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VAZA JATO
Lava Jato ocultou gravações sobre nomeação de Lula, que contrariam Moro e mostram conciliação petista
Yuri Capadócia

Novo vazamento de mensagens dos procuradores da Lava Jato mostra uma vez mais o conluio entre Polícia Federal, procuradores e juiz para formar peça de acusação e mobilizar a opinião pública. Grampos deixados de lado do processo mostram que a intenção principal de Lula na Casa Civil era restabelecer a governabilidade, conciliando com os futuros golpistas Temer, Renan Calheiros e Jader Barbalho.

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O mais recente vazamento de mensagens divulgadas em reportagem da Folha, em colaboração com o The Intercept, expôs novamente as articulações entre investigadores da Polícia Federal, procuradores e juiz para condenar Lula e manipular a opinião pública. No dia 16 de março, Moro tomou a decisão premeditada de vazar o diálogo entre Lula e Dilma, que confirmava a nomeação do ex-presidente para o cargo de ministro da Casa Civil. O diálogo, capitalizado imediatamente pela mídia e exposto em rede nacional, despertaria a fúria da base lavajatista contra a nomeação, apontada como um desvio de funcionalidade.

16.mar.2016
Carlos Fernando (18:40:09) Tá na globo news
Deltan (18:52:42) Ótimo dia rs
Orlando Martello (18:53:19) O q está na globo news? Os áudios?
Athayde (18:53:37) Tudo
Jerusa Viecili (18:53:40) Isso
Orlando (18:53:59) Eu deus!!! Rs
Athayde (18:54:11) O mundo caiu
Deltan (18:59:54) Caros vamos descer a lenha até terça
(19:00:02) por cautela falei com Pelella e deu ok

Jogando lenha na fogueira, que em pouco tempo iria acarretar no processo de impeachment de Dilma, Moro conseguiu mobilizar sua base para pressionar o STF para que barrasse a nomeação de Lula para o cargo, evitando assim que o ex-presidente escapasse de sua jurisdição. Entretanto, as mensagens revelam que os investigadores da PF tiveram acesso a outras 22 conversas, cujo conteúdo demonstrava que o intuito principal da nomeação de Lula não era salvar-se, mas salvar o governo da iminente derrocada atirando-se num renovado ímpeto conciliatório com o MDB, com Temer, Renan e Cunha.

No próprio contexto da época, Moro tinha plena consciência da ilegalidade daquelas escutas. No dia 16 de março, o juiz havia suspendido a interceptação das conversas de Lula, às 11h12. Porém, houve um lapso de tempo entre a decisão do juiz e a efetiva suspensão das escutas pelas operadoras de telefonia. Dessa forma, ilegalmente, a PF continuou grampeando as ligações de Lula por pelo menos 5 horas a mais, tendo acesso a outras 22 ligações realizadas por ele no período e que foram omitidas dos autos do processo. A parceria da Folha e do Intercept teve acesso ao resumo dessas conversas que eram enviadas pelos investigadores aos procuradores através do Telegram. Apenas o telefonema de Dilma para Lula, às 13h32, foi oportunamente selecionado e anexado posteriormente aos autos do processo.

As conversas expostas mostram como, a partir do momento que tomaram conhecimento do provável movimento de nomeação do ex-presidente, os procuradores se puseram a calcular qual o melhor momento para levantar o sigilo do processo e mobilizar sua base, em acordo também com o “russo” - apelido de Moro. O que revela como as ações da Lava Jato em momento nenhum se basearam na justiça, que foi se reduzindo a uma mera “filigrama”, nas palavras dos próprios procuradores, em comparação com os objetivos políticos da operação. Nem mesmo a consciência da ilegalidade do grampo, discutida no grupo, deteve o ímpeto político de condenação dos procuradores.

16.mar.2016
Deltan (12:44:28) A decisão de abrir está mantida mesmo com a nomeacao, confirma?
Sergio Moro (12:58:07) Qual é a posicao do mpf?
Deltan (15:27:33) Abrir

16 de março de 2016
Andrey (21:55:59) Mas juridicamente seria difícil argumentar q continuaria a ter validade apos a suspensao... Pode-se tentar, mas sera dificil
[...]
Carlos Fernando (21:58:06) O moro recebeu relatório complementar e o incorporou. Nesta altura, filigranas não vão convencer ninguém.
Jerusa (21:58:28) A operadora tinha autorizacao por 15 dias, ou seja ate dia 18/3. A operadora so interromperia antes se fosse comunicada.
[...]
Andrey (22:01:30) Se foi posterior, eu acredito q stf nao aceitara.A operadora so executa, nao eh parte. Mp e pf eh q sao.
Diogo (22:01:46) Nesta altura do campeonato
Andrey (22:01:48) Mas espero q esteja completamente errado
Antônio Carlos Welter (22:01:58) Se verdade, a autorização judicial cessou. Tendo sido desviado o audio, tem q desconsiderar
[...]
Carlos Fernando (22:02:48) O Moro aceitou.
[...]
Roberson Pozzobon (22:04:46) Creio que esse áudio, consolida uma situação de fato, mesmo na hipótese de nao ser formalmente utilizado daqui pra frente
[...]
Januário Paludo(22:39:17) Quem decide o que vai para os autos e o juiz. Se ele podia interromper também pode mandar juntar aos autos e validar. Filigrana.
[...]
Andrey (22:41:20) Januario, desculpe, eu nao vejo assim. Isso esta longe de ser filigrama na minha visao
(22:41:40) Se ele suspendeu a interc, juridicamente nada vale dps
(22:41:59) Eu espero q vcs estejam certos, mas nao eh tao tranquilo assim
[...]
Deltan (22:49:16) Andrey No mundo jurídico concordo com Vc, é relevante. Mas a questão jurídica é filigrana dentro do contexto maior que é político.
Andrey (22:59:55) Concordo Deltan
(23:01:28) Isso tera q ser enfrentado muito em breve no mundo juridico. O estrago porem esta feito. E mto bem feito

A divulgação dessas mensagens, pela Folha em parceria com o Intercept, reafirma a necessidade de que seja disponibilizado todo o conteúdo dos vazamentos. Parte do diálogo divulgado entre Moro e Dallagnol, sobre a decisão de levantar ou não o sigilo do processo, já havia sido publicado em uma das primeiras matérias da Vaza Jato (parte 4). Por que apenas agora o jornal sob o comando de Glenn Greenwald decide aprofundar a denúncia? Sob sua estratégia de conta gotas o Intercept vai controlando os ritmos da crise da Lava Jato, evitando que a operação sangre até o final. e preservando parte de sua iniciativa.

O renovado ímpeto conciliatório de Lula

O resumo das conversas de Lula interceptadas revelam que o intuito principal do ex-presidente ao ser nomeado a Casa Civil era recompor a governabilidade do fragilizado governo de Dilma, que sofreria o impeachment no mês seguinte. Se por um lado os diálogos afastam a tese de crime por parte do petista, revelam a tragédia da estratégia petista de combate ao golpismo. Tão crente estava do caráter inalienável de sua posição de conciliação como pilar do regime de 88, que o PT se recusou a enxergar que também de dentro de suas alianças vinha o golpismo que lhe retiraria do poder para intensificar os ataques que o partido já vinha descontado nas costas da classe trabalhadora.

Na lista de 22 telefonemas realizado pelo presidente, após a suspensão das escutas e ignorados pela justiça, estiveram nomes como Temer, principal beneficiado pelo golpe, os senadores emedebistas Renan Calheiros e Jader Barbalho, que votariam sim ao impeachment.

A amigável conversa com Temer ilustra excepcionalmente essa ilusão petista. Enquanto pede para Temer preparar o whiskey e o gelo para a futura conversa entre eles, convoca o futuro golpista a se aliar com ele numa frente da casta política contra o autoritarismo da Lava Jato, que segundo ele alimenta os golpistas. Frente a ameça golpista Lula diz que vai “restabelecer a relação carinhosa entre seres humanos nesse país”, e em outra ligação posterior afirma que quer ser “irmãos de fé”.

12h47 - resumo da ligação para Michel Temer nas palavras do investigador da PF:
"Diz que vão conversar amanhã. TEMER está em SÃO PAULO. LILS quer saber se o uísque está lá ainda. Diz que TEMER tomou um pouco. LILS quer conversar com TEMER porque aceitou a CASA CIVIL. TEMER diz que precisam conversar. LILS diz que quer mudar a relação de TEMER com o PALÁCIO. Marcam às 19 horas em SÃO PAULO. Pede para preparar o uísque e o gelo. LILS diz que aceitou porque há uma possibilidade de animar o país. LILS diz que ficou preocupado com a manifestação de domingo. Diz que ninguém ganhou com a manifestação de domingo. Diz que quem ganhou foi o combate à corrupção expressado na figura do MORO. Diz que esse combate à corrupção foi sempre um alimento para golpistas no mundo inteiro. E quem ganhou foi a negação da política. O que fizeram com a MARTA, com o AÉCIO, com o ALCKMIN. Diz que a classe política tem que se unir para recuperar o seu espaço. LILS diz que vai restabelecer a relação carinhosa entre seres humanos nesse país."

12h58 - 2ª ligação de Lula para Temer:
"[Temer] Diz que está muito preocupado com MAURO LOPES assumir antes de resolver essas questões. Fala da história da afronta. Tem que esperar mais uns dias. LILS diz que tentou falar com ela. Ela está em reunião. LILS quer ser o parceiro de TEMER para reconstruir a relação com PMDB. LILS quer ser irmãos de fé. Se coloca à disposição. Quer harmonizar isso. TEMER quer trazer algumas pessoas para a relação deles. TEMER vai chamar PADILHA. LILS diz para chamar. TEMER diz que sempre teve bom relacionamento com LILS."

Em ligação com o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), Lula chega ao ponto de afirmar que está disposto a chamar o próprio Eduardo Cunha para sentar pra conversar. No mês seguinte Cunha protagonizaria o show de horrores na Câmara, no qual se aprovaria o golpe. Ingenuamente, o PT ignorou a sanha golpista dentro do parlamento acreditando que o golpe assumiria apenas os instrumentos jurídicos e midiáticos, pensando que seria possível reverter no parlamento a degradação da democracia burguesa, unificando a casta política. Porém, também a maioria do parlamento comporia a frente burguesa que se levantaria contra o partido para consolidar o golpe institucional e intensificar uma agenda reacionária contra os trabalhadores.

A tirania da Lava Jato, o fracasso da estratégia petista e a necessidade da independência de classe

Os novos vazamentos - que ao não serem publicados em seu conjunto pelo The Intercept deixam muitos questionamentos no ar - mostram mais uma vez a seletividade dessa tirânica operação Lava Jato, blindando um dos partidos burgueses mais podres como o MDB ao não vazar as ligações que o comprometeriam como um dos pilares dessa suja casta política (optando por vazar apenas as ligações entre Dilma e Lula). Mas esses vazamentos também mostram a derrota da estratégia petista, que é a comprovação da tendência ao fracasso de toda estratégia que não se pauta pela independência de classe. O partido confiou tanto que seu lugar no regime era intocável, que deixou de perceber que todo o regime ao seu redor começava a ruir, sob efeito do rolo compressor da Lava Jato subordinada aos interesses capitalistas e fazendo emergir as forças que hoje colocaram no poder, ainda que de forma indireta, o herdeiro ilegítimo do golpe Jair Bolsonaro. Mesmo quando já se articulavam todas as forças para um golpe institucional que se preanunciava, o PT confiou mais nas alianças com o que havia de mais podre no regime ao invés de confiar e incentivar que as massas saíssem às ruas contra o golpe. Como já anunciamos muitas vezes, o PT teme, acima de tudo, o poder da luta de classes.

Nós do Esquerda Diário sempre exigimos a liberdade imediata de Lula, denunciando o autoritarismo da Lava Jato, mas sem prestar apoio político à estratégia falida de conciliação de classes do PT. Para vencer os diferentes projetos autoritários em choque, que tem como acordo comum a aprovação das reformas contra os trabalhadores, é preciso uma estratégia que se apoie na mobilização das massas e tenha independência de classes para derrotar Bolsonaro e o golpismo, o judiciário e também a casta política, impondo um programa dos trabalhadores para a crise criada pelos capitalistas.

 
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