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OBSCURANTISMO
Negação do aquecimento global: mais um obscurantismo de Bolsonaro e adesão à extrema-direita global
Maré
Professora designada na rede estadual de MG

É a primeira vez que o governo brasileiro se reúne com negacionistas do aquecimento global. Embora absurdo, não é nada espantoso vindo de um governo com tendências obscurantistas, cuja política é ainda mais ofensiva contra o meio ambiente em nome do lucro.

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Bolsonaro, espelhado em Trump, enviou representantes diplomáticos a 13ª Conferência Internacional Sobre Mudança do Clima, nos Estados Unidos no último dia 25. Promovida pelo The Heartland Institute, o evento contou com a presença de alguns dos mais famosos expoentes da negação à existência do aquecimento global, membros deste instituto que defende a isenção do Estado com relação a políticas de mitigação das mudanças climáticas. O relato do ocorrido chega ao Brasil em telegrama assinado por Nestor Forster, encarregado de negócios na embaixada do Brasil em Washington.

O Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores) justificou o gesto do governo brasileiro como um “dever de informar”, por isso “diplomatas acompanham constantemente, em seus postos no exterior, discussões mantidas na academia, em think tanks, órgãos de imprensa e com formadores de opinião”.

O presidente Jair Bolsonaro foi mais agressivo em sua declaração: “[...]mudou o governo do Brasil. Aquela subserviência que tínhamos no passado de outros chefes de Estado para com o primeiro mundo não existe mais. Se fosse outro governo qualquer, quando estava em Osaka, no G20, quando viesse para cá, demarcaria mais 10, 15, 20 reservas indígenas” – disse, sem perder o costume de demonstrar a cada vez mais aparente total frieza com relação às vidas indígenas, frequentemente assassinadas. Este trecho vem de uma troca de farpas com a França no que tange o acordo da União Europeia com o Mercosul. Bolsonaro, então, finge oscilar seu alinhamento e aparecer como “independente de outros chefes de Estado” quando na verdade é o governo brasileiro mais subserviente aos imperialismos dos últimos anos.

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Apesar do possível alinhamento do governo brasileiro com a política negacionista, o diplomata que escreve o fatídico telegrama alerta: “O diretor do Heartland Institute também indicou disposição de cooperar com entidades não governamentais no Brasil relacionadas com os temas examinados durante a conferência.”. Poderia ser um posicionamento “desde fora” na discussão entre Brasil e França sobre o tratado EU-Mercosul? Já que o apoio da França à participação do Brasil nele supostamente “depende de ações concretas e resultados” acerca da diminuição da emissão de gases do efeito estufa (o que pode parecer uma preocupação da imperialista europeia com o meio ambiente, mas diz mais sobre ser favorecida ou não em terras brasileiras com suas “tecnologias limpas”, que tiveram que desenvolver por pressão popular, e explorando a variedade de matéria prima das florestas daqui).

Timothy Ball, autor de “Aquecimento global causado pelo homem – a maior fraude da história”, é um dos cientistas mais influentes sobre o governo americano e enviou um vídeo à Conferência. Vale dizer: nos EUA a discussão em torno das mudanças climáticas é um verdadeiro “fla X flu”, e faz parte dos “marcadores” para o que é identificado como esquerda ou direita por setores de massas. Em 2015 Barack Obama assinou o “Acordo de Paris”, uma política da ONU para supostamente diminuir a exposição de gases do efeito estufa. Em 2017 Trump retira os EUA deste acordo, Bolsonaro aplaude e, durante sua campanha, ameaça tirar também o Brasil (o que ainda não aconteceu). Na conferência, Myron Ebell, o ex-assessor para Assuntos Climáticos da Casa Branca, comentou que continuar no Acordo "devastaria as economias norte-americana e mundial e causaria um desastre econômico e social", ignorando que esse desastre está em curso, levando junto a catástrofes ambientais, fruto do capitalismo inevitavelmente predatório.

Apesar de, do ponto de vista econômico, Republicanos e Democratas terem uma política, em última instância, meramente capitalista, e a “ala esquerda” do regime estar muito longe de ser, de fato, de esquerda, o anti-cientificismo dos negacionistas do aquecimento global é facilmente reconhecido como reacionário. Nas palavras da direita: "Eles estão colocando em risco nosso modo de vida. O debate não é sobre mudança do clima nem sobre dióxido de carbono. Não é sobre clima nem ciência. É sobre socialismo contra capitalismo" – apelou à Conferência o hidrólogo Jay Lehr. É com isso que Bolsonaro não hesita em se alinhar, nada novo sob o sol de um governo que tem declarado repetidas vezes coisas como “o Brasil é a virgem que todo tarado de fora quer”.

O gesto do governo brasileiro indica uma nova aproximação ideológica com o imperialista Trump e a extrema direita mundial, que, não atoa, é o setor da política mais alinhado aos terraplanistas e anti-ciência. O ministro das relações exteriores, Ernesto Araújo, um nome da “ala ideológica” do governo Bolsonaro, diz que é preciso fazer “uma discussão aberta e não ideológica desse tema” [!], e já deixou clara a sua posição. “Nos Estados Unidos, foi feito um estudo sobre estações meteorológicas, e diz que muitas estações que, nos anos 30 e 40, ficavam no meio do mato hoje ficam no asfalto, na beira do estacionamento. É óbvio que aquela estação vai registrar um aumento extraordinário da temperatura na comparação com os anos 50. E isso entra na média global." – diz o “gênio”, como se nenhum climatologista sério tivesse pensado nisso.

Cientistas a serviço dos planos do imperialismo na América Latina e dos lucros dos capitalistas

Mesmo sendo cientistas, os ditos negacionistas do aquecimento global presentes na Conferência – e não quaisquer cientistas, nada menos do que Lord Cristopher Monckton, o ex-assessor da ex-primeira-ministra imperialista alemã Margaret Thatcher; e o próprio Myron Ebell, por exemplo – estão dentre os setores mais obscurantistas, com no mínimo séculos de atraso no que diz respeito aos avanços metodológicos e epistemológicos da ciência.

Isso quer dizer que, após décadas de incessantes discussões entre cientistas, filósofos, outros profissionais e, inclusive, políticos, discussões que estabeleceram um certo consenso no sentido de qual a quantidade de evidências necessárias para chegar a uma conclusão cientificamente robusta, os negacionistas do aquecimento global trilham a contramão, e afirmam que este fenômeno não existe e que a humanidade não interfere nas mudanças climáticas, com a justificativa de que não existem evidências suficientes.

Ou seja: para explorar desenfreadamente as riquezas naturais do Brasil, produzir desenfreadamente segundo as demandas dos capitalistas e não segundo as necessidades humanas, desmatar e predar o solo desenfreadamente segundo a vontade das grandes mineradoras, alagar vales inteiros segundo os interesses das grandes empresas energéticas... para atender aos interesses do capital há evidências suficientes. Mas para discutir um modelo de produção que seja compatível com a vida a curto, médio e longo prazo, não há.

A face obscurantista do governo Bolsonaro está evidente, parece não ter fim sua disposição para simplesmente negar os avanços que a humanidade conquistou a duras penas sob um capitalismo que, por subordinar o conhecimento ao lucro, é um entrave para o desenvolvimento da ciência. Para isso une o útil ao agradável (para os capitalistas): ataca as universidades, o livre pensamento, o conhecimento crítico, e corta verbas, bolsas de pesquisa, ameaça cobrar mensalidades, etc, buscando dar continuidade à resposta que tem dado a crise com a aprovação da reforma da previdência, descarregando-a nas costas dos trabalhadores e da juventude, em primeiro lugar das mulheres, negros, indígenas, imigrantes e LGBTs.

 
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