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GOVERNO BOLSONARO
O que quer dizer a queda da aprovação de Bolsonaro?
Gabriel Girão

Nesta segunda (2), uma pesquisa publicada pelo Datafolha corrobora o que as pesquisas de opinião publicadas semana passada vinham mostrando: que a popularidade de Bolsonaro está decrescendo. Porém, o que siginfica politicamente isso? Bolsonaro estaria "morto politicamente" como alguns já estão falando? Buscamos nesse artigo discutir um pouco esses dados.

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A pesquisa publicada pela Datafolha nessa segunda-feira (2) traz dados muito interessantes: pela primeira vez, a reprovação de Bolsonaro está significativamente maior que sua aprovação. 38% acham ruim ou péssimo, frente a 29% que acham bom ou ótimo, além de 30% que acham regular. Muitos do que, com razão, tem ódio a esse governo, comemoraram os dados.

Para além da euforia, vamos aqui nos debruçar sobre o que esses dados querem dizer.

Analisando o conjunto de pesquisas, podemos ver que tem 2 "picos" na queda de popularidade. O primeiro é em maio, frente aos cortes da educação e os consequentes protestos. O segundo pico é em agosto, motivado principalmente por suas declarações xenofóbicas e pela crise na Amazônia. Serve para corroborar essa hipótese o fato de que, no Nordeste sua desaprovação saltou de 41 para 52%. Além dos moradores desta região, sua desaprovação se encontra majoritariamente em negros, mulheres, desempregados, ateus e quem ganha menos de 2 salários mínimos e, no outro extremo, quem ganha mais de 10 salários mínimos. A queda é generalizada. Mesmo que os índices sejam muito diferentes ainda, Bolsonaro também caiu nos setores e nas regiões geográficas mais tipicamente marcadas pelo apoio ao mesmo.

O que parece é que cada vez mais Bolsonaro começa a ter uma política voltada à sua própria base ideológica e de classe. Suas declarações e ações vão cada vez mais neste caminho explícito. Não à toa, um dos principais grupos em que Bolsonaro mantém uma alta taxa de apoio entre os evangélicos, com 47%. Entre aqueles que se declaram "empresários" esse índice 48%, afinal como diz o presidente, não há nada mais difícil no Brasil do que ser empresário.

Neste sentido, a queda da popularidade de Bolsonaro é um dado importante e é muito significativo que ele seja o presidente eleito com popularidade mais baixa em primeiro ano de mandato. Porém, não podemos cair no erro de exagerar as debilidades e não ver as "fortalezas" que o governo ainda mantém.

Se Bolsonaro é o pior presidente avaliado nos primeiros oito meses em primeiro mandato, ele também é que mais fez ataques. Só em 8 meses já vimos cortes na educação, reforma da previdência, Future-se, perda de direitos trabalhistas etc. Apesar de sua popularidade ter caído, Bolsonaro continua com uma aprovação significativa, de 29%, que ainda é maior que as intenções de voto que ele tinha antes da facada e decisão de importantes setores empresariais em apoiá-lo. Isso se traduz no resultado da Datafolha que aponta que 57% dos eleitores do Bolsonaro no segundo turno continuam o apoiando e aprovando seu mandato como "ótimo/bom". Além disso, 30% ainda avalia seu governo como como regular. Enquanto o setor que o aprova ainda é uma base de apoio para as medidas do governo, o setor que vê o governo como regular atua como uma espécie de pacificador para as tendências opositoras e na luta de classes, muitas vezes vendo que o Bolsonaro é um "mal menor de direita" frente ao PT.

Analisar com clareza as debilidades e fortalezas do governo é essencial para se ter uma política e estratégia correta para enfrentar Bolsonaro. A própria queda de popularidade do governo é utilizada por setores do STF e do Congresso aos seus próprios fins. Apesar de seus eventuais e recorrentes conflitos, estes setores tem em comum os ataques à classe trabalhadora, não a toa se uniram para passar a reforma da previdência. Inclusive, frente à crise política mais intensa no início do ano, fruto do conflito entre o governo e o Congresso, o presidente do STF Dias Toffoli atuou para pacificar a situação e preservar não somente o governo mas fundamentalmente os ataques que unem todos eles.

Apesar da importante queda de popularidade do governo o mesmo segue de pé, e, no recente momento, não há nenhum setor importante do regime que questione seriamente esse fato. Mais do que isso, o governo segue aprofundando seus ataques como a reforma da previdência, a retirada de direitos trabalhistas, o Future-se e o recente corte das bolsas, que se somam aos cortes que já tinham sido previamente realizados.

Dar o Bolsonaro como morto não apenas é uma análise exagerada da realidade como também é propositalmente feita com a intenção de legitimar a estratégia do petismo de fazer uma oposição meramente parlamentar e institucional e alimentar as ilusões de que Bolsonaro poderia cair por suas próprias contradições. Enquanto há comemoração de 5 pontos percentuais a menos na Datafolha, arde a Amazônia e a educação pública, subtrai-se direitos trabalhistas e previdenciários.

Estaria a estratégia de guerra híbrida encontrando seu limite?

Como é de público conhecimento, as fake news foram um fator essencial para a Bolsonaro se eleger. Longe de ser uma estratégia meramente para o momento eleição, Bolsonaro continuou usando a mesma estratégia durante seu governo. Combinando declarações com fake news ligadas aos fatos que geravam crise em seu governo, ele e seus agentes tentaram legitimar os cortes à educação e minimizar a crise da Amazônia, divulgando milhões de mensagens pessoais de whatsapp com supostas fotos de estudantes nus em universidades e chegando a falar que existiriam 100 mil ONGs na Amazônia.

Essa estratégia, conhecida como guerra híbrida, é alvo de muitas discussões no Brasil desde o ano passado. Como discutimos nesse artigo a tática de fake news e calúnias já é algo utilizado há muito tempo. É claro que as novas tecnologias facilitaram muito sua difusão. Porém, diferente de setores que viam nas guerras híbridas uma certa onipotência, nós sempre dizemos que a luta de classes é ainda um importante fator para definir a situação.

Eleito com um discurso de nova política e anticorrupção, o governo Bolsonaro rapidamente viu-se metido em esquemas de corrupções (dos quais o judiciário, desde Moro e Lava Jato mas também alas críticas da operação no STF o tem blindado) e obrigado a retomar a política do "toma lá dá cá" com o congresso. Foram bilhões de reais em emendas parlamentares para comprar deputados em apoio a Reforma da Previdência. Além de que, como já vínhamos remarcando desde as eleições, muitos dos setores que votaram em Bolsonaro não concordavam com sua agenda de ataques, com destaque para a Reforma da Previdência. Isso se soma ao fato que havia uma certa esperança de recuperação da economia que não se concretizou.

A crescente queda de Bolsonaro pode estar indicando que os métodos de guerra híbrida atingiram um limite para sustentar a popularidade do presidente quando eles não condizem com a realidade econômica, social e ambiental do país. Várias das declarações mais polêmicas do presidente, mesmo que acompanhadas de uma bateria de fake news, são reprovadas pela maior parte da população além de que 1/3 das pessoas crê que ele não se porta como um presidente deveria. Esses fatos se somam com a dificuldade que o presidente tem e terá em melhorar a economia, o que poderá atuar mais ainda para minar sua popularidade. Longe de acreditar que isto por si só irá derrotar o governo, cremos que esse fenômeno poderá acarretar interessantes movimentos políticos e até mesmo de luta de classes, de forma que os revolucionários tem de se preparar desde já para isso, aproveitando o momento para aprofundar as lições políticas enquanto esse questionamento não se expressa em luta de classes aberta. A atuação das direções sindicais e estudantis são um fator crucial a explicar como um questionamento crescente não se expressa com a força ativa que poderia ter.

O caso de Bolsonaro não é uma exceção na extrema direita internacional

O fenômeno da ascensão de Bolsonaro encontra-se inserido em um fenômeno maior de respostas à direita nas crises orgânicas que atravessam vários países, expressando em resultados eleitorais de ascensão da extrema direita internacional. Entretanto, essa não é a única tendência da realidade. Ao mesmo tempo também surgem fortes movimentos de mulheres, além de crescentes questionamentos sobre as questões ambientais pela juventude.

Bolsonaro, assim como os governos da direta, também tem dificuldade de levar seus planos até o final. A tendência recessiva mundial é um alerta disso, e o fracasso eleitoral do parceiro de Bolsonaro na Argentina, Mauricio Macri mostra importantes limites na consolidação à direita no nosso continente. O governo Trump tem sido alvo de protestos populares e teve parte de seus planos dificultados pelo congresso americano. Salvini na Itália viu seus intentos bonapartistas frustrados por um acordo no parlamento para formar um novo governo. O destino do Brexit está incerto até agora e, Boris Johnson, após movimentos para suspender o parlamento inglês, também está tendo de lidar com protestos da população. Alguns partidos de extrema direita na Europa, como o AfD alemão, perderam uma parcela significativa de votos, especialmente para setores "verdes" com questionamentos que podem abrir espaço a um anticapitalismo ou serem contidos nos marcos de um "capitalismo verde".

Estas dificuldades que a extrema direita encontra em impor seus programas mostra como, em nível internacional, a classe burguesa se encontra com profundas cisões em seu interior. Além disso, também é uma prova de que o pêndulo da luta de classes internacional não está definitivamente pendendo à direita.

Isso posto, não quer dizer que de forma alguma cremos que a extrema direita seja um mero desvio que possa ser corrigido e a ordem burguesa seguir de forma pacífica. É uma novidade histórica no Brasil que exista uma extrema direita consolidada, por mais encolhida que ela esteja agora em setembro comparada com janeiro e fevereiro. Mesmo que esta ainda tenha dificuldade em se impor, o crescimento da extrema direita global é fruto direto da crise mundial de 2008, sendo um dos indícios de putrefação do sistema capitalista. Fica portanto a tarefa dos revolucionários de acabar com esse sistema de miséria que engendra essa extrema direita odiosa.

Por uma estratégia para derrotar Bolsonaro e a extrema direita

Como já dissemos antes, a oposição encabeçada por PT e PCdoB tinham desde o início do ano uma política de oposição puramente parlamentar e que buscava nutrir as esperanças que o governo Bolsonaro iria cair "sozinho".

Quando o movimento estudantil entrou em cena no dia 15 de maio, estes mesmos partidos atuaram como forma de desmobilizar a luta. Se um dos diferenciais para que o dia 15 reunisse mais de um milhão de estudantes pelo país fosse sua autoorganização pela base, a UNE (dirigida pelo PCdoB) atuou de forma a impedir isso convocando atos desde cima e sem nenhuma organização efetiva nas universidades. Junto às centrais sindicais, como a CUT e CTB (dirigidas por PT e PCdoB respectivamente), fizeram de tudo para separar a luta contra os cortes da educação da luta da reforma da previdência. Como resultado concreto disso vimos a desmobilização e o refluxo do movimento. Este fato foi essencial para que não somente a popularidade Bolsonaro caísse mais lentamente, assim como para que o governo conseguisse passar a reforma da previdência e, na esteira disso, anunciar mais ataques como o Future-se e cortes de Bolsa.

Ver também: "As centrais sindicais precisam antecipar a greve geral unificando no dia 30 de maio com a juventude", diz Flavia Valle

Discutir o balanço profundo dessas lutas é uma tarefa para todos que se propõem seriamente a enfrentar o governo Bolsonaro. Junto a isso também é necessário questionar profundamente este sistema que engendrou este governo e a extrema direita internacional. A estratégia meramente eleitoral e institucional do PT não nos rende nenhum fruto frente aos ataques da burguesia, enquanto pode-se comemorar alguns pontos a menos no Datafolha a Amazônia arde, o direito à aposentadoria foi furtado e a educação universitária está em chamas. Enfrentar-se com Bolsonaro e a extrema direita passa por questionar o programa de classe do golpismo e sua continuidade, exige tirar lições da estratégia de conciliação de classes e mirar o fortalecimento nos locais de trabalho e estudo de uma estratégia socialista e revolucionária.

 
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