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DITADURA "NOSSA"
Arábia Saudita e a hipocrisia do Ocidente
Josefina L. Martínez
Madrid | @josefinamar14
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Essa semana o primeiro-ministro do Reino Unido pediu à Arábia Saudita que não aplique a pena de 360 chibatadas à um inglês condenado em Riad por portar vinho em seu carro. Na mesma semana a França firmou um contrato de 10 bilhões com a Arábia Saudita.

Um aposentado inglês de 74 anos, Karl Andree, está preso a mais de um ano na Arábia Saudita, detido pela polícia religiosa em agosto de 2014. Encontraram duas garrafas de vinho caseiro em seu carro e o condenaram a um ano de prisão e 360 chibatadas, já que o álcool esta proibido no reino saudita.

O caso gerou uma verdadeira crise diplomática esta semana, depois da filha de Andree ter dito à BBC que seu pai teve três tipos de câncer e que poderia morrer se recebesse as 360 chibatadas.

“É um idoso, tem 74 anos, sobreviveu à três tipos de câncer com tratamentos muitos fortes, é asmático, tem gota, não está muito bem”, disse a filha.
A repercussão do caso obrigou o governo de Cameron a intervir pela via diplomática, enviando uma carta à Riad. “Se trata de um caso extremamento preocupante. Temos proporcionado ajuda consular ao senhor Andree e à sua família desde o momento de sua detenção e abordamos o caso em repetidas ocasiões nas últimas semanas”, disse um porta-voz do executivo de Cameron esta terça. Cameron se viu obrigado a suspender um plano de financiamento à prisões sauditas.

É uma ditadura assassina, porém, é “nossa” ditadura

A relação privilegiada do Reino unido com a Arábia Saudita vem fermentando na politica interna britânica. Há poucas semanas, Jeremy Corbyn denunciou as “violações aos direitos humanos” neste país, e pediu que se desfaçam os acordos de exportação de armas.

Teve muita repercussão também a entrevista que um jornalista fez com Cameron insistindo na pergunta sobre a relação com a Arábia Saudita e o caso do jovem que pode ser decapitado e crucificado por participar em uma manifestação contra o regime quando ainda era menor de idade.

O jornalista questiona em relação ao caso, e quando Cameron se esquiva do tema dizendo que seu governo “condena a pena de morte e as torturas em todos os lados”, lhe é perguntado por que então do Reino Unido apoiou a entrada da Arábia Saudita na comissão de direitos humanos da ONU.

Cameron termina respondendo que a relação privilegiada com a Arábia Saudita se mantêm por questões de “segurança nacional”, e que a Arábia Saudita aporta informações de inteligência contra o terrorismo. O jornalista respondeu que a Arábia Saudita apoiou organizações que o Reuni Unido considera terrorista.

Desde meados de setembro, Arábia Saudita lidera o Grupo Consultivo do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Segundo telegramas diplomáticos revelados pelo wikileaks, Reino Unido e Arábia Saudita chegaram a um acordo em 2013 para apoiarem-se mutuamente no ingresso ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas.

França, bons negócios com as ditaduras árabes

Estados Unidos, França, Reino Unido, Alemanha, Espanha; todos mantêm relações prioritárias, diplomáticas, comerciais, e militares com a monarquia saudita.

Esta mesma semana o primeiro-ministro francês, Valls, visitava a Arábia Saudita como parte de um giro pelo Oriente Médio que incluiu Egito e Jordânia.

Terça-feira, Valls anunciava por Twitter que se havia chegado a um acordo por contrato de 10 bilhões de euros entre a França e a dinastia saudita. “França-Arábia Saudita: contrato de 10 bilhões de euros”, festejava em um tuit.

Se trata de acordos e contratos em energia, saúde, agronegócio, setor marítimo, defesa, cooperação espacial e infraestruturas, como deixou claro o governo francês.

Valls encabeçou um giro junto a vinte empresários, com os quais passou também pelo Egito (onde foram recebidos por outro ditador amigo do ocidente, Al Sisi) e Jordânia, dois aliados que incrementaram seus laços econômicos e militares com a França.

França é o terceiro maior investidor na Arábia Saudita, com um capital estimado em 14 bilhões de euros em diferentes atividades industriais e de serviços. O intercambio comercial entre os dois países durante 2014 superou os 12 bilhões de euros, segundo informou o ministro do comércio saudita. Valls também firmou um acordo bilateral com o Egito, no qual o país árabe comprará dois navios porta-helicópteros do tipo Mistral.

No caso da Alemanha, as exportações de armas para os países do Golfo Pérsico aumentaram em 2015 chegando a mais de 3 bilhões de euros no primeiro semestre do ano. Segundo o jornal Der Spiegel, Arábia Saudita é um dos principais importadores de armas, especialmente tanques, da Alemanha.

O governo espanhol justifica sua venda de armas à Arábia Saudita dizendo que esse país cumpre com “a norma internacional sobre exportação de armas” e “os direitos humanos”. As “boas relações” entre a monarquia saudita e a espanhola vem de larga data e o novo Rei Felipe VI não poupou elogios à monarquia saudita em janeiro quando viajou para prestar “condolências” pela morte do Rei Abdalá.

As mulheres e os jovens, os mais oprimidos pela monarquia saudita

Um dos argumentos mais cínicos que vem utilizando os Estados Unidos e a Europa para justificar a “guerra contra o terrorismo” desde 2001, as invasões ao Iraque, Afeganistão e sua politica intervencionista militar, é a “defesa dos direitos humanos” e especialmente a defesa das “mulheres” frente a repressão de ditaduras e grupos fundamentalistas como o Estado Islâmico.

Ideologicamente, isso se apresenta como um “choque de civilizações”. Onde o ocidente representaria o desenvolvimento para as liberdades democráticas e a emancipação das mulheres.

Porém o seu principal aliado no Golfo, a Arábia Saudita, impõe a ferro e fogo uma feroz opressão sobre as mulheres, que não tem direitos políticos nem civis (apenas esse ano foi concedido o direito ao voto), e que podem ser castigadas a chicotadas pelo simples fato de dirigir um carro.

Um dos casos mais absurdos de repressão é do jovem de 21 anos, Ali Mohamed al Nimr, condenado a pena de morte, que pode ser decapitado e crucificado em qualquer momento.

Seu “crime” foi ter participado e difundido pelas redes sociais os protestos contra o regime quando tinha 17 anos de idade. Uma vez detido lhe arrancaram uma “confissão” mediante tortura, e o acusam de participar de protestos, chamar a participar por seu celular blackberry, usar molotovs e ensinar primeiros socorros a outros ativistas. O fato de que seja sobrinho de um clérigo que é conhecido ativista contra o governo, não é casualidade. Neste momento se desenvolve uma campanha internacional por sua liberação.

Só esse ano, 134 pessoas foram assassinadas pelo Estado saudita por decapitação, mais que o ano anterior.

A Arábia Saudita cumpre um papel chave na guerra síria, armando e financiando grupos opositores ao tão sangrento quanto ditador Al Assad, como parte de seus enfrentamentos com o Irã na região. A nível geopolítico global é um aliado privilegiado do “ocidente”. É uma ditadura fundamentalista brutal, porém é “nossa” ditadura.

 
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