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Pequeno Memorial Prático das Revoluções Proletárias (parte 2)
Afonso Machado
Campinas
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Em seus lares, diante de um tanque de lavar roupa, trabalhadores lavam a bandeira dos seus países com água e sabão. Conforme a bandeira é lavada, conforme ela é limpa de todos os vírus, de todos os discursos que distorcem a realidade, ela adquire a cor vermelha. Alguns trabalhadores ficam espantados, outros rezam, mas os mais politicamente perspicazes sentem, compreendem, que isto não é apenas um simples fenômeno cromático: trata-se da constatação histórica de que perante a atual crise do capitalismo, a classe trabalhadora poderá redescobrir a cor da sua única bandeira possível. A Revolução de 1848 na França, a Comuna de Paris de 1871 e a Revolução russa de 1917(esta última foi comentada na primeira parte deste texto) assinalam a trajetória histórica internacional desta bandeira vermelha.

Independentemente das posições políticas dos historiadores, as revoluções existem. Quando se escreve sobre a história das revoluções, como por exemplo aquelas ocorridas em 1848 e 1871 na França, é impossível que as opiniões(e as paixões) de um autor não assumam a forma de imagens. Já frisamos aqui que a pretensa imparcialidade é uma invenção dos historiadores medrosos ou politicamente mal intencionados(no sentido de que o escritor se esconde atrás da sua narrativa para exprimir um ponto de vista conservador, que adultera ou oculta fatos). Outrossim, devemos ter em mente que as imagens construídas numa narrativa histórica devem ser proporcionais ao peso histórico dos acontecimentos que se narra: não se pode perder de vista a veracidade.

Ao mesmo tempo sabe-se que o material da narrativa histórica é moldável, está sujeito a uma montagem: quando observa-se a construção da narrativa, o mais importante não é saber a cor favorita do historiador. Fundamental é compreender o seu método, para assim entender o significado político daquilo que se escreve. O método materialista, que não parte das credenciais dos super homens e de vocabulários celestiais, considera que os acontecimentos históricos estão enraizados na estrutura social: personagens, partidos, instituições, manifestações e ideias são condicionados pela divisão das classes sociais. Quando se faz uso deste método materialista para narrar as revoluções, a história torna-se inevitavelmente instrumento político nas mãos da classe trabalhadora: uma das missões da militância cultural é construir a tradição dos oprimidos, ou seja, a reunião de uma série descontínua de episódios políticos ao longo dos tempos. Sendo o processo histórico heterogêneo, devemos procurar no movimento combinado e desigual(Trotski) das diferentes realidades históricas, os momentos de revolta e revolução que contribuem com a mobilização de energias políticas(Benjamin) do proletariado atual.

A Revolução de 1848 e a Comuna de Paris de 1871 envolvem acontecimentos que compõem o início das revoluções proletárias. 1848 entrou para a história como sendo a Primavera dos Povos: foi um momento de levantes populares em várias partes do mundo. No Brasil, por exemplo, o ciclo revolucionário pernambucano se fecha com a Revolta Praieira ocorrida naquele ano. Porém, á frente de todas as tendências de um republicanismo radical, encontramos na França um passo além na história das revoluções: a lógica dos conflitos e interesses de classe impõe o fato de que o drama coletivo do nosso tempo consistir nas lutas entre burguesia e proletariado.

A Revolução de 1848 obrigou o rei Luís Filipe de Orleáns a dar no pé. De malas prontas e pálido de medo, “ o rei burguês “, como ficou conhecido, deve ter dito para si mesmo:

  •  Por que fui escorraçado do poder? Servi aos banqueiros, amamentei esta aristocracia financeira! Ah, existem burgueses insatisfeitos! Sim: os industriais por exemplo querem a república. Mas os operários também a querem! Será esta a república da burguesia ou a república dos trabalhadores?

    O leitor deve perdoar esta especulação imaginária, porém útil: esta fala dramática, que não se baseia na personalidade ou no tipo psicológico de Luís Filipe, nos ajuda a pensar que tanto numa monarquia quanto numa república, o Estado possui conteúdo de classe. Foi em fevereiro daquele ano na França que a classe operária, junto á Guarda Nacional e lideranças de setores da burguesia, proclamaram a república: o calor jacobino de 1792-94 espantou mais uma vez os mortos vivos da monarquia, oferecendo trajes revolucionários. Mas em 1848 os trajes estavam rotos, com traças, não estavam á altura da ocasião e qualquer classe social poderia vesti-los. Os operários franceses daquele momento não compreenderam que eles não poderiam fazer sua revolução com a burguesia: como Marx iria salientar, o erro do proletariado foi ter lutado ao lado da burguesia e não contra a burguesia.

    O jogo de cartas marcadas pelos liberais limitava os direitos do proletariado, isolava as lideranças, inviabilizava politicamente o projeto socialista. Quando os trabalhadores decidem reagir já era tarde... Um carrasco chamado General Cavaignac eliminou os direitos civis e iniciou um massacre contra o povo. Registros falam em 3 mil fuzilamentos e 15 mil deportações. Mas se as jornadas de junho de 1848 encerravam tragicamente um importante Ato da história do movimento operário, em 1871 o palco político de Paris teria como atores principais os Assaltantes do Céu: a Comuna pegou de surpresa os bonapartistas de plantão.

    O patético Napoleão III, “ o sobrinho do seu tio “ nas ferinas e precisas palavras de Marx, é humilhado pelos prussianos: na Guerra Franco Prussiana, quem dava o tom da música era a burguesia alemã e não a burguesia francesa. A máquina militar de Bismarck não poderia ter suas rodas paradas pela maquiagem excessiva e pelos trajes forçados de Napoleão III. Ele não tinha uma unha do tio Napoleão Bonaparte, não tinha vocação para ser carrasco do povo e muito menos talento político para ser imperador da França. Sua queda, que resultou em uma grave humilhação político-militar, liberou profundos anseios revolucionários do proletariado francês, recalcados na imaginação política desde 1848/50. A Terceira República francesa, que contou com personagens não menos patéticos como Thiers e Jules Favre, não poderia com suas manobras burguesas enganar novamente a classe operária. Se fizermos aqui mais um exercício literário inspirado na prosa de Marx, é possível sintetizar na fala de um possível banqueiro qualquer da França, o sentimento de terror da elite francesa perante o proletariado armado e disposto a assumir o controle político de Paris:

  •  Rápido, homens de bem: façam suas malas, tragam suas esposas e amantes, suas riquezas, nossos policiais e nossos padres. Vamos todos fugir para Versalhes!

    Em março de 1871 dava-se início á Comuna, isto é, o primeiro governo operário da história. Durou pouco, é verdade: apenas 72 dias. Falhas políticas e militares contribuiriam para isso. Apesar de todas elas, existe uma história do movimento dos trabalhadores antes e após a Comuna. Composta por dezenas de membros de diferentes correntes políticas, a Comuna legou uma administração municipal eleita diretamente pelos trabalhadores, cujos representantes não tinham qualquer privilégio e poderiam ser substituídos se necessário. Operários, artesãos, intelectuais e especialistas sob a garantia do poder de fogo revolucionário da Guarda Nacional, formavam um governo independente: Paris era território livre, uma municipalidade nova e vibrante. Igualdade entre homens e mulheres e Educação gratuita são algumas das conquistas deste governo popular. As burguesias não poderiam admitir o sucesso político da Comuna de Paris. Diante da possibilidade dela tornar-se um modelo político internacional para a classe operária, a burguesia francesa com ajuda dos...alemães(!) cobriu as ruas de Paris com sangue, miolos, ossos e trapos do proletariado: mais de 20 mil são assassinados e cerca de 70 mil são expulsos do país.

    Pois é, a burguesia é uma classe violenta, talvez a classe dominante mais violenta de toda a história. Por isso rememorar a história das revoluções proletárias possui um sentido prático: fortalecer através da imaginação histórica a consciência política dos trabalhadores da atualidade, que devem ter motivações espirituais profundas para combater a burguesia. Marx, criador de um pensamento revolucionário que explica a história a partir das relações entre opressores e oprimidos, possui dois escritos fundamentais para aqueles que desejam compreender a Revolução de 1848 e a Comuna de Paris de 1871:

    - As Lutas de Classes na França (1848/1850)
    (...) “ O que sucumbiu nessas derrotas não foi a revolução. Foram os penduricalhos pré revolucionários tradicionais, os resultados de relações sociais que ainda não haviam culminado em antagonismos agudos de classe(...) Em suma: não foram suas conquistas tragicômicas imediatas que abriram caminho ao progresso revolucionário; muito pelo contrário, foi a geração de uma contrarrevolução coesa e poderosa , a geração de um adversário , e foi no combate a ele que o partido da revolta amadureceu, tornando-se realmente um partido revolucionário “(...)

    - A Guerra Civil na França

    (...) “ A Paris dos trabalhadores, com sua Comuna, será eternamente celebrada como a gloriosa precursora de uma nova sociedade. Seus mártires estão gravados no grande coração da classe trabalhadora. Quanto a seus exterminadores, a história já os acorrentou áquele eterno pelourinho, do qual todas as preces de seus clérigos de nada servirão para os redimir “(...).

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