas acessórias de caráter perpétuo. Ele (G.A.J.) cumpriu a pena em liberdade assistida e, a partir daí, leva uma vida normal”

G.A.J. foi aprovado, em 2015, em um concurso da Polícia Rodoviária Federal e hoje é agente da corporação, em Cuiabá (MT). Atuando desde novembro de 2016, ele recebe atualmente remuneração bruta de R$ 9 mil. Os outros três são servidores públicos. Tomás é hoje técnico legislativo no Senado Federal e recebe, por mês, um salário bruto de mais de R$ 18 mil. Eron é agente do Departamento de Trânsito do DF (Detran-DF) e recebe um salário de aproximadamente R$ 9 mil. Antônio Novély Cardoso de Vilanova, filho do desembargador federal Novély Vilanova, formou-se em fisioterapia e hoje é servidor da Secretaria de Saúde do DF, no Hospital Regional de Santa Maria. Por mês, ele tem uma média salarial de R$ 12 mil. Max Rogério foi o único que não virou servidor público e trabalha em um importante escritório de advocacia de Brasília

Já a mãe de Galdino, Minervina de Souza, que fez apelos contra a impunidade durante e depois do julgamento dos cinco acusados, morreu há cerca de 10 anos. De acordo com Wilson de Jesus, ela não resistiu ao desgosto pelo óbito do filho “Estava tão traumatizada com a morte do Galdino que ficou doente e nunca mais conseguiu recuperar a saúde”, conta.

Wilson de Jesus, sobrinho de Galdino, fala contra a leveza das penas: “Eles ficaram presos por pouco tempo, hoje já têm empregos. Conseguiram reconstruir a vida, mas para a família foi bem mais difícil. Pelo menos eles pagaram de alguma forma e não ficaram impunes”.

É preciso realizar uma crítica radical à um sistema penal que foi desenvolvido para sustentar uma dominação de classe e raça. Um sistema em que portar uma garrafa de Pinho Sol pode significar uma punição severa e o “você sabe com quem está falando” pode livrar a cara daqueles que são “filhinhos de papai” de poderosos.

Galdino de Jesus era um homem forjado na luta. Cacique de um povo que hoje conta com cerca de 2 mil representantes. Era porta-voz da luta pela demarcação das terras pataxós. Uma guerra que, em 1986, já tinha matado um de seus irmãos.

Na atualidade o Brasil compreende um território ao qual estão localizadas mais de trezentas etnias indígenas, com uma gama sociocultural imensa. Suas lutas não são de hoje: são 520 anos de resistência, apesar do genocídio, apesar do etnocídio, apesar do racismo estrutural e institucional. Atualmentente os ataques realizados pelo governo bolsonaro são muitos, são ações claras para fortalecer o agronegócio, grileiros de terra e garimpo ilegal, contra os povos indígenas.

A memória de Galdino permanece viva na luta de todos que constroem um amanhã em que todas as etnias e classes sociais tenham o direitos garantidos. Um mundo onde não ter um teto sob sua cabeça não seja um perigo.

Galdino: não esqueceremos!

 
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