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CRISE POLÍTICA NO PERU
Se aprofunda a crise política no Peru
Redação

As manifestações contra o Congresso, de maioria fujimorista, somam-se à proposta de adiantamento eleitoral do presidente Vizcarra que, por sua vez, enfrenta protestos contra o projeto Tía María de mega mineração, e uma greve da mineração iniciando nesta segunda-feira.

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Na última quinta-feira, 5 de setembro, na cidade de Lima, mais quatro mil pessoas se mobilizaram questionando o papel que vem cumprindo o Congresso da República, de maioria fujimorista, juntando à proposta de adiantamento das eleições dada pelo presidente Martín Vizcarra. Entretanto, o presidente não encontra o caminho livre, uma vez que os campesinos do Valle de Tambo, junto aos trabalhadores e ao povo da província de Islay (Arequipa), já lutam fazem mais de 50 dias pelo cancelamento definitivo do projeto Tía María (o Governo se viu obrigado a suspendê-lo por 120 dias) e contra o executivo que nos últimos dias endureceu a repressão militar e policial. Os setores em luta já anunciaram novas ações para os próximos dias, às quais se soma a greve nacional de trabalhadores mineiros que começa hoje (10 de setembro).

Qual o objetivo do Governo com o adiantamento das eleições

Cabe lembrar que o adiantamento, proposto pelo presidente Martín Vizcarra no dia 28 de julho, foi uma resposta do executivo para salvar o país da crise política que o Peru vive hoje como consequência das contradições entre as duas facções burguesas que ocupam o executivo e o parlamento.

O anúncio do adiantamento das eleições busca também desviar a atenção da população de Tambo contra o projeto de mega mineração Tía María que alguns dias antes havia sido iniciado e que rapidamente colocou o Governo em xeque, uma vez que este aprovou a licença da construção sem consultar o povo e se fazendo de surdo pro rechaço popular generalizado, assim aumentando significativamente o repúdio social. Por essa razão e pela forma como as empresas de mineração vêm operando no país com a permissão do Estado, surgiram outros conflitos na região sul, como o protagonizado pela população de Moquegua contra a mineradora Quellaveco, ou o das comunidades campesinas localizadas no chamado corredor de mineração, que abarca as regiões do Cusco, Apurímac e Arequipa.

O presidente Martín Vizcarra, amparado pelo enorme desprestígio do Parlamento de maioria fujimorista, sustentou sua proposta de adiantamento das eleições para 2020 argumentando que o congresso tinha um caráter obstrucionista e que, portanto, não o permitiam implementar suas medidas de reforma política aprovadas no referendo de dezembro de 2018 as quais, no momento de aprovação, foram oferecidas à população como a única opção viável para sair da crise. O que Vizcarra esqueceu de dizer é que, durante seu mandato e durante o governo de PPK (Pedro Pablo Kuczynski), o fujimorismo sempre esteve do lado com ele e com o seu antecessor em matéria econômica e trabalhista, por essa razão os projetos de razão pública apresentados todos os anos pelo executivo sempre foram referendados com o voto obsequente da maioria fujimorista do Congresso. Se isso foi possível foi porque, tanto o fujimorismo liderado por Keiko, como o setor liderado por Martin Vizcarra, os une no cordão umbilical do modelo neoliberal.

Por essa razão, horas antes de anunciar sua proposta de adiantamento das eleições, o presidente não teve uma ideia melhor que a de aprovar o Plano Nacional de Competitividade e Produtividade que, em linhas gerais, busca precarizar ainda mais o trabalho e facilitar a privatização dos recursos naturais e dos serviços públicos através da Associação Público Privada (APP), que é uma forma de implementar novas privatizações e concessões ao grande capital. Esta estratégia pró empresarial do Governo se dá como resposta ao impacto da crise econômica internacional que já se expressa no Peru através da redução do crescimento, que já gerou o aumento do desemprego, da inflação e dos índices de pobreza em diversas regiões que anteriormente vinham sendo beneficiadas pelos preços das matérias primas no mercado internacional.

Para o governo e os empresários é muito importante silenciar os protestos sociais retirando do cenário os temas econômicos (como as novas concessões às grandes mineradoras dos cortes nos direitos trabalhistas), uma vez que, desta maneira, podem aprofundar sua política de ajuste contra o povo e os trabalhadores. Por isso apelam ao adiantamento das eleições, para chegar a um novo consenso que desvie o descontentamento social que começa a emergir em setores como o campesinato da região sul e nas comunidades afetadas pelos projetos de mega mineração. Se eles obtiverem sucesso, a atenção do povo não se concentrará mais nas iniciativas do executivo, mas nas promessas da campanha e nas expectativas que uma mudança de governo sempre gera.

A resposta do fujimorismo

Entretanto e pensando mais para além do caráter de maquiagem desta medida, o fujimorismo incrustado no parlamento não gostou, uma vez que, frente a um eventual adiantamento das eleições, esta força política sairia dizimada, como evidenciado por muitos dos números expressos pelas empresas de pesquisa que demonstram a alta rejeição que os seguidores de Keiko Fujimori têm no parlamento.

Em função deste raciocínio, os congressistas fujimorismo aliados aos congressistas da APRA (Aliança Popular Revolucionária Americana) e a outros setores autodenominados independentes -todos unidos pelo medo de perder sua permanência no parlamento- vêm realizando tudo o que está a seu alcance para evitar que se concretize a iniciativa do adiantamento das eleições. Até agora eles não levaram a debate a proposta apresentada por Vizcarra e inclusive fizeram circular um boato de promover a vacância presidencial, além de organizar uma mesa diretiva absolutamente servil encabeçada pelo congressista Pedro Olaechea, de onde fazem a guerra contra o presidente da República. Todos estes acontecimentos levaram a que o rechaço ao parlamento de conjunto e ao fujimorismo em particular volte a manifestar-se com muita força, sobretudo em setores urbanos provenientes das classes médias, o qual vem sendo utilizado pelo executivo e seus aliados para passar para a ofensiva.

Cabe mencionar que as diferenças entre o fujimorismo liderado por Keiko Fujimori e o setor encabeçado por Martín Vizcarra, embora estejam em forma e se expressam na luta por quem controla o aparato do Estado para colocá-lo a serviço dos grandes capitais, no momento alcançaram fronteiras antagônicas, uma vez que o fujimorismo é consciente de que suas últimas cartas para liberar seu líder e tentar a possibilidade de voltar a lutar pela presidência nas próximas eleições, enquanto o presidente Vizcarra é consciente também que grande parte da sua popularidade se deve a sua suposta luta contra o fujimorismo. Por essa razão, a disputa entre estes dois poderes de Estado leva a que alguns setores interessados em distorcer a natureza da crise terminem naturalizando a ideia de que hoje a luta é entre os maus (fujimoristas) vs os bons (governo), o que ajuda a ocultar as verdadeiras razões da crise orgânica, a mesma que tem relação com as diversas instituições do Estado e os partidos políticos que perderam legitimidade ao se tornarem intermediários dos interesses dos empresários.

Unir as lutas para parar as políticas de ajuste

Desta maneira, os operadores políticos do Governo buscam construir uma falsa polarização entre o fujimorismo e o anti fujimorismo, mostrando como o problema central do país para, assim, tirar de discussão todo o questionamento às políticas econômicas do executivo que beneficiam, como já vimos, os grandes empresários. Vizcarra conta com todo o apoio tácito da burocracia sindical, dos partidos da esquerda reformista e neo reformista e diversas ONGs, quem utiliza a justa indignação popular contra os poderes do Estado para instrumentalizar esta estratégia de desvio da mobilização social. Sob o argumento de que com o adiantamento das eleições, todos deixarão, estes setores vêm construindo um discurso orientado a centrar todas as forças no adiantamento, com o qual oxigenam o governo e fundamentalmente evitam que os trabalhadores e o povo se organize para enfrentar as medidas de ajuste do executivo, o qual tem um caráter marcadamente empresarial.

No entanto, e como mencionamos no início desta nota, Vizcarra não tem o caminho livre uma vez que, como consequência do aprofundamento da desaceleração econômica, surgem novos conflitos sociais, alguns muito contundentes como o de Tambo e Islay, que obrigam que o Governo tire a máscara de progressista e acabe apelando à repressão e a criminalização dos protestos. Estas novas lutas sociais abrem a possibilidade para que se possa construir uma saída verdadeiramente independente e reforçada na luta e na auto organização dos trabalhadores e do povo. Para avançar neste caminho, é muito importante unir as diversas lutas que vem surgindo como a dos campesinos dos vales afetados pela atividade de mineração e os trabalhadores mineradores, por exemplo, criando assim espaços de articulação regional e nacional que nos permitam avançar até a possibilidade de implementar um Plano de Lutas Nacional, que contemple a realização de uma Greve Nacional operária, campesina e popular contra as políticas de ajuste do Governo.

 
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