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CORONA VÍRUS
Planos de Saúde querem acabar com o SUS e são obstáculos ao tratamento do coronavírus
Desirée Carvalho
Pedro Cheuiche

Por que o SUS não está preparado para pandemia? Planos de saúde cresceram exorbitantemente em tamanho, preço e número de beneficiários nos últimos dez anos enquanto o serviço público só desandou.

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Imagem: Istoé/ Divulgação

Desde 2009 são 43 mil leitos de internação a menos. Governo atrás de governo se submetem aos desmandos dos monopólios, o SUS se enfraquece e agora, diante de uma pandemia, estamos pouco preparados para responder.

A expansão de planos de saúde privados no Brasil se dá concomitantemente ao descaso de governos com a saúde pública. De Eduardo Cunha a Rodrigo Maia essas grandes empresas querem garantir sua penetração em novos nichos de mercado e novos meios de ganhar dinheiro com um direito da população, necessariamente em detrimento do Sistema Único de Saúde (SUS). Desde a instituição do SUS enquanto política pública já se previa a participação do setor privado, abrindo espaço para a mercantilização da saúde.

Um breve histórico dos planos de saúde no Brasil: gigantes que ameaçam a saúde pública

Lena Lavinas e Denise Gentil descrevem uma realidade para as políticas sociais no Brasil, o governo PT, dito progressista, não alterou a realidade de uma saúde precária para pobres e saúde de “primeira” para ricos. No período, foram assinaladas medidas para que a saúde privada se tornasse cada vez mais cara. Planos de saúde no Brasil encareceram 127% entre 2006 e 2017, com autorização da Agencia Nacional de Saúde (1). Desde 2017, a alta foi mais que o triplo da inflação: 36,61, contra 11,41% (2).

Segundo dados da agencia nacional de saúde, uma massa de 50,4 milhões de brasileiros utilizavam plano privados e outros 20,3 milhões odontológicos (contra 31,5 milhões e 3,6 milhões, respectivamente, em dezembro de 2002, no inicio do Governo Lula), correspondente a 28% da população. No período, à medida que trabalhadores contavam com uma expansão do poder de consumo, adotaram os planos de saúde, que reproduzem a desigualdade pela própria forma com que se estruturam. A maior parcela dos usuários utiliza os planos menos abrangentes:

“A Pesquisa Nacional de Saúde (IBGE, 2014), ao analisar a distribuição dos planos de saúde privados segundo o valor do prêmio mensal, revela uma forte concentração (58%) nas menores faixas de preço, com prêmios mensais abaixo de R$ 199,00. Os planos mais baratos, de valor inferior a R$ 99,00, reuniam, por si só, 38% da clientela das seguradoras. Planos de saúde com tratamentos e cobertura de escopo amplo, no padrão requerido, com prêmios a partir de R$ 500,00 por mês, são acessíveis apenas a uma pequena elite (15%) que, mesmo assim, raramente obtém assistência integral em todas as especialidades desejadas.”

Ou seja, a política pública autorizada pela ANS durante os governos do PT, autorizando o encarecimento dos planos privados, esteve voltada para aumentar o peso privado mediante endividamento das famílias, ao invés de melhorar o SUS qualitativamente. Segundo as autoras, o gasto público corresponde somente a 46% do dispêndio com assistência a saúde no Brasil, sendo a media mundial é de 60,1%. Já o gasto privado se dá majoritariamente pela compra de medicamentos com 58,7% dos gastos totais, conhecido como “out-of-pocket”, prevalecendo inclusive com o que é gasto com os planos de saúde privado: “Isso significa que nem mesmo o gasto privado é eficiente, pois ocorre de forma não planejada e não preventiva, o que pode representar um risco real para as famílias” (2).

Com o golpe, e o governo Temer, os planos de saúde se alçaram ainda mais como gigantes monopólios. O Bradesco Saúde e a Amil, com 22 bi e 21,6 bi de receita liquida em 2018, estão entre as 30 maiores empresas do país, segundo o Valor Econômico (4). Já a Rede D’Or-São Luiz e farmácias como a Raia-Drogasil e a DPSP estão entre as 100. O número de clientes pouco cresceu de 2010 a 2018 (5%), mas as receitas cresceram 165% no período. As isenções fiscais, o aumento do preço dos planos e as fusões e aquisições se combinam para benefício dessas que ampliam seus tentáculos para as mais diversas áreas da saúde (5):

“O que se pode afirmar é que os principais grupos econômicos do setor diversificaram suas atividades e já desempenham funções desde a formação de estudantes de graduação e enfermagem, passando pela distribuição de insumos e tecnologia de informações, até a administração de organizações sociais.”
Os governos fazem demagogia de que falta dinheiro para a saúde e a PEC do teto dos gastos de fato diminuiu os gastos na saúde pública desde 2017. É parte de uma estratégia bem consciente de abrir espaço aos planos de saúde. O atual ministro da saúde, Luiz Henrique Mandetta, teve sua campanha para deputado federal financiada pela Amil em 2014.

O que querem os planos de saúde hoje?

Ligia Bahia, em seu artigo “Planos de saúde privados são predadores do SUS” descreve a estratégia atual dos planos de saúde para abrirem novas brechas e seguirem crescendo nesse ritmo, agora com o Governo Bolsonaro. Com seu lema
“Mais planos, menos SUS”, o que estão buscando é o mercado dos trabalhadores informais e desempregados, que tem uma menor renda e pagam proporcionalmente mais impostos, para serem inclusos na lógica do pré-pagamento para serviços de atendimento ultralimitados e precários.

O que buscariam os planos seria encaixar o SUS em um papel meramente complementar em que, somente os setores mais abastados teriam acesso as mais diversas funções necessárias à saúde, e os outros setores precarizados da classe trabalhadora utilizariam os serviços mais simples, e indo buscar o sistema público somente em caso de emergências mais graves. Ou seja, o que querem os planos de saúde é inverter a lógica usual de menos complexidade para o SUS e maior complexidade para o setor privado. Por isso, o esvaziamento no SUS ao longo dos anos é tão direcionado a prevenção e atendimento familiar.

Se torna óbvio perceber que nada do que buscam está ligado a uma saúde de qualidade para a população. Por isso, esse sistema de saúde privado nos ameaça ainda mais quando chega ao Brasil uma pandemia como o coronavírus.

Planos de Saúde privados não combatem a pandemia de coronavírus

Todo os planos de saúde e farmácias privados não se interessam pela vida da população, mas unicamente nos lucros. A precarização do SUS e sua incapacidade material de lidar com essa pandemia está diretamente ligada ao estabelecimento desse monopólios da saúde que não investem no melhoramento da saúde e estão mais preocupados em medicalizar e segmentar o atendimento por faixas de renda.

O número de leitos de UTI na rede pública, são em média de 1 para cada 10 mil habitantes, se somados aos da rede publica esse número sobe para 2,1 leitos para cada mil habitantes, nem de longe o suporte necessário para tratamento da pandemia mundial do COVID 19.

Nos epicentros mundiais da epidemia, a demanda por leitos de UTI chegou a 2,4 por 10 mil habitantes , segundo a AMIB (Associação de Medicina Intensiva Brasileira), mais que o dobro da média oferecida pela rede pública no Brasil. Partindo de que 95% dos leitos nos hospitais públicos estão permanentemente ocupados, faltariam ainda milhares de leitos.

Para que não sejam os mais pobres que sofram por essa pandemia é necessário que haja a centralização de todo sistema de saúde, incluindo toda saúde privada (desde os grandes laboratórios até as clínicas hospitalares e hospitais privados), sob gestão pública e controle dos trabalhadores e especialistas, para garantir o atendimento a todos. O Estado não garante o minimo para que os mais pobres se tratem.

Se os planos de saúde seguirem sua lógica de atenderem somente os seus próprios segurados veremos o caos e muitas mortes para os trabalhadores e o povo pobre. O Estado precisa garantir todas as instalações necessárias para receber os eventuais infectados que necessitem de internação: confiscando todas as salas que faltarem (hotéis, etc.) e provendo respiradores (mediante produção de emergência, importação, etc.). Sabemos que para os empresários da saúde, tanto faz. O que lhes interessa é o lucro e não a vida.

Que os estados garantam a distribuição gratuita de tudo que for necessário para a detenção temporária da infecção: desde os elementos básicos (álcool em gel, sabonetes, máscaras, luvas, etc.) até os necessários kits de teste para que se realizem de forma gratuita e massiva em todos os que tenham sintomas, assumindo o controle dos grandes laboratórios privados.

Notas:

(1) LAVINAS, L. e GENTIL, D. L. “Brasil anos 2000: a política social sob a regência da financeirização”. IN: Novos Estudos. São Paulo: CEBRAP, v. 37 (2): 191-211, mai-ago/2018.

(2) https://oglobo.globo.com/economia/em-tres-anos-planos-de-saude-sobem-triplo-da-inflacao-mensalidades-escolares-dobro-24182717?utm_source=aplicativoOGlobo&utm_medium=aplicativo&utm_campaign=compartilhar

(3) Op. Cit. Reproduzo aqui nota das autoras acerca dos gastos com medicamentos entre as famílias brasileiras: São “Despesas com saúde, realizadas pelas famílias, sem direito a reembolso, nem pelo IRPF nem pelos planos de saúde. Na maioria das vezes, é uma despesa assumida na ausência de provisão pública. É bom lembrar que uma das despesas mais expressivas com saúde para as famílias é a aquisição de medicamentos: em 2013, apenas um terço da demanda foi atendida pelo sistema público (IBGE, 2014), muito embora o SUS dispusesse de um programa bem avaliado nessa área, o Farmácia Popular. Dados da última POF - Pesquisa de Orçamentos Familiares/IBGE, 2009, confirmam a baixa efetividade do programa: o maior gasto com saúde no primeiro quintil da distribuição de renda é justamente com compra de medicamentos (80%).”

(4) Ligia Bahia, Planos de saúde privados são predadores do SUS, Le Monde Diplomatique, 31/out/2019. Dísponível em: https://diplomatique.org.br/planos-de-saude-privados-sao-predadores-do-sus/

(5) Op.Cit. A autora complementa: “Aquisições e fusões de laboratórios de análises clínicas e exames de imagem, empresas oncológicas, oftalmológicas, farmácias, hospitais e empresas de planos de saúde conformaram oligopólios que definem preços e acesso, inclusive para a rede pública e usuários do SUS.”

 
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